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Processo n.º 59/10
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em Conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. Nos presentes autos, A. e esposa, B., vieram apresentar requerimento, onde referem pretender “expor, reclamar e solicitar a aclaração do decidido”. Não obstante se reportarem expressamente ao despacho de 20 de Maio de 2010, compreende-se, pelo teor do articulado, que pretendem reagir da Decisão Sumária proferida em 23 de Junho de 2010.
Referem os reclamantes que não entendem a decisão, porquanto, no tocante ao não conhecimento do recurso, por intempestividade do respectivo requerimento de interposição, não são indicadas as normas jurídicas que fundamentam a decisão e, no que concerne às custas, falta a fundamentação fáctica respectiva.
Nestes termos, requerem a reparação do “lapso de linguagem” e, subsidiariamente, a aclaração dos segmentos de escrita que se revelam obscuros, face às omissões aludidas, mais invocando a nulidade da decisão, decorrente da falta de fundamentação de facto e de direito.
Terminam, requerendo a “correcção do decidido e/ou aclaração/definição deste quadro.”
Notificada a parte contrária, nada veio dizer.
II - Fundamentos
2. Analisado o teor do requerimento, constata-se que os reclamantes, não obstante pedirem uma aclaração, não especificam qualquer excerto da decisão, que, comportando alguma incompreensibilidade ou incongruência, torne inteligível o seu pedido, o que nos leva a concluir que a pretensão dos requerentes não corresponde substancialmente a uma dúvida ou dificuldade de compreensão da decisão.
Na verdade, a aclaração justifica-se quando a decisão é obscura – impedindo a inteligibilidade do pensamento nela expresso – ou ambígua – admitindo mais do que um sentido – o que não sucede in casu.
De facto, a decisão proferida é clara, não contendo ambiguidades ou obscuridades.
Os próprios reclamantes parecem reconduzir a invocada obscuridade à alegada “omissão de fundamentação”, pelo que, independentemente do nomen iuris que lhe atribuem, é no âmbito da invocação deste vício que a questão substancial deverá ser tratada.
Assim, tendo em conta a pretensão expressa pelos requerentes, que se reconduz, substancialmente, como vimos, a uma arguição de vício da Decisão sumária proferida, por falta de fundamentação – não obstante a equivocidade da referência à aclaração – conclui-se que o meio processual idóneo para tratamento de tal questão é a reclamação para a conferência, definida no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, razão que justifica a prolação do presente acórdão.
Na verdade, nada obsta a que o Tribunal decida a questão substancial colocada, no âmbito do meio processual idóneo, apesar de o seu accionamento não ter sido inequivocamente operado pela parte, que, in casu, não denomina a peça processual como reclamação, embora aluda à pretensão de “reclamar”. A interpretação defendida justifica-se, como se refere no Acórdão n.º 716/04 deste Tribunal, “(…) por um lado, porque, na estrutura do processo constitucional, a reclamação para a conferência, prevista no n.º 3 do art.º 78.º-A, da LTC, surge como um modo de reexame da decisão do relator, independentemente desta haver decidido o recurso de meritis ou com base em razões simplesmente processuais, conhecendo a conferência das questões nos mesmos termos e com o mesmo âmbito ou extensão do relator.
Por outro lado, porque não faria o mínimo sentido à luz da garantia constitucional a uma tutela efectiva e eficaz e dos princípios da economia, da celeridade e da preclusão processual (art.º 20.º da CRP), admitir-se a arguição de uma nulidade para o relator quando está configurada legalmente a possibilidade de a ver logo julgada por uma formação superior do Tribunal.
Numa tal situação, a reclamação para a conferência surge com a natureza de um verdadeiro “recurso ordinário” para os efeitos referidos no n.º 3 do art.º 668.º do CPC, disposição aplicável ao processo constitucional por mor do disposto no art.º 69.º da LTC. Estando previsto esse meio de reexame da decisão do relator, em tudo correspondente a um recurso de reexame, a nulidade da decisão do relator apenas poderia ser arguida perante a conferência e nunca perante o relator, de acordo com tal preceito do n.º 3 do art.º 668.º do CPC.”
3. Feito este esclarecimento prévio, justificativo da tramitação do requerimento apresentado como Reclamação para a conferência, cumpre apreciar da pertinência da arguição apresentada.
Os reclamantes vêm invocar a nulidade da decisão – reportando-se à Decisão Sumária proferida – por omissão de fundamentação.
Da mera leitura da decisão reclamada resulta que não lhes assiste razão, porquanto foram indicados, com suficiência, os argumentos de facto e de direito que fundamentam a decisão.
Na parte da decisão, que ditou a improcedência do recurso, ao contrário do que referem os reclamantes, a fundamentação jurídica – assim como a fáctica – é pormenorizada, contendo a expressa menção das normas aplicáveis, pelo que é manifesta a falta de razão da reclamação.
Na parte concernente a custas, segmento em que é feita expressa remissão para os critérios aludidos no artigo 9.º, n.º 1 do Decreto – Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro, igualmente é aduzida fundamentação suficiente.
Quanto a este específico ponto, convém relembrar que o cumprimento do dever de fundamentação é variável, dependendo o seu grau de exigência de várias circunstâncias, nomeadamente da importância da questão tratada, atendendo ao objecto do processo, da proximidade do sentido da decisão relativamente à letra inequívoca da lei a que a situação se subsume ou do grau de novidade da decisão, no sentido de a mesma corresponder a mera aplicação da corrente doutrinária/jurisprudencial unânime ou maioritária ou, ao invés, consubstanciar um desvio ao sentido que vem sendo geralmente defendido.
Ora, no caso concreto e no que à decisão quanto a custas concerne, realça-se que a condenação dos reclamantes é directa consequência, legalmente imposta, do não conhecimento do recurso, correspondendo a taxa de justiça fixada ao valor sedimentado pela jurisprudência reiterada e uniforme deste Tribunal, em situações semelhantes, pelo que não se justifica fundamentação mais vasta do que aquela que foi aduzida (cfr., no mesmo sentido, os Acórdãos deste Tribunal Constitucional n.ºs 168/05 e 223/06, disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt).
Nestes termos, considera-se tal arguição improcedente.
III - Decisão
4. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º do mesmo diploma).
Lisboa, 13 de Outubro de 2010.- Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.