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Processo n.º 174/2010
1 ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. A fls. 653 dos presentes autos, foi proferida, em 6 de Abril de 2010, a
seguinte decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso interposto
A.:
«Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional,
decide-se:
1. Convidado, nos termos do n.º 5 do artigo 75º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro (LTC), a «identificar a alínea ao abrigo da qual pretende recorrer,
enunciar o sentido da norma cuja conformidade constitucional pretende
questionar, e indicar a peça processual em que suscitou a questão de
inconstitucionalidade» veio o recorrente A. esclarecer o Tribunal de que
pretende, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, «ver apreciada
a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 123.º, 363.º e 364.º
todos do Código de Processo Penal, efectivamente aplicados pelo Tribunal da
Relação de Évora, com a interpretação que resulta do acórdão ora recorrido»,
especificando ainda o seguinte:
Ou seja, com a interpretação de que a falta de parte da documentação gravada em
sede de audiência de discussão e julgamento da causa constitui uma mera
irregularidade prevista no artigo 123.º do CPP.
Acontece que, qualquer falta de documentação, normalmente gravação
magnetofónica, das declarações prestadas pelas testemunhas em audiência de
julgamento da causa constitui hoje uma verdadeira nulidade e não apenas uma mera
irregularidade, como foi sustentado pelo acórdão recorrido.
Tal nulidade encontra-se prevista com a Lei nº 48/07 de 29/98 que deu nova
redacção ao artigo 363.º do Código de Processo Penal que passou a dispor o
seguinte: «As declarações prestadas oralmente na audiência são sempre
documentadas na acta, sob pena de nulidade» e a essa falta de gravação deve ser
equiparada a imperceptibilidade das mesmas declarações, por deficiente gravação,
ou outra causa.
Face à estatuição do artigo 363.º do CPP, não há dúvida sobre a classificação
daquela falta como nulidade, e assim já o decidiu vários tribunais, a título de
exemplo a Relação do Porto no Ac. R.P de 29/10/08, www.dgsi.pt/trp proc nº
0844934: «1-A imperceptibilidade do conteúdo das gravações da prova constitui
nulidade. ...».
A falta de decretação da nulidade em questão afectou o direito ao recurso do
aqui Recorrente e o seu direito fundamental de defesa, pois inviabilizou a
impugnação, nessa parte, da matéria de facto, designadamente porque o impediu de
proceder à indicação das passagens em que funda a impugnação, artigo 412.º, n.º
3 e 4 do Código de Processo Penal, ónus que impendia sobre o Recorrente.
Bem como, obsta ao efectivo direito do Recorrente ao recurso em matéria de
facto, ou seja, ao reexame total da matéria de facto, contrariando o preceito
constitucional vertido no art.º 32.º, n.º 1, “in fine”, da Constituição da
República Portuguesa.
Bem como ainda, afectou os direitos fundamentais do Recorrente, pondo em causa o
duplo grau de jurisdição em matéria de facto e implicando, necessariamente uma
limitação ao direito de recurso.
O Recorrente ficou impossibilitado de dar cumprimento ao disposto no art.º 412º
n.º 4 do Código Processo Penal, relativamente ao depoimento prestado pelo
Subintendente B., logo ficou prejudicada a sindicância da matéria de facto, o
pertinente reexame da matéria de facto, artigo 428.º, n.º 1 do Código Processo
Penal, limitando o direito ao recurso que se perfila como um dos direitos
fundamentais dos arguidos, art. 2º da Constituição.
Tanto mais que, o depoimento da testemunha B. podia levar a outra decisão, ou
pelo menos teria força suficiente para o efeito. Isto porque, a ilação que o
tribunal de primeira instância tirou desse depoimento foi totalmente contrária
àquilo que foi dito pela testemunha em causa.
E, diga-se mais, o tribunal de primeira instância deu grande ênfase ao
depoimento desta testemunha, pois tratava-se de saber se a actuação do aqui
Reclamante tinha sido, ou não, coincidente com a actuação levada a cabo pela
maioria dos seus colegas de profissão em situações idênticas e se a actuação do
Reclamante tinha sido em harmonia com a instrução técnica dada pelos seus
superiores hierárquicos. Ora, ao ter concluído com o fez, o tribunal de primeira
instância tirou a ilação totalmente contrária ao que foi dito pela testemunha
B..
Destarte, foram violados os artigos 363.º, 364.º, nº 1 e 428.º, nº 1 do Código
de Processo Penal, e o artigo 13.º e 32.º da Constituição da República
Portuguesa.
2. Nos termos do citado artigo 70º n.º 1 alínea b) da LTC cabe recurso para o
Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja
inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. O recurso só pode
ser interposto pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade
de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão
recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72º n.º 2
LTC).
Acontece que o recorrente não suscitou a questão de inconstitucionalidade, que
pretende ver resolvida no presente recurso, perante a Relação de Évora. Isto é:
perante a Relação, o recorrente não colocou, em momento adequado, qualquer
questão relacionada com a inconstitucionalidade imputada a normas retiradas dos
artigos 123.º, 363.º e 364.º do Código de Processo Penal.
Cumpre, por isso, reconhecer que não se verifica o requisito da suscitação
prévia da questão de inconstitucionalidade, que é essencial para a interposição
do presente recurso.
3. Decide-se, por isso, não conhecer do recurso. Custas pelo recorrente, (...)»
2. Inconformado, A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3
do artigo 78º-A da LTC, nos seguintes termos:
«(...) Colendos Juízes Conselheiros
Com o devido respeito, o aqui Reclamante não concorda com a decisão sumária que
recaiu sobre o recurso por si interposto neste Tribunal.
Consultando a decisão do STJ de que o aqui Reclamante interpôs recurso de
constitucionalidade, o teor do seu requerimento de recurso e a decisão sumária
reclamada verifica-se que a norma impugnada no recurso de constitucionalidade
constitui a ratio decidendi do acórdão recorrido.
Aliás,
O acórdão recorrido, que não foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça após reclamação contra a sua irrecorribilidade, e sendo este
o acórdão que está em causa, esmiúça profundamente a questão da
constitucionalidade que foi, em sede de recurso, trazida a este Tribunal.
O Reclamante recorreu para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b), do
n.º 1, do artigo 280.º da Constituição da República Portuguesa e alínea b), do
n.º 1, do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º
28/82, de 15 de Novembro. Fê-lo, como já se disse, contra o despacho do
Excelentíssimo Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que
indeferiu a reclamação por si deduzida, por não ter sido admitido o recurso
ordinário de revista interposto pelo Recorrente do acórdão do Tribunal da
Relação de Évora, de 23.06.2009, com fundamento na sua irrecorribilidade (a qual
veio a ser confirmada, em sede de reclamação para o Excelentíssimo Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça).
Com este recurso, pretendeu o Recorrente ver apreciada a inconstitucionalidade
das normas constantes dos artigos 123.º, 363.º e 364.º todos do Código de
Processo Penal (doravante CPP), efectivamente aplicados pelo Tribunal da Relação
de Évora, com a interpretação que resulta do acórdão ora recorrido (STJ).
Ou seja, com a interpretação de que a falta de parte da documentação gravada em
sede de audiência de discussão e julgamento da causa constitui uma mera
irregularidade prevista no artigo 123.º do CPP.
É que, qualquer falta de documentação, normalmente gravação magnetofónica, das
declarações prestadas pelas testemunhas em audiência de julgamento da causa
constitui hoje uma verdadeira nulidade e não apenas uma mera irregularidade,
como foi sustentado pelo acórdão recorrido (acórdão da Relação de Évora).
Tal nulidade encontra-se prevista com a Lei nº 48/07 de 29/98 que deu nova
redacção ao artigo 363.º do Código de Processo Penal que passou a dispor o
seguinte: «As declarações prestadas oralmente na audiência são sempre
documentadas na acta, sob pena de nulidade» e a essa falta de gravação deve ser
equiparada a imperceptibilidade das mesmas declarações, por deficiente gravação,
ou outra causa.
Face à estatuição do artigo 363.º do CPP, não há dúvida sobre a classificação
daquela falta como nulidade, e assim já o decidiu vários tribunais, a título de
exemplo a Relação do Porto no Ac. R. P de 29/10/08, www.dgsi.pt/trp proc nº
0844934: «I-A imperceptibilidade do conteúdo das gravações da prova constitui
nulidade…»
A falta de decretação da nulidade em questão afectou o direito ao recurso do
aqui Recorrente e o seu direito fundamental de defesa, pois inviabilizou a
impugnação, nessa parte, da matéria de facto, designadamente porque o impediu de
proceder à indicação das passagens em que funda a impugnação, artigo 412.º, n.º
3 e 4 do Código de Processo Penal, ónus que impendia sobre o Recorrente.
Bem como, obsta ao efectivo direito do Recorrente ao recurso em matéria de
facto, ou seja, ao reexame total da matéria de facto, contrariando o preceito
constitucional vertido no art. 32º, n.º 1, “in fine”, da Constituição da
República Portuguesa.
Bem como ainda, afectou os direitos fundamentais do Recorrente, pondo em causa o
duplo grau de jurisdição em matéria de facto e implicando, necessariamente uma
limitação ao direito de recurso.
O Recorrente ficou impossibilitado de dar cumprimento ao disposto no art.º 412º
n.º 4 do Código Processo Penal, relativamente ao depoimento prestado pelo
Subintendente B., logo ficou prejudicada a sindicância da matéria de facto, o
pertinente reexame da matéria de facto, artigo 428.º, n.º 1 do Código Processo
Penal, limitando o direito ao recurso que se perfila como um dos direitos
fundamentais dos arguidos, art. 32º da Constituição.
Tanto mais que, o depoimento da testemunha B. podia levar a outra decisão, ou
pelo menos teria força suficiente para o efeito, Isto porque, a ilação que o
tribunal de primeira instância tirou desse depoimento foi totalmente contrária
àquilo que foi dito pela testemunha em causa.
E, diga-se mais, o tribunal de primeira instância deu grande ênfase ao
depoimento desta testemunha, pois tratava-se de saber se a actuação do aqui
Reclamante tinha sido, ou não, coincidente com a actuação levada a cabo pela
maioria dos seus colegas de profissão em situações idênticas e se a actuação do
Reclamante tinha sido em harmonia com a instrução técnica dada pelos seus
superiores hierárquicos. Ora, ao ter concluído com o fez, o tribunal de primeira
instância tirou a ilação totalmente contrária ao que foi dito pela testemunha
B..
Destarte, foram violados os artigos 363.º, 364.º, nº 1 e 428.º, nº 1 do Código
de Processo Penal, e o artigo 13.º e 32.º da Constituição da República
Portuguesa.
E tudo isto foi devidamente suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça,
pois quem, de forma grotesca, cometeu a maior inconstitucionalidade foi a
Relação de Évora com a interpretação que fez dos artigos mencionados supra.
Mas também o foi junto do Tribunal da Relação de Évora, isto porque, chamou-se a
atenção para aquele Tribunal, por ser este o órgão competente, para conhecer da
ausência de acesso à documentação gravada do depoimento prestado pelas
testemunhas (testemunha em questão é o Subintendente B.) e que tal consistia num
prejuízo de um direito fundamental do aqui Reclamante. Vejamos com a transcrição
do capítulo XVIII do aludido recurso (recurso interposto no Tribunal da Relação
de Évora):
«XVIII
Como ficou já dito supra, o ora Recorrente não teve acesso à documentação
gravada do depoimento prestado pelo Subintendente B..
O Recorrente desconhece a razão pelo qual o depoimento prestado por esta
testemunha está inaudível, pela forma imperceptível como o mesmo se apresenta.
A irregularidade que se verifica, no caso em apreço, consistente na falta de
documentação das declarações daquela testemunha. Tal situação afecta um direito
fundamental do Recorrente, tanto mais que o Recorrente põe em causa o que foi
dito por esta testemunha e a ilação que o tribunal tirou dessas declarações.
Ou seja, o Recorrente sente o seu direito ao recurso em matéria de facto
impeditiva do completo exercício da competência material do Tribunal da Relação,
em matéria de recursos – conhecer de facto e de direito.
Assim, pese embora tal irregularidade só agora seja arguida – por só agora se
ter tido conhecimento da mesma – deve o Tribunal da Relação conhecer dela e
determinar a sua reparação e proceder em conformidade.»
Ora, qualquer falta de documentação, normalmente gravação magnetofónica, das
declarações prestadas pelas testemunhas em audiência de julgamento da causa
constitui hoje uma verdadeira nulidade e não apenas uma mera irregularidade,
como foi interpretado e sustentado pelo acórdão do Tribunal da Relação de Évora.
É esta interpretação que está em causa; e é esta interpretação que se encontra
enfermada da maior inconstitucionalidade!
E tal inconstitucionalidade foi devidamente suscitada junto do Tribunal da
Relação de Évora, aquando da interposição de recurso ordinário de revista para o
Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação de Évora, recurso
este que não foi admitido com fundamento na sua irrecorribilidade, a qual veio a
ser confirmada, em sede de reclamação para o Excelentíssimo Senhor Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça.
Assim sendo, o aqui Reclamante colocou, em momento adequado, a questão
relacionada com a inconstitucionalidade imputada a normas retiradas dos artigos
123.º, 363.º e 364.º do Código de Processo Penal.
Destarte, cumpre reconhecer-se que se verifica o requisito da suscitação prévia
da questão de inconstitucionalidade, essencial para a interposição do presente
recurso.
Nestes termos e nos mais de direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão,
deverá reconhecer-se que se verifica o requisito da suscitação prévia da questão
de inconstitucionalidade, essencial para a interposição do presente recurso.
Concomitantemente, deve ser concedido prazo ao aqui Reclamante para apresentar
as suas alegações de recurso.
Só assim se fará a já acostumada Justiça!»
3. Foi ouvido o representante do Ministério Público neste Tribunal que respondeu
à reclamação desta forma:
1.º
Pela Decisão Sumária de fls. 653 e 654, não se conheceu do recurso porque,
pretendendo o recorrente ver apreciada a questão de inconstitucionalidade de
normas retiradas dos artigos 123º, 363º e 364º do CPP, não tinha, durante o
processo e de forma adequada, suscitado a questão da sua inconstitucionalidade.
2.º
Uma vez que o recurso interposto do Acórdão da Relação de Évora para o Supremo
Tribunal de Justiça não foi admitido, a última decisão que aplicou e podia ter
aplicado as normas anteriormente referidas, foi aquele acórdão da Relação que
negou provimento ao recurso interposto de sentença condenatória proferida no
tribunal de primeira instância.
3.º
Assim sendo, o momento processual próprio para suscitar a questão da sua
inconstitucionalidade, era a motivação do recurso para a Relação.
4.º
Aí, sobre esta matéria, o que se diz, quer no texto, quer nas conclusões, é que
o depoimento prestado pelo subintendente B., apresentava-se imperceptível, sendo
“consequentemente nulo” (fls. 387) e que a falta de acesso a essa documentação
gravada, que se verificava, constituía uma irregularidade (fls. 433).
5.º
É assim evidente que não foi enunciada qualquer questão de
inconstitucionalidade, não tendo sido referido, sequer, qualquer princípio ou
preceito constitucional.
6.º
Por outro lado, o acórdão da Relação não fez das normas em causa a interpretação
que o recorrente refere.
7.º
Aliás, não fez essa interpretação, nem qualquer outra, porque, apesar de
considerar a questão pertinente, o Tribunal estava limitado no que toca ao
conhecimento do recurso da matéria de facto, dizendo-se o seguinte: “daí o
perder acuidade a questão em análise e nada, a respeito, se poder decidir” (fls.
506 v).
8.º
Em conclusão, o Tribunal da Relação não aplicou as normas.
9.º
Efectivamente, o tribunal da Relação entendeu que o recorrente não cumprira
alguns dos ónus que o nº 4 do artigo 412º CPP exige, não sendo, no entanto, de o
notificar para suprir as deficiências, dada a sua natureza e profundidade.
10.º
Consequentemente o Tribunal, no que toca ao conhecimento matéria de facto,
apenas exerceu as limitadas competências que lhe são atribuídas pelo artigo
4100, nº 2, doCPP.
11.º
Em relação aos ónus que sobre ele impendiam, (artigo 412º, nº 4, do CPP) e às
consequências que advieram do seu incumprimento, o recorrente, por diversas
vezes, refere a violação das garantias de defesa (artigo 32º, nº 1, da
Constituição).
12º
No entanto, também neste ponto, nunca enuncia uma questão de
inconstitucionalidade normativa, antes considera que o que viola as suas
garantias de defesa é a forma como o Tribunal decidiu.
13º
Por isso, mesmo que se entendesse que, neste caso, ele estava dispensado do ónus
de suscitação prévia, sempre o recurso seria inadmissível.
14º
Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.
4. Cumpre decidir.
O recurso que A. pretendia interpor para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da
alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, não foi recebido por se haver
entendido, na decisão sumária proferida nos termos do n.º 1 do artigo 78º-A da
LTC, que a questão de inconstitucionalidade que é objecto do recurso não fora
adequadamente suscitada perante o tribunal comum, conforme determina o n.º 2 do
artigo 72º da aludida LTC.
Na reclamação agora em apreciação, o recorrente sustenta, contudo, que «colocou,
em momento adequado, a questão relacionada com a inconstitucionalidade imputada
a normas retiradas dos artigos 123.º, 363.º e 364.º do Código de Processo
Penal.»
Vejamos, pois.
Tendo o recurso previsto na referida alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC
carácter normativo, a suscitação da questão de inconstitucionalidade perante o
tribunal comum deve necessariamente reportar-se à imputação a uma determinada
norma, aplicável ao caso como sua ratio decidendi, de desconformidade
constitucional. Isto significa que o interessado deve, em momento oportuno,
identificar uma determinada norma, aplicável ao seu caso, que o tribunal não
pode aplicar por se mostrar desconforme com a Constituição. Como é manifesto, a
suscitação da questão de inconstitucionalidade deve obrigatoriamente ser
apresentada em momento anterior à prolação da decisão final, pois só assim o
tribunal comum tem oportunidade de se pronunciar sobre essa matéria.
O reclamante alega que a questão «foi devidamente suscitada junto do Tribunal da
Relação de Évora, aquando da interposição de recurso ordinário de revista para o
Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação de Évora, recurso
este que não foi admitido com fundamento na sua irrecorribilidade, a qual veio a
ser confirmada, em sede de reclamação para o Excelentíssimo Senhor Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça». Mas a verdade é que, conforme observa o
representante do Ministério Público neste Tribunal, a suscitação da questão
ocorreu num momento processual em que já não era lícito ao tribunal recorrido
conhecer dessa matéria, por já haver proferido a sua decisão. Assim, uma vez que
perante a Relação de Évora o reclamante não suscitou adequadamente a questão de
inconstitucionalidade que pretende ver apreciada no seu recurso, deve
concluir-se que se não verifica o respectivo requisito, o que obsta ao
conhecimento do seu objecto.
5. Em consequência, o tribunal decide indeferir a reclamação, mantendo a decisão
sumária de não conhecimento do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a
taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 28 de Abril de 2010
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão