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Processo n.º 628/97 Conselheiro Messias Bento
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. J... propôs, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, contra o ESTADO PORTUGUÊS e a C..., EP (em liquidação) uma acção ordinária, pedindo a condenação solidária dos réus no pagamento na quantia de 10.561.816$00, sendo 3.561.075$00 de indemnização pelo despedimento e 179.550$00 das remunerações equivalentes ao período de aviso prévio em falta.
A acção naufragou logo no saneador: para o que aqui interessa, o pedido formulado contra a C... foi, aí, julgado improcedente, uma vez que, no momento da propositura da acção - decidiu-se -, o crédito invocado pelo autor já tinha prescrito.
Inconformado, interpôs o autor recurso para a Relação de Lisboa. Mas esta, por acórdão de 24 de Setembro de 1997, julgou-o improcedente, por considerar que o crédito invocado tinha prescrito.
Ainda inconformado, o autor recorreu deste acórdão, ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, uma vez que
- disse -, nele, fez-se aplicação implícita da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 138/85, de 3 de Maio, que havia sido declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, pelo acórdão n.º 162/95, publicado no Diário da República, I série-A, de 8 de Maio de 1995.
O Desembargador relator não admitiu, porém, o recurso.
Disse, para tanto, que, 'em parte alguma se fez aplicação expressa ou implícita da norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º
138/85 [...]. Antes pelo contrário, teve-se o cuidado de expressamente referir que, para chegarmos à conclusão que o contrato dos A. tinha cessado, por caducidade, com a extinção da Ré C..., por via legal, não se tornava necessário aplicar ao caso aquela norma, bastando fazer a sua subsunção jurídica ao nº 1 da mesma disposição legal'.
2. É contra este despacho de inadmissão do recurso (de 15 de Outubro de 1997) que foi apresentada pelo autor a presente reclamação.
O Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal, no seu visto, disse que 'a decisão recorrida, ao julgar extinto por prescrição tal direito [refere-se ao direito a uma indemnização, que - por força da declaração de inconstitucionalidade constante do acórdão n.º 162/95 - o autor tem direito a receber pela cessação do seu posto de trabalho, decorrente da extinção da C...), fez aplicação implícita da norma já declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, o que conduz à verificação dos pressupostos de admissibilidade do presente recurso, devendo a reclamação ser julgada procedente'.
3. Corridos os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentos:
4. A presente reclamação deverá ser deferida, se o acórdão da Relação (de 24 de Setembro de 1997), de que o ora reclamante quis recorrer para este Tribunal, tiver feito aplicação, ainda que tão-só implícita, da norma constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 138/85, de 3 de Maio, segundo a qual 'a extinção da c... [determinada pelo artigo 1º, n.º 1, do mesmo diploma legal] implica [...] a extinção por caducidade imediata de todos os contratos de trabalho, em que seja parte a C... [...], sem prejuízo do direito aos salários e outras remunerações em dívida à data da extinção do contrato de que se trata' - norma que este Tribunal, pelo seu acórdão n.º 162/95
(publicado no Diário da República, I série-A, de 8 de Maio de 1995), declarou inconstitucional, com força obrigatória geral.
Se isso tiver ocorrido, mostram-se preenchidos os pressupostos do recurso interposto (recte, do recurso da alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional), pois que há também lugar para este tipo de recurso de constitucionalidade, sempre que exista contradição entre a decisão de que se recorre e um acórdão deste Tribunal, contendo uma declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral.
5. Vejamos, então:
No acórdão recorrido, afirmou-se que o caso ia ser decidido 'sem fazer apelo à norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º
138/85'. Ponderou-se, depois, que, em 8 de Maio de 1985 - que é a data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 138/85 - ocorreu a extinção, por caducidade, do contrato de trabalho, que ligava o reclamante à C.... Acrescentou-se que é jurisprudência pacífica que o prazo de 1 ano estabelecido no artigo 38º, n.º 1, da Lei do Contrato de Trabalho, 'relativo à extinção de créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação', se conta 'a partir do dia seguinte àquele em que cessou, independentemente da validade do acto que lhe deu causa ou do juízo sobre a sua ilicitude'. Recordou-se que a acção foi proposta em 26 de Abril de 1996. Isto ponderado, decidiu a Relação que 'bem julgou' o juiz da 1ª instância, 'ao considerar prescritos os créditos reclamados pelo autor, nesta acção, e ao não considerar a data da publicação do acórdão n.º
162/95, como a do início do prazo prescricional'. E, a finalizar - depois de insistir em que 'a decisão sob recurso resolveu bem a questão da prescrição dos créditos do autor' -, concluiu que se impunha a absolvição da ré C..., 'por virtude da procedência da excepção peremptória da prescrição' por ela invocada.
Este Tribunal teve já ocasião de, no acórdão n.º 513/97 (por publicar), decidir que 'a conclusão contida no acórdão recorrido de que 'à data da propositura da acção os créditos dos AA. estavam prescritos e por conseguinte extintos, há alguns anos', envolve aplicação pelo menos implícita da norma constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 138/85, de 3 de Maio, com preterição da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral dessa norma, proferida no acórdão n.º 162/95, deste Tribunal, publicado no Diário da República, I série-A, de 8 de Maio de 1995'.
É esta jurisprudência que aqui se reafirma, pois que ela é a única conforme com o sentido e alcance da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do mencionado acórdão n.º 162/95.
De facto, tal como foi explicitado no acórdão n.º 528/96 (publicado no Diário da República, II série, de 18 de Julho de 1996), esse sentido e alcance é o de que tal declaração de inconstitucionalidade 'impede, pelo menos, que a extinção ou cessação dos contrato de trabalho se faça sem que aos trabalhadores se pague uma indemnização - a indemnização correspondente à que lhes seria devida se tivesse havido despedimento colectivo'.
Ora, no caso, o reclamante peticionou, entre o mais, o pagamento de uma indemnização. E foi o direito a recebê-la que o acórdão da Relação lhe negou, com fundamento em que tal direito se achava prescrito - e, assim, extinto.
6. Conclusão: tendo o acórdão recorrido aplicado, ao menos implicitamente, a norma constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 138/85, de 3 de Maio, que este Tribunal já tinha declarado inconstitucional, com força obrigatória geral, estão verificados os pressupostos do recurso que o reclamante interpôs, mas que a Relação não admitiu.
Há, por isso, que deferir a reclamação apresentada contra o despacho que não admitiu tal recurso.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, defere-se a reclamação e revoga-se o despacho reclamado, a fim de que seja substituído por outro que admita o recurso interposto para este Tribunal.
Lisboa, 19 de Fevereiro de 1998 Messias Bento Luis Nunes de Almeida Fernand Alves Correia Guilherme da Fonseca José de Sousa e Brito José Manuel Cardoso da Costa