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Processo n.º 783-A/09
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A. reclama do despacho prolatado pelo relator, nestes autos, que não admitiu o recurso interposto para o Plenário do Acórdão n.º 593/09, proferido em Secção, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão.
2 – Fundamentando a sua reclamação, esgrime o reclamante o seguinte:
“[…]
A., recorrente melhor identificado no processo à margem referenciado, notificado que foi do Despacho proferido pelo Mm.° Conselheiro Relator que não admitiu o Recurso para o Plenário formulado pelo requerente,
Com o fundamento de que o mesmo não foi apresentado dentro do prazo, ou seja no prazo de 10 dias a que se refere o art. 75 da LTC.
Vem expor, motivar e requerer o seguinte:
Começa por dizer o reclamante que, em sua modesta opinião, o prazo de 10 dias aí mencionado no art. 75 da L.T.C., aplica-se aos requerimentos de recurso vindos de outros tribunais, com destino a ser apreciados no T.C.;
O que não é o caso dos presentes autos, na verdade, o processo já estava e tinha sido apreciado neste mesmo Tribunal,
Ora, como se pode constatar dos autos, o ora reclamante, no prazo de 10 dias reclamou da decisão proferida pelo Mm.° Conselheiro relator que não julgou inconstitucional a norma constante do art. 1842 do C. Civil a qual já tinha sido mais do que uma vez, declarada inconstitucional anteriormente;
Porém, o reclamante não motivou essa reclamação e a mesma não foi apreciada,
Inconformado o reclamante e sentindo-se injustiçado, dentro do prazo de 30 dias a que se refere o art. 79 da L.T.C. requereu e apresentou alegações a fim de o recurso subir ao Plenário,
No entanto, veio a ser rejeitado esse recurso com o fundamento que não deu entrada dentro do prazo.
Ora a questão que se põe é de saber se estando já o processo a correr seus tramites processuais no próprio T.C. se torna necessário cada vez que se não concorda com a decisão tomada na cadeia e organização hierárquica interna deverá ou não o recorrente apresentar um simples requerimento no prazo de 10 dias a dizer que deseja impugnar esta ou aquela decisão;
Parece-nos que não, pois a norma constante do art. 75 da L.T.C. apenas refere que o prazo da interposição do recurso para o T.C. é de 10 dias, nada se referindo quando o processo já se encontra a correr internamente, ou seja, dentro do próprio Tribunal Constitucional.
E, se analisarmos a norma constante do art. 79 da L.T.C. nada se retira a esse respeito, a não ser a de que, o prazo para apresentar alegações é de 30 dias a contar da notificação, Qual- Da decisão ou da admissão do recurso-;
No caso concreto, parece-nos que deve ser a contar da decisão que recaiu sobre a reclamação apresentada pelo ora reclamante.
Em abono da tese do reclamante existem também as regras processuais de outros ramos do direito.
Vejamos então o que nos dizem outras normas similares em matéria de recursos e como se processa a tramitação desses recursos:
No âmbito do Código do Processo Civil, a norma constante do art. 685 diz-nos que o prazo para a interposição do recurso é de 30 dias e é nesse prazo que o recorrente apresenta o requerimento juntamente com as alegações,
Não há a necessidade de apresentar nenhum requerimento antes no prazo de 10 dias e esperar pela sua admissão:
No âmbito do Código do Trabalho, a norma constante no art. 80 diz-nos que o prazo para a interposição do recurso é de 10 ou 20 dias e é nesse prazo que o recorrente apresenta o requerimento juntamente com as respectivas alegações,
Também não há a necessidade de apresentar nenhum requerimento antes no prazo de 10 dias:
No âmbito do Código do Processo Penal, a norma constante no art. 411 diz-nos que o prazo para a interposição do recurso é de 20 dias e é nesse prazo que o recorrente apresenta o requerimento juntamente com as alegações,
Não há a necessidade de apresentar nenhum requerimento antes no prazo de 10 dias a não ser para as reclamações, v.g. art. 405 do mesmo diploma legal!:
No âmbito do Código do Processo Tribunais Administrativos, a norma constante no art. 111 diz-nos que o prazo para a interposição do recurso é de 30 dias e é nesse prazo que o recorrente apresenta o requerimento juntamente com as alegações,
Também não há a necessidade de apresentar nenhum requerimento antes no prazo de 10 dias.
A Lei do Tribunal Constitucional, em matéria de recursos, não deverá ser diferente dos restantes ramos do Direito;
Até por uma questão de coerência processual, digamos que se sobrepõe às restantes, Ademais, nada consta em contrário na lei do Tribunal Constitucional acerca desta concreta situação;
Porquanto, os 10 dias exigidos na norma constante do art. 75 da LTC é apenas e só para a interposição do recursos vindos de outros tribunais, internamente parecem-nos mais consentâneo com a realidade actual o requerimento e as alegações serem apresentas conjuntamente, sem necessidade de outros formalismos.
Conclusão:
O Mm.° juiz conselheiro relator, ao não admitir o recurso e as respectivas alegações destinadas ao Plenário, apresentadas no prazo de 30 dias a contar do Despacho que recaiu sobre a reclamação, fez errada interpretação das normas constantes do n.º 2 do art. 79 e do art. 75 da L.T. Constitucional
Termos em que deve ser revogado o despacho posto em crise e em consequência substituído por outro que admita a subida do recurso ao Plenário.
Só assim se poderá fazer a justiça esperada
pelo recorrente!».
3 – O despacho reclamado tem o seguinte teor:
“Independentemente de a situação processual se enquadrar ou não no âmbito normativo do artigo 79.º-D da Lei do Tribunal Constitucional, constata-se que o recurso interposto é extemporâneo, por o ter sido depois do trânsito em julgado da decisão pretendida recorrer. Na verdade, esta decisão transitou em julgado em 03.12.2009 e o recurso foi interposto em 6.01.2010. Ora, o recurso apenas podia ser interposto, nos termos do art.º 75.º da L.T.C., no prazo de 10 dias a contar da notificação pretendida recorrer, sendo que o trânsito em julgado apenas ocorre depois de esgotado o prazo de recurso”.
4 – O Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional, pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação, seja em face do disposto no artigo 75.º, n.º 1, da LTC, seja em face da regra constante do artigo 153.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 69.º daquela Lei.
B – Fundamentação
5 – Com relevo para a compreensão da questão posta, importa dar conta do seguinte:
a) – No recurso interposto pelo Representante do Ministério Público, junto do Supremo Tribunal de Justiça e por Domingas dos Santos Guerreiro e outro para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual redacção (LTC), foi decidido por decisão do relator, no Tribunal Constitucional, não julgar inconstitucional a norma do artigo 1842.º, n.º 1, alínea a), do Código Civil, na medida em que limita a possibilidade de impugnação, a todo o tempo, pelo presumido progenitor, da sua paternidade, e conceder provimento aos recursos, determinando-se a reforma da decisão recorrida na parte especificamente referida à questão de constitucionalidade considerada.
b) – Desta decisão sumária, o ora reclamante reclamou para a conferência da 2.ª Secção.
c) – Pelo acórdão n.º Acórdão n.º 593/09 foi decidido indeferir a reclamação por ineptidão, dada a total ausência de fundamentos da reclamação.
d) – Este acórdão foi notificado ao ora reclamante em 19.11.2009.
e) – Através de requerimento apresentado em 6 de Janeiro de 2010, o ora reclamante interpôs recurso para o Plenário sob invocação do disposto no art.º 79.º-D da LTC.
f) Tal requerimento mereceu o despacho ora reclamado.
6 – A decisão ora reclamada considerou que o Acórdão n.º 593/09, pretendido recorrer para o Plenário, havia transitado em julgado em 03.12.2009, sendo extemporâneo o requerimento formulado para tal efeito, em virtude de ter sido apresentado depois do trânsito em julgado do acórdão, dado que o prazo de interposição do recurso é de 10 dias a contar da notificação da decisão pretendida recorrer, nos termos do artigo 75.º da LTC.
Pretexta o reclamante, em resumo, que o prazo estabelecido no artigo 75.º da LTC rege, apenas, para a interposição dos recursos vindos de outros tribunais para apreciação pelo Tribunal Constitucional, não se aplicando à interposição do recurso quando este respeita a decisão do Tribunal Constitucional, e que o prazo para a interposição de recurso para o Plenário corre em paralelo com o prazo para apresentar as respectivas alegações, tal como acontece no âmbito de outros recursos, como no Código de Processo Civil, no Código do Trabalho, no Código do Processo Penal e no Código de Processo nos Tribunais Administrativos, sendo, no presente caso, de 30 dias, pois tal é o prazo fixado no n.º 2 do artigo 79.º da LTC para apresentar as respectivas alegações.
Note-se, antes de mais, que o artigo 79.º-D da LTC configura a impugnação para o Plenário da decisão de qualquer das suas secções como um recurso.
E, na verdade, trata-se de um verdadeiro recurso, porquanto, segundo a sua estrutura, o Plenário, sendo embora uma outra formação do Tribunal Constitucional, sindica a decisão da secção como órgão jurisdicional autónomo e com efeito vinculativo.
O n.º 1 do artigo 75.º da LTC fixa o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional, independentemente da formação sob a qual este decida, segundo as regras de competência legalmente definidas, sendo de registar que os recursos podem ser logo conhecidos, em determinadas situações, pelo relator (n.º 1 do artigo 78.º-A) ou pelo plenário (artigo 79.º-A, ambos os preceitos da LTC).
Não se descortinam, assim, razões para restringir o campo de aplicação do n.º 1 do artigo 75.º da LTC aos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional perante os outros tribunais: o recurso é sempre para o Tribunal Constitucional, actuando sob uma outra formação jurisdicional.
De resto, a circunstância de o legislador ter optado, na regulamentação de outros tipos de recurso jurisdicional, pela simultaneidade dos prazos de interposição do recurso e para a apresentação de alegações, não induz a que tenha de ser outra a leitura feita do n.º 1 do artigo 75.º da LTC.
O facto de o legislador do recurso constitucional, não obstante determinar que “à tramitação dos recursos para o Tribunal Constitucional são subsidiariamente aplicáveis as normas do Código de Processo Civil, em especial as respeitantes ao recurso de apelação” (artigo 69.º da LTC), ter disposto expressamente sobre o prazo do recurso para o Tribunal Constitucional, não se arrimando ao sistema geral adoptado nas várias espécies de recurso previstos no processo civil (ou em outras leis adjectivas), onde, então, se distinguia o prazo de interposição do recurso do da apresentação das alegações e em que o prazo destas só se abria depois de notificado o despacho de admissão (cf. artigos 685.º, 687.º, 698.º e 743.º, todos do Código de Processo Civil, na versão anterior à introduzida pelo DL n.º 303/2007, de 24 de Agosto), significa que efectuou uma ponderação própria sobre os interesses a acautelar, neste âmbito, pelo recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.
Assim sendo, embora, posteriormente, se tenha alterado a regra, nos outros tipos de recurso previstos no sistema jurídico, o prazo de interposição do recurso para o Plenário continua a ser de 10 dias.
Deve improceder, pois, a reclamação.
D – Decisão
7 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 15 UCs.
Entrelinhei “o”.-
Lisboa, 2.06.2010
Benjamim Rodrigues
Carlos Pamplona de Oliveira
Vítor Gomes
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Maria Lúcia Amaral
Catarina Sarmento e Castro
Carlos Fernandes Cadilha (vencido quanto à fundamentação por considerar que o prazo aplicável é o prazo supletivo do art. 153 do CPC)
Maria João Antunes (vencida, pelas razões da declaração do Senhor Conselheiro Carlos Cadilha, quanto à fundamentação legal)
João Cura Mariano (não acompanhei a fundamentação pelas razões constantes da declaração apresentada pelo Conselheiro Carlos Cadilha)
Joaquim de Sousa Ribeiro (votei a decisão, muito embora creia que o disposto no art. 75.º, n.º 1, da LTC não é susceptível de aplicação directa ao caso, pois só se aplica a recursos interpostos de decisões de outros tribunais, de todo o mundo, quer por aplicação analógica dessa disposição, quer por força da aplicação da norma supletiva do art. 153.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (como propõe o Ministério Público, o prazo é sempre o de 10 dias)
Ana Maria Guerra Martins (vencida quanto à fundamentação nos termos da declaração do Conselheiro Carlos Cadilha)
Rui Manuel Moura Ramos