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Processo nº. 165/92
2ª Secção Rel: Cons. Mário de Brito
1. Condenados em 28 de Outubro de 1991 na comarca de Tomar pelo crime de exercício venatório em local proibido, de acordo com os artigos 31º., nº. 11, da Lei nº. 30/86, de 27 de Agosto, e 37º. do Decreto-Lei nº. 274-A/88, de 3 de Agosto, e a Circular do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação
(M.A.P.A.) de 14 de Outubro de 1991, arguiram A. e B. a nulidade e inconstitucionalidade da sentença, por a proibição de caçar dever constar de portaria, não sendo pois legítima a forma utilizada, isto é, a circular. A reclamação foi, todavia, indeferida, por o fundamento invocado se não enquadrar em qualquer dos casos de nulidade da sentença taxativamente indicados no artigo
379º. do Código de Processo Penal.
Desse despacho recorreram os arguidos para a Relação de Coimbra, tendo concluído na respectiva alegação que a sentença deveria ser declarada nula, nos termos dos artigos 17º. e 29º., nºs. 1 e 3, da Constituição e 379º. do Código de Processo Penal. Mas o juiz não admitiu o recurso, por, em processo sumário, só ser admissível recurso da sentença ou de despacho que puser termo ao processo, conforme se dispõe no artigo 391º. do citado Código.
Contra o respectivo despacho reclamaram os arguidos, ao abrigo do artigo
405º. do mesmo Código, para o Presidente da Relação de Coimbra. Este, porém, em despacho de 20 de Janeiro de 1992, indeferiu a reclamação, por o despacho impugnado não ser susceptível de recurso ordinário:- recorrível era a sentença, mas dela não recorreram os referidos arguidos.
Expedida pela Relação, em 21 de Janeiro, carta registada para notificação dos arguidos, apresentaram eles no tribunal da comarca em 29 de Janeiro um requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional da sentença que os havia condenado, com fundamento na sua nulidade, face aos preceitos do nº. 2 do artigo 122º. e dos nºs. 1 e 3 do artigo 29º. da Constituição. O juiz não admitiu, todavia, o recurso, por intempestivo, dado o disposto no artigo 75º., nº. 1, da Lei nº. 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº. 85/89, de 7 de Setembro, até porque da referida sentença e pelos ora recorrentes não havia sido interposto qualquer recurso ordinário.
É do respectivo despacho que vem a presente reclamação, baseada em que a nulidade arguida foi a inconstitucionalidade da sentença, esta foi suscitada durante o processo e, nos termos do citado artigo 75º., nº. 2, 'o prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional só se conta a partir do momento em que se torne definitiva a decisão que não admitiu o recurso'.
Neste Tribunal, o magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação:- na verdade, o recurso para o Tribunal Constitucional era inadmissível, quer por extemporaneidade, quer porque nunca os reclamantes suscitaram a questão da inconstitucionalidade de qualquer norma, antes imputaram directamente a pretensa inconstitucionalidade à própria sentença condenatória.
Cumpre decidir.
2. Como se disse, os ora reclamantes interpuseram recurso para este Tribunal da sentença que os condenou pelo crime de 'exercício venatório em local proibido'. Indeferido o requerimento de interposição do recurso, reclamaram eles também para este Tribunal.
Na verdade, o nº. 4 do artigo 76º. da Lei nº. 28/82 prevê a reclamação para o Tribunal Constitucional do despacho que indefira o requerimento de interposição do recurso para o mesmo Tribunal.
Tendo esse requerimento sido indeferido por intempestivo, importa verificar se se verifica esse motivo de indeferimento:- com efeito, o nº. 3 do artigo
687º. do Código de Processo Civil manda indeferir o requerimento quando se entenda, v.g. que o recurso foi interposto fora de tempo.
Ora, nos termos do nº. 1 do artigo 75º. da Lei nº. 28/82 (na redacção que lhe foi dada pela Lei nº. 85/89), 'o prazo de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional é de 8 dias' e, tendo a sentença recorrida sido proferida em 28 de Outubro de 1991, é evidente que à data da interposição do recurso - 29 de Janeiro de 1992 - há muito tinha decorrido aquele prazo.
É certo que, interposto recurso ordinário que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da decisão - di-lo o nº. 2 do mesmo artigo 75º. -, o prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional se conta do momento em que se torne definitiva a decisão que não admite o recurso.
Mas este preceito é inaplicável ao caso, desde logo porque os ora reclamantes não interpuseram recurso ordinário da sentença, mas sim do despacho que indeferiu a reclamação por nulidade contra ela deduzida.
O requerimento de interposição do recurso não podia, pois, deixar de ser indeferido por estar fora de tempo.
Aliás, o recurso seria sempre inadmissível, uma vez que, como se entende uniformemente da doutrina e na jurisprudência deste Tribunal, objecto de fiscalização de constitucionalidade são apenas as normas - não, portanto, as decisões judiciais - e, no caso, a inconstitucionalidade foi sempre referida à sentença.
3. Pelo exposto, indefere-se a reclamação.
Custas pelos reclamantes com taxa de justiça de quatro unidades de conta.
Lisboa, 29 de Setembro de 1992
Mário de Brito Bravo Serra Luís Nunes de Almeida Messias Bento Fernando Alves Correia José Manuel Cardoso da Costa
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19920300.html ]