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Procº nº 535/93.
2ª Secçäo. Relator:- Consº BRAVO SERRA.
1. O Tribunal do Trabalho de Leiria, nos autos de execução por coima em que é executada A., deprecou ao Tribunal de comarca de Alcobaça a realização de penhora em bens pertença da executada, suficientes para garantir o pagamento da quantia de 6.323$00 e juros, além da notificação da mesma executada para, querendo, deduzir oposição à execução.
2. Recebida a deprecada no Tribunal de comarca de Alcobaça, o respectivo Juiz, em 5 de Maio de 1993, exarou o seguinte despacho:
'Este Tribunal não tem competência, em razão da matéria, para proceder à diligência deprecada (artº 56º e 64º da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro e 66º e 67º do Código de Processo Civil.
É certo que o artº 26º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 315/89, de 21 de Setembro, permite que se depreque aos Tribunais de competência genérica que se não situem na localidade sede do Tribunal de Trabalho territorialmente competente a realização de diligências como a presente.
Porém, esta norma é organicamente inconstitucional, pois que o Governo invadiu, sem que para tal estivesse autorizado, matéria da reserva relativa de competência da Assembleia da República [cfr. artº 168º, nº 1, alínea q) da Constituição da República; neste sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional, nos Acordãos nº 374/92 e 375/92].
As normas inconstitucionais não podem ser aplicadas pelos Tribunais, pelo que tudo se passa como se as mesmas não existissem (artº 207º da Constituição da República).
O cumprimento das cartas precatórias deve ser recusado, além do mais, quando o Tribunal carecer de competência para o acto requisitado (artº
184º,nº 1 do Código de Processo Civil).
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Face ao exposto, recuso o cumprimento da carta precatória e determino que a mesma seja devolvida à entidade deprecante.----------------------------------------'
3. Do transcrito despacho recorreu para o Tribunal Constitucional o representante do Ministério Público junto do Tribunal de comarca de Alcobaça, o que fez, disse, 'nos termos do artigo 70 nº. 1 al. a) e
72 nº. 3 da Lei 28/82 de 5 de Novembro', por isso que com tal despacho foi recusado o cumprimento da deprecada 'por alegada inconstitucionalidade da alteração dada ao artigo 26 nº. 1 do Código de Processo Trabalho pelo Decreto-Lei 315/89 de 21 de Setembro'.
4. Admitido o recurso, neste Tribunal apresentou alegação o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto aqui em funções, que a concluiu no sentido de se dever confirmar a decisão recorrida na parte impugnada, dado que a norma constante do nº 1 do artº 26º do Código de Processo de Trabalho, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 315/89, de 21 de Setembro, é organicamente inconstitucional, por isso que a mesma incide sobre matéria contida na reserva legislativa de competência da Assembleia da República e, não obstante, foi editada por diploma emanado do Governo sem que estivesse munido da necessária autorização legislativa, pelo que é ela violadora da alínea q) do nº 1 do artigo
168º da Constituição.
5. A norma objecto de apreciação no presente recurso foi já, por intermédio do Acórdão nº 805/93, deste Tribunal (publicado na 1ª Série-A do Diário da República de 4 de Janeiro do corrente ano), declarada inconstitucional com força obrigatória geral.
Assim sendo, em face de tal declaração, nada mais resta do que aplicá-la ao vertente caso.
Nestes termos, nega-se provimento ao recurso.
Lisboa, 16 de Fevereiro de 1994
Bravo Serra Fernando Alves Correia Luís Nunes de Almeida Messias Bento José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca José Manuel Cardoso da Costa