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Procº nº 796/96.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação do Porto e nos quais figura como recorrente o Ministério Público, concordando-se, no essencial, com a exposição lavrada pelo relator de fls. 61 a 64, que aqui se dá por integralmente reproduzida, decide-se não tomar conhecimento do recurso interposto por aquele recorrente. Lisboa, 26 de Fevereiro de 1997 Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa
EXPOSIÇÃO PRÉVIA Procº nº 796/96.
2ª Secção.
1. Em processo comum com intervenção de juiz singular pendente pelo 2º Juízo Criminal do Tribunal de comarca de Guimarães e no qual foi demandada como parte civil a companhia de seguros A., pretendeu a mesma, da sentença proferida em 11 de Julho de 1995 e que a condenou no pagamento de determinada indemnização, recorrer para o Tribunal da Relação do Porto.
Porém, como não tivesse pago no prazo a taxa de justiça a que se reporta o artº 192º do Código das Custas Judiciais, foi o recurso, por despacho de 27 de Outubro de 1995, dado sem efeito.
Desse despacho recorreu aquela seguradora para o Tribunal da Relação do Porto, sustentando, na respectiva motivação, a inconstitucionalidade da mencionada disposição do Código das Custas Judiciais.
A Relação do Porto, por acórdão de 9 de Outubro de 1996, negou provimento ao recurso, o que motivou, por entre o mais, que o Ministério Público, ao abrigo da alínea g) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, e ponderando o decidido no Acórdão nº 575//96 do Tribunal Constitucional, tivesse interposto recurso para este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa.
2. Entende-se, porém, que se não deve tomar conhecimento do recurso interposto pelo Ministério Público.
Na verdade, no citado Acórdão deste Tribunal, tirado por maioria, foi a norma constante do artº 192º do Código das Custas Judiciais julgada inconstitucional 'na medida em que prevê que a falta de pagamento, no tribunal a quo, no prazo de sete dias, da taxa de justiça devida pela interposição de recurso da sentença penal condenatória pelo arguido determina irremediavelmente que aquele fique sem efeito, sem que se proceda à prévia advertência dessa cominação ao arguido recorrente' (sublinhados da autoria do subscritor da presente exposição).
De outro lado, na fundamentação desse aresto foi, de uma banda, sublinhado que, sendo desiguais os regimes concernentes a custas nos processos civis e criminais, justifica-se o tratamento diferenciado e, consequentemente, não se divisava, nesse ponto, violação do princípio da igualdade. E, de outra, que a descortinada inconstitucionalidade residia, e tão só, na circunstância de, ao ditar a norma em apreço 'irremediavelmente a imediata deserção do recurso, pelo simples não cumprimento do ónus de pagamento da taxa', sem que ocorresse qualquer formalidade de aviso ou comunicação ao arguido sobre as consequências desse não pagamento, isso constituía 'uma intolerável limitação do direito ao recurso em processo penal', direito que deve ser perspectivado, no caso das sentenças penais condenatórias, como um 'direito fundamental' do arguido, para garantir que este 'tenha à sua disposição, de forma eficaz e efectiva, todas as garantias de defesa', garantias essas
(consagradas no nº 1 do artigo 32º da Constituição) no núcleo das quais se há-de integrar 'necessariamente' o 'direito ao recurso das sentenças penais condenatórias', recurso que 'pressupõe o duplo grau de jurisdição'.
Vale isto por dizer que o julgamento de inconstitucionalidade levado a efeito pelo aludido Acórdão nº 575/96 não se reportou a todo o comando constante da norma do artº 192º do C.C.J., mas sim e tão só a uma sua dada medida, qual seja a de, estando em causa um recurso interposto pelo arguido e respeitante a uma sentença penal que o condenou, não efectuando ele o pagamento da taxa de justiça nos sete dias contados desde a data da apresentação do requerimento de interposição ou da data da formulação processual da vontade de recorrer, isso ter por consequência que, sem qualquer outra formalidade tendente à sua advertência, tal recurso venha a ser dado sem efeito, e isso porque foi entendido que um regime como o consagrado nessa medida violava as garantias de defesa do mesmo arguido postuladas pelo nº 1 do artigo
32º da Lei Fundamental.
Ora, no caso dos vertentes autos, a companhia de seguros A.,não figura como arguida (é uma parte meramente civil) e pretendeu recorrer da sentença na parte em que na mesma foi condenada a pagar determinada indemnização, o que o mesmo é dizer que pretendeu recorrer no tocante à matéria civil da decisão (cfr. artº 403º do Código de Processo Penal).
Daí que se não possa dizer que a hipótese ora sub iudicio é coberta pela decisão tomada no Acórdão nº 575/96 e que, desta arte, o acórdão pretendido impugnar pelo Ministério Público tivesse feito aplicação de norma numa medida que, já anteriormente, fora julgada inconstitucional por este Tribunal.
Assim sendo, não se verifica, in casu, o pressuposto a que alude a alínea g) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, razão pela qual se propugna por não tomar conhecimento do recurso interposto pelo Ministério Público.
Cumpra-se, nesta parte, o disposto no nº 1 do artº 78º-A da dita Lei nº 28/82.
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Tocantemente ao recurso interposto pela companhia de seguros A., fixo em vinte dias o prazo para a produção de alegação.
Lisboa, 14 de Novembro de 1996.