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Processo nº 348/97
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- Nos autos de inventário a correr termos no Tribunal Judicial da comarca de Vagos, instaurados por óbito de M..., os interessados L... e marido, inconformados com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de Outubro de 1996 - confirmativo do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 5 de Março de 1996, no sentido de que o pedido de apoio judiciário pelos agravantes, ora reclamantes, formulado, só tem efeito a partir da sua dedução, não abrangendo as custas contadas anteriormente - e o de 20 de Fevereiro de
1997, que desatendeu a arguição de nulidades do primeiro por invocada omissão de pronúncia, atravessaram requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, limitando-se a afirmar estarem em tempo e terem legitimidade, devendo, assim, o recurso subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.
Notificados nos termos e para os efeitos dos nºs. 1 e 2 do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, reagiram com o fundamento de terem cumprido o disposto nos artigos 70º, nº 1, alínea b), e 75º-A deste diploma legal, uma vez que resulta das alegações que apresentaram junto da Relação terem 'levantado o problema da inconstitucionalidade das normas aplicadas, por violação do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa', e, bem assim, decorre dos autos que a arguição de nulidades relativa ao acórdão de 30 de Outubro de 1996, teve por fundamento a omissão de pronúncia quanto ao problema de inconstitucionalidade equacionado na conclusão VIII daquelas alegações.
Face a semelhante atitude processual, o Senhor Conselheiro relator, por despacho de 10 de Abril de 1997, considerou não observado o disposto no citado artigo 75º-A, na medida em que os próprios recorrentes reconhecem que, por omissão de pronúncia, não se violou qualquer norma ou princípio constitucional, desse modo não admitindo o recurso.
Em conferência (artigo 688º, nº 3, do Código de Processo Civil), o Supremo, por acórdão de 8 de Maio seguinte, concordou com o despacho, decidindo não admitir o recurso para o Tribunal Constitucional.
É desse despacho que os interessados reclamam.
O MºPº emitiu parecer, nos termos do nº 2 do artigo 77º da Lei nº 28/82, no sentido da improcedência da reclamação.
Correram-se os vistos legais.
2.1.- Os ora reclamantes agravaram, na oportunidade, para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação de Coimbra de 7 de Junho de 1994, tendo sido notificados, após a fase das alegações, nos termos e para os efeitos dos artigos
143º a 145º do Código das Custas Judiciais, na sequência do que requereram a concessão de apoio judiciário, na modalidade de isenção total de preparos e custas até final, o que lhes foi concedido.
No entanto, o Supremo, por acórdão de 26 de Outubro de
1995, entendeu que o apoio judiciário não abrange actos processuais anteriores à formulação do respectivo pedido - o que ora é insindicável - pelo que, não tendo os recorrentes pago as custas, deviam os autos baixar ao tribunal a quo para aí se julgar deserto o recurso, como efectivamente veio a ocorrer, pelo acórdão da Relação de 5 de Março de 1996.
Inconformados, agravaram os interessados, novamente, para o Supremo pretendendo que, revogado o acórdão, se decida pela não obrigação do pagamento de preparos: por um lado, o pedido de apoio judiciário foi deduzido no decurso do prazo de pagamento das custas, o que provoca a suspensão desse prazo (nº 2 do artigo 24º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro), e, por outro lado, as normas citadas no acórdão recorrido não têm aplicação ao caso concreto, 'ou, se o tiverem, então tais normas violam o disposto no artigo 20º da Constituição e por isso são inconstitucionais [...]'.
O Supremo Tribunal de Justiça decidiria este novo agravo, confirmando o acórdão da Relação, através do aresto de 30 de Outubro de
1996 cujo recurso para este Tribunal está em causa.
2.2.- O Ministério Público, no parecer emitido ao abrigo do nº 2 do artigo
77º da Lei nº 28/82, pronunciou-se, como já se registou, pela improcedência da reclamação.
No seu entender, a decisão de que se pretende recorrer - ou seja, o acórdão de 30 de Outubro de 1996 - não aplicou a 'norma' cuja inconstitucionalidade fora suscitada pelos reclamantes, aplicada, efectivamente, pelo anterior acórdão de 26 de Outubro de 1995, onde se decidiu, com força de caso julgado, que o apoio judiciário não abrange actos anteriores à sua formulação e respectiva responsabilidade por custas.
Assim sendo, transitado em julgado o decidido, não é possível aos reclamantes aproveitar a 'ulterior prolação da decisão que se limita a considerar 'prejudicada' a questão suscitada, em consequência da formação de caso julgado e da indiscutibilidade das questões por ele abrangidas, para recobrarem tal questão'.
É certo - observa-se - que o acórdão recorrido acabou por dirimir questão diversa, não prejudicada pelo aludido caso julgado, traduzida em determinar qual a repercussão do não pagamento das custas devidas na sorte do agravo, considerando-se que o recurso deveria ficar deserto, nos termos do artigo 292º, nº 2, do Código de Processo Civil (redacção anterior ao Decreto-Lei nº 329-A/95) por a dedução do pedido de apoio judiciário carecer de efeitos retroactivos.
No entanto, acrescenta-se, por 'culpa evidente dos ora reclamantes', não se mostra devidamente suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa susceptível de abranger tal tema e que, nomeadamente, implicaria que se tivesse começado por questionar a norma em que fundamentalmente se fez assentar o efeito preclusivo - a do artigo 292º, nº 2, citado, conjugada com o disposto no artigo 24º do Decreto-Lei nº 387-B/87.
3.- Ora, independentemente de um juízo sobre a pertinência das observações avançadas pelo Ministério Público no sentido da improcedência da reclamação, o certo é que, desde logo, notificados ao abrigo do nº 5 do artigo
75º-A da Lei nº 28/82, para integrar o requerimento de interposição do recurso dos elementos previstos no citado preceito, os reclamantes não o fizeram. Ou melhor, fizeram-no defeituosamente, remetendo para anteriores peças processuais em termos que, se implicitamente subentendem a invocação da alínea b) do nº 1 do artigo 70º daquela Lei e denunciam uma parcial suscitação atempada das questões de constitucionalidade, não esclarecem, no entanto, que normas pretendem que o Tribunal aprecie.
Com efeito, importaria questionar a que 'normas aplicadas' se estão a referir, quais as 'normas citadas no Douto Acórdão recorrido [que] não têm aplicação no caso concreto, ou se o tiverem então tais normas violam o disposto no artigo 20º da Constituição e por isso são inconstitucionais porque impedem os Agravantes, dada a sua pobreza, de defender os seus Direitos'.
É que não só não se conhece, inequivocamente, qual a normação 'citada no acórdão' que os recorrentes têm por inconstitucional, como é certo que a equacionação da questão há-de ser feita clara e perceptivelmente, de modo a que o tribunal a quo, a quem a mesma é colocada, possa sobre ela pronunciar-se devidamente.
Por outro lado, e como o Tribunal Constitucional vem entendendo, a norma do artigo 75º-A não se limita a decretar um dever de colaboração do recorrente com o tribunal. Antes estabelece um requisito formal de apreciação do recurso de constitucionalidade que apenas pode ser apreciado em face das indicações fornecidas por aquele, por esse motivo sendo-lhe dada uma oportunidade de suprir essa falta, por parte do juiz, não admitindo que o tribunal possa, oficiosamente, substituir-se-lhe (cfr., inter alia, os acórdãos nºs. 402/93 e 636/93, publicados no Diário da República, II Série, de 18 de Janeiro e 31 de Março de 1994, respectivamente).
Não observado esse requisito pelos autores do requerimento, não obstante para o efeito terem sido expressamente notificados, não podia ser outro o despacho que não fosse o de não recebimento do recurso, atendendo ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 76º da Lei nº 28/82.
De qualquer modo - e para além disso - sempre se depararia ao Tribunal o trânsito em julgado da decisão sobre o apoio judiciário, como frisa o Ministério Público no seu parecer, após o que deixou de ser possível provocar a reponderação dessa matéria e a suscitação de questões de inconstitucionalidade a ela relativas.
4.- Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, com taxa de justiça que se fixa em 6 (seis) unidades de conta.
Lisboa, 5 de Fevereiro de 1998 Alberto Tavares da Costa Armindo Ribeiro Mendes Maria da Assunção Esteves Vitor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa