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Processo n.º 6-A/10
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Veio A. arguir a nulidade do Acórdão n..º 233/10, ao abrigo do disposto nos artigos 668.º, n.ºs. 1, c), e 3, do Código de Processo Civil (CPC) e 69.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), alegando, para tanto, que «a decisão que consta da alínea d) do seu n..º 6, na medida em que é aplicável ao reclamante, é contrária à fundamentação do mesmo Acórdão».
O Ministério Público, em resposta, considerou não padecer o referido Acórdão do arguido vício processual.
Cumpre apreciar e decidir.
2. Sustenta, em síntese, o requerente, para consubstanciar o arguido vício, que o Acórdão em causa, na parte em que determinou a imediata remessa do processo ao tribunal recorrido, nos termos do n.º 2 do artigo 720.º do Código de Processo Civil, e se considerou transitado com a extracção do traslado é, no que respeita à sua pessoa, contraditória com a sua própria fundamentação, pois que os fundamentos aduzidos para justificar a aplicação do citado normativo legal não se referem à sua conduta processual, nem se poderiam referir por não ser esta qualificável como infundada ou dilatória, como o demonstra a sua concreta trajectória processual nos autos, que sintetiza.
Afigura-se, contudo, não lhe assistir razão.
Com efeito, apenas se verifica a nulidade processual tipificada na invocada norma do artigo 668.º, n.º 1, alínea c), do CPC, quando se surpreende, na estruturação do acórdão, a existência de contradição lógica entre os fundamentos (de facto e de direito) da decisão e esta última. Ou seja: um vício de raciocínio, um erro lógico, uma incoerência entre a fundamentação (que aponta em dado sentido decisório) e a decisão (que, surpreendentemente, segue em sentido oposto ou, pelo menos, diverso).
Ora, analisado o conteúdo do Acórdão n.º 233/10, na parte relevante, não se descortina a existência de qualquer contradição lógica entre as razões invocadas e a decisão tomada.
Com efeito, o raciocínio estruturante da decisão, na parte atinente à extracção de traslado e remessa dos autos ao tribunal recorrido, reside na factualidade processual complexa referente à existência, no processo, de sucessivos incidentes processuais com evidentes fins dilatórios, de que são enumerados alguns exemplos, conjugado com factos respeitantes à «longa duração do processo» e à circunstância de a decisão final quanto ao recurso de constitucionalidade ter já transitado em julgado relativamente aos recorrentes que não reclamaram da decisão sumária, e àqueles que o fizeram mas sem sucesso, ou estar prestes a transitar para alguns outros recorrentes.
Foi apenas esta e não outra a fundamentação da decisão tomada, pelo que é à luz deste enunciado de razões que se deve aferir da existência da apontada contradição lógica, sendo irrelevante, como é sabido, o juízo que a parte faça sobre a insuficiência ou incorrecção jurídica das razões que fundamentaram o decidido, quer ao nível da subsunção dos factos ao direito, quer ao nível da interpretação da norma jurídica aplicada (erro de julgamento).
A esta luz, é, pois, de concluir que nenhuma das razões efectivamente invocadas no Acórdão em referência para justificar a aplicação do artigo 720.º do CPC, isolada ou conjugadamente apreciadas, apontariam para decisão oposta ou diversa da que foi proferida.
O requerente invoca, no entanto, que inexistem no processo razões que justifiquem, em relação a si, a aplicação do artigo 720.º do CPC, por considerar que o seu comportamento processo não é qualificável como abusivo, por não dilatório ou manifestamente infundado.
E, no essencial, é com esta linha de argumentação que o ora requerente pretende demonstrar que se verifica, no caso, a nulidade por oposição dos fundamentos com a decisão, quando expressamente repudia «qualquer sugestão de uso de expedientes dilatórios (…) e sublinha que se limitou, «em todos os momentos, em usar os direitos processuais que a Constituição e a lei lhe conferem, não tendo, em nenhum momento, abusado de tais direitos», enunciando, por recurso aos autos, um percurso processual que considera, sob uma tal perspectiva, insusceptível de reparo.
Mas uma coisa é a bondade da decisão, para o que relevam os supostos erros de subsunção ou interpretação; outra a sua validade, que apenas assenta, para o que agora interessa, na sua intrínseca coerência lógica (ou falta dela).
Assim sendo, não se verificando qualquer contradição lógica entre a decisão de ordenar a extracção de traslado e a sua imediata remessa dos autos ao Tribunal recorrido, com as legais consequências processuais, e a fundamentação para tanto invocada, e sendo, em rigor, irrelevantes os argumentos invocados em sentido contrário pelo ora arguente, cumpre indeferir o requerido.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir o requerido.
Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 10 UC.
Lisboa, 22 de Setembro de 2010. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.