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Processo nº 118/10
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e são recorridos o Ministério Público e B., foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), dos acórdãos daquele Tribunal de 15 de Julho de 2009, de 17 de Setembro de 2009 e de 12 de Novembro de 2009.
2. Em 25 de Março de 2010, foi proferida a decisão sumária nº 116/2010, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 78º-A da LTC, com os seguintes fundamentos:
«1. Foi interposto recurso para este Tribunal, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, de três decisões do Supremo Tribunal de Justiça: do acórdão de 15 de Julho de 2009, do acórdão de 17 de Setembro de 2009 e do acórdão de 12 de Novembro de 2009.
Tendo sido interposto recurso de constitucionalidade da decisão de 12 de Novembro de 2009, é de concluir que os acórdãos de 15 de Julho de 2009 e de 17 de Setembro de 2009 não são, ainda, decisões definitivas do tribunal recorrido, o que obsta ao conhecimento do objecto dos recursos interpostos destes dois acórdãos (artigo 70º, nº 2, da LTC).
2. Constitui, entre outros, requisito do recurso interposto a suscitação prévia e de forma adequada, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, da questão de inconstitucionalidade normativa cuja apreciação é requerida a este Tribunal (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC).
Do acórdão de 12 de Novembro de 2009 foi interposto recurso para apreciação “das normas do artigo 666º, nºs 1 e 2, do CPP, com o sentido arguido de inconstitucionalidade, ao decidir que «com a primeira decisão esgota-se o poder jurisdicional»”.
Não se pode concluir, no caso, pela satisfação dos requisitos do artigo 75º-A, nºs 1 e 2, da LTC, mas não se justifica convidar o recorrente a prestar as indicações em falta (artigo 75º-A, nº 6, da LTC). Ainda que as viesse a prestar, não se poderia conhecer, também nesta parte, do objecto do recurso. O recorrente não suscitou, durante o processo, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa reportada àquele artigo do Código de Processo Civil, o que justifica a prolação da presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC).
No requerimento de 6 de Outubro de 2009, na parte em que há uma qualquer referência à Constituição, não é sequer mencionado o artigo 666º daquele Código. Por outro lado, o que o recorrente questiona, do ponto de vista jurídico-constitucional, é o “acórdão de 17.9.2009”, por o mesmo violar garantias constitucionais (e legais)».
3. Notificado desta decisão, vem agora o recorrente “dizer e requerer” o seguinte:
« (…)
3. Dos autos de recurso para o TC consta, além do mais, o seguinte:
a) no requerimento de interposição de recurso para o TC, de 30.11.2009 (intróito) «no processo acima referenciado, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 280º, nº 1, al. b), da Constituição (CRP), 72º, nºs 1 e 2, e 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 29/82, de 15 de Novembro (LTC), interpor recurso para o Tribunal Constitucional (TC), dos acórdãos nele prolatados em 15.7.2009, 17.9.2009 e 12.11.2009, dizendo:»
b) no dito requerimento de interposição do recurso (cf. nºs 8 a 10), a arguição de falsidade dos acórdãos de 17.9.2009 e 12.11.2009, cujos termos aqui se dão por reproduzidos, e o pedido seguinte: «A presente arguição de falsidade não pode deixar de ser decidida pelo STJ, antes de o processo ser remetido ao TC, em virtude de influir na determinação do objecto do recurso de constitucionalidade. Caso tal decisão seja negada, a respectiva questão constituirá questão prévia prejudicial para o Relator no TC» (negrito actual);
c) no requerimento de 18.1.2010 (data do registo postal) dirigido ao Exmo Juiz Conselheiro Relator no TC… «notificado de um acórdão do STJ de 6.1.2010, e de um despacho do Relator de 7.1.2010, apresenta o presente requerimento, para ser junto aos autos de o processo ser distribuído no Tribunal Constitucional, dizendo:
«No mesmo requerimento, foi expresso o entendimento de que a falsidade arguida não podia deixar de ser apreciada pelo STJ, antes de o processo ser remetido ao Tribunal Constitucional, em virtude de ela influir na determinação do objecto do recurso de constitucionalidade. Tal apreciação só pode ser de mérito» (cf. nº2);
d) no mesmo requerimento de 18.1.2010: «Mais foi requerido que, caso tal decisão fosse negada, a respectiva questão fosse apreciada no Tribunal Constitucional como questão prévia prejudicial» (cf. nº 3);
e) no dito requerimento de 18.1.2010: «Verificando-se que o STJ não conheceu da falsidade arguida, nos termos da lei, o conhecimento dessa questão prévia prejudicial tem, agora, cabimento nos termos do disposto nos artigos 96º e 97º do CPC, ex vi o disposto nos artigos 69º e 78º-B, nº 1, da LTC. e 223º, no 3, da Constituição» (cf. nº 4);
no sobredito requerimento de 18.1.2010: «Caso, porém, se entenda que tem de ordenar-se a baixa do processo ao STJ, para apreciação de mérito da arguição deduzida no requerimento de interposição do recurso, nos termos da lei, o Recorrente desde já requer, ao abrigo do disposto no artigo 123º, nº 1, do CPC, que os Ilustres Juízes Conselheiros subscritores dos acórdãos de 17.9.2009 e 12.11.2009, se declarem impedidos por força do disposto no artigo 122º, nº 1, alíneas a) e c), do CPC» (cf. nº 5);
3.1. Verifica-se, porém, que a questão logo posta no requerimento de interposição do recurso, nº 11, de a arguição de falsidade dos acórdãos recorridos, de 17.9.2009 e 12.11.2009, não poder deixar de ser decidida pelo STJ, antes de o processo ser remetido ao TC, e reiterada no requerimento de 18.1.2010, nos termos acima reproduzidos, não foi apreciada e decidida pela Exma Juíza Conselheira Relatora, no TC.
3.2. Por força do disposto na Constituição e na lei, segundo os preceitos acima invocados, a pronúncia sobre tais pedidos é obrigatória.
3.3. Nos termos dos respectivos requerimentos, a decisão sobre a falsidade arguida é susceptível de influir na determinação do objecto do recurso de constitucionalidade (cf. supra citado nº 11 do requerimento de interposição do recurso, de 30.11.2009).
3.4. Por força das supra invocadas disposições do artigo 20 1º, nºs 1 e 2, do CPC, a omissão do acto decisório imposto por lei, ora reclamado, é causa de nulidade processual determinante de anulação dos termos subsequentes.
• Pelo que, o recorrente pede seja suprida a nulidade processual ora arguida, com as legais consequências de anulação dos termos subsequentes.
4. Sem prejuízo do acima exposto e requerido, o Recorrente sempre dirá que a “decisão sumária” integrante dos termos subsequentes, enferma de erros materiais do supra referido artigo 667º, nº 1, do CPC, cuja rectificação oficiosamente se impõe, para cujo efeito, o Recorrente, em cumprimento do supra referido artigo 103º, nº 1, do LOA, oferece o contributo seguinte:
a) a omissão, no nº5 da parte 1, do teor dos nºs 8 a 11 do requerimento de interposição de recurso, configura omissão devida a lapso manifesto;
b) a conclusão do nº 1, da parte II, de que «os acórdãos de 15 de Julho de 2009 e de 17 de Setembro de 2009 não são, ainda, decisões definitivas do tribunal recorrido» ... «(artigo 70º, nº 2, da LTC)», configura inexactidão devida a lapso manifesto porquanto a letra do nº 2 do invocado artigo 70º refere decisões que não admitam recurso ordinário;
c) a atestação constante do último parágrafo do nº 2 da parte II, de que «No requerimento de 6 de Outubro de 2009, na parte em que há uma qualquer referência à Constituição, não é sequer mencionado o artigo 666º daquele Código», enferma de inexactidão evidente devida a lapso manifesto, pois a impugnação da constitucionalidade da norma extraída do artigo 666º, nº2, do CPC, já fora objecto do requerimento de 30.7.2009, nºs 3 e 4 (cf. fls 1668 e 1669), cujo teor aqui se dá por reproduzido, conforme requerimento de interposição do recurso, nos 19 e 20;
d) a atestação constante do referido último parágrafo, de que «o recorrente questiona, do ponto de vista jurídico constitucional, é o “acórdão recorrido”, por o mesmo violar garantias constitucionais (e legais)», enferma de inexactidão devida a lapso manifesto por ser evidente que a impugnação feita no dito requerimento de 30.7.2009, a fls 1668 e 1669, nºs 3 e 4, tem por objecto as normas nele identificadas aplicadas nas decisões recorridas».
4. Notificados os recorridos, respondeu apenas o Ministério Público, nestes termos:
«1º
Não vislumbramos que tivesse sido praticada qualquer nulidade processual.
2º
Caso se entenda que o requerimento de fls. 1738 consubstancia numa reclamação para a conferência, sempre diremos que ele é manifestamente improcedente, sendo evidente a inverificação dos pressupostos do recurso de constitucionalidade.
3.º
Quanto aos erros materiais de que a Decisão enfermaria, tendo em atenção o afirmado pelo recorrente, não se trata de quaisquer “erros materiais”, pretendendo-se, somente, ver alterada a decisão».
II. Fundamentação
1. O recorrente pede que seja suprida nulidade processual, por não ter sido apreciada e decidida pela relatora questão posta no requerimento de interposição do recurso e reiterada no requerimento de 18 de Janeiro de 2010.
Sobre isto, importa dizer, desde logo, que os recursos das decisões judiciais para o Tribunal Constitucional são restritos à questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade suscitada (artigo 71º da LTC). Por outro lado, por acórdão de 6 de Janeiro de 2010, o Supremo Tribunal de Justiça já conheceu da questão posta no requerimento de interposição do recurso, reiterada depois no requerimento de 18 de Janeiro de 2010.
2. O recorrente sustenta que a decisão sumária nº 116/2010 enferma de erros materiais, “cuja rectificação oficiosamente se impõe”, assinalando uma omissão e três inexactidões devidas a lapso manifesto. É isto que cumpre apreciar e decidir, nos termos do artigo 78º-A, nº 3, da LTC.
De acordo com o disposto nos artigos 666º, nº 1, e 667º, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do que dispõe o artigo 69º da LTC, o juiz pode, proferida a sentença e já esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, corrigir a sentença se esta contiver inexactidões devidas a omissão ou lapso manifesto.
A decisão sumária cuja rectificação é pedida não padece de qualquer inexactidão que, de acordo com aqueles preceitos, deva ser corrigida.
A omissão que é assinalada tem a ver com determinado passo do Relatório da decisão sumária, no qual se transcreveu apenas parte do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, antecedido da expressão: “Para o que agora releva, foi então interposto o presente recurso, mediante requerimento onde se lê:”. Ou seja, omitiu-se, deliberadamente, a transcrição integral do requerimento.
As inexactidões elencadas pelo recorrente nas alíneas b) c) e d) do ponto 4. do presente requerimento revelam, todas elas, que o que o recorrente questiona, verdadeiramente, é a decisão de não conhecer do objecto do recurso interposto.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 16 de Junho de 2010
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Rui Manuel Moura Ramos