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Processo n.º 271/10
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. A. e Outros, notificados da decisão do Tribunal da Relação do Porto de 6 de Julho de 2009, que decidiu confirmar a decisão da 4.ª Vara Cível do Porto e negar o arresto preventivo de bens por si requerido, interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça pedindo, nomeadamente, a reforma quanto à condenação em custas e terminando o seu requerimento nos seguintes termos:
“4) Desde já, para processar oportunamente, declaram a intenção de recorrer do decidido em aplicação de dimensão normativa inconstitucional e interpõem recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional (artigo 70.º, n.º 1, al. b) da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82).”
Este recurso não foi admitido no Supremo Tribunal de Justiça. Após indeferimento de um pedido de aclaração e reforma quanto a custas, os recorrentes formularam o seguinte pedido ao Relator, na parte que ora releva:
“(…) 22) Oportunamente, os recorrentes declararam a sua intenção de recorrer do decidido em aplicação de dimensão normativa inconstitucional e interpuseram recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional (art. 70°, n°1, al. b) da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82).
23) O que aqui renovam e ampliam ao decidido em contrário à Constituição não apenas no acórdão do Tribunal da Relação do Porto como, agora também, neste Supremo Tribunal de Justiça, nos acórdãos de 5 de Novembro de 2009 e 10 de Dezembro de 2009: novamente sobre custas judiciais mas agora, também, pelas dimensões normativas encontradas e aplicadas para o disposto nos artigos 387-A° e 721-A° do CPC, em violação do princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20.º da Constituição) e direito a um processo equitativo (artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ex vi do Tratado de Lisboa).”
Por acórdão de 2 de Fevereiro de 2010, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu, no que ora importa, nos seguintes termos:
“2- Quanto aos dois segmentos dirigidos ao Relator (!!) dir-se-á apenas o seguinte:
(…) - O recurso para o Tribunal Constitucional, como qualquer recurso, não pode ser interposto condicionalmente, isto é, de uma decisão a proferir em determinado sentido.
Não releva a ‘intenção de recorrer’ mas, apenas, a interposição do recurso.
Trata-se de conceito linear e consabido. (…)”
Inconformados com esta decisão, A. e Outros vêm agora reclamar para o Tribunal Constitucional, apresentando o seguinte requerimento:
“A interposição de recurso para este Tribunal Constitucional consta claramente dos números 22 e 23 do requerimento entrado por fax no Supremo Tribunal de Justiça em 28 de Dezembro de 2009 e por correio em 29 de Dezembro de 2009, sem qualquer condição ou sombra de dúvida, nos seguintes termos expressos:
‘F... recorrentes nos autos à margem identificados, no recurso de revista excepcional, reforma/recurso esdrúxulo que interpuseram para o Supremo Tribunal de Justiça, notificados do acórdão de 10 de Dezembro de 2009, em esclarecimento/reforma do acórdão de 5 de Novembro de 2009, vêm expor e requerer o seguinte:... III – Ao Juiz Conselheiro Relator: pedem que o recurso siga os seus termos no Tribunal Constitucional. 22) Oportunamente, os recorrentes declararam a sua intenção de recorrer do decidido em aplicação de dimensão normativa inconstitucional e interpuseram recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional (art. 70°, n°1, al. b) da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82). 23) O que aqui renovam e ampliam ao decidido em contrário á Constituição não apenas no acórdão do Tribunal da Relação do Porto como, agora também, neste Supremo Tribunal de Justiça, nos acórdãos ie 5 de Novembro de 2009 e 10 de Dezembro de 2009: novamente sobre custas judiciais mas agora, também, pelas dimensões normativas encontradas e aplicadas para o disposto nos artigos 387-A° e 721-A° do CPC, em violação do principio constitucional do aceso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 200 da Constituição) e direito a um processo equitativo (artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ex v, do Tratado de Lisboa) ‘.
O que não pode ser interpretado de outro modo senão como a interposição de um recurso para o Tribunal Constitucional, incondicionada e efectiva.
Se se pede que o ‘recurso siga os seus termos no Tribunal Constitucional’ que outra coisa se pedirá senão a admissão do recurso interposto-
Aquilo que no número 23 se declara que ‘aqui renovam e ampliam’ é, obviamente, o que consta do número 22: ‘declararam a sua intenção de recorrer’.., e ‘interpuseram recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional’.
Aliás, se dúvida coubera, haveria lugar ao convite previsto no n°5 do art. 75°-A da Lei do Tribunal Constitucional, e não ao indeferimento puro e simples ora reclamado. Convite que não foi feito.
A decisão de indeferir o recurso, ou reter a sua subida, é ilegal e deverá ser revogada e substituída por o que é de Direito, declarando-se a admissibilidade do recurso, como requerem.
Pretende-se, por um lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da norma aplicada, desproporcionada e limitadora do acesso ao direito, que se extrai da Tabela Anexa ao Código das Custas Judiciais conjugada com o art.14°, n°1, al. n) do mesmo Código, da qual resultam mais de 150 UC de custas devidas por instância, na vigência concorrente entre esse Código e o Regulamento das Custas Judiciais, que impõe o limite máximo de 20 UC por instância. Consideram violados os arts. 2°, 18°, n°2 e 20.º da Constituição. Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada nos requerimentos de 6 de Maio de 2009, 14 de Maio de 2009, 27 de Julho de 2009, 1 de Outubro de 2009, 20 de Novembro de 2009 e 29 de Dezembro de 2009.
Pretende-se, por outro lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da dimensão normativa encontrada e aplicada por este Supremo Tribunal de Justiça para o disposto nos artigos 387-A° e 721-A° do Código de Processo Civil. Consideram violados o princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20° da Constituição) e o direito a um processo equitativo (artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ex vi do Tratado de Lisboa, art. 8° da CRP). Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada no requerimento de 29 de Dezembro de 2009.”
Nesse mesmo requerimento, interpuseram recurso de constitucionalidade, pelo seguinte modo:
“Interpõem II RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
que é de fiscalização concreta de constitucionalidade ao abrigo da alínea b) do n° 1 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional (Lei 28/82), por aplicação de normas cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo.
Pretendem, por um lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da norma aplicada, desproporcionada e limitadora do acesso ao direito, que se extrai da Tabela Anexa ao Código das Custas Judiciais conjugada com o art.14°, n°1, al. n) do mesmo Código, da qual resultam mais de 150 UC de custas devidas por instância, na vigência concorrente entre esse Código e o Regulamento das Custas Judiciais, que impõe o limite máximo de 20 UC por instância. Consideram violados os arts. 2°, 18°, n°2 e 20° da Constituição. Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada nos requerimentos de 6 de Maio de 2009, 14 de Maio de 2009, 27 de Julho de 2009, 1 de Outubro de 2009, 20 de Novembro de 2009 e 29 de Dezembro de 2009.
Pretendem, por outro lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da dimensão normativa encontrada e aplicada por este Supremo Tribunal de Justiça para o disposto nos artigos 387-A° e 721-A° do Código de Processo Civil. Consideram violados o princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20° da Constituição) e o direito a um processo equitativo (artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ex vi. do Tratado de Lisboa, art. 8° da CRP). Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada no requerimento de 29 de Dezembro de 2009.”
2. O Representante do Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação, dizendo, nomeadamente, o seguinte:
“3. A confirmação de uma intenção de interposição de recurso, não constitui interposição de recurso ou, como bem se diz na decisão reclamada, o recurso para o Tribunal Constitucional, como qualquer outro, não pode ser interposto condicionalmente, isto é, de uma decisão a proferir em determinado sentido, não relevando a ‘intenção de recorrer’, mas, apenas, a interposição do recurso.
4. Não estamos, pois, perante um forma correcta e processualmente aceitável de recorrer para este Tribunal, não tendo ocorrido uma efectiva impugnação, por via de recurso, de uma decisão inequivocamente identificada.
5. Consequentemente, não existindo no processo nenhum requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, não tem aplicação o disposto no artigo 75.°-A, n.° 5, da LTC, que se destina, precisamente, a dar a possibilidade ao recorrente de suprir as deficiências formais desse requerimento.
6. Por outro lado, quando ao longo do processo o recorrente referiu a violação do artigo 20.°, n.° 1, da Constituição, fá-lo, não enunciando, todavia, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, única matéria que o tribunal Constitucional teria competência para conhecer.
7. Além disso no que respeita aos artigos 387.°-A e 721.°-A do CPC (inadmissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça das decisões proferidas em providências cautelares), a sua inconstitucionalidade não foi suscitada durante o processo.
8. Mas mesmo que se entendesse que o recorrente estava dispensado do ónus de suscitação prévia, sempre a questão teria de ser considerada como manifestamente infundada, atenta a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre o direito ao recurso em processo civil, designadamente o Acórdão n.° 132/2001, que apreciou e não julgou a inconstitucional as normas em causa.
9. Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação da decisão que não admitiu o recurso.”
Notificada desse parecer, a Reclamante respondeu:
“1) O referido pelo Senhor Procurador-Geral Adjunto a fls. 635 a 637 resultará de unia leitura apressada ou truncada dos autos, com o devido respeito.
Com efeito,
2) Ai se omite que logo a seguir à ‘intenção de recorrer’ se pode ler ‘interpõem recurso’.
3) Repete-se, desta vez com sublinhados, que a interposição de recurso para este Tribunal Constitucional consta claramente dos números 22 e 23 do requerimento entrado por fax no Supremo Tribunal de Justiça em 28 de Dezembro de 2009 e por correio em 29 de Dezembro de 2009, sem qualquer condição ou sombra de dúvida, nos seguintes termos expressos: “F.. recorrentes nos autos à margem identificados, no recurso de revista excepcional, reforma/recurso esdrúxulo que interpuseram para o Supremo Tribunal de Justiça, notificados do acórdão de 10 de Dezembro de 2009, em esclarecimento/reforma do acórdão de 5 de Novembro de 2009, vêm expor e requerer o seguinte:... III - Ao Juiz Conselheiro Relator: pedem que o recurso siga os seus termos no Tribunal Constitucional. 22) Oportunamente, os recorrentes declararam a sua intenção de recorrer do decidido em aplicação de dimensão normativa inconstitucional e interpuseram recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional (art. 70.º, n°1, al. b) da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82). 23) O que aqui renovam e ampliam ao decidido em contrário à Constituição não apenas no acórdão do Tribunal da Relação do Porto como, agora também, neste Supremo Tribunal de Justiça, nos acórdãos de 5 de Novembro de 2009 e 10 de Dezembro de 2009: novamente sobre custas judiciais mas agora, também, pelas dimensões normativas encontradas e aplicadas para o disposto nos artigos 387-A° e 721-A° do CPC, em violação do principio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20° da Constituição) e direito a um processo equitativo (artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ex vi do Tratado de Lisboa)’. O que não pode ser interpretado de outro modo senão como a interposição de um recurso para o Tribunal Constitucional, incondicionada e efectiva. Se se pede que o ‘recurso siga os seus termos no Tribunal Constitucional’ que outra coisa se pedirá senão a admissão do recurso interposto- Aquilo que no número 23 se declara que ‘aqui renovam e ampliam’ é, obviamente, o que consta do número 22: ‘declararam a sua intenção de recorrer’... e ‘interpuseram recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional’. Aliás, se dúvida coubera, haveria lugar ao convite previsto no n°5 do art. 75°-A da Lei do Tribunal Constitucional, e não ao indeferimento puro e simples ora reclamado. Convite que não foi feito. A decisão de indeferir o recurso, ou reter a sua subida, é ilegal e deverá ser revogada e substituída por o que é de Direito, declarando-se a admissibilidade do recurso, como requerem. Pretende-se, por um lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da norma aplicada, desproporcionada e limitadora do acesso ao direito, que se extrai da Tabela Anexa ao Código das Custas Judiciais conjugada com o art.14°, n°1, al. n) do mesmo Código, da qual resultam mais de 150 UC de custas devidas por instância, na vigência concorrente entre esse Código e o Regulamento das Custas Judiciais, que impõe o limite máximo de 20 UC por instância. Consideram violados os arts. 2°, 18°, n°2 e 20° da Constituição. Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada nos requerimentos de 6 de Maio de 2009, 14 de Maio de 2009, 27 de Julho de 2009, 1 de Outubro de 2009, 20 de Novembro de 2009 e 29 de Dezembro de 2009. Pretende-se, por outro lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da dimensão normativa encontrada e aplicada por este Supremo Tribunal de Justiça para o disposto nos artigos 387-A° e 721-A° do Código de Processo Civil. Consideram violados o princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20° da Constituição) e o direito a um processo equitativo (artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ex vi do Tratado de Lisboa, art. 8° da CRP). Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada no requerimento de 29 de Dezembro de 2009.
4) Sem prescindir, (re)interpuseram recurso no requerimento entrado no Supremo Tribunal de Justiça via telecópia em 18 de Fevereiro de 2010 e por carimbo de protocolo em 19 de Fevereiro de 2010. Sobre este requerimento também ainda não há pronúncia.
5) Deste modo se esclarece que falece de razão o Senhor Procurador-Geral Adjunto no que aduz de 1 a 8 do seu requerimento.
6) Quanto ao infundadamente referido no ponto 9 como jurisprudência deste Tribunal Constitucional basta recordar, com a devida perplexidade e sempre sem quebra de respeito, que o acórdão ai mencionado é de 2001 (Acórdão 132/2001) e a norma do artigo 721-A° do Código de Processo Civil cuja dimensão normativa se pretende ver apreciada (nos termos suscitados de conjugação inconstitucional com a do art.387-A° do CPC) resulta da redacção aditada pelo Decreto-Lei n° 303/2007, de 24 de Agosto, com entrada em vigor a 1 de Janeiro de 2008.”
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
3. Em sede de reclamações deduzidas ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4 da LTC, compete ao Tribunal Constitucional averiguar se, em concreto, se encontravam reunidos todos os pressupostos necessários à admissão do recurso que foi recusada pelo tribunal a quo, uma vez que a sua decisão faz caso julgado sobre a admissibilidade do recurso (artigo 77.º, n.º 4 daquele diploma).
A adequada interposição de um recurso de constitucionalidade não se basta com a manifestação prévia da intenção de recorrer, a confirmar em momento posterior caso o curso processual venha a confirmar essa intenção ou interesse por parte do recorrente. O acautelamento, durante o processo, de um eventual recurso de constitucionalidade é feito por via do preenchimento dos requisitos do mesmo, nomeadamente, a suscitação da questão de constitucionalidade de modo processualmente adequado.
Ora, independentemente das vicissitudes processuais ocorridas, o facto é que, contrariamente ao afirmado pelos ora Reclamantes, em parte alguma deste processo se encontra por eles suscitada, de modo processualmente adequado, uma questão de constitucionalidade normativa, susceptível de constituir objecto idóneo do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.
O que conduz, desde logo, à impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso e, consequentemente, é manifesta a improcedência da reclamação apresentada.
III – Decisão
4. Nestes termos, acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional, indeferir a presente reclamação.
Custas pelos Reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC.
Lisboa, 25 de Maio de 2010
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Rui Manuel Moura Ramos