Imprimir acórdão
Processo n.º 477/09
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. O Magistrado do Ministério Público pediu, no 2.º Juízo Cível de Santarém, a regulação do exercício do poder paternal relativamente ao menor A., nascido a 3 de Dezembro de 1991, filho de B. e de C.. Realizadas as diligências ordenadas pelo juiz, foi proferida sentença nos seguintes termos:
“(…)
A 18 de Abril de 2008, o Digno Magistrado do Ministério Público instaurou a presente acção contra (…) para regulação do exercício do poder paternal referente a (…), nascido a 03 de Dezembro de 1991.
Por força da ausência em parte incerta do requerido, foi este citado editalmente, sendo-lhe nomeado defensora oficiosa e tomando-se declarações à requerida.
Solicitou-se relatório social referente à requerida.
Após a junção aos autos do relatório solicitado à Segurança Social, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer pugnando, de forma explícita, pela conformação do regime do exercício das responsabilidades parentais às novas disposições introduzidas pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, atribuindo-se o exercício exclusivo das responsabilidades parentais à requerida dada a ausência em parte incerta do requerido.
Cumpre apreciar e decidir.
(…)
3. Questões a decidir
3.1 determinação da lei material aplicável;
3.2 definição da guarda do menor e do regime de visitas ao menor por parte do progenitor a quem eventualmente não for confiado;
3.3 definição da prestação alimentar a cargo do progenitor a quem o menor não for eventualmente confiado.
4. Fundamentos de facto derivados do teor do documento autêntico junto de folhas 4, das declarações de folhas 125 a 126 e do relatório social junto de folhas 130 a 132
4.1
A. nasceu a 03 de Dezembro de 1991 e é filho de B., casado e de C., solteira, nada tendo sido declarado quanto ao exercício do poder paternal perante o funcionário do registo civil.
4.2
A. vive e sempre viveu na companhia de sua mãe, vivendo exclusivamente na companhia desta desde os seus seis anos de idade, em casa própria desta.
4.3
C. está desempregada desde Março de 2008 e não recebe subsídio de desemprego, não tendo quaisquer encargos com amortização de empréstimos contraídos para aquisição da habitação.
4.4
A. completou o nono ano de escolaridade, tendo interrompido os estudos quando frequentava o décimo ano de escolaridade.
4.5
C. efectua alguns trabalhos esporádicos na agricultura e é auxiliada economicamente por duas filhas mais velhas.
4.6
B. está ausente em parte incerta e desde que A. completou seis anos de idade não teve mais contacto com este.
5. Fundamentos de direito
5.1 A 30 de Novembro de 2008, entrou em vigor a Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, que procedeu, entre outras alterações, à alteração do regime do exercício do poder paternal, procedendo a uma sua redenominação, passando a referência ao “poder paternal” a considerar-se substituída pela designação “responsabilidades parentais” nas epígrafes da secção II e da sua subsecção IV, do capítulo II, do título III, do livro IV do Código Civil e em todas as disposições da secção II, do capítulo II, do título III, do livro IV do Código Civil.
(…)
No entanto, mais importante do que esta redenominação, é a alteração introduzida no leque dos poderes-deveres dos progenitores não unidos pelo casamento e que não vivem em condições análogas às dos cônjuges, prevendo-se na Lei nº 61/2008, como regime regra, o exercício em comum das responsabilidade parentais por ambos os progenitores relativamente às questões de particular importância, exercício em comum que só é passível de ser afastado por decisão judicial fundamentada (artigos 1906º, nºs 1 e 2 e 1912º, nº 1, ambos do Código Civil).
No regime anterior, no caso de progenitores não unidos entre si pelo casamento e que não vivessem em união de facto, ou havia acordo dos progenitores no sentido do exercício em comum por ambos ou, não existindo tal acordo, o exercício do poder paternal competiria ao progenitor que tivesse a guarda do menor, presumindo-se iuris tantum que tal guarda cabia à mãe do menor. Ao progenitor a quem não competia o exercício do poder paternal assistia o poder de vigiar a educação e as condições de vida do filho (artigo 1906º, nº 4, do Código Civil, na redacção anterior à introduzida pela Lei nº 6 1/2008).
Apesar desta verdadeira revolução copernicana, no que tange o regime do exercício das ora denominadas responsabilidades parentais, ou talvez por isso, o legislador previu no artigo 9º da Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, que tal regime não se aplica aos processos pendentes em tribunal.
Assim, aplicando literalmente a lei, é expedita a conclusão de que à face do normativo que se acaba de citar não é aplicável ao caso dos autos o regime das responsabilidades parentais que emerge da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro.
No projecto de Lei nº 509/X que deu origem à Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, na publicação a que tivemos acesso, não se divisa qualquer norma transitória nem qualquer justificação para a norma transitória que acabou por figurar na Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro.
A questão que a referida norma transitória coloca é a de saber se é sustentável, do ponto de vista do princípio constitucional da igualdade, que o conteúdo dos poderes-deveres dos progenitores relativamente a seus filhos possa depender duma circunstância tão aleatória como é a propositura de uma acção.
A mesma norma suscita também a questão de saber quais os poderes-deveres dos progenitores que viram a sua situação resolvida antes da entrada em vigor da Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro. Será que continuarão a ter os mesmos poderes-deveres, não lhes sendo aplicável o novo regime e nem podendo tal alteração legislativa, por si só, fundamentar uma alteração da regulação do exercício do poder paternal- (neste sentido que decididamente repudiamos veja-se, Tomé d’Almeida Ramião, O Divórcio e Questões Conexas, Quid Juris 2009, página 164); ou, ao invés, em homenagem ao princípio constitucional da igualdade que impõe que situações iguais devam ser igualmente tratadas, bem como considerando as regras gerais sobre aplicação no tempo de normas relativas ao conteúdo de uma relação jurídica, abstraindo dos factos que lhe deram origem (artigo 12º, nº 2, 2 parte do Código Civil), deve o novo regime aplicar-se aos processos pendentes-
A circunstância da regulação do exercício do poder paternal resultar eventualmente de um acordo dos progenitores não é na nossa perspectiva bastante para que se entenda que existe uma relação contratual que se sobrepõe a uma nova regulamentação legal em que o legislador equacionou de modo totalmente diverso a configuração regra daqueles poderes-deveres. É que esse acordo estava sempre sujeito a homologação do Tribunal ou do Conservador do Registo Civil, homologação esta sempre norteada pelo supremo interesse do menor. Daí que se nos afigure descabido o apelo à natureza puramente contratual da regulação do exercício do poder paternal para entender que a nova lei sobre o conteúdo das responsabilidades parentais não é de aplicação às situações já resolvidas.
A nosso ver, a norma transitória em análise introduz um tratamento discriminatório, desigual e injustificado dos progenitores em função da simples propositura da acção e conduz ao absurdo do conteúdo dos poderes-deveres dos progenitores poder divergir tão só por causa daquele critério temporal. Pode até suceder que o mesmo progenitor tenha poderes-deveres distintos relativamente a filhos diferentes e de mães diversas, apenas porque os processos nos quais vieram a ser regulados o exercício do poder paternal/responsabilidades parentais foram instaurados em momentos diversos.
Em nosso entender, tal disposição transitória, com tal alcance, atenta contra o princípio da igualdade (artigo 13º da Constituição da República Portuguesa), na medida em que progenitores colocados na mesma situação de facto terão poderes-deveres diversos no que respeita as ora denominadas responsabilidades parentais, tão-só por causa do momento em que foi proposta a acção para tal regulação. Afigura-se-nos deste modo que aquela norma transitória enferma de inconstitucionalidade material e deve por isso ser desaplicada (artigos 13º 204º e 277º, nº 1, todos da Constituição da República Portuguesa).
Assim, desaplicando-se pelos referidos fundamentos o artigo 9º da Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, aplicar-se-á ao caso dos autos a nova lei.
5.2 O artigo 1912º, nº 1, do Código Civil prescreve que “quando a filiação se encontre estabelecida relativamente a ambos os progenitores e estes não vivam em condições análogas às dos cônjuges, aplica-se ao exercício das responsabilidades parentais o disposto nos artigos 1904º a 1908º.”
Por seu turno, o artigo 1906.º, n.º 1, do Código Civil prevê que “as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.”
“Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores” (artigo 1906º, nº 2, do Código Civil).
“O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente” (artigo 1906º, nº 3, do Código Civil).
“O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro” (artigo 1906º, nº 5, do Código Civil).
No caso dos autos, o menor está a viver na companhia da mãe e desde os seus seis anos de idade que não tem qualquer contacto com o pai, desconhecendo-se o paradeiro deste. Neste quadro factual é indubitável que é contrário ao interesse do menor o exercício em conjunto das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do menor.
Uma decisão no sentido do exercício conjunto das responsabilidades parentais em tais questões criaria uma situação de bloqueio dada a impossibilidade de estabelecer contacto com o progenitor do menor.
Neste contexto, o menor deve continuar a residir na companhia da mãe, competindo a esta o exercício das responsabilidades parentais não só no que respeita os actos da vida corrente do menor, mas também no que tange as questões de particular importância.
No que respeita o regime de visitas, desconhecendo-se o paradeiro do progenitor do menor, apenas há que deixar uma porta aberta a que se possam estabelecer visitas, mediante prévio aviso à mãe do menor e assentimento deste.
5.3 No que respeita os alimentos devidos ao menor, entendendo-se por tal tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário e educação (artigo 2003º do Código Civil), deve ter-se em atenção que os mesmos deverão ser proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los, não se olvidando ainda a possibilidade do alimentando prover à sua subsistência (artigo 2004º do Código Civil).
“Os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se houver acordo ou disposição legal em contrário ou se ocorrerem motivos que justifiquem medidas de excepção” (artigo 2005º, nº 1, do Código Civil)
“Se porém, aquele que for obrigado aos alimentos mostrar que os não pode prestar como pensão, mas tão-somente em sua casa e companhia, assim poderão ser decretados” (artigo 2005º, nº 2, do Código Civil).
A mãe do menor tem a guarda deste e, vivendo na sua companhia, já lhe vem prestando alimentos. Por isso, no caso dos autos, apenas há que decidir da fixação de alimentos ao menor por parte do pai deste.
As necessidades do menor são em tudo similares às de um jovem da sua idade.
Já no que respeita as possibilidades do obrigado a alimentos, resulta da matéria de facto provada que nada se apurou quanto ao modo de vida do pai do menor, desconhecendo-se inclusivamente o seu paradeiro. Em rigor, desconhece-se até se o progenitor do menor ainda está vivo.
Neste quadro fáctico, afigura-se-nos que não estão reunidos os pressupostos legais para que a obrigação alimentar que recai sobre o pai do menor seja fixada, devendo tal obrigação alimentar ser exercida contra os outros obrigados legais (veja-se o artigo 2009º do Código Civil; sobre esta questão veja-se, Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores), 2.ª Edição Revista, Coimbra Editora 2007, J. P. Remédio Marques, páginas 235 a 237).
O tribunal está bem ciente que a não fixação de qualquer obrigação alimentar a cargo do progenitor do menor inviabilizará o subsequente accionamento do Fundo de Garantia de Tribunal Judicial de Santarém Alimentos Devidos a Menores fundado no incumprimento daquele progenitor.
Porém, uma tal fixação, em clara violação de um dos parâmetros da determinação da obrigação alimentar previsto no artigo 2004º, nº 1, do Código Civil, constituiria uma verdadeira fraude à lei, porquanto se estaria a fixar uma prestação abstraindo de todo das possibilidades do obrigado a alimentos e com a certeza de que o montante fixado nunca poderia ser satisfeito, tudo com a estrita finalidade de fazer intervir o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.
Esta finalidade de protecção do menor é sem dúvida uma finalidade louvável mas, na nossa óptica, não justifica atropelos ao sistema legal vigente. Existem mecanismos de prestações sociais alternativas ao Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores com aptidão a fazer face às necessidades que o menor eventualmente tenha, como seja, a título de exemplo, o Rendimento Social de Inserção.
Na nossa perspectiva, cabe ao legislador, no uso da sua liberdade de conformação, vinculado às normas constitucionais (artigo 69º da Constituição da República Portuguesa), determinar sob que condições intervém o Fundo de Garantia de Alimentos a Menores, ou alterar as regras que regem a fixação da prestação alimentar, de modo a abstrair das possibilidades do obrigado a alimentos, impondo que seja sempre fixada uma prestação alimentar, ainda que num valor mínimo.
Assim, pelo que precede, face à impossibilidade de comprovação das possibilidades do pai do menor lhe prestar alimentos, não se fixa qualquer prestação alimentar a seu cargo.
6. Dispositivo
Pelo exposto, ao abrigo do disposto nos artigos 13º, 204º e 277º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa, decide-se desaplicar por inconstitucionalidade material o artigo 9º da Lei nº 6 1/2008, de 31 de Outubro e, em consequência, ao abrigo do disposto nos artigos 1912º, nº 1 e 1906º do Código Civil, na redacção introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro e dos artigos 2003º, 2004º e 2005º, todos do Código Civil, regula-se o exercício das responsabilidades parentais relativo a A., nascido a 03 de Dezembro de 1991, filho de B. e C., nos termos que seguem:
a) A. fica a residir na companhia de sua mãe, competindo a esta o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente da criança e bem assim o exercício em exclusividade das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância;
b) B. poderá visitar A. mediante aviso prévio à mãe do menor e assentimento deste;
(…)”
2. É desta decisão que o Ministério Público interpõe recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto nos artigos 70.º n.º 1 alínea a), 71.º n.º 1 e 72.º n.ºs 1 alínea b) e 2 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC). Admitido o recurso, o Ministério Público recorrente apresentou alegação, e concluiu:
“(…)
1- A Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, alterou diversos preceitos do Código Civil, designadamente os artigos 1904º a 1908º e 1912º, fixando num novo regime no que toca ao exercício das responsabilidades parentais.
2- A norma do artigo 9º daquela Lei, enquanto exclui a aplicabilidade aos processos pendentes daquele novo regime, não viola o princípio de igualdade não sendo, por isso, inconstitucional. (…)”.
3. O Ministério Público foi convidado a pronunciar-se sobre o eventual não conhecimento do recurso, com fundamento na falta de utilidade concreta da decisão da questão de inconstitucionalidade que é seu objecto. Manifestou, na sua resposta, concordância com tal solução.
II - Fundamentação
4. Em primeiro lugar, cumpre apreciar a questão prévia, oficiosamente suscitada pelo relator, atinente ao conhecimento do objecto do recurso.
O recurso de inconstitucionalidade desempenha uma função instrumental em fiscalização concreta, apenas havendo interesse processual em apreciar a questão de inconstitucionalidade suscitada quando o julgamento dessa questão for susceptível de se projectar, ou repercutir, de forma útil e eficaz, na decisão recorrida, de modo a alterar, no todo ou em parte, a solução jurídica que se obteve no caso concreto. Isso significa, como se afirmou no Acórdão n.º 498/96, “que o interesse no conhecimento de tal recurso há-de depender da repercussão da respectiva decisão na decisão final a proferir na causa. Não visando os recursos dirimir questões meramente teóricas ou académicas, a irrelevância ou inutilidade do recurso de constitucionalidade sobre a decisão de mérito torna-o uma mera questão académica sem qualquer interesse processual, pelo que a averiguação deste interesse representa uma condição da admissibilidade do próprio recurso”.
Carece, portanto, de utilidade o julgamento do recurso quando a solução a dar pelo Tribunal Constitucional à questão de inconstitucionalidade que integra o objecto do recurso for insusceptível de se projectar na solução dada ao caso concreto, que se mantém inalterada qualquer que venha a ser o juízo do Tribunal Constitucional sobre a questão jurídico-constitucional que lhe é submetida. E é este inequivocamente o caso dos autos.
O 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Santarém entendeu ser aplicável ao caso o regime introduzido pela Lei n.º 61/2008, mas julgou que o mesmo não era adequado, por o interesse do menor exigir que ele deveria ser entregue à guarda da mãe, a quem estava confiado, conforme se previa como regra no regime anterior ao da Lei já mencionada.
Na lógica da decisão recorrida, e independentemente do regime legal aplicável, sempre a acção deveria ter como decisão final a entrega do menor à mãe, por ser essa solução a única que garantiria o interesse que a causa protegia. Com feito, o menor estava a viver na companhia da mãe há largos anos, sem qualquer contacto com o pai, de quem se desconhecia paradeiro. Com este fundamento, o Tribunal considerou contrário ao interesse do menor o exercício em conjunto das responsabilidades parentais relativas à vida do menor, decidindo que este deveria continuar a residir na companhia da mãe, a quem passaria a competir o exercício das responsabilidades parentais. É, assim, de concluir que aplicando-se o regime regra anterior (de exercício do poder paternal pelo progenitor guardião) ou o actual (de exercício conjunto do poder paternal), sempre a ponderação das circunstâncias do caso conduziria o tribunal a entregar à mãe o exercício do poder paternal.
Verifica-se, pois, que a declaração de inconstitucionalidade proferida não teve qualquer efeito prático, pois que, apesar de o regime regra prever o exercício conjunto das responsabilidades parentais, ele era manifestamente inaplicável ao caso. Tal juízo retira, enfim, qualquer utilidade ao recurso, já que a eventual procedência da questão de inconstitucionalidade que integra o objecto do recurso sempre seria insusceptível de se projectar na solução dada ao caso concreto, mantendo-se a decisão impugnada em virtude do juízo alcançado quanto à opção da guarda do menor, qualquer que venha a ser o juízo formulado pelo Tribunal Constitucional sobre a questão que lhe é submetida.
E como também se não dá o caso de a questão ganhar relevância por via de qualquer outra acção a intentar ulteriormente, mormente quanto à questão alimentar, já que não foram, na altura, fixados alimentos ao menor, sendo certo que o menor atingiu, nesta data, a maioridade.
Em consequência, o Tribunal Constitucional não deve conhecer do objecto do recurso, por faltar utilidade ao seu conhecimento.
III. Decisão
5. Nestes termos, decide-se não tomar conhecimento do recurso. Sem custas.
Lisboa, 12 de Outubro de 2010.- Carlos Pamplona de Oliveira – José Borges Soeiro – Gil Galvão – Maria João Antunes – Rui Manuel Moura Ramos.