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Procº nº 219/91
1ª Secção Rel. Cons. Vítor Nunes de Almeida
Acordam na 1ª secção do Tribunal Constitucional:
1. - O Procurador-Geral Adjunto em exercício junto deste Tribunal veio requerer, ao abrigo do preceituado no artigo 69º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, conjugado com os artigos 669º, alínea a), e 716º, nº 1, do Código de Processo Civil, a aclaração do Acórdão nº
69/92, de 24 de Fevereiro de 1992.
Para tanto alegou que nele se produziram afirmações contraditórias que originam obscuridade ou ambiguidade do acórdão. Assim, refere que a fls. 238 dos autos se escreveu:
'O réu A. recorreu da decisão para a Relação do Porto visando obter uma atenuação especial da pena e a suspensão da sua execução, mas sem que nas alegações tenha suscitado qualquer questão de constitucionalidade e, não levantando por forma expressa, a questão de renovação da prova, suscita algumas questões relativas à matéria de facto, designadamente, quanto às respostas aos quesitos 2º, 3º 4º, 5º e 6º na perspectiva da existência ou não de provocação
(ponto II das alegações) e ainda quanto à resposta ao quesito 13º na qual se acusa o Colectivo de ter exorbitado em tal resposta inserindo nela 'matéria conclusiva a tirar dos factos e não um facto em si' (ponto VI das alegações).'
(Sublinhados acrescentados).
Esta afirmação do acórdão é reproduzida, no nº 4 da Parte II - Fundamentos (fls. 7-8 do acórdão; fls.
243-244 dos autos), nos seguintes termos:
'4. - É manifesto que o recorrente não pediu nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação a renovação da prova, mas o certo é que não deixou de suscitar várias questões acerca da alteração da matéria de facto, como acima se referiu (ponto 1), questões que manteve no recurso para o S.T.J..' (Sublinhados acrescentados).
Ora, no mesmo texto escreveu-se e, segundo o requerente, por forma contraditória, que 'o recorrente não pediu a alteração da matéria de facto' (fls. 246) e 'mesmo não tendo havido alteração da matéria de facto' (fls.248), expressões que gerariam a referida ambiguidade do acórdão.
Mais refere o requerente:
'2. Acresce que, tendo o signatário sustentado nas suas alegações - como foi transcrito no relatório do acórdão - que 'o recorrente não questionou a matéria de facto apurada pelo tribunal colectivo mas apenas a valoração jurídica que dela foi feita', as primeiras passagens transcritas do acórdão - onde se afirma que o recorrente suscitou várias questões acerca da alteração da matéria de facto - implicam que o signatário terá faltado ao seu dever de objectividade e rigor, afirmando uma realidade (e não uma mera opinião jurídica, esta sempre contestável) que o Tribunal deu por não verificada.
Ora, o que se afirmou nas alegações - que o recorrente não questionou a matéria de facto apurada pelo tribunal colectivo mas apenas a valoração jurídica que dela foi feita - corresponde ao que dos autos, a nosso ver, inequivocamente resulta, e por isso se mantém e reitera tal afirmação'.
Seguidamente, com a transcrição de parte das alegações do recorrente, propõe-se o requerente demonstrar o que entretanto deixara afirmado.
2. - Ouvido sobre a questão suscitada pelo Ministério Público, o recorrente A. nada veio dizer aos autos.
Corridos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
3. - Quanto ao pedido de esclarecimento:
As expressões indiciadas como contraditórias não o são, de facto. Com efeito, o recorrente não pediu, por forma expressa, a alteração da matéria de facto, como se diz a fls. 238. Isso, porém, não pode significar que o Tribunal não possa extrair do conjunto das alegações do recorrente uma outra conclusão no sentido de que, de qualquer modo, põe em causa matéria de facto, como fez, sem qualquer ambiguidade.
Por outro lado, o Tribunal colocou a si próprio a seguinte interrogação: 'não poderá verificar-se uma diferente forma de «aplicação» da norma sem ser como fundamento de indeferimento da pretensão de alteração da matéria de facto?' (ponto 4 in fine do acórdão, a fls. 246) e deu-lhe resposta positiva.
A esta luz, nada tem de contraditório e também não põe em causa a posição sustentada nas alegações do Ministério Público no plano da afirmação acerca de uma realidade, antes correspondendo a uma divergência quanto a possíveis entendimentos acerca de uma mesma factualidade, o inciso 'mesmo não tendo havido alteração da matéria de facto'.
Na verdade, não houve qualquer alteração da matéria de facto e, não a houve - entendeu o acórdão - pela razão simples de que o tribunal recorrido, por ter utilizado o artigo 665º na interpretação do Assento de 29 de Junho de 1934, logo à partida afastou qualquer hipótese de vir a proceder a tal alteração.
Ficam, assim, devidamente esclarecidas as dúvidas geradas pelas expressões objecto do reparo do Exmo. Procurador-Geral Adjunto.
4. - Quanto às restantes observações do requerente dir-se-á apenas que, o Tribunal não questiona, obviamente, a objectividade e rigor das alegações do Ministério Público, sendo certo porém que não está vinculado ao entendimento nelas propugnado.
Nestes termos, decide-se desatender o pedido de aclaração formulado pelo Digno representante do Ministério Público junto deste Tribunal.
Lisboa, 1992.09.29
Vítor Nunes de Almeida
António Vitorino
Alberto Tavares da Costa
Maria da Assunção Esteves
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
José Manuel Cardoso da Costa
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19920292.html ]