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Proc. nº 827/97 Cons. Messias Bento
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. A JUNTA AUTÓNOMA DE ESTRADAS (Direcção de Estradas do Distrito de Aveiro), na expropriação por utilidade pública da parcela nº 166, com a área de
2.690m2, a destacar de um prédio rústico composto de pinhal, sito em Mesura, S. Félix da Marinha, Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz sob o artigo 1.286º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 00272/28/087, em que são expropriados M... e J..., recorreu da decisão arbitral, por entender não haver lugar a indemnização pela servidão non aedificandi incidente sobre a parte sobrante.
Da decisão arbitral recorreram também os expropriados, sustentando que a mesma pecava por defeito.
O Juiz da Comarca de Vila Nova de Gaia, por sentença de 5 de Fevereiro de 1997, julgou procedente o recurso dos expropriados e improcedente o da expropriante.
Na sentença, recusou o Juiz aplicação à norma do artigo 8º, nº 2, do vigente Código das Expropriações, por inconstitucionalidade.
2. Dessa sentença interpôs recurso o MINISTÉRIO PÚBLICO, para apreciação da inconstitucionalidade do mencionado artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações.
Neste Tribunal alegou o Procurador-Geral Adjunto que conclui as suas alegações como segue:
1º - A norma constante do nº 2 do artigo 8º do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, é - tal como a norma que constava do artigo 3º, nº 2, do anterior Código - materialmente inconstitucional, por violação dos artigos 13º e 62º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, na parte em que não consente a indemnização do prejuízo resultante da imposição de uma servidão 'non aedificandi' sobre parcela sobrante do terreno expropriado.
2º - Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.
Os expropriados contra-alegaram, dizendo, a concluir, que, pelas razões invocadas pelo Ministério Público, se deve confirmar o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.
3. Com dispensa de vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentos:
4. O artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações (aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro), cuja aplicação foi recusada pela sentença recorrida, com fundamento na sua inconstitucionalidade, dispõe como segue: As servidões fixadas directamente na lei não dão direito a indemnização, salvo se a própria lei determinar o contrário.
Trata-se de norma cujo teor verbal é em tudo idêntico à do nº 2 do artigo 3º do Código das Expropriações anterior, aprovado pelo Decreto-Lei nº
845/76, de 11 de Dezembro.
De facto, no artigo 8º, nº 2, fala-se em 'servidões fixadas directamente na lei'; no artigo 3º, nº 2, aludia-se a 'servidões derivadas directamente da lei'.
Ora, este Tribunal decidiu, em inúmeros arestos, que o mencionado artigo 3º, nº 2, era inconstitucional, por violação dos artigos 13º, nº 1, e
62º, nº 2, da Constituição, enquanto não permitia que houvesse indemnização pelas servidões non aedificandi derivadas directamente da lei, desde que essas
servidões resultassem para a totalidade da parte sobrante de um prédio na sequência de um processo expropriativo incidente sobre parte de tal prédio, e quando este, antecedentemente àquele processo, tivesse já aptidão edificativa
[cf. os acórdãos nºs 594/93, 329/94 (publicados no Diário da República, II série, de 29 de Abril de 1994 e de 30 de Setembro de 1994, respectivamente),
800/93, 405/94, 438/94, 657/94, 71/95, 72/95, 112/95, 142/95, 154/95, 173/95,
192/95, 230/95, 250/95, 391/95, 588/95, 665/95, 174/96 e 299/97 (estes, por publicar)].
É que, tal como o Tribunal já tinha sublinhado no acórdão nº 184/92
(publicado no Diário da República, II série, de 18 de Setembro de 1992), a diminuição das utilidades da coisa, por virtude da imposição de certos vínculos administrativos (maxime, de uma servidão non aedificandi) é susceptível de fazer nascer uma obrigação de indemnizar. E, por isso, resultando essa servidão do acto expropriativo, tem ela de ser levada em conta na determinação do montante a pagar, a título de indemnização.
Sendo o conteúdo normativo do referido artigo 8º, nº 2, em tudo idêntico ao do artigo 3º, nº 2, há que, pelos fundamentos de tais arestos, para os quais se remete, repetir - agora quanto ao artigo 8º, nº 2 - esse juízo de inconstitucionalidade.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). julgar inconstitucional - por violação dos artigos 13º, nº 1, e 62º, nº 2, da Constituição - a norma constante do artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações de 1991 (aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro), enquanto não permite que haja indemnização pelas servidões fixadas directamente na lei, desde que essa servidão resulte para a totalidade da parte sobrante de um prédio na sequência de um processo expropriativo incidente sobre parte de tal prédio, e quando este, antecedentemente àquele processo, tivesse já aptidão edificativa;
(b). em consequência, confirmar o acórdão recorrido quanto ao julgamento da questão de constitucionalidade por ele feito. Lisboa, 19 de Fevereiro de 1998 Messias Bento Luis Nunes de Almeida Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca José Manuel Cardoso da Costa