Imprimir acórdão
Processo nº 102/10
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é
recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei da
Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), da
decisão daquele tribunal de 13 de Janeiro de 2010.
2. Em 16 de Março de 2010 foi proferida decisão sumária, ao abrigo do disposto
no nº 1 do artigo 78º-A da LTC, pela qual se entendeu não tomar conhecimento do
objecto do recurso, com os seguintes fundamentos:
«1. O recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º
da LTC visa a apreciação da conformidade constitucional de normas. O recurso é
interposto de decisões dos tribunais, mas ao Tribunal Constitucional cabe apenas
apreciar a conformidade constitucional de normas.
O recorrente requer a apreciação da “inconstitucionalidade dos artigos 411º e
425º, n.º 7 do C.P.P. quando (ou na interpretação em que) em conjugação com os
artigos 379º e 380º do mesmo diploma, impedissem que o pedido de aclaração; se
não declarado dilatório, determinasse o termo “a quo” para efeitos dos artigo
411º C.P.P., criando obstáculos que a lei não impõe ao regime da recorribilidade
ampla das decisões”; “a inconstitucionalidade dos artigos 411º e 425º, n.º 7 do
C.P.P. ou na interpretação em que, em conjugação com os artigos 379º e 380º do
mesmo diploma, impedem ou cerceiam o pedido de aclaração, se não declarado
dilatório, obstando a que, através dessa aclaração, «se pudesse considerar
obtido o instrumento de ponderação e legitimidade da própria decisão judicial e
de garantia do direito de recurso» (…) – em plenitude”; a “inconstitucionalidade
dos artigos 411º e 425º, n.º 7 do C.P.P. quando (ou na interpretação em que), em
conjugação com os artigos 379º e 380º do mesmo diploma, impedem ou cerceiam o
pedido de aclaração, se e enquanto direito à fundamentação (convincente e
suficientemente entendível) da decisão; e a “inconstitucionalidade dos artigos
379º, 380º, 425º, n.º 7 e 411º do C.P.P., na leitura de que, proferida sentença
ou acórdão em 1ª ou 2ª instância, para algumas das matérias, o tribunal possa
delas continuar a conhecer – até fazendo “acrescentos” posteriores –, e doutras,
da mesma natureza, não conheça, vindo, então, daí e depois, o mesmo tribunal
concluir que o prazo para dissentir ou infirmar a decisão inicialmente
reclamada, se devia contar daquela e não de decisão posterior aclarada ou a
merecer que não havia lesão do mesmo imperativo constitucional a um «processo
equitativo» (…), quando se permitisse, nova aclaração”.
É manifesto que estes enunciados não correspondem à indicação de uma qualquer
norma, o que obsta, nesta parte, ao conhecimento do objecto do recurso.
Correspondem antes à explicitação das consequências da aplicação de uma
determinada interpretação (não identificada) dos preceitos citados e à descrição
das vicissitudes processuais que, na óptica do recorrente, ocorreram.
2. O recorrente pretende que o Tribunal aprecie também a “inconstitucionalidade
da interpretação dos artigos 399º e 411º do C.P.P. que faça distinção entre
acórdãos finais e acórdãos sobre pedidos de aclaração, para fixar o termo “a
quo” [do prazo de interposição do recurso] no inicial ou no «2º acórdão» e
excluir o «3º», quando a lei somente fala em acórdão”.
Um dos requisitos do recurso de constitucionalidade interposto é a aplicação
pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade
é questionada pelo recorrente, requisito que não se pode dar como verificado.
Com efeito, da fundamentação da decisão recorrida não é possível retirar
qualquer distinção entre acórdãos finais e acórdãos sobre pedidos de aclaração,
no que respeita ao critério de fixação do início do prazo de interposição de
recurso.
No despacho que não admitiu o recurso interposto para o Supremo Tribunal de
Justiça, com fundamento em extemporaneidade, decide-se no sentido da
inadmissibilidade de pedidos de aclaração de decisões que indefiram pedidos
anteriores idênticos, subscrevendo-se o entendimento de que a decisão que recair
sobre a arguição de nulidades, pedido de aclaração e correcção não é susceptível
de nova arguição pelos mesmos fundamentos. Ou seja, só são admissíveis pedidos
de aclaração de decisões que tenham como objecto pedidos diferentes dos
anteriores. É certo que a decisão recorrida retira consequências desta
distinção, quanto ao termo inicial do prazo de interposição de recurso, mas tal
não corresponde, de todo, à assunção de um critério que assente na distinção
entre acórdãos finais e acórdãos sobre pedidos de aclaração. Para o demonstrar,
basta verificar que, no caso, o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que o prazo
para recorrer se contava justamente da notificação de um acórdão que conheceu,
entre outros pedidos, de uma arguição de obscuridade (acórdão de 8 de Julho de
2009).
Uma vez que a decisão recorrida não aplicou, como razão de decidir, a norma cuja
inconstitucionalidade o recorrente pretende que o Tribunal aprecie, resta
concluir pelo não conhecimento do objecto do recurso».
3. Notificado desta decisão, o recorrente vem agora reclamar para a conferência,
ao abrigo do nº 3 do artigo 78º-A da LTC, nos seguintes termos:
«9. - É que essa norma (a norma questionada) não é – como de forma redutora se
refere naquela Decisão – a que simplesmente faça uma «distinção entre acórdãos
finais e acórdãos sobre pedidos de aclaração», para efeitos de prazo de recurso:
9.1. - é antes a que faça essa distinção em termos de fixar o termo a quo (para
o recurso) apenas no acórdão inicial e ou no 2º acórdão, e excluir o 3º acórdão
(ou seja, o acórdão sobre um segundo pedido de aclaração).
9.2. - Foi assim, com esta explicitação final, e decisiva, que o recorrente
enunciou a norma questionada na reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça,
10. – e foi exactamente essa norma (com tal explicitação) que na decisão
recorrida foi enunciada (como antes se transcreveu), foi considerada e foi
aplicada.
Foi aplicada e teve necessariamente de sê-lo, pois só a aplicação dela (a
aplicação de uma norma que, para a definição do termo a quo de recurso,
considere irrelevante o 3º acórdão) permitia fundar confirmar a decisão do Exmo.
Desembargador Relator na Relação e, fundar a intempestividade do recurso para o
Supremo Tribunal de Justiça.
11. - Ora, no nº 1 do requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional,
apresentado pelo recorrente, é exactamente a mesma norma – com a decisiva
explicitação que acabou de ser posta em destaque – que se submete à apreciação
desse Venerando Tribunal.
O que, data venia pelo entendimento que se adopta, é quanto basta para mostrar
que não pode nem deve manter-se a afirmação e a conclusão da douta Decisão
Sumária, ora reclamada, de que a decisão recorrida não aplicou a norma
questionada como ratio decidendi – nem pode afastar-se por aí, o conhecimento do
recurso.
III
Esclarecido este decisivo ponto, também se torna claro o alcance das questões
enunciadas nos nºs 2º a 5º do requerimento do recurso.
12. - Diz-se na douta Decisão Sumária que se está aí perante a mera explicitação
de consequências da aplicação de certa interpretação normativa e a descrição de
certas vicissitudes processuais – donde a falta de carácter normativo dessas
questões.
Ora,
13. - quanto à «descrição de vicissitudes processuais», cabe dizer que não será
decerto descabido fazê-lo (e, aliás, isso é feito no requerimento de modo muito
sumário) para situar, enquadrar e explicitar uma certa «situação normativa», ou
o resultado a que leva a interpretação de uma norma: não é uma tal descrição que
pode descaracterizar a situação como «normativa» (para o efeito de recurso para
o Tribunal Constitucional), se ela efectivamente se revestir dessa natureza.
13.1. - E, quanto à consideração ou argumento de que são «consequências da
aplicação» de uma norma que aí se explicitam, também não será isso que pode
descaracterizar como «normativa» a situação questionada.
Bem pelo contrário:
13.2. - pois do que se trata é de trazer à luz o resultado de uma interpretação
em toda a sua amplitude e alcance, uma vez que é naturalmente a essa luz que
há-de avaliar-se a conformidade constitucional dessa interpretação.
13.2.1. - E não é mais do que isso o que o recorrente faz nos nºs 2 a 5 do
requerimento do recurso (mais uma vez, nos mesmos exactos termos em que o fez na
reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça).
Do que se trata – por outras palavras – é:
14. - de mostrar, por outros ângulos, a razão por que o recorrente, e ora
reclamante, entende ser inconstitucional a interpretação, feita nos autos (no
despacho do Relator na Relação e, depois, no douto despacho recorrido) dos
artigos 399º e 411º, mas também do artigo 425º, nº 7, do Código de Processo
Penal – interpretação essa que fez precludir a possibilidade de interpor o
recurso que pretendia levar ao Supremo Tribunal de Justiça (do acórdão
condenatório do Tribunal da Relação do Porto).
Ou seja: de mostrar, pelos vários ângulos relevantes que melhor a iluminam e
fundamentam, a razão por que o recorrente entende que deve ser atendida a
questão central de constitucionalidade (normativa) que levantou.
15. - Dito isto, e dentro deste contexto, impõe-se entretanto chamar
especialmente a atenção para o ponto que se destacou no nº 5 do requerimento de
recurso – correspondente ao alegado no nº 44 e retomado na conclusão h) da
reclamação dirigida ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
É que ele realmente ilumina, melhor que todos os outros, o fundamento da questão
de inconstitucionalidade suscitada.
Com efeito, aquilo que aí se reporta:
16. - a «vicissitude processual», certamente, que aí se refere – é que,
proferido nos autos, pela Relação do Porto, o acórdão condenatório do
recorrente, e havendo esse acórdão sido objecto de um pedido de aclaração e de
arguição de nulidades, aquele Tribunal, no acórdão em que se pronunciou sobre
tais pedido e arguição (o seu 2º Acórdão, de 8 de Julho de 2009), por um lado,
conheceu de algumas nulidades, mas não conheceu de outras (por entender que
estas respeitavam a matéria a impugnar em recurso) mas, além disso, e por outro
lado, fez acrescentos em matéria de facto (como se vê e mesmo expressamente se
diz no seu ponto 17. do douto acórdão de 8 de Julho de 2009), para “integrar” a
matéria de facto com que podia ter feito a qualificação que fez.
17. - Ora, um tal conteúdo decisório deste 2º Acórdão do Tribunal da Relação –
tratando de modo diferente questões análogas, por um lado, e aditando um
elemento novo em matéria fáctica – não podia como não pôde, deixar de gerar uma
indiscutível «ambiguidade» quanto ao âmbito do poder de jurisdição de que o
mesmo Tribunal ainda se considerava afinal investido, repercutindo-se sobre o
próprio sentido e alcance do anterior Acórdão condenatório
18. - «ambiguidade ou ambiguidades estas que importava ao recorrente esclarecer
antes de, e em ordem a interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça,
para poder exactamente definir e enunciar os termos desse recurso.
19. – E daí o novo pedido de aclaração formulado pelo recorrente, mas com novos
fundamentos (e não pelos mesmos, fundamentos) – porque justamente referidos já a
esta nova ambiguidade decisória com que se viu confrontado.
Pois bem:
20. - o que no referido ponto (nº5) do requerimento de recurso (e nos
mencionados lugares correspondentes da reclamação) se pretende pôr em evidência
– e generalizando – é que, numa situação com o perfil descrito, em que um novo
pedido de aclaração (como, de resto, não deixou de sublinhar-se nos nºs
anteriores do requerimento) não tem mero carácter dilatório (nem foi como tal
declarado), mas antes se reveste de perfeita justificação (autónoma),
20.1. - é inaceitável que o prazo para um eventual recurso haja de correr a
partir, necessariamente, da decisão (recte, da respectiva notificação) que
recaiu sobre o primeiro pedido de aclaração (e/ou arguição de nulidades), sendo
irrelevantes, para esse efeito, o segundo pedido de aclaração e a decisão que
sobre ele recaia.
21. - Um tal resultado é inaceitável, justamente sob o ponto de vista do direito
ao recurso, mormente em processo penal – área em que tal direito, mas, em
particular, a confiança na possibilidade do seu exercício, bem pode e deve ser
vista como justamente uma dimensão, também, do direito a um «processo
equitativo», de que se trata no artigo 20º da Constituição da República.
21.1. - Uma tal «confiança» – na possibilidade de interpor um recurso a que se
tem direito – fica efectivamente frustrada se, numa situação do tipo ou com as
características da referida (que são as da situação ocorrente nos autos), o
prazo para a interposição desse recurso não começar a correr só a partir da
última decisão proferida pelo tribunal a quo (revertendo ainda ao exemplo do
autos, a partir do 3º Acórdão da Relação).
22. - Eis o que torna claro que um entendimento das normas legais pertinentes –
no caso, uma interpretação dos artigos 399º e 411º, e também do artigo 425º, nº
7; todos do Código de Processo Penal – que, fazendo pura e simplesmente tábua
rasa de ocorrência de situações do tipo referido, situe sempre numa primeira
decisão sobre um pedido de aclaração ou/e de arguição de nulidades o momento
relevante para o início do prazo do recurso para um tribunal superior é
constitucionalmente inaceitável.
Ora,
23.1. – foi a um tal entendimento dessas normas, sem qualquer reserva, que se
ateve o Exmo. Desembargador Relator na Relação do Porto, ao não admitir o
recurso que o recorrente pretendia interpor para o Supremo Tribunal de Justiça;
– foi a constitucionalidade de um tal entendimento que o recorrente questionou,
em reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, mas tendo visto
tal questão expressamente desatendida;
– e foi (e é), pois, essa mesma questão de constitucionalidade que o recorrente
submeteu (e submete) agora ao Tribunal Constitucional – como bem resulta de tudo
quanto antecede».
4. Notificado, o Ministério Público concluiu pelo indeferimento da reclamação,
nos seguintes termos:
«4.º
Sinteticamente a tramitação processual seguida, na parte agora relevante, foi a
seguinte:
- Por Acórdão de 25 de Março de 2009, o Tribunal da Relação do Porto, negou
provimento a um recurso interposto pelo arguido.
- Em 8 de Julho de 2009, a mesma Relação, profere Acórdão, indeferindo a
arguição de nulidades, obscuridades e erros, daquele Acórdão.
- Tendo insistido na arguição de nulidade, a Relação, por Acórdão de 7 de
Outubro de 2009, “indeferiu” essa arguição.
- Interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, ele não foi admitido
porque sendo relevante, para a contagem do prazo de interposição, a data do
segundo acórdão (o de 8 de Julho de 2009), aquele prazo tinha sido ultrapassado.
5.º
O recorrente entende, pelo contrário, que é a data do terceiro acórdão que deve
ser levada em consideração.
6.º
Portanto, a questão de constitucionalidade consistiria em, simplesmente,
considerar relevante para o efeito de contagem do prazo de recurso, a data em
que foi proferido um acórdão que indeferira a arguição de nulidade, mesmo nos
casos em que, posteriormente, venha a ser proferido outro acórdão “indeferindo”
renovadas arguições de nulidades.
7.º
Ora, ao invés de enunciar a questão de forma geral e abstracta, para que não
restassem dúvidas sobre o seu carácter normativo, o recorrente desdobrou a
questão em quatro outras extensas e complexas questões, pormenorizando de tal
forma a situação ocorrida nos autos, que afastou, em absoluto, a natureza
normativa de que ela, necessariamente, se tinha de se revestir, para poder
accionar a competência deste Tribunal Constitucional.
8.º
Diremos ainda que na decisão do Senhor Vice-Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça que apreciou a reclamação da decisão que, na Relação, não admitira o
recurso, diz-se que o terceiro acórdão proferido pela Relação (de 7 de Outubro
de 2009) apesar dos termos em que se expressara, não conhecera do objecto do
requerimento de arguição de nulidades, porque o considerou não admissível.
9.º
Ou seja, não estaríamos perante duas decisões que indeferiram nulidades, mas
apenas perante uma, dado que, a segunda, não se pronunciou sobre as invocadas
nulidades, antes considerou o pedido inadmissível.
10º
Assim sendo, a segunda arguição de nulidade, consubstancia a utilização, por
parte do recorrente, de meio processual inadequado.
11.º
Apesar da relevância que esta questão tem e que lhe foi atribuída na decisão
recorrida, ela está ausente nos diversos segmentos que o recorrente colocou à
apreciação deste Tribunal.
12º
Na verdade, o recorrente, apenas tendo em atenção o teor do terceiro acórdão da
Relação, que “indeferiu” a segunda arguição de nulidades, põe a tónica na não
declaração do carácter dilatório do pedido, ignorando em absoluto o que
inovatoriamente se disse na decisão do Senhor Vice-Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça, a decisão recorrida.
13º
Quanto à afirmação, constante da reclamação da Decisão Sumária de que na decisão
recorrida se tinha apreciado as questões de inconstitucionalidade, levantadas na
reclamação para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, tal
corresponde à verdade.
14.º
No entanto, o que ali se apreciou, foi se as diversas situações processuais que
levaram à não admissibilidade do recurso violavam os princípios constitucionais
invocados, tendo-se concluído pela não violação.
15.º
Não vem apreciada, na decisão recorrida, a inconstitucionalidade de qualquer
norma ou interpretação normativa, que, de forma processualmente adequada, tenha
sido previamente suscitada.
16º
Quanto à primeira questão referida no requerimento de interposição e mencionada
no artigo 3º desta resposta, diremos que não assiste razão ao reclamante.
17º
Na verdade, a norma que de “forma redutora” (segundo o reclamante) é tratada na
Decisão, foi-o de acordo com a forma como vinha colocada a questão, não podendo
o reclamante, na reclamação, alargar, inovatoriamente, o seu âmbito».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Nos presentes autos decidiu-se não tomar conhecimento do objecto do recurso: na
parte relativa aos artigos 379º, 380º, 425º, nº 7 e 411º do Código de Processo
Penal, por o recurso não ter carácter normativo; na parte que se refere à
“inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 399º e 411º do C.P.P. que
faça distinção entre acórdãos finais e acórdãos sobre pedidos de aclaração, para
fixar o termo “a quo” [do prazo de interposição do recurso] no inicial ou no «2º
acórdão» e excluir o «3º», quando a lei somente fala em acórdão”, por a decisão
recorrida não ter aplicado, como razão de decidir, a norma cuja
constitucionalidade foi questionada pelo recorrente.
A argumentação do reclamante para contrariar o primeiro fundamento do não
conhecimento do objecto do recurso, apenas confirma o bem fundado da decisão
sumária. O carácter não normativo do recurso interposto mostra-se quando se
assume que os enunciados em causa pretendiam explicitar o resultado de uma dada
interpretação com o objectivo de demonstrar a inconstitucionalidade da mesma e
quando se mostra que, afinal, se discorda do acórdão recorrido por o mesmo não
ter entendido o segundo pedido de aclaração como pedido com novos fundamentos.
Para contrariar o segundo fundamento do não conhecimento do objecto do recurso
interposto, o reclamante sustenta que a decisão sumária considerou, de forma
redutora, que a norma questionada é a que simplesmente faça uma distinção entre
acórdãos finais e acórdãos sobre pedidos de aclaração, para efeitos de prazo de
recurso, quando é antes a que faça essa distinção em termos de fixar o termo a
quo (para o recurso) apenas no acórdão inicial e ou no 2º acórdão e excluir o 3º
acórdão.
Esta precisão feita pelo reclamante em nada abala a decisão reclamada, sendo
certo que foi o próprio recorrente quem, ao indicar a norma cuja apreciação
pretendia, especificou uma interpretação dos artigos 399º e 411º do Código de
Processo Penal que contém a distinção entre acórdãos finais e acórdãos sobre
pedidos de aclaração. Quando a distinção relevante é entre acórdãos
pós-decisórios: relativamente a pedidos idênticos ou quanto a pedidos
diferentes.
Com efeito, o Supremo Tribunal de Justiça não aplica, como ratio decidendi,
norma de acordo com a qual o prazo de interposição de recurso é contado a partir
da notificação do acórdão inicial (acórdão final) ou do 2º acórdão (acórdão
sobre pedidos de aclaração). E não, portanto, nunca a partir da notificação de
um terceiro acórdão que se lhe siga. O tribunal recorrido aplica, como razão de
decidir, norma segundo a qual o prazo de interposição de recurso é contado a
partir da notificação do acórdão que conheça pedido de aclaração (segundo
acórdão), quando o terceiro acórdão tenha a ver com pedido de aclaração de
decisão que indefira pedido anterior idêntico. É o que decorre de forma clara da
passagem que, de seguida, se transcreve:
«(…) a jurisprudência tem entendido que não há lugar nem a arguição de nulidade,
nem a pedido de reforma, nem a aclaração de decisões que indefiram pedidos
anteriores idênticos, sob pena de se protelar indefinidamente o trânsito em
julgado de uma decisão (cf. entre outros o acórdão do S.T.J. de 29.06.99 –
processo 99A025 - disponível em www.dgsi.pt.).
Daí que, nestas circunstâncias, o prazo para a interposição do recurso se deva
começar a contar a partir da notificação do 2.º acórdão proferido pela Relação
em 08.07.2009, onde foram julgadas improcedentes as nulidades e os vícios
arguidos imputados ao acórdão que conhecera do recurso interposto».
Há que indeferir, pois, também nesta parte, a presente reclamação.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão reclamada.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 27 de Abril de 2010
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão