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Processo n.º 218/2010
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão:
“1. A., notificado da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de
11 de Fevereiro de 2010, que indeferiu a reclamação que, ao abrigo do disposto
no artigo 405.º do Código de Processo Penal, deduzira contra o despacho do
relator na Relação, que, com fundamento na alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do
mesmo código, não admitiu o recurso que havia interposto para o Supremo Tribunal
de Justiça do acórdão da Relação de Coimbra de 4 de Outubro de 2009, veio
interpor recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento na alínea b) do
n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, nos seguintes termos:
«[…]Dando cumprimento ao plasmado nos n.ºs 1 e 2 do art. 75º-A da LTC, refere-se
que o presente recurso versa desde logo duas questões concretas e objectivas da
inconstitucionalidade, as quais se mostram contudo, encadeadas: a violação
plúrima de lei processual condizente à eventual nulidade do douto acórdão
proferido e a não admissão do recurso interposto, aplicando-se o a alínea f) do
art. 400º f) CPP. [Certamente queria dizer alínea f) do n.º1 do artigo 400º do
CPP]
Tais questões foram validamente suscitadas quer no recurso interposto para o
Supremo Tribunal de Justiça (a fls. 6, 8 e nomeadamente a conclusões 14 a 16 e
25) quer na reclamação (maxime arts. 8º a 12º, 34º, 36º, 37º, 43º, 59º) .
Como fundamento do recurso aponta-se o entendimento sufragado quer no Acórdão da
Relação de Coimbra quer nas sucessivas não admissões do recurso, por se entender
violador das normas legais plasmadas nos arts. 399º, 400º n°.1 f), 411º nº.5,
419º nº.3 c), 379º nº.1 c) ex vi art. 425º nº.4), todos do CPP e art. 32º nº1 da
CRP, afigurando-se, não só relevante como essencial para a boa decisão da
questão principal, uma vez que em causa estão direitos, liberdades e garantias
do recorrente, e constitucionalmente tutelados.
Razão pela qual, nos termos do art. 78º LTC deverá o mesmo ter efeito suspensivo
e subir nos próprios autos.[…]»
A fls. 92 dos autos consta o despacho, de 11 de Março de 2010, do seguinte teor:
«Admite-se o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, na parte em que
se questiona a constitucionalidade da norma do art. 400.º, n.º 1, alínea f), do
CPP, mas já não se admite o recurso na parte respeitante à nulidade do acórdão
da 2.ª instância, por estranha ao conhecimento da reclamação, como se referiu no
despacho que desta conheceu.»
2. A decisão recorrida é do seguinte teor:
«[…]
Na apreciação da reclamação contra o despacho de não admissão do recurso, única
questão de que cabe conhecer, apenas compete apreciar a admissibilidade do
recurso, de harmonia com o disposto no art. 405.º do CPP, encontrando-se fora do
âmbito da reclamação a questão da nulidade imputada ao acórdão de que se
pretende recorrer.
Vejamos.
Numa certa perspectiva – minoritária no STJ – poder-se-á dizer que a decisão
proferida no recurso não foi inteiramente no mesmo sentido da decisão da 1.ª
instância, por o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra ter absolvido o
arguido da prática do crime de burla informática e, em conformidade, reduzido a
pena aplicada ao arguido.
Com efeito, o elemento central da norma, que define a não recorribilidade e os
critérios da conformidade, é a confirmação da decisão da primeira instância.
Segundo o sentido comum da linguagem, a confirmação significa identidade de
sentido, afirmar do mesmo modo, traduzir uma convergência; confirmar significa
tornar mais certo, seguro e firme, concordar, certificar, revalidar, sancionar.
A confirmação d decisão em recurso significa, assim, em leitura literal, decidir
do mesmo modo, concordar, convergir ou certificar a decisão sobre que versa o
recurso. A convergência ou a confirmação deve significar que não existe qualquer
divergência, e que se afirma a identidade quanto aos elementos centrais e
verdadeiramente constitutivos das decisões.
Elementos constitutivos – elementos definidores e caracterizadores – da decisão
penal condenatória são a qualificação (identificação legal do crime) e a
condenação.
A conformidade afasta, por sua natureza, a existência de qualquer elemento de
não conformidade, desde que se refira aos elementos constitutivos das decisões.
Na parte em que as decisões divirjam, não há conformidade; se não há
conformidade, mesmo que parcial (isto, é, se existe não conformidade parcial),
poder-se-á entender que não está integrado inteiramente o elemento nuclear da
norma, que supõe convergência, certificação e concordância.
Este sentido literal coincide com justificação racional da solução legal de não
admissibilidade de recurso em casos de «dupla conforme». O julgamento «conforme»
em duas instâncias traduz uma presunção de bom julgamento, de julgamento certo e
seguro, dispensando na proporcionalidade e racionalidade do uso dos meios
processuais, uma outra apreciação em casos em que esteja em causa a aplicação de
penas até ao limite definido, isto é, com um referencial de gravidade de
determinado limite.
Mas este pressuposto, que dá coerência à opção da lei, não se verifica quando
entre uma e outra decisão existirem elementos relevantes de não conformidade,
sendo arbitrária a opção interpretativa de desconsiderar, para este efeito, a
não conformidade in melius, introduzindo um desequilíbrio sistémico que o rigor
dos critérios de interpretação dificilmente suportará.
Por isso, nesta perspectiva, e visto o conteúdo da decisão recorrida, não havia
identidade do conteúdo decisório.
Neste entendimento, não poderia, no caso concreto, segundo uma perspectiva
aceitável, dizer-se que houve confirmação ou dupla conforme, para efeitos do
disposto na alínea f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP.
Mas a posição maioritária deste Supremo Tribunal é no sentido de que há dupla
conforme quando haja confirmação da condenação in melius, o que se teria
verificado no caso presente, por o acórdão em causa ao ter absolvido o arguido
da prática de um crime de burla informática e, em conformidade, reduzido a pena
aplicada, ter sido mais favorável ao arguido. De acordo com esta jurisprudência
o caso seria subsumível na citada alínea f) do n.º 1 do art. 400.º, com a
consequente inadmissibilidade do recurso interposto.
E se, porventura, se não considerar que há dupla conforme poderia,
eventualmente, ser aplicável a alínea e) do n.º 1 do mesmo preceito que
estabelece serem irrecorríveis os «acórdãos proferidos, em recurso, pelas
relações, que apliquem pena não privativa da liberdade».
Porém, o recurso também não é admissível ao abrigo desta alínea, por o arguido
ter sido condenado numa pena não superior a 5 anos de prisão.
Com efeito, como se disse no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.02.09
– Proc. n.º 102/09 - 3.ª « (...) A referência essencial para a leitura integrada
do regime – porque constitui a norma que define directamente as condições de
admissibilidade do recurso para o STJ – não pode deixar de ser a alínea c) do nº
1 o artigo 432º do CPP, que fixa, em termos materiais, uma condição e um limiar
material mínimo de recorribilidade – acórdãos finais, proferidos pelo tribunal
do júri ou pelo tribunal colectivo, que apliquem pena de prisão superior a cinco
anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito.
(...) A repartição das competências em razão da hierarquia pelas instâncias de
recurso está, assim, delimitada por uma regra-base que parte da confluência de
uma dupla de pressupostos – a natureza e a categoria do tribunal a quo e a
gravidade da pena efectivamente aplicada.
A coerência interna do regime de recursos para o STJ em matéria penal supõe,
deste modo, que uma decisão em que se não verifique a referida dupla de
pressupostos não deva ser (não possa ser) recorrível para o STJ. Com efeito, se
não é admissível recurso directo de decisão proferida por tribunal singular, ou
que aplique pena de prisão não superior a cinco anos, também por integridade da
coerência que deriva do princípio da paridade ou até da maioria de razão, não
poderá ser admissível recurso de segundo grau de decisão da relação que conheça
de recurso interposto nos casos de decisão do tribunal singular ou do tribunal
colectivo ou do júri que aplique pena de prisão não superior a cinco anos.
Como a propósito se refere em acórdão do STJ (de 25 de Junho de 2008, proc.
1879/2008), «desde que não haja condenação em pena não superior a cinco anos de
prisão, não incumbe ao STJ, por não se circunscrever no âmbito dos seus poderes
de cognição, apreciar e julgar recurso interposto de decisão final do tribunal
colectivo o do júri, que condene em pena não superior a cinco anos de prisão»;
«o legislador, ao arredar da competência do Supremo o julgamento do recurso de
acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que apliquem pena não privativa
de liberdade, quis implicitamente significar, de harmonia com o artigo 9º do
Código Civil, na teleologia e unidade do sistema quanto a penas privativas de
liberdade, que [...] apenas é admissível recurso de acórdão da relação para o
Supremo quando a relação julgar recurso de decisão do tribunal colectivo ou do
júri, em que estes tivessem aplicado pena superior a cinco anos de prisão».
É, pois, neste círculo hermenêutico que têm de ser interpretadas as normas do
artigo 400º, nº 1 do CPP, quando determinam a irrecorribilidade (e, por
autonomia, a recorribilidade) das decisões proferidas, em recurso, pelo tribunal
da relação.
Desde logo a norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 400º, que prevê a
irrecorribilidade das decisões proferidas em recurso pela relação, que apliquem
pena não privativa de liberdade.
A formulação da norma constava da Proposta de Lei nº 109/X (DAR, II série, nº
31, de 23/Dez/06) em termos diversos («são irrecorríveis» os acórdãos
proferidos, em recurso, pela relação, «que apliquem pena de multa ou pena de
prisão não superior a cinco anos»), adaptando por comparação com a anterior
formulação e para os casos aí previstos, o critério da “pena aplicada” em lugar
da “pena aplicável ao crime” (Os Projectos de Lei nº 2371X, DAR, II série, nº
100, de 6/Abril/06; 368/X, 369/X e 370/X, DAR, II série, nº 52, de 9/Março/07
não previam qualquer alteração para a alínea e) do nº 1 do artigo 400º).
A redacção final foi votada, após proposta oral do PS (com a abstenção dos
restantes Partidos), em última leitura no Grupo de Trabalho da Comissão
Parlamentar, ficando a expressão constante da redacção fixada pela Lei nº
48/2007, de 29 de Agosto – «que apliquem pena não privativa de liberdade».
O Relatório dos trabalhos preparatórios, de 18 de Julho de 2007, fixando a
alteração na sequência da «proposta oral», não deixa qualquer traço de
fundamentação que justifique o desvio em relação ao primeiro texto proposto e a
consequente «descontinuidade metodológica».
E, assim, também não deixa massa crítica nos procedimentos que permita obter
deduções, com o peso de probabilidade necessário, sobre a vontade ou a intenção
de legislador.
Isto é, não parece possível determinar se a formulação final e votada da norma
constitui um «acidente» na metodologia da formação normativa, ou uma expressão
concreta, firme e pensada da vontade do legislador.
A conclusão que poderá ser extraída de todo o processo legislativo, tal como
deixou traço, será a de que se não manifesta nem revela uma intenção, segura, de
alteração do paradigma que vem já da revisão do processo penal de 1998: o STJ
reservado para os casos mais graves e de maior relevância, determinados pela
natureza do tribunal de que se recorre e pela gravidade dos crimes aferida pelo
critério da pena aplicável. É que, no essencial, esta modelação mantém-se no
artigo 432º do CPP, e se modificação existe, vai ainda no sentido da restrição:
o critério da pena aplicada conduz, por comparação com o regime antecedente, a
uma restrição no acesso ao STJ.
Não sendo razoavelmente possível, pelos elementos objectivos que o processo
legislativo revela, identificar a vontade do legislador no sentido de permitir a
conclusão de que na alínea e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP disse mais do que
quereria, não parece metodologicamente possível operar uma interpretação
restritiva da norma.
Porém, a norma, levada isoladamente ao pé da letra, sem enquadramento sistémico,
acolheria solução que é directamente afastada pelo artigo 432º, nº 1, alínea c),
produzindo uma contradição intrínseca que o equilíbrio normativo sobre o regime
dos recursos para o STJ não pode comportar.
(...) A perspectiva, o sentido essencial e os equilíbrios internos que o
legislador revelou na construção do regime dos recursos para o STJ, com a
prevalência sistémica, patente e mesmo imanente, da norma do artigo 432º, e
especialmente do seu nº 1, alínea c), impõe, por isso, em conformidade, a
redução teleológica da norma do artigo 400º, n.º 1, alínea e) do CPP, de acordo
com o princípio base do artigo 432º, nº 1, alínea c) do CPP, necessária à
reposição do equilíbrio e da harmonia no interior da regime dos recursos para o
STJ», no sentido de o recurso não ser admissível para o STJ no caso que tenha
sido aplicada uma pena não superior a 5 anos de prisão.
No mesmo sentido, embora com fundamento metodológico não inteiramente
coincidente, os Acórdãos deste Supremo Tribunal de 17.04.08 – Proc. n.º 903/08 e
de 24.04.09 – Proc. n.º 329/05.1PTLRS.Sl.
O reclamante suscita a inconstitucionalidade da alínea f) do n.º 1 do art. 400.º
do CPP, quando interpretada no sentido da inadmissibilidade do recurso, por
violação das garantias de defesa constitucionalmente consagradas, referindo que
o recurso penal que consta do art. 2.º do Protocolo 7 à Convenção para a
Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais é um dos direitos
fundamentais do arguido com consagração no art. 32.º, n.º 1, da CRP.
Quanto ao art. 2.º do Protocolo 7.º à Convenção Europeia, nele apenas se
encontra estabelecido o direito a um segundo grau de jurisdição como garantia de
defesa em termos substancialmente coincidentes com o art. 32.º, n.º 1, da
Constituição.
E o direito ao recurso, garantido como direito de defesa no citado n.º 1 do art.
32.º da CRP, basta-se com um grau de recurso, ou segundo grau de jurisdição,
direito esse, que o reclamante já utilizou ao recorrer para a Relação.»
3. O presente recurso de constitucionalidade tem unicamente por objecto a norma
da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, na
interpretação adoptada na decisão recorrida, porquanto o mesmo não foi admitido
na parte em que o recorrente, no requerimento de interposição, se reportava “à
nulidade do acórdão da 2ª instância”, que não conheceu desta questão por ter
entendido ser a mesma estranha ao âmbito da reclamação prevista no artigo 405.º
do Código de Processo Penal. A rejeição do recurso, nesta parte, assentou, pois,
na falta de um dos pressupostos da admissibilidade do tipo de recurso em causa,
a saber, a aplicação por parte da decisão recorrida da norma que se pretende
sindicar.
Relativamente à norma da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de
Processo Penal, a questão analisada na decisão recorrida reconduz-se a saber se,
num caso como o dos autos em que a Relação, em recurso, absolveu o arguido de um
dos crimes por que havia sido condenado em 1ª instância, reduzindo a pena em
conformidade com essa absolvição, e mantendo no mais o decidido em 1ª instância,
é ainda uma “decisão confirmativa”, para efeitos da aplicação daquele preceito,
conducente à inadmissibilidade do recurso.
Da sistematização seguida na decisão recorrida e do discurso argumentativo
adoptado retira-se que a decisão em causa seguiu a tese maioritária do Supremo,
«no sentido de que há dupla conforme quando haja confirmação da condenação in
melius», tendo entendido que tal se teria verificado no caso presente, por o
acórdão em causa ao ter absolvido o arguido da prática de um crime de burla
informática e, em conformidade, reduzido a pena aplicada, ter sido mais
favorável ao arguido. Assim, e de acordo com esta jurisprudência o caso seria
subsumível à citada alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º, com a consequente
inadmissibilidade do recurso interposto. Só deste modo se compreende que no
final da decisão se tenha conhecido da questão da constitucionalidade desta
norma.
Porém, a decisão recorrida avança com um outro fundamento (ao qual dedica se
dedica boa parte da fundamentação) para o caso de «se, porventura, se não
considerar que há dupla conforme», que consiste na aplicação da norma da alínea
e) do n.º 1, do artigo 400.º do Código de Processo Penal, conjugada com a da
alínea c) do n.º 1, do artigo 432.º do mesmo Código, por via da qual «o recurso
também não é admissível», «por o arguido ter sido condenado numa pena não
superior a 5 anos de prisão».
Esta interpretação faz apelo de anterior jurisprudência do Supremo onde se
entendeu que: «(...) A perspectiva, o sentido essencial e os equilíbrios
internos que o legislador revelou na construção do regime dos recursos para o
STJ, com a prevalência sistémica, patente e mesmo imanente, da norma do artigo
432.º, e especialmente do seu nº 1, alínea c), impõe, por isso, em conformidade,
a redução teleológica da norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) do CPP, de
acordo com o princípio base do artigo 432.º, n.º 1, alínea c) do CPP, necessária
à reposição do equilíbrio e da harmonia no interior da regime dos recursos para
o STJ, no sentido de o recurso não ser admissível para o STJ no caso que tenha
sido aplicada uma pena não superior a 5 anos de prisão.»
Ora, o recorrente não impugnou em sede de recurso de constitucionalidade tais
normas/dimensões normativas, nada constando a este respeito no requerimento de
interposição de recurso.
Deste modo, quer se entenda existir uma dupla fundamentação, quer se considere
que, no caso, a aplicação da norma da alínea e) do n.º 1, do artigo 400.º,
conjugada com a da alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º, do Código de Processo
Penal, constitui um fundamento alternativo decisório, igualmente conducente, por
si só, à inadmissibilidade do recurso do acórdão da Relação para o Supremo
Tribunal de Justiça, não pode tomar-se conhecimento do objecto do presente
recurso de constitucionalidade, por inutilidade, como é entendimento pacífico
deste Tribunal. Efectivamente, em resultado da aplicação destes preceitos, não
constantes do objecto do recurso, qualquer que fosse a sorte deste relativamente
à questão da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal
sempre a decisão recorrida se manteria com base nos preceitos não impugnados.
4. Nestes termos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei n.º
28/82, de 15 de Novembro, decide-se não tomar conhecimento do objecto do
recurso.
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 unidades de
conta.”
2. O recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do citado artigo
78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), nos seguintes termos:
“A., arguido/recorrente nos autos supra referenciados e nos mesmos melhor
identificado, tendo sido notificado de douta decisão sumária proferida, no
sentido de não tomada de conhecimento do recurso interposto, vem, nos termos e
para os efeitos do n.º 3 do art. 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional
(doravante LTC brevitatis causa), apresentar reclamação para a conferência nos
termos e com os seguintes fundamentos:
I) Da decisão sumária
1º
Mediante douta decisão sumária, proferida pelo Ex.mo Juiz Conselheiro relator,
foi decidido não ser tomado conhecimento do objecto do recurso apresentado.
2º
Ora, tal douta decisão não deixa de ser curiosa e surpreendente na sua
fundamentação.
3º
Todavia, previamente, diga-se que o despacho de 11 de Março de 2010 admitiu o
recurso para o Tribunal Constitucional unicamente na parte da
constitucionalidade da norma do art. 400º, nº 1, f) do Código de Processo Penal
(doravante CPP brevitatis causa) e não já na parte respeitante à nulidade do
acórdão de 2ª instância.
4º
Com efeito, por se ter previsto tal facto e ser o mesmo decorrente da aplicação
correcta da lei, relativamente a tal matéria havia sido intentado, no dia 26 de
Fevereiro de 2010, o competente recurso de constitucionalidade no Venerando
Tribunal da Relação de Coimbra, estando-se a aguardar a admissão do mesmo.
5º
Temos assim que a questão concreta que se versa no presente recurso de
constitucionalidade é unicamente a referente à alínea f) do nº.1 do art. 400º
CPP.
6º
O presente recurso foi objecto de decisão sumária de não conhecimento em razão
de se mostrarem igualmente aplicáveis à rejeição do recurso interposto para o
STJ as alíneas e) do nº.1 do art. 400º conjugada com a alínea c) do nº.1 do art.
432º, ambos do CPP.
7º
Alega-se, com justeza diga-se, que tais normas não teriam sido impugnadas em
sede de recurso de constitucionalidade pelo ora reclamante, o que não constituiu
obstáculo a que o mesmo fosse admitido!
8º
Ora, sobre tal facto, duas considerações: em primeiro lugar, o despacho de não
admissão de tal recurso, proferido no Venerando Tribunal da Relação de Coimbra e
datado de 31 de Dezembro de 2009, conforme fls. 1412 dos autos, apenas indicou
como razão de tal não admissão a alínea f) do n.º 1 do art. 400º CPP.
9º
Ora, se apenas foi indicada tal alínea como constituindo obstáculo à admissão de
recurso, obviamente que a reclamação dirigida ao Ex.mo Presidente do STJ versou
apenas sobre a inconstitucionalidade de tal norma, tal como o mesmo
expressamente refere a fls. 1 in fine da sua douta decisão.
10º
Constitui fundamento para apresentação de recurso de constitucionalidade, nos
termos da alínea b) do nº 1 do art. 70º LTC, que tenha havido aplicação de norma
cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
11º
Assim sendo, como poderia o recorrente fundamentar tal recurso na
inconstitucionalidade de normas que nunca havia suscitado no processo-!
12º
Por outro lado, é exigência do n.º 2 do art. 75º-A LTC que se indiquem as peças
processuais onde tal questão de inconstitucionalidade foi suscitada.
13º
Ora, dentro de toda a boa-fé que sempre moveu o reclamante, não iria recorrer
com base em questões não suscitadas por si no processo...
14º
Razão pela qual se entenda que enferma a douta decisão sumária de vício na sua
fundamentação, mostrando-se mesmo violadora dos limites impostos na própria LTC
e que norteiam o âmbito dos recursos de constitucionalidade, sendo o
entendimento nela consagrado, ironia das ironias, e com o devido respeito,
inconstitucional.
15º
Com efeito, a ser dado provimento a tal linha jurisprudencial, mais uma vez se
vê o reclamante prejudicado nos seus direitos, sendo, na gíria popular, “preso
por ter cão e por não ter”.
16°
Na verdade, tivesse o mesmo intentado recurso de constitucionalidade sobre tais
normas e muito provavelmente não teria sido o mesmo aceite...
17º
Todavia, começámos por referir que haveria duas notas em relação a tal decisão
sumária, impondo-se agora a segunda delas: com efeito, as razões pelas quais se
defende a inconstitucionalidade da não admissão do recurso aplicam-se igualmente
a tais normas não impugnadas à luz dos argumentos a simili e a fortiori!
18º
De facto, o que está em causa para o reclamante é a suscitação de questões novas
que não tiveram ainda nenhum grau de jurisdição decisória.
19º
Na verdade, apenas subsidiariamente se discute a execução da pena de prisão, uma
vez que maioritariamente, está em causa a violação de norma processual e a
preterição de direitos de defesa validamente suscitados.
20º
Com efeito, tais restrições ao direito de recurso apenas poderão valer quando o
recorrente pretenda novamente questionar a pena aplicada ou a condenação.
21º
Ora, no presente caso, trata-se de questão diversa, uma vez que a única coisa
que exactamente se pretende é a reposição e harmonia do processo penal.
22º
A entender-se diversamente, toda e qualquer preterição de direitos dos arguidos,
em julgamentos de recurso com aplicação de pena de prisão inferior a 5 anos,
ficariam impunes.
23º
Viam-se os arguidos impedidos de reagir contra tais violações processuais, da
mesma forma que o Tribunal da Relação ganharia um poder acrescido que nunca
seria sindicável.
24º
Ora, tal concepção de Direito processual que se queira justo é para nós
intolerável!
25º
E as razões pelas quais se defende a inconstitucionalidade da alínea f) do nº.1
do art. 400º CPP prendem-se com o seu entendimento de sempre constituir
obstáculo à admissão do recurso independentemente do fundamento do recurso.
26º
Concorda-se que assim deva ser quando o recorrente mais não pretenda que um
terceiro grau de julgamento, sobre questões já anteriormente julgas e
reapreciadas.
27º
Agora quando, como no presente caso, se pretende a apreciação em primeiro grau
de questões que o Venerando Tribunal de recurso expressamente não conheceu,
cremos que tal entendimento comportará a inconstitucionalidade apontada.
28º
Tem-se assim por de duvidosa bondade jurídica a decisão sumária proferida nos
presentes autos...
29º
Há boas e válidas razões que sustentam a cognoscibilidade do objecto do recurso
interposto.
II) Da recorribilidade e consequente inconstitucionalidade
30º
Primeiramente, um pouco de resenha histórico-processual para que tenham V/ Exas.
a panorâmica geral e a real percepção da importância suprema da decisão a
proferir.
31º
O reclamante foi condenado em primeira instância, em cúmulo jurídico, na pena de
4 anos e 3 meses de prisão, tendo, inconformado com tal douta decisão,
interposto o competente recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra.
32º
Tal recurso versava, desde logo, a reapreciação da prova gravada relativamente à
prática do crime de roubo bem como sobre matéria de Direito sobre a condenação
pelos dois demais crimes e ainda, a final, sobre a não aplicação do instituto da
suspensão da pena de prisão.
33º
Todavia, incluía igualmente a alegação de nulidade do douto acórdão de primeira
instância nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 379º CPP, pedido de
realização de audiência nos termos do nº.5 do art. 411º CPP e diligências de
prova.
34º
Mediante douto acórdão, veio o mesmo a obter parcial provimento, sendo certo
que, entende o reclamante, por não apreciação de questão suscitada pelo
reclamante e violação de lei processual, enfermava o mesmo de nulidade e demais
vícios.
35º
Razão pela qual apresentou o competente recurso para o Supremo Tribunal de
Justiça, invocando desde logo tais factos.
36º
Na verdade, a motivação do recurso apresentado não radicava em primeira linha na
condenação e medida da pena, razão pela qual se entende não poder a alínea f) do
n.º 1 do art. 400º CPP constituir óbice à sua admissibilidade.
37º
De facto, o recurso interposto está para lá de tal fronteira, razão pela qual se
entende ser admissível, sob pena de perversão dos mais elementares direitos
processuais.
38º
Há assim que interpretar cum grano salis tal disposição legal, sendo certo que a
reforma processual penal pretendeu diminuir a recorribilidade junto do Supremo
Tribunal de Justiça, mas não terá querido deixar os sujeitos processuais à mercê
de decisões judiciais que se possam mostrar inquinadas ou sejam resultado de
“atropelos” processuais.
39º
De facto, a ser interpretada de tal forma, não deixará de ser a mesma
inconstitucional por violação das garantias de defesa constitucionalmente
tuteladas.
40º
Na verdade, o TC tem decidido que o núcleo essencial de garantias de defesa
abrange o «direito a ver o caso examinado em via de recurso, mas não abrange já
o direito a novo reexame de uma questão já reexaminada por uma instância
superior» (cf. Ac. do TC n.º 565/07, DR II Série, de 03-01 -08).
41º
Por isso, deve aceitar-se que o legislador possa fixar um limite abaixo do qual
não é possível um terceiro grau de jurisdição – duplo grau de recurso –,
reservando o STJ para a apreciação dos casos mais graves, tal como parece ter
sido o espírito que presidiu à recente reforma processual penal.
42º
O recurso penal – que consta do art. 2.º do protocolo n.º 7 à Convenção para a
Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, aprovado, para
ratificação, pela Resolução da AR n.º 22/90, de 27-09, e ratificado pelo Decreto
do PR n.º 51/90 – é um dos direitos fundamentais do arguido, com consagração no
art. 32.º, n.º 1, da CRP (após a 4ª revisão constitucional), havendo sempre que
salvaguardar a existência de um duplo grau de jurisdição.
43º
E humildemente se confessa que “duplo grau de jurisdição” não é a mesma coisa
que um duplo grau de recurso, tendo-se perfeita consciência de tal facto, pois
nunca se pretendeu exercer o denominado “terrorismo de direitos fundamentais”.
44º
Na verdade, na vida sempre haverá que fazer honra e timbre da Justiça, nem
sempre os fins justificando os meios.
45º
Ao interpor o recurso ordinário, pretendeu unicamente o reclamante exercer um
seu direito de “manifestação de posição contrária” face à disposição inovatória
traduzida no douto acórdão recorrido.
46º
Na verdade, a enfermar, como supomos, o dito acórdão de uma nulidade e
mostrando-se violada lei processual penal, como garantir o duplo grau de
jurisdição face a tal douta decisão ou a reacção face à mesma-
47º
Aceita-se que se entenda que relativamente aos pontos VII, IX e X do recurso
apresentado ocorra a referida inadmissibilidade legal de conhecimento do
recurso, mas não se deixa de apontar que tais pontos são os finais, pelo que se
mostram unicamente “à boleia”, ou seja, “por arresto”.
48º
De facto, os alicerces do recurso, são os que constam essencialmente dos pontos
que III), IV), V) e VI), nos quais se abordam as questões da nulidade, da
omissão de pronúncia, da não realização de audiência, da ausência de atendimento
a documentos e diligência requerida.
49º
O presente recurso, além da invocação de erro notório na apreciação da prova,
versa primacialmente tais questões de Direito, sendo que nenhuma delas se mostra
já julgada anteriormente.
50º
Afinal, sobre as mesmas não há mesmo decisão, uma vez que o que existe são
omissões de pronúncia.
51º
Assim sendo, havendo fundamentos de nulidade do douto acórdão recorrido, estará
o reclamante coarctado processualmente, não podendo reagir contra a mesma-
52º
Ora, tal entendimento é juridicamente sindicável e violador da lei,
representando sinais de um sistema jurídico que, por certo, se não quer por não
erigido sob os alicerces de um Estado de Direito!
53º
Citando Ortega y Gasset, desde logo se dirá que “a única perspectiva falsa é que
a pretende ser única”, pelo que quer a defendida no douto despacho quer a que
infra deixaremos, nunca poderão gozar da característica da verdade suprema.
54º
Na verdade, com o recurso interposto não pretendia o recorrente colocar em causa
o exercício das mui nobres funções nas quais se mostram investidos os Ilustres
julgadores, mas tão-somente exercer o direito de “manifestação de posição
contrária”, traduzido no direito de recorrer, consagrado n alínea i) do nº.1 do
art. 61º CPP e no nº.1 da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP
brevitatis causa).
55º
Sucede que as decisões de não admissão de tal recurso se afiguram, salvo o
devido respeito por melhor opinião, aos olhos do ora reclamante, como sendo um
retrato distorcido da legalidade plasmada no Código de Processo Penal bem como
dos seus direitos, ou seja, disforme com a normatividade jurídica vigente
aplicável ao presente caso.
56º
Segundo a alínea b) do art. 379º CPP, a sentença é nula quando “condenar por
factos diversos dos descritos na acusação... fora dos casos e das condições
previstos nos arts. 358º e 359º CPP”.
57º
Nos termos de douta acusação pública proferida, apenas se mostravam acusados
pelo crime de burla informática o ora reclamante e a arguida Elisabete.
58º
Tal douta acusação pública foi recebida pelo Tribunal a quo, que não procedeu a
nenhuma alteração, mediante despacho datado de 05 de Janeiro de 2009, sendo tal
facto expressamente referido em sede de relatório do douto acórdão de primeira
instância (pg. 1 in fine).
59º
Sucede porém que, a final, vieram os três arguidos a ser condenados por tal
crime, não tendo havido, tanto quanto se julga saber, qualquer alteração
substancial, ou não, dos factos constantes na douta acusação pública.
60º
E não se pôde deixar de apontar a ilegalidade da mesma, qualificada pela lei
como nulidade, nos termos do princípio da legalidade consagrado no art. 118º
CPP, sendo certo que nos termos do n.º 1 do art. 122º CPP, as nulidades tornam
inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas
puderem afectar.
61º
No douto acórdão recorrido, optou o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra por
não conhecer da apontada nulidade, “dada a solução que a final se dará à questão
da burla informática, e que abrangerá todos os arguidos” (fls. 22 in fine de
douto acórdão recorrido).
62º
Ora, não poderá o reclamante estar em maior desacordo com tal entendimento, uma
vez que a questão da nulidade teia de ser analisada e conhecida, pois, a
mostrar-se o douto acórdão condenatório de primeira instância manchado pela
mesma, não se mostrará uma absolvição de todos os arguidos pela prática do crime
de burla informática apta a eliminar tal “nódoa jurídica”.
63º
De facto, se antes havia um arguido que havia sido condenado sem se mostrar
acusado, em flagrante violação legal, agora temos o mesmo arguido absolvido da
prática de um crime pelo qual se não mostrava acusado, sendo que tal absolvição
radica unicamente no concurso aparente entre roubo e burla informática e não já
da apontada nulidade, que assim continua a manchar a decisão.
64º
Entende-se que a reposição da legalidade unicamente será feita pelo
reconhecimento e expurgação de tal pecado original, sendo o acórdão nulo, atento
o disposto no n.º 4 do art. 425º CPP e a aplicabilidade do art. 379º nº.1 c) do
mesmo diploma legal, por não ter conhecido da referida nulidade.
65º
A opção seguida pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, ao optar por não
conhecer da nulidade, mostra-se violadora dos direitos de defesa do reclamante,
consubstanciando uma inconstitucionalidade.
66º
De facto, entende-se como violador da lei fundamental o entendimento segundo o
qual as violações de lei penal, cominadas como nulidade, podem ser sanadas por
“remendo”, sem conhecimento, declaração e expurgação de tal nulidade.
67º
Mais se entende que se não possa considerar sanada uma nulidade, resultante da
condenação de um não acusado, pela sua posterior absolvição baseada na
consumpção do crime e não pela apontada violação de lei processual, uma vez que
tal redunda na absolvição de um não acusado.
68º
Na verdade, se um arguido não é acusado, não pode ser perseguido criminalmente,
ou seja, nem condenado nem absolvido, tendo de ser um terceiro estranho à douta
decisão dos julgadores face ao cometimento de tal crime.
69º
Condenação sem acusação constitui violação legal cominada com nulidade e
absolvição sem acusação é um paradoxo, uma impossibilidade e salvo o devido
respeito, um erro!
70º
Não se pode esquecer que igualmente havia o recorrente pugnado pela alteração do
ponto 12 dos factos dados como não provados, com base nos relatórios juntos aos
autos, e não houve igualmente conhecimento de tal facto.
71º
O reclamante, aquando da interposição do recurso, quer em sede de parte inicial
bem como de motivação (bastará atentar que na página inicial do requerimento de
recurso, por entre as normas legais que servem de base ao mesmo consta o n.º 5
do artº 411º CPP e a fls. 27, no terminus da motivação), expressou solene e
inequivocamente o desejo de existência de audiência, nos termos do n.º 5 do art.
411º CPP, tendo requerido a sua realização.
72º
Mesmo que se entendesse que o mesmo poderia enfermar de qualquer vício, sempre
teria o recorrente de ser notificado para proceder a explicitações do mesmo, sob
pena de inconstitucionalidade por violação das suas garantias de defesa (maxime
as plasmadas no art. 32º nº.1 CRP).
73º
De facto, temos por inconstitucional o entendimento de que qualquer não
preenchimento de um formalismo legal, no tocante ao requerimento de realização
de audiência, nos termos do n.º 5 do art. 411º CPP, produzirá, sem hipótese de
convalidação ou reparação pelo recorrente, a sua imediata rejeição.
74º
Para mais quando no presente caso nem houve lugar a notificação de tal rejeição
nem tal tema é aflorado no douto acórdão recorrido.
75º
Pelo que, igualmente por esta via, deixou o Venerando Tribunal a quo de conhecer
de uma questão sobre a qual e deveria ter pronunciado, com a consequente
nulidade, a qual se invoca, nos termos do alínea c) do n.º 1 do art. 379º ex
n.º.4 art. 425º CPP.
76º
Dúvidas não haverão assim de que tal pedido foi efectuado, havendo ainda o teor
do referido a fls. 11 do douto acórdão recorrido, sob o ponto 4, no sentido da
realização de tal audiência, pelo que sempre colocou o reclamante a questão de
não ter sido notificado.
77º
Todavia, atenta a consideração que sempre nos merecem os Tribunais, duvidou o
recorrente de tamanha preterição dos seus direitos, pelo que aquando
da ultimação do recurso, se procedeu à consulta dos autos, junto do Venerando
Tribunal da Relação de Coimbra, tendo-se constatado que a mesma não teve lugar,
mostrando-se violado o requerimento nesse sentido e o douto acórdão recorrido
eivado de uma não-verdade.
78°
Com efeito, conforme fls. 1364 dos autos, apenas teve lugar a conferência
(conforme acta da mesma) e não já a audiência, mostrando-se assim violado o teor
do art. 419º nº 3 c) CPP, dado o julgamento do recurso ter sido em conferência
quando o devia ser, em razão de pedido efectuado nesse sentido, em audiência.
79º
Após ter sido proferido douto acórdão de primeira instância, acabou por ser
junto aos autos o relatório de perícia psiquiátrica médico-legal do reclamante,
afigurando-se desde logo essencial por comprovar a dependência de
estupefacientes pela qual passou o recorrente, a qual, conforme factos dados
como provados, se mantinha à data da prática dos factos.
80º
E aí se refere, a fls. 3, que apresenta como sintomas nucleares a suspeição e a
desconfiança, pelo que teria poucas ou nenhumas amizades, preferindo estar só,
perante o desconforto sentido em situações especiais.
81º
Assim sendo, tornar-se-ia pouco provável uma comparticipação a três para o
cometimento de crimes, mostrando-se condenação pela qual foi alvo, violadora de
tal relatório, tudo apontando para que o mesmo nunca agisse em conjugação de
esforços com outrem, mas sozinho.
82º
Ora, tal facto, pese embora ainda não fosse do conhecimento do Tribunal de 1ª
instância, já o seria do Venerando Tribunal a quo, sendo que igualmente não
mereceu a mínima consideração.
83º
Havendo um relatório médico, insuspeito, que atesta uma realidade e se dá outra
por provada, não incorrerá o Tribunal a quo em erro notório na apreciação da
prova-
84º
Ora, tal resposta ficou por dar, não havendo igualmente conhecimento de tal
questão, o que, igualmente poderá ser foco de nulidade.
85º
Por outro lado, tanto quanto se julga saber, não atendeu igualmente o Venerando
Tribunal a quo ao pedido de obtenção de certidão face a diligência realizada
contra o ora reclamante, após a entrada do requerimento de recurso num outro
processo-crime.
86º
Na verdade, por requerimento datado de 30 de Julho de 2009, havia sido
solicitada certidão do resultado da busca domiciliária levada a cabo no dia 21
de Maio do corrente ano, no âmbito e para efeitos lo Proc. nº. 202/07.9JACBR,
pois foi a residência do reclamante alvo de busca sem que nada tenha sido
encontrado.
87º
Todavia, como tal bus a teve lugar após a entrada do requerimento de recurso, o
ora recorrente não é arguido em tal processo e se mostra o mesmo sujeito a
segredo, para defesa e salvaguarda dos seus direitos, requereu o recorrente a
obtenção de certidão pelo Tribunal.
88º
Pelo que, à imagem d sucedido com a ausência de conhecimento do facto 12 dos
factos dados como não provados, também o resultado de tal busca igualmente se
mostrava essencial para o juízo de prognose e para efeitos de suspensão da
execução da pena de prisão.
89º
Estando na base do recurso primacialmente tais questões (e não a condenação e
medida da pena em si!) que ainda não foram julgadas nem em primeiro grau nem em
segundo, entende-se que não será de aplicar quaisquer alíneas do nº.1 do art.
400º ou do art. 432º CPP, não havendo assim razões para a sua inadmissibilidade
e não conhecimento do actual.
90º
Assim falecendo igualmente as razões de sustentação da condenação em taxa de
justiça.
91º
Para mais no montante de 7 unidades de conta, o que se mostra exagerado, atento
o facto de a final, nem se mostrar conhecido o objecto do recurso...
92º
Ora, assim ficarão V/Exas. devida e cabalmente elucidadas sobre a luta do
reclamante, em prol da reposição da verdade processual, podendo constatar quão
juridicamente injusta foi a não admissão do recurso interposto bem como o não
conhecimento deste.”
3. O Ministério Público responde nos termos seguintes:
“[ ...]
Resta, pois, para apreciação, apenas, a questão relativa ao art. 400º, nº 1,
alínea f) do Código de Processo Penal.
12º
Ora, desde logo, regista-se a forma deficiente como a questão foi definida pelo
recorrente, na formulação que dela faz, um pouco mais adiante:
“Como fundamento do recurso aponta-se o entendimento sufragado quer no Acórdão
da Relação de Coimbra quer nas sucessivas não admissões do recurso, por se
entender violador das normas legais plasmadas nos arts. 399º, 400º nº 1 f), 411º
nº 5, 419º nº 3 c), 379º nº 1 c) ex vi art. 425º nº 4, todos do CPP e art. 32º
nº 1 da CRP, afigurando-se, não só relevante como essencial para a boa decisão
da questão principal, uma vez que em causa estão direitos, liberdades e
garantias do recorrente, e constitucionalmente tutelados.”
Com efeito, a referida formulação reporta-se a diversas disposições legais
quando, o que está em causa no presente recurso é, exclusivamente, a aplicação
do art. 400º, nº 1, alínea f) do Código de Processo Penal, como antes se
referiu.
13º
Por outro lado, tem-se alguma dificuldade em perceber qual a exacta dimensão
normativa que o recorrente pretende ver apreciada, a propósito desta última
disposição do Código de Processo Penal, uma vez que nunca enuncia tal disposição
normativa.
Ora, a redacção deste preceito é a seguinte:
“1 – Não é admissível recurso:
f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações
que confirmem decisão de 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8
anos”.
14º
Por outro lado, não se aceita, de todo, a argumentação do interessado, segundo a
qual esta disposição do CPP terá de ser interpretada em função do que indica na
sua motivação (cfr. nºs 18 a 22 da motivação da sua reclamação):
“18. De facto, o que está em causa para o reclamante é a suscitação de questões
novas que não tiveram ainda nenhum grau de jurisdição decisória.
19. Na verdade, apenas subsidiariamente se discute a execução da pena de prisão,
uma vez que maioritariamente, está em causa a violação de norma processual e a
preterição de direitos de defesa validamente suscitados.
20. Com efeito, tais restrições ao direito de recurso apenas poderão valer
quando o recorrente pretenda novamente questionar a pena aplicada ou a
condenação.
21. Ora, no presente caso, trata-se de questão diversa, uma vez que a única
coisa que exactamente se pretende é a reposição e harmonia do processo penal.
22. A entender-se diversamente, toda e qualquer preterição de direitos dos
arguidos em julgamento de recurso com aplicação de pena de prisão inferior a 5
anos, ficariam impunes.”
15º
Com efeito, o recurso de constitucionalidade não serve para apreciar questões
novas, mas questões já suscitadas nos autos e apreciadas pelas instâncias
recorridas.
Por outro lado, o objecto do recurso é, no presente caso, o art. 400º, nº 1,
alínea f) do Código de Processo Penal, na redacção do mesmo Código, e não na
interpretação que dele faz o interessado. Quod erat demonstrandum!
Por último, o recurso de constitucionalidade destina-se, no caso português, à
apreciação de dimensões normativas e não da situação em concreto verificada em
cada processo (incidentes processuais, apreciação da prova, nulidades, etc.),
cabendo esta apreciação exclusivamente à jurisdição recorrida.
Daí que uma parte muito significativa da argumentação do interessado, na
motivação da sua reclamação, seja alheia à questão jurídica em apreciação,
respeitando a aspectos específicos do processo em apreciação, que não poderão
ser sindicados por este Tribunal Constitucional (cfr. por exemplo, nºs 30 a 92
da mesma motivação).
16º
Por outro lado, compulsando a motivação da mesma reclamação para a conferência,
há dificuldade em saber, exactamente, qual a dimensão normativa que o recorrente
pretende ver apreciada, a propósito da inconstitucionalidade que invoca.
Na verdade, o recorrente afirma, por um lado (cfr. nº 66 da referida motivação):
“ De facto, entende-se como violador da lei fundamental o entendimento segundo o
qual as violações de lei penal, cominadas como nulidade, podem ser sanadas por
«remendo», sem conhecimento, declaração e expurgação de tal nulidade”.
Como afirma, por outro (cfr. nº 73 da motivação da reclamação):
“De facto, temos por inconstitucional o entendimento de que qualquer não
preenchimento de um formalismo legal, no tocante ao requerimento de realização
de audiência, nos termos do nº 5 do art. 411º CPP, produzirá, sem hipótese de
convalidação ou reparação pelo recorrente, a sua imediata rejeição”.
17º
Ora, pergunta-se, onde está, nesta argumentação, o art. 400º, nº 1, alínea f) do
CPP - único objecto do recurso, volta a sublinhar-se-
A bem dizer, em parte alguma!
E é uma tal ausência que dita, inevitavelmente, o destino da presente
reclamação, tal como já havia ditado o destino do recurso inicial.
18º
É bem certo que toda a argumentação do interessado parece ter subjacente a
preocupação de assegurar, custe o que custar, a suspensão da execução da pena de
prisão que lhe foi aplicada.
São elucidativos, a este respeito, os argumentos esgrimidos nas suas alegações
de recurso para o STJ (cfr. fls. 48-49, 51-53, 55-61 dos autos).
19º
No entanto, o que está em causa, na apreciação do recurso inicial e da presente
reclamação, é a aplicação, no caso dos autos, do art. 400º, nº 1, alínea f) do
CPP.
E, quanto a este ponto, a argumentação do Ilustre Conselheiro Relator, deste
Tribunal Constitucional, mantém plena consistência.
20º
É bem certo, reconhece-se, que o reclamante tem alguma razão, quando refere a
sua estranheza quanto à possível aplicação do art. 400º, nº 1, alínea e),
conjugada com o art. 432º, nº 1, alínea c), ambos do CPP, enunciada, pela
primeira vez, no despacho do Senhor Vice-Presidente do STJ (cfr. nºs 1 a 17 da
motivação da reclamação em apreciação e supra nº 7 da presente resposta).
A este propósito, tal argumentação não pode deixar de ser tida por inovadora, e
de constituir uma decisão-surpresa, nunca tendo o recorrente sido, com ela,
confrontada, para poder reagir-lhe.
21º
No entanto, tal argumento foi apenas invocado, pelo Ilustre Conselheiro Relator,
como mais um argumento que precludiria a apreciação do recurso do interessado,
não significando, no caso concreto, que foi tal argumento – exclusivamente - que
precludiu essa apreciação.
A argumentação utilizada, como se viu (cfr. supra nºs 6 e 8 da presente
resposta), foi o seguinte:
“Relativamente à norma da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de
Processo Penal, a questão analisada na decisão recorrida reconduz-se a saber se,
num caso como o dos autos em que a Relação, em recurso, absolveu o arguido de um
dos crimes por que havia sido condenado em 1ª instância, reduzindo a pena em
conformidade com essa absolvição, e mantendo no mais o decidido em 1ª instância,
é ainda uma “decisão confirmativa”, para efeitos da aplicação daquele preceito,
conducente à inadmissibilidade do recurso.
Da sistematização seguida na decisão recorrida e do discurso argumentativo
adoptado retira-se que a decisão em causa seguiu a tese maioritária do Supremo,
«no sentido de que há dupla conforme quando haja confirmação da condenação in
melius», tendo entendido que tal se teria verificado no caso presente, por o
acórdão em causa ao ter absolvido o arguido da prática de um crime de burla
informática e, em conformidade, reduzido a pena aplicada, ter sido mais
favorável ao arguido. Assim, e de acordo com esta jurisprudência o caso seria
subsumível à citada alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º, com a consequente
inadmissibilidade do recurso interposto. Só deste modo se compreende que no
final da decisão se tenha conhecido da questão da constitucionalidade desta
norma” […].
“Deste modo, quer se entenda existir uma dupla fundamentação, quer se considere
que, no caso, a aplicação da norma da alínea e) do n.º 1, do artigo 400.º,
conjugada com a da alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º, do Código de Processo
Penal, constitui um fundamento alternativo decisório, igualmente conducente, por
si só, à inadmissibilidade do recurso do acórdão da Relação para o Supremo
Tribunal de Justiça, não pode tomar-se conhecimento do objecto do presente
recurso de constitucionalidade, por inutilidade, como é entendimento pacífico
deste Tribunal. Efectivamente, em resultado da aplicação destes preceitos, não
constantes do objecto do recurso, qualquer que fosse a sorte deste relativamente
à questão da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal
sempre a decisão recorrida se manteria com base nos preceitos não impugnados”.
22º
Sublinha-se, a este propósito, a expressão “ … igualmente conducente, por si só,
à inadmissibilidade do recurso do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de
Justiça …”, que ilustra bem a argumentação acabada de apresentar.
23º
De todo o modo, mantém-se incólume o argumento principal enunciado pelo Senhor
Vice-Presidente do STJ, de forma alguma posto em causa pela argumentação do ora
reclamante:
“Da sistematização seguida na decisão recorrida e do discurso argumentativo
adoptado retira-se que a decisão em causa seguiu a tese maioritária do Supremo,
«no sentido de que há dupla conforme quando haja confirmação da condenação in
melius», tendo entendido que tal se teria verificado no caso presente, por o
acórdão em causa ao ter absolvido o arguido da prática de um crime de burla
informática e, em conformidade, reduzido a pena aplicada, ter sido mais
favorável ao arguido. Assim, e de acordo com esta jurisprudência o caso seria
subsumível à citada alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º, com a consequente
inadmissibilidade do recurso interposto. Só deste modo se compreende que no
final da decisão se tenha conhecido da questão da constitucionalidade desta
norma” […].
24º
Concorda-se, pois, com esta posição do STJ.
Assim, mesmo que se entenda que o recurso inicial, do ora reclamante, deva
merecer apreciação, julga-se que a conclusão a retirar, de tal apreciação,
deverá ser a de rejeição do mesmo recurso, nos termos do art. 400º, nº 1, alínea
f) do Código de Processo Penal.”
4. A questão que agora cumpre decidir é menos complexa do que, face à
argumentação do recorrente, poderia parecer.
A decisão recorrida é o despacho do Vice-Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça que, indeferindo reclamação deduzida ao abrigo do artigo
405.º do Código de Processo Penal, confirmou a não admissão do recurso
interposto pelo ora reclamante de um acórdão da Relação. Esse acórdão, em
provimento parcial do recurso pelo mesmo interposto, absolveu o recorrente de um
dos crimes pelos quais tinha sido condenado em 1ª instância e reduziu a pena
unitária para 4 anos de prisão (diminuiu em 3 meses a condenação de 1.ª
instância).
Na Relação, considerou-se que o recurso para o Supremo não era admissível por
aplicação da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal (a
regra da chamada “dupla conforme”). No despacho recorrido entendeu-se que
efectivamente o recurso não seria admissível à luz desse preceito na
interpretação que lhe é dada na jurisprudência maioritária do Supremo Tribunal
de Justiça. Mas, porque esse entendimento não é inteiramente pacífico,
acrescentou-se que, de todo o modo, nunca o recurso seria admissível face ao
disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º, conjugada com a alínea c) do n.º
1 do artigo 432.º do Código de Processo Penal.
A não admissão do recurso pela decisão recorrida assenta, portanto,
em dois fundamentos, cada um deles susceptível de, por si só, conduzir a esse
resultado. Como o recorrente só pretende atacar um deles – o da alínea f) do n.º
1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal –, na “decisão sumária” agora
objecto de reclamação entendeu-se que não tem utilidade conhecer do recurso
interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de
15 de Novembro (LTC) porque sempre a decisão de não admissão do recurso para o
Supremo se manteria com o outro fundamento. E, com base na ideia, solidamente
firmada na jurisprudência do Tribunal, de que o recurso de fiscalização concreta
de constitucionalidade tem natureza instrumental, decidiu-se pelo seu não
conhecimento.
Esta decisão corresponde à realidade que os autos patenteiam e ao
entendimento uniforme do Tribunal acerca do objecto e função do recurso de
fiscalização concreta de constitucionalidade. E reitera-se, uma vez que nada
daquilo que o reclamante alega é susceptível de pôr em crise os seus
fundamentos.
Não se contesta que, na reclamação só se justificasse suscitar a
inconstitucionalidade da norma da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código
de Processo Penal, porque esta era a norma que constituía a base legal da
decisão de não admissão do recurso contra a qual se reagia. Mas a configuração
do incidente mudou a partir do momento em que o órgão jurisdicional que apreciou
a reclamação introduziu um outro fundamento que, embora conduzindo ao mesmo
resultado, constitui uma base normativa autónoma. O despacho recorrido entende
que a situação concreta preenche a hipótese normativa de duas previsões
autónomas de irrecorribilidade de acórdãos da Relação. E invocou-os a ambas como
ratio decidendi. Perante essa decisão só um recurso de constitucionalidade que
permita remover ambos os fundamentos pode reflectir-se utilmente no processo.
Virtualidade que o recurso interposto não tem porque, admitindo que viesse a
julgar-se inconstitucional a norma da alínea f), sempre se manteria firme a
decisão de não admitir o recurso para o Supremo com fundamento na alínea e) do
n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal.
O reclamante argumenta ainda que só tendo suscitado a questão de
inconstitucionalidade relativamente à norma da alínea f) e só isso lhe sendo
exigível porque esta fora a norma aplicada pelo despacho contra que reagia,
ficou confrontado com o facto de face ao disposto no n.º 2 do artigo 72.º da
LTC, só poder recorrer relativamente a essa inconstitucionalidade que suscitou.
Pelo que o entendimento adoptado na decisão sumária conduz a que lhe fique
vedado o recurso de constitucionalidade para defesa de garantias do processo
criminal constitucionalmente impostas.
Mas sem razão.
Independentemente da questão da saber se, no caso, lhe era exigível a referida
suscitação o Tribunal vem desde sempre decidindo que o referido ónus não tem
aplicação naquelas situações, excepcionais ou anómalas, em que o interessado não
tenha disposto de oportunidade processual para, agindo com a devida diligência,
suscitar previamente a questão de constitucionalidade perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida. Pelo que não é real o obstáculo que invoca a que
tivesse incluído no objecto do recurso de constitucionalidade os dois
fundamentos que o despacho recorrido adoptou. Isto, sem curar de saber se a
reacção perante “decisões surpresa” com a arguição da respectiva nulidade não
será ainda um meio necessário para provocar uma primeira apreciação da questão
de constitucionalidade por parte da ordem jurisdicional competente das normas
(inovatoriamente) aplicadas (cfr. Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização
Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, págs. 83 e
segs).
Diga-se, finalmente, que só podendo agora decidir-se se deve ou não
conhecer-se do recurso, as considerações do recorrente acerca da importância ou
do bem fundado da questão de inconstitucionalidade são irrelevantes.
5. O recorrente insurge-se também contra o montante em que foi fixada a taxa de
justiça, que considera excessiva.
Mas também aqui sem razão. A taxa de justiça foi fixada dentro dos
limites previstos no artigo 6.º, n.º 2 e com observância dos parâmetros
estabelecidos pelo artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (com as
alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 91/2008, de 2 de Junho)
correspondendo à prática do Tribunal em casos semelhantes.
6. Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação e condena-se o recorrente nas custas com
20 (vinte) UCs de taxa de justiça.
Lx., 28/4/2010
Vítor Gomes
Ana Maria Guerra Martins
Gil Galvão