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Proc. nº 838/97 Cons. Messias Bento
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. O Ministério Público recorre, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, da sentença de 3 de Outubro de
1997, do Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto, que, julgando verificados os créditos reclamados pela Fazenda Nacional, recusou aplicação, com fundamento na sua inconstitucionalidade, à 'conjugação normativa do artigo 3º do Decreto-Lei nº 199/90', de 19 de Junho, e mandou que a taxa de justiça fosse
'calculada de acordo com a tabela a que se reporta o Código das Custas Judiciais, e não a do mencionado preceito'.
Nos autos, é recorrida a A..., Ldª.
O relator elaborou exposição, nos termos do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional, concluindo que se deve julgar inconstitucional o mencionado artigo 3º do Decreto-Lei nº 199/90, de 19 de Junho, conjugado com a tabela I anexa, no trecho de que resulta a taxa de justiça para um concurso de credores com o valor de 1.604.622$00. E, justamente, pelos fundamentos do mencionado acórdão nº 1182/96, para os quais se remete. E, em consequência, que há que negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida quanto ao julgamento de inconstitucionalidade.
O Procurador-Geral Adjunto, na sua resposta, concluiu que:
1º - Não pode inferir-se do juízo de inconstitucionalidade ínsito no Acórdão nº
1182/96 que toda a tabela I de custas anexa ao Decreto-Lei nº 199/90, de 19 de Junho, seja materialmente inconstitucional, pelo facto de as custas devidas em certos processos tributários serem de valor mais elevado do que as que seriam devidas na jurisdição comum, em processos de função ou natureza análoga.
2º - Na verdade, importa ponderar, em termos concretos e casuísticos, qual o montante das custas devidas, formulando um juízo comparativo em função das tabelas anexas ao Código das Custas Judiciais e ao citado Decreto-Lei nº 199/90, tendo em conta o valor da causa e a repercussão que o montante devido possa ter na efectividade prática do direito de acesso à justiça fiscal.
3º - Não pode considerar-se desproporcionado o estabelecimento de um montante de custas, devidas em concurso de credores em execução fiscal de 14.263$00 -e representando o agravamento das custas tributárias, numa acção desse valor, cerca de 3 vezes o que corresponderia a processo, de idêntica natureza, que fosse instaurado perante os tribunais judiciais.
4º - Termos em que deverá, salvo melhor opinião, julgar-se procedente o presente recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida.
2. Cumpre decidir, com dispensa de vistos.
II. Fundamentos:
3. Este Tribunal, no seu acórdão nº 1182/96 (publicado no Diário da República, II série, de 11 de Fevereiro de 1997), julgou 'inconstitucional - por violação do direito de acesso aos tribunais, decorrente do artigo 20º, nº 1, da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade - a norma que se extrai da conjugação do artigo 3º do Decreto-Lei nº 199/90, de 19 de Junho, com as tabelas I e II a ele anexas, no trecho de que resulta a taxa de justiça para um processo de oposição com o valor de 24.910.629$00'.
O valor da reclamação de créditos é, no caso, de 1.604.622$00
(772.220$00+832.432$00).
No processo, não chegaram a ser calculadas as custas pela tabela I anexa ao mencionado artigo 3º. Decorre, porém, dessa tabela I que, para um valor de 1.604.622$00, a taxa de justiça é de 158.290$00. E como (por força do que dispõe o nº 1, alínea a), do artigo 12º do Decreto-Lei nº 449/71, de 26 de Outubro), no concurso de credores, quando, como é o caso, as custas fiquem a cargo do executado, a taxa de justiça é reduzida a um quarto, o seu montante seria de 39.572$50.
Ora, embora as custas judiciais, a pagar na jurisdição fiscal, não tenham que corresponder às custas devidas noutras jurisdições, elas não podem ser desproporcionadamente altas, em termos de tornarem particularmente oneroso o acesso à justiça.
É que - como se sublinhou no acórdão nº 352/91 (publicado no Diário da República, II série, de 17 de Dezembro de 1991) - o limite da liberdade constitutiva do legislador na fixação do montante das custas é, justamente, 'o da justiça ser realmente acessível à generalidade dos cidadãos sem terem de recorrer ao sistema de apoio judiciário'.
Há-de convir-se que as custas devidas na 1ª instância da jurisdição fiscal, sendo, no caso, 39.572$50, são, na verdade, desproporcionadas, muito principalmente quando em comparação com as que seriam pagas num tribunal cível. Aí, com efeito, a taxa de justiça, para um valor de 1.604.622$00, é de
54.000$00; e como, no concurso de credores, quando, como é o caso, não tenha havido oposição, a taxa de justiça é reduzida a um oitavo (cf. artigos 13º e tabela anexa, e 15º, nºs 1, alínea l), e 2, do Código das Custas Judiciais), o seu montante seria de 6.750$00.
A aplicação da referida tabela I conduz, em geral, a uma desproporção similar à que se deixa apontada. O facto de, nalgum caso, essa desproporção não ser tão significativa não justifica, por isso, que a norma sub iudicio seja julgada inconstitucional apenas em parte, e não na sua totalidade.
Há, por isso, que julgar inconstitucional o mencionado artigo 3º do Decreto-Lei nº 199/90, de 19 de Junho, conjugado com a tabela I anexa. E, justamente, pelos fundamentos do mencionado acórdão nº 1182/96, para os quais se remete. E, em consequência, há que negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida quanto ao julgamento de inconstitucionalidade.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide:
(a). julgar inconstitucional - por violação do direito de acesso aos tribunais, decorrente do artigo 20º, n.º 1, da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade - a norma que se extrai da conjugação do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 199/90, de 19 de Junho, com a tabela I anexa;
(b). em consequência, negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida quanto ao julgamento da questão da inconstitucionalidade. Lisboa, 4 de Fevereiro 1998 Messias Bento Bravo Serra Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca Luis Nunes de Almeida