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Processo n.º 912/09
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
A ? Relatório
1 ? A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A
da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão, da decisão sumária
proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que decidiu não conhecer das
questões de constitucionalidade apontadas nas alíneas c) a e) do seu
requerimento de interposição de recurso e negar provimento ao recurso na parte
restante [alíneas a) e b) do mesmo requerimento], ou seja, no tocante à norma
obtida do artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil, conjugadamente com o disposto da
Lei n.º 7/2001, do Decreto?Lei n.º 322/90 de 18/10 e do Decreto?Regulamentar n.º
1/94 de 18/01, quando interpretado no sentido de que no tipo de acções como a
que deu causa aos presentes autos, ser necessário a alegação e a prova, por
parte da Autora, da impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do
falecido e da norma extraída dos artigos 6.° da Lei n.º 7/2001 de 11.5, 8.° n.º
1 do DL 322/90 de 18.10 e 3.° n.º 1 do Dec. Reg 1/94 de 18.1, quando
interpretados no sentido de fazer depender a atribuição das prestações sociais à
verificação dos requisitos exigíveis pela lei civil para a atribuição da pensão
alimentar, julgando-as constitucionais.
2 ? Fundamentando a sua reclamação, a reclamante esgrime do seguinte modo:
«[?]
Conforme consta dos autos, a reclamante apresentou recurso para o Tribunal
Constitucional.
Aduzindo os seguintes argumentos:
??
1. Nos autos em referência, foram proferidas decisões as quais aplicaram normas
cuja inconstitucionalidade já havia sido suscitada durante o processo, a saber:
1.1 Foi suscitada a inconstitucionalidade da norma do artigo 2020° n.º 1 do
Código Civil; a inconstitucionalidade da norma do artigo 6° da Lei n.º 7/2001; a
inconstitucionalidade da norma do artigo 8°, n.º 1 do Decreto ? Lei n.º 322/90
de 18/10; a inconstitucionalidade da norma do artigo 3°, n.º 1 do Decreto ?
Regulamentar n.º 1/94 de 18/01;
1.2 E as peças processuais em que foram invocadas as inconstitucionalidades
apontadas em 1.1 são as seguintes: Réplica (cfr. artigo 20°); Reclamação para a
Conferência do Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. artigo 13°); Resposta às
Alegações perante o Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. conclusão n.º 45);
Alegações de Revista perante o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. conclusão 35);
Perante o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70° e seguintes da Lei
do Tribunal Constitucional, requer-se a apreciação do seguinte:
a) É inconstitucional a norma do artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil, quando
interpretada no sentido de que no tipo de acções como a que deu causa aos
presentes autos, ser necessário a alegação e a prova, por parte da Autora, da
impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido; O artigo 2020°
do Código Civil está regulado nos termos da Lei n.º 7/2001, do Decreto-Lei n.º
322/90 de 18/10 e do Decreto ? Regulamentar n.º 1/94 de 18/01. Analisando este
diploma regulamentar constata-se que os requisitos para que se beneficie de
pensão de sobrevivência por parte da Segurança Social, basta apenas demonstrar o
estado civil do falecido e a existência de uma relação de união de facto que
perdura há mais de 2 anos (cfr. art. 2° DR 1/94) não incorrendo sobre o
interessado o ónus da prova, quer da necessidade de alimento, quer da
impossibilidade para os pagar por parte da herança ou dos familiares ? os
regimes legais que vieram fundamentar a disposição do artigo 2020° do CC resulta
de forma inequívoca que, de acordo com a aplicação daqueles regimes existe uma
equiparação total relativamente às medidas de protecção social quer em caso de
agregado familiar unido pelo casamento, quer em caso de agregado familiar unido
pela união de facto ? os pressupostos para atribuição da pensão de sobrevivência
são os mesmos seja para um, seja para o outro caso. Pelo que a norma do artigo
2020° interpretado em sentido diferente do supra explanado está a desvirtuar o
espírito da Lei e a sua própria regulamentação ? estando ainda a violar os
artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da
República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta
dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
b) São inconstitucionais as normas dos artigos: artigo 6° da Lei n.º 7/2001;
artigo 8°, n.º 1 do Decreto ? Lei n.º 322/90 de 18/10; artigo 3°, n.º 1 do
Decreto ? Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretadas fora da concepção
de que existe uma equiparação total relativamente às medidas de protecção que
são atribuídas aos membros do agregado familiar unidos pela via do casamento com
os membros do agregado familiar unidos pela via da união de facto ? estando
ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da
Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e
21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
c) Inconstitucionalidade do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido
nos presentes autos, na medida em que faz uma interpretação inconstitucional do
artigo 2020° do Código Civil e dos diplomas legais regulamentadores da união de
facto ? estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3
e 67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto
nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
d) Inconstitucionalidade do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido
nos presentes autos, na medida em que faz uma interpretação inconstitucional do
artigo 2020° do Código Civil e dos diplomas legais regulamentadores da união de
facto ? estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3
e 67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto
nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
e) Diz-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que a Autora não alegou a
impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido, referindo-se
naquele Acórdão que a Autora não invocou nem demonstrou essa impossibilidade.
Todavia, antes que fosse apreciada esta questão, nunca a recorrente foi
notificada por qualquer tribunal para os efeitos previstos no artigo 508° do CPC,
nomeadamente para a parte aperfeiçoar os seus articulados para depois o Tribunal
poder decidir em conformidade. Note-se que ao decidir-se por um juízo com base
numa falta de alegação ? juízo esse efectuado em sede de recurso ? nunca podia o
Tribunal decidir antes de dar à parte prazo para esta, caso quisesse, poder
aperfeiçoar o seu articulado. Ao não proceder deste modo, o Tribunal cometeu uma
ilegalidade, proferindo uma decisão surpresa ? proibida nos termos da nossa Lei,
na medida em que decidiu sem assegurar a igualdade de meios e de recursos entre
as partes ? estando ainda a violar os artigos n.º 13° da Constituição da
República Portuguesa;
Todavia, através da Decisão Sumária agora reclamado o Tribunal Constitucional,
decidiu:
?? Não tomar conhecimento do objecto do recurso relativamente à matéria
constante das alíneas c) a e) do requerimento de interposição de recurso (...)
negar provimento ao recurso ??
Salvo o devido respeito, tal decisão não acautela devidamente os direitos da
recorrente, na medida em que não foi proferida de acordo com todas as normas
legais aplicáveis ao caso em concreto.
Nos presentes autos, a Autora (aqui alegante) intentou contra o ISS, Centro
Nacional de Pensões acção visando a condenação daquela entidade a reconhecer a
Autora, enquanto unida de facto de B., falecido em Janeiro de 2006, o direito a
auferir as prestações por morte referidas nos artigos 3ª, al. e) e 6° da Lei n.º
7/2001 de 11 de Maio.
A acção interposta pela Autora mereceu provimento junto do, aliás douto,
Tribunal de primeira instância.
Inconformado, o ISS ? Centro Nacional de Pensões recorreu para as instâncias
superiores, obtendo decisão de provimento quanto à sua pretensão.
Todavia, não obstante a prolação de tais decisões, a verdade é que as mesmas
foram proferidas ao longo do processo em atropelo à Lei Fundamental do nosso
sistema jurídico.
Isto é, ao longo de todo este processo verificaram-se várias situações de
inconstitucionalidade, que foram devidamente invocadas e alegadas por parte da
Autora.
Bem como se verificaram ilegalidades que, apesar de devidamente invocadas, ainda
não foram corrigidas de modo a assegurar a regularidade e o equilíbrio da
presente instância.
Irregularidades estas que não foram devidamente apreciadas e decididas pela
decisão ora reclamada.
Ora, conforme consta do requerimento de interposição de recurso apresentado pela
reclamante perante o Tribunal Constitucional, nunca a recorrente foi notificada
por qualquer tribunal para os efeitos previstos no artigo 508° do CPC, no que
diz respeito à questão invocada de que a Autora não alegou a impossibilidade de
obtenção de alimentos da herança do falecido, referindo-se naquele Acórdão que a
Autora não invocou nem demonstrou essa impossibilidade.
Tanto mais que, neste caso, compulsando os autos, verificamos que a Autora na
parte final da p.i., alega inclusive que ?não tem meios de subsistência?,
Todavia, sem concretizar se tal falta de meios de subsistência derivava da sua
incapacidade pessoal, da sua família ou da própria herança do falecido.
Pelo que se impunha que a Autora fosse convidada a concretizar e a esclarecer o
seu articulado sobre esta matéria a fim e antes do Tribunal proferir qualquer
decisão.
Note-se que ao decidir-se por um juízo com base numa falta de alegação ? juízo
esse efectuado em sede de recurso ? nunca podia o Tribunal decidir antes de dar
à parte prazo para, caso quisesse, poder aperfeiçoar o seu articulado.
E, ao não proceder deste modo, o Tribunal cometeu uma ilegalidade, proferindo
uma decisão surpresa, proibida nos termos da nossa Lei, na medida em que decidiu
sem assegurar a igualdade de meios e de recursos entre as partes.
Violando assim o principio da igualdade previsto no artigo 13° da Constituição
da República Portuguesa.
Requerendo-se desde já a apreciação sobre esta inconstitucionalidade e
ilegalidade supra referenciada, por parte do venerando Tribunal Constitucional.
Sendo que a decisão reclamada podia e devia ter apreciado sobre esta questão ? o
que não sucedeu.
Por outro lado, a decisão reclamada não faz uma correcta interpretação dos
factos e normas apresentados em sede de recurso, bem como não faz uma correcta
interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso concreto.
No entender da Autora, nos autos em referência, foram proferidas decisões as
quais aplicaram normas que sofrem de inconstitucionalidade, a saber:
A inconstitucionalidade das normas dos artigos 2020° n.º 1 do Código Civil; da
norma do artigo 6° da Lei n.º 7/2001; do artigo 8°, n.º 1 do Decreto ? Lei n.º
322/90 de 18/10; do artigo 3°, n.º 1 do Decreto ? Regulamentar n.º 1/94 de 18/01,
por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade ínsitos nas
disposições combinadas dos artigos 2°, 13º n.º 2, 18° n.º 2, 36 n.º 1, 63° n.º 1
e 3 e 67° da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP),
Nos termos e conforme consta das peças processuais em que foram invocadas as
inconstitucionalidades apontadas em supra:
? Réplica (cfr. artigo 20º);
? Reclamação para a Conferência do Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. artigo
13°);
? Resposta às Alegações perante o Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. conclusão
n.º 45);
? Alegações de Revista perante o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. conclusão 35);
Ora, é inconstitucional a norma do artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil,
conjugada com o disposto da Lei n.º 7/2001, do Decreto Lei n.º 322/90 de 18/10 e
do Decreto-Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretada no sentido de que
no tipo de acções como a que deu causa aos presentes autos, ser necessário a
alegação e a prova, por parte da Autora, da impossibilidade de obtenção de
alimentos da herança do falecido.
Isto porque, analisando o Dec. Reg. 1/94 constata-se que os requisitos para que
se beneficie de pensão de sobrevivência por parte da Segurança Social, são
apenas a demonstração do estado civil do falecido e a existência de uma relação
de união de facto que perdura há mais de 2 anos (cfr. art. 2° DR 1/94),
Não incorrendo sobre o interessado o ónus da prova quer da necessidade de
alimentos, quer da impossibilidade para os pagar por parte da herança ou dos
familiares.
O DL. n.º 322/90, de 18.10, ?define e regulamenta a protecção na eventualidade
da morte dos beneficiários do regime geral da segurança social?,
Protecção essa consubstanciada no direito á atribuição de pensões de
sobrevivência e subsidio por morte (artigo 3°, n.º 1 do DL citado), direito esse
que nos termos do artigo 8° n.º 1 do mesmo diploma, é extensivo ás pessoas que
se encontram na situação prevista no n.º 1 do art. 20200 do CC.
De facto, o Dec. Reg. n.º 1/94 de 18.1, veio em cumprimento do art. 8° n.º 2 do
DL 322/90 de 18.10 supra citado, regulamentar o processo de prova das situações
referidas n.º 1 do citado artigo 8° o qual estatui que «O Direito ás prestações
previstas neste diploma e o respectivo regime jurídico são tomadas extensivos ás
pessoas que se encontrem na situação prevista no n.º 1 do artigo 2020° do Código
Civil».Ou seja, tal direito é extensível ás pessoas que, à data da morte do
companheiro, tenham vivido com ele por mais de 2 anos em condições análogas ás
dos conjugues.
Por sua vez, a Lei 7/200 1 de 11.5, vem adoptar medidas de protecção das uniões
de facto, nomeadamente o reconhecimento do direito ás prestações por morte.
A citada Lei, no seu artigo 1°, refere-se expressamente á regulação da união de
facto quando refere: ?a presente lei regula a situação jurídica de duas pessoas,
independentemente do sexo, que vivam em união de facto há mais de 2 anos.?
E, no artigo 3° alínea e) e 6° n.º 1 do mesmo diploma legal, institui-se que as
pessoas que vivem em união de facto têm direito á protecção na morte do
beneficiário, beneficiando dos direitos constantes no regime geral da Segurança
Social e da Lei, quem reunir as condições constantes no artigo 2020° do Código
Civil,
Efectivando-se o direito mediante acção proposta contra a instituição competente
para a respectiva atribuição (cfr. artigo 6° n.º 2 da citada Lei).
Prevendo assim, o artigo 6°, o regime de acesso as prestações por morte,
considerando que têm direito a estas prestações aqueles que se encontrem na
situação do artigo 2020º do C.C.
Sendo que o artigo 2020° n.º 1 1ª parte do C.C., refere-se ao conceito de união
de facto, o qual se traduz num projecto comum de vida entre duas pessoas, há
mais de dois anos, em condições análogas ás dos cônjuges.
Acresce que, tem sido defendido por diversos tribunais superiores, que para a
atribuição das prestações por morte ao unido de facto sobrevivo, torna-se
necessário apenas a prova traduzida em sentença judicial que declare que o
respectivo requerente preenche as condições previstas no art.2020° do CC, no que
respeita á titularidade das mesmas ? art.6° n.º 1, 8° do DL 322/90 e 2° e 5° Dec
Reg. n.º 1/94.
Pois há que interpretar adequadamente o que dispõe o n.º 1 da norma (artigo 2020°),
nos termos do qual, aquele que no momento da morte de pessoa não casada ou
separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em
condições análogas ás dos conjugues, tem direito a exigir alimentos da herança
do falecido, se os não puder obter, nos termos das alíneas a) a d) do artigo
2009°?.
Tanto mais que, resulta da conjugação dos artigos 6° n.º 1 da LUF, 8° do DL 322/90
e 2° e 5° do Dec. Regulamentar de 1/94, que os requisitos exigíveis ao membro
sobrevivo da união de facto para que lhe possa ser atribuída o direito ás
prestações no âmbito do regime da segurança social por morte do respectivo
beneficiário, sempre que seja proposta acção contra a instituição incumbida da
atribuição das prestações sociais a conceder, limitam-se tão só, á prova
relativa ao estado civil do beneficiário falecido e á existência de uma relação
de união de facto que dura há mais de 2 anos, não impendendo, portanto, sobre o
respectivo interessado, o ónus da prova, quer da necessidade de alimentos ? art.
2004° do CC. quer da impossibilidade de os obter da herança ou dos familiares
indicados nas alin. a) a d) do art. 2009°.
(cfr. neste sentido acórdão do STJ, de 13/02/01, revista n.º 23/01, 1ª secção -
sumários do STJ)
Pelo que, a conclusão que deriva da conjugação das referidas normas é de que o
direito ás referidas prestações, efectiva ? se mediante acção proposta perante
os tribunais cíveis contra a instituição competente para a respectiva atribuição,
sendo que, desde que se verifiquem os referidos requisitos do artigo 2020° do C.
Civil, tal direito é concedido, independentemente de a herança ter ou não ter
bens para prestar alimentos ao membro sobrevivo, uma vez que não é a herança que
está a ser demandada.
Sendo assim inócuo, ilegal, discriminatória, imoral e injusta a exigência da
alegação e prova que a herança não tem bens, ou estes são insuficientes para tal
efeito.
Neste sentido decidiu também o STJ: ?... os requisitos exigíveis ao membro
sobrevivo da união de facto, para que possa aceder às prestações sociais
decorrentes do óbito de um beneficiário, reconduzem se apenas, à prova relativa
ao estado civil do beneficiário, e á circunstancia de o respectivo interessado
ter vivido e há mais de dois anos com o falecido.?
(cfr. CJ tomo II/2004, PAG 30).
São vários os acórdãos que seguem a orientação defendida pelo acórdão supra
mencionado, de que são exemplos, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa 25
de Novembro de 2004, da Relação de Évora de 9 de Dezembro de 2004, publicados na
Colectânea de Jurisprudência, tomo 5/2004, pág. 101 e 250, respectivamente, os
acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 16/11/2004 (processo n.º 1167/04,
www.dgsi.pt), e de 9/05/2006 (processo n.º 648/06, www.dgsipt), Acórdão da
Relação de Lisboa de 17/02/2005, (processo n.º 9513/2004-6), Ac. R.L. (processo
n.º 4630/2006-7 de 16/1/2007,e processo n.º 7594/2003-7 de 4/11/2003, www.dgsi.pt)
Assim, e em seguimento de tal equiparação, no que se reporta ás prestações
decorrentes do decesso dos beneficiários do regime geral da segurança social -
pensão de sobrevivência e subsidio por morte - a sua atribuição ao conjugue do
falecido não está dependente das necessidades económicas do mesmo, nem da
existência de familiares cuja situação económica seja susceptível de lhe poderem
prestar alimentos -arts 24°, 25°, 32° a 35º do DL n.º 322/90 e 26°,27°,e 40° n.º
1 al. a) do estatuto das Pensões de Sobrevivência,
Este instituto jurídico, interpretado e aplicado nos termos supra referidos
permite uma adequação á natureza dos referidos benefícios, que, quanto ás
pensões de sobrevivência, se traduzem numa prestação pecuniária, de natureza
continuada,
Destinada a compensar os familiares do beneficiário da perda de rendimentos do
trabalho decorrente do óbito daquele,
Enquanto que, o subsidio por morte tem a finalidade de minorar o acréscimo de
encargos decorrentes de tal evento, facilitando dessa forma, a reorganização da
vida familiar ? art.4° do D.L. n.º 322/90 de 18.10.
Situações estas das quais se mostra totalmente excluída qualquer eventual
correlação com os meios económicos do conjugue do beneficiário, pelo que o mesmo
deverá ocorrer relativamente ao membro sobrevivo da união de facto.
Por conseguinte, se de tal conjugação normativa resulta uma equiparação
relativamente ás prestações de protecção social que são atribuídas aos membros
de um agregado familiar unido pelo vínculo matrimonial,
Aos que vivam em união de facto não será de exigir a prova da verificação de
requisitos diversos para a atribuição de prestações sociais análogas, conforme
se trate de interessados ligados ao beneficiário falecido pelo casamento ou por
uma situação de união de facto.
O direito à pensão de sobrevivência defendido pela interpretação e aplicação das
normas nos termos supra indicados, vai de encontro aos valores que protegem a
instituição família e á integração e coesão social,
Pois de acordo com o que determina o art. 63° n.º 3 da C.R.P.? o sistema de
segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez,
orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou
diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.
A Lei 7/2001, atribui á união de facto uma protecção que passa por diversas
áreas, entre elas e para o caso em concreto, no seu art.3° al. e) ?protecção na
eventualidade de morte do beneficiário, pela aplicação do regime geral da
segurança social e da lei.
Veja-se neste sentido o que foi dito por parte do ilustre Dr. Joel Timóteo Ramos,
na Revista «O Advogado, II série, Dezembro 2006» num estudo publicado no site
www.verbojuridico.pt, que referencia que a jurisprudência mais recente, face ao
actual quadro jurídico emergente da Lei n.º 7/2001 de 11.5, adoptou uma evolução
interpretativa da Lei da União de facto, no sentido de que a Lei n.º 135/99 que
veio regular a situação jurídica das pessoas de sexo diferente que vivessem em
união de facto há mais de dois anos (art. 3 al. f), definiu, que quem vivesse em
união de facto tinha direito a protecção na eventualidade da morte do
beneficiário, pela aplicação do regime geral da segurança social e da lei.
Subjacente a esta Lei estava o princípio visado da total equiparação da união de
facto ao casamento.
Tal Lei foi revogada e substituída pela Lei 7/2001 que, contudo, manteve a mesma
e precisa solução (art. 3° da al. e).
E, como bem referem o Acórdão da R. de Guimarães de 04.12.2005 (proc. 778/05-2,
www.dgsi.pt), e o Ac. da RL. de 25/11/2004 (Col.Jur.2004, 5, pág. 101 e Seg.)
passou a entender-se que: A letra e o espírito das citadas Leis fazem precludir
qualquer interpretação que se faça do Dec. Reg. n.º 1/94 de 18.1 tendente à
exigência, como pressuposto do direito à pensão de sobrevivência, quer da
necessidade de alimentos, quer da impossibilidade da sua prestação por parte dos
familiares do requerente ou da herança do falecido.
A lei 7/2001, ao dispor no seu artigo 6° n.º 1, que beneficia dos direitos
estipulados nas alíneas e) f) e g) do art. 3º, no caso das uniões de facto
previstas na presente lei, quem reunir as condições constantes do 2020° do
Código Civil, decorrendo as acções perante tribunais cíveis, apenas está a
exigir que esteja preenchida a condição de união de facto (comunhão de vida por
mais de dois anos entre duas pessoas em condições análogas ás dos conjugues, e
prova do estado civil do beneficiário falecido), e não também a necessidade de
alimentos, a insuficiência dos bens da herança e a impossibilidade de os obter
dos familiares referidos no art. 2009° do Código. Civil.
A não se entender assim, então tais normas seriam materialmente
inconstitucionais por violação dos princípios da proporcionalidade (como
defendido pelo Ac. TC 88/2004-DR II, 16/04/2004), e da igualdade.
A este propósito afigura-se referir que para a violação de tais princípios
releva a identidade de situações sociais em si mesmas (diminuição de rendimentos
decorrentes da morte daquele com quem se vivia em comunhão de vida), pelo que se
mostra irrelevante o título da constituição, de tal comunhão. Ou seja, ambas as
situações se impõem constitucionalmente (artigos 63° n.º 3 e 13° da C.R.P)
idêntico nível de protecção social.
Fazer depender a atribuição da mesma prestação de segurança social, destinada a
salvaguardar uma idêntica situação social relevante, de diferentes requisitos
apenas em função do título da relação que proporcionou essa situação social,
constituiria uma solução de puro arbítrio, que salvo o devido respeito não pode
ser tolerada.
A garantia de igualdade considerada na C.R.P não tem significado absoluto, se
nos conformarmos com as discriminações ou desigualdades que não sejam
devidamente fundamentadas.
Como se refere no AC. do Tribunal Constitucional n.º 275/2002, de 19/6/2002 DR,
II serie de 24/7/2002 «o princípio da igualdade proíbe a criação de medidas que
estabeleçam distinções discriminatórias, isto é desigualdades de tratamento
materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, ?objectiva e
racional».
Ora, é do conhecimento geral na nossa sociedade (que se arroga de moderna, laica
e evoluída) que a família, enquanto elemento caracterizador e configurador das
sociedades ocidentais, não se esgota hoje no modelo tradicional baseado no
casamento, antes surgindo ao lado destes vários tipos de situação familiares
factuais, a prejudicar de forma irremediável uma sua definição consensual.
A C.R.P., reconhecendo a todos o direito de constituir família, não impõe, para
tanto, a obrigatoriedade ou necessidade do casamento (art. 36°).
Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, ? o conceito constitucional da
família não abrange, portanto, apenas a família jurídica, havendo assim uma
abertura constitucional ? senão mesmo uma obrigação ? para conferir o devido
relevo jurídico ás uniões de facto (CRP Anotada, 3ª ed. Rv. Pág. 220)
Nesta perspectiva, deverá entender-se que a simples existência do vinculo
contratual do matrimónio, por contraposição à união de facto traduzida na
convivência estável e duradoura, não deva constituir fundamento razoável para
retirar ao companheiro sobrevivo o direito á atribuição pela segurança social
das prestações por morte previstas na legislação atinente, tanto mais que este
direito é um direito distinto do direito a alimentos da herança do falecido,
radicando não no estatuto das relações familiares, como este, mas antes no
aforro que foi realização pelo falecido durante a sua vida de trabalho, mediante
descontos mensais depositados à ordem da respectiva instituição de segurança
social (posição defendida por França Pitão, in União de facto no direito
português, págs 189/190), sem esquecer que a CR.P. a todos garante o direito à
segurança social (art.63°).
Ora, a Constituição reconhece à família, independentemente de ser fundada ou não
no casamento, o ?direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de
todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros (art. 67°,
1), pelo que há-de convir-se que, embora não se impondo ao legislador ordinário
uma protecção á união de facto em tudo idêntica à união conjugal, (v.g. quem
vive em situação de união de facto não é herdeiro legitimo ou legitimario do ?de
cujus?), pelo menos, sobrará o dever de não se desproteger, sem justificação
razoável, a família não fundada no casamento e tal resultará por exemplo da
diferenciação no acesso ás prestações sociais por morte entre o cônjuge
sobrevivo e a pessoa sobreviva que tenha convivido em união de facto estável e
duradoura com o beneficiário falecido.
A plena igualdade para a constituição da família entre casamento e união de
facto, tendencial à não preconização de soluções legais assentes na
diferenciação das duas situações, sai ainda reforçada quando o artigo 13° n.º 2
da CRP expressamente proíbe a privação de qualquer direito em função de razões
ideológicas ou sociais, em que as mais das vezes se suportam as uniões de facto.
Face ao exposto, entende-se assim, que a conjugação dos art. 2020° do CC, art. 6°
da Lei n.º 7/2001 de 11/5, 8° n.º 1 do DL 322/90 de 18/10 e 3º n.º 1 do Dec Reg.
1/94 de 18/1, quando interpretada no sentido de fazer depender a atribuição das
prestações sociais da verificação dos requisitos exigíveis pela lei civil para a
concessão de pensão alimentar, está ferida de inconstitucionalidade por violação
dos princípios da igualdade e proporcionalidade ínsitos nas disposições
combinadas dos art. 2°, 13° n.º 2, 36° n.º 1 e 3, 63° n.º 1 e 3 e 67° da CRP, (Ac.
n.º 88/2004 de 10/2/2004, no mesmo sentido Ac. do STJ de 20/4/2004 e 13/5/2004(
Col. Jur).
Pois, o espírito da Lei nomeadamente do (Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10, e do
Decreto-Regulamentar n.º 1/94 de 18/01) aponta para a interpretação e aplicação
do princípio da relevância das uniões de facto equiparáveis à sociedade conjugal.
Estando devidamente vincado nos preâmbulos daqueles diplomas legais a
preocupação e o intuito de harmonizar os regimes legais internos de protecção
social com as recomendações formuladas no âmbito das instâncias internacionais.
Da conjugação das referidas disposições legais resulta de forma inequívoca que,
de acordo com a aplicação daqueles normativos existe uma equiparação total
relativamente às medidas de protecção social quer em caso de agregado familiar
unido pelo casamento, quer em caso de agregado familiar unido pela união de
facto ? os pressupostos para atribuição da pensão de sobrevivência são os mesmos
seja para um, seja para o outro caso.
Assim, a norma do artigo 2020° do Código Civil, interpretada em sentido
diferente do supra explanado está a desvirtuar o espírito da Lei e a sua própria
regulamentação ? estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°,
n.º 1 e 3 e 67°, todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o
disposto nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União
Europeia;
Na verdade, ?Lex specialis derrogat Iex generalis?, visto que a norma do artigo
2020° deve ser interpretada de acordo com o espírito do Decreto-Lei n.º 322/90
de 18/10, Decreto-Regulamentar n.º 1/94 de 18/01) e conjugado com o princípio da
relevância das uniões de facto equiparáveis à sociedade conjugal.
Acresce que, são também inconstitucionais as normas dos artigos 6° da Lei n.º 7/2001;
artigo 8°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10; artigo 3°, n.º 1 do Decreto-Regulamentar
n.º 1/94 de 18/01, quando interpretadas fora da concepção de que existe uma
equiparação total relativamente às medidas de protecção que são atribuídas aos
membros do agregado familiar unidos pela via do casamento com os membros do
agregado familiar unidos pela via da união de facto ? estando ainda a violar os
artigos 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da
República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9°,21°, 33° e 34° da
Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido nos presentes autos a 23/04/2009
faz uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos
diplomas legais regulamentadores da união de facto ? estando ainda a violar os
artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da
República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta
dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido nos presentes autos, faz
uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos
diplomas legais regulamentadores da união de facto.
Estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67°
todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos
artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
Pelo que deverá julgar-se declarando-se a inconstitucionalidade nos termos supra
requeridos, nomeadamente:
? Julgando-se nulo todo o processado, voltando o processo à fase dos articulados
na primeira instância, ordenando-se a notificação da Autora para completar o seu
articulado relativamente à alegação referente aos requisitos para atribuição de
pensão de sobrevivência à Autora, nos termos do artigo 508° do CPC e de acordo
com o garantido pelo artigo 13° da CRP;
? Declarando-se a inconstitucionalidade das normas dos artigos 2020° n.º 1 do
Código Civil; da norma do artigo 6° da Lei n.º 7/2001; do artigo 8°, n.º 1 do
Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10; do artigo 3°, n.º 1 do Decreto Regulamentar n.º
1/94 de 18/01, por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade
ínsitos nas disposições combinadas dos artigos 2°, 13° n.º 2, 18° n.º 2, 36 n.º
1, 63° n.º 1 e 3 e 67° da Constituição da República Portuguesa;
? Declarando-se a inconstitucionalidade da norma do artigo 2020°, n.º 1 do
Código Civil, conjugada com o disposto da Lei n.º 7/2001, do Decreto-Lei n.º 322/90
de 18/10 e do Decreto-Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretada no
sentido de que no tipo de acções como a que deu causa aos presentes autos, ser
necessário a alegação e a prova, por parte da Autora, da impossibilidade de
obtenção de alimentos da herança do falecido.
? Declarando-se inconstitucionais as normas dos artigos 6° da Lei n.º 7/2001;
artigo 8°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10; artigo 3°, n.º 1 do Decreto-Regulamentar
n.º 1/94 de 18/01, quando interpretadas fora da concepção de que existe uma
equiparação total relativamente às medidas de protecção social em caso de
falecimento que são atribuídas aos membros do agregado familiar unidos pela via
do casamento com os membros do agregado familiar unidos pela via da união de
facto ? estando ainda a violar os artigos 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e
67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos
artigos 9°,21°, 33° e 34° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
? Em consequência, revogar-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça,
proferido nos presentes autos a 23/04/2009 por fazer uma interpretação
inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos diplomas legais
regulamentadores da união de facto ? estando ainda a violar os artigos n.º 2°,
18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da República
Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9°,21°,33° e 34° da Carta dos
Direitos Fundamentais da União Europeia;
? Revogar-se Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido nos presentes
autos, por fazer uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código
Civil e dos diplomas legais regulamentadores da união de facto ? estando ainda a
violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da
Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e
21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
Termos em que deverá dar-se provimento à presente reclamação, julgando-se nos
termos requeridos e consequentemente:
1. Julgar-se nulo todo o processado, voltando o processo à fase dos articulados
na primeira instância, ordenando-se a notificação da Autora para completar o seu
articulado relativamente à alegação referente aos requisitos para atribuição de
pensão de sobrevivência à Autora, nos termos do artigo 508° do CPC e de acordo
com o garantido pelo artigo 13° da CRP;
2. Declarar-se a inconstitucionalidade das normas dos artigos 2020° n.º 1 do
Código Civil; da norma do artigo 6° da Lei n.º 7/2001; do artigo 8°, n.º 1 do
Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10; do artigo 3°, n.º 1 do Decreto-Regulamentar n.º
1/94 de 18/01, por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade
ínsitos nas disposições combinadas dos artigos 2°, 13° n.º 2, 18° n.º 2, 36 n.º
1, 63° n.º 1 e 3 e 67° da Constituição da República Portuguesa;
3. Declarar-se a inconstitucionalidade da norma do artigo 2020°, n.º 1 do Código
Civil, conjugada com o disposto da Lei n.º 7/2001, do Decreto-Lei n.º 322/90 de
18/10 e do Decreto-Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretada no
sentido de que no tipo de acções como a que deu causa aos presentes autos, ser
necessário a alegação e a prova, por parte da Autora, da impossibilidade de
obtenção de alimentos da herança do falecido.
4. Declararem-se inconstitucionais as normas dos artigos 6° da Lei n.º 7/2001;
artigo 8°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10; artigo 3°, n.º 1 do Decreto-Regulamentar
n.º 1/94 de 18/01, quando interpretadas fora da concepção de que existe uma
equiparação total relativamente às medidas de protecção social em caso de
falecimento que são atribuídas aos membros do agregado familiar unidos pela via
do casamento com os membros do agregado familiar unidos pela via da união de
facto ? estando ainda a violar os artigos 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e
67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos
artigos 9°, 21°, 33° e 34° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
5. Em consequência, revogar-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça,
proferido nos presentes autos a 23/04/2009 por fazer uma interpretação
inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos diplomas legais
regulamentadores da união de facto ? estando ainda a violar os artigos n.º 2°,
18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da República
Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9°, 21°, 33° e 34° da Carta
dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
6. Revogar-se Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido nos presentes
autos, por fazer uma interpretação inconstitucional do artigo 2020º do Código
Civil e dos diplomas legais regulamentadores da união de facto ? estando ainda a
violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da
Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e
21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
7. Revogar-se a decisão ora reclamada devendo a sobre a mesma recair Acórdão a
proferir pelo Tribunal Constitucional, nos termos e de acordo com o supra
exposto».
3 ? A decisão reclamada tem o seguinte teor:
«1 ? A., melhor identificada nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional
ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15
de Novembro, na sua actual versão (LTC), tendo instruído o requerimento de
recurso com as seguintes indicações:
?(...)
1. Nos autos em referência, foram proferidas decisões as quais aplicaram normas
cuja inconstitucionalidade já havia sido suscitada durante o processo, a saber:
1.1 Foi suscitada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 2020° n.º 1 do
Código Civil; da norma do artigo 6° da Lei n.º 7/2001; do artigo 8°, n.º 1 do
Decreto ? Lei n.º 322/90 de 18/10; do artigo 3º, n.º 1 do Decreto ? Regulamentar
n.º 1/94 de 18/01, por violação dos princípios da igualdade e da
proporcionalidade ínsitos nas disposições combinadas dos artigos 2°, 13º n.º 2,
18° n.º 2, 36 n.º 1, 63° n.º 1 e 3 e 67° da Constituição da República Portuguesa
(doravante CRP);
1.2 E as peças processuais em que foram invocadas as inconstitucionalidades
apontadas em 1.1 são as seguintes: Réplica (cfr. artigo 20°); Reclamação para a
Conferência do Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. artigo 13°); Resposta às
Alegações perante o Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. conclusão n.º 45);
Alegações de Revista perante o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. conclusão 35);
Perante o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70° e seguintes da Lei
do Tribunal Constitucional, requer-se a apreciação do seguinte:
a) É inconstitucional a norma do artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil, conjugada
com o disposto da Lei n.º 7/2001, do Decreto ? Lei n.º 322/90 de 18/10 e do
Decreto ? Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretada no sentido de que
no tipo de acções como a que deu causa aos presentes autos, ser necessário a
alegação e a prova, por parte da Autora, da impossibilidade de obtenção de
alimentos da herança do falecido.
Analisando o Dec. Reg. 1/94 constata-se que os requisitos para que se beneficie
de pensão de sobrevivência por parte da Segurança Social, são apenas a
demonstração do estado civil do falecido e a existência de uma relação de união
de facto que perdura há mais de 2 anos (cfr. art. 2° DR 1/94), não incorrendo
sobre o interessado o ónus da prova quer da necessidade de alimentos, quer da
impossibilidade para os pagar por parte da herança ou dos familiares.
Da conjugação das referidas disposições legais resulta de forma inequívoca que,
de acordo com a aplicação daqueles normativos existe uma equiparação total
relativamente às medidas de protecção social quer em caso de agregado familiar
unido pelo casamento, quer em caso de agregado familiar unido pela união de
facto ? os pressupostos para atribuição da pensão de sobrevivência são os mesmos
seja para um, seja para o outro caso.
Assim, a norma do artigo 2020° do Código Civil, interpretada em sentido
diferente do supra explanado está a desvirtuar o espírito da Lei e a sua própria
regulamentação ? estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°,
n.º 1 e 3 e 67°, todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o
disposto nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União
Europeia;
b) São também inconstitucionais as normas dos artigos 6° da Lei n.º 7/2001;
artigo 8°, n.º 1 do Decreto ? Lei n.º 322/90 de 18/10; artigo 3°, n.º 1 do
Decreto ? Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretadas fora da concepção
de que existe uma equiparação total relativamente às medidas de protecção que
são atribuídas aos membros do agregado familiar unidos pela via do casamento com
os membros do agregado familiar unidos pela via da união de facto ? estando
ainda a violar os artigos 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da
Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e
21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
c) O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido nos presentes autos a 23/04/2009
faz uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos
diplomas legais regulamentadores da união de facto ? estando ainda a violar os
artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da
República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta
dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
d) O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido nos presentes autos,
faz uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos
diplomas legais regulamentadores da união de facto ? estando ainda a violar os
artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da
República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta
dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
e) Diz-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que a Autora não alegou a
impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido, referindo-se
naquele Acórdão que a Autora não invocou nem demonstrou essa impossibilidade.
Todavia, antes que fosse apreciada esta questão, nunca a recorrente foi
notificada por qualquer tribunal para os efeitos previstos no artigo 508° do CPC,
nomeadamente para a parte aperfeiçoar os seus articulados, para depois o
Tribunal poder decidir em conformidade. Note-se que ao decidir-se por um juízo
com base numa falta de alegação ? juízo esse efectuado em sede de recurso ?
nunca podia o Tribunal decidir antes de dar à parte prazo para esta, caso
quisesse, poder aperfeiçoar o seu articulado. Ao não proceder deste modo, o
Tribunal cometeu uma ilegalidade, proferindo uma decisão surpresa ? proibida nos
termos da nossa Lei, na medida em que decidiu sem assegurar a igualdade de meios
e de recursos entre as partes ? violando assim o principio da igualdade previsto
no artigo 13° da Constituição da República Portuguesa;
(...)?.
2 ? Integrando-se o caso sub judicio na hipótese normativa recortada no n.º 1 do
artigo 78.º-A da LTC, passa a decidir-se nos termos seguintes.
3.1 ? Tendo o recurso sido interposto ao abrigo da norma do artigo 70.º, n.º 1,
alínea b), da LTC, são condições do conhecimento do seu objecto que o mesmo
incida sobre uma questão de constitucionalidade normativa, suscitada qua tale
durante o processo, e que a norma controvertida tenha sido aplicada como ratio
decidendi do juízo proferido, esclarecendo o artigo 72.º, n.º 2, que tais
recursos só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da
inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.
Por outro lado, como se afirmou no Acórdão n.º 618/98, ?suscitar a
inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal
perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de
constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, obviamente, que (...)
tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a norma (ou um segmento
dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender de quem suscita essa
questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte o porquê
dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao menos, a norma ou
princípio constitucional infringido. Impugnar a constitucionalidade de uma norma
implica, pois, imputar a desconformidade com a Constituição não ao acto de
aplicação do Direito ? concretizado num acto de administração ou numa decisão
dos tribunais ? mas à própria norma, ou, quando muito, à norma numa determinada
interpretação que enformou tal acto ou decisão (cf. Acórdãos nºs 37/97, 680/96,
663/96 e 618/96, este publicado no Diário da República II Série, de 15-05-1996)?.
3.2 ? Perante o Tribunal a quo, a recorrente concluiu que ?a conjugação dos
artigos 6.° da Lei n.º 7/2001 de 11.5, 8.° n.º 1 do DL 322/90 de 18.10 e 3.° n.º
1 do Dec. Reg 1/94 de 18.1, quando interpretada no sentido de fazer depender a
atribuição das prestações sociais à verificação dos requisitos exigíveis pela
lei civil para a atribuição da pensão alimentar, viola os princípios de
igualdade e proporcionalidade ínsitos nas disposições combinadas dos art. 2°, 13º
n.º 2, 36° n.º 1 e 3°, 63° n.º 1 e 3° e 67° da CRP, o que constitui urna
inconstitucionalidade material (...)?, não suscitando em termos adequados
qualquer outra questão de constitucionalidade normativa.
Nesta sede, pretende a recorrente que o Tribunal Constitucional aprecie as
questões feitas constar das alíneas a) a e) do seu requerimento de interposição
de recurso ? supra transcrito ?, aí incluindo matéria não susceptível de
apreciação no âmbito do recurso de constitucionalidade ? alíneas c) a e) ?, na
medida em que exorbitam da questão suscitada, referindo-se, ademais, ao controlo
de legalidade e constitucionalidade das próprias decisões jurisdicionais
proferidas, o qual não integra a esfera de competência cognitiva deste Tribunal.
Quanto às restantes questões ? alíneas a) e b) do requerimento ?, ainda que a
recorrente as autonomize ex novo, o certo é que ambas imbricam no mesmo problema
de constitucionalidade já que a ponderação da constitucionalidade da primeira
norma não pode dissociar-se, na sua fundamentação, da questão equacionada na
segunda, designadamente na parte em que se considere como parâmetro o princípio
da igualdade.
Por outro lado, nesta parte, não obstará ao conhecimento do objecto do recurso o
facto da recorrente introduzir no seu objecto a norma do artigo 2020.º, n.º 1,
do Código Civil, perante a referência apenas remissiva e implícita constante da
indicada conclusão 35.ª das alegações produzidas no Tribunal a quo.
4 ? Passando a conhecer das questões de constitucionalidade [alíneas a) e b) do
requerimento do recurso], cumpre começar por referir que o problema equacionado
pela recorrente foi já objecto de diversas decisões deste Tribunal que em
diversas ocasiões teve ensejo de pronunciar-se sobre a conformidade
constitucional dos preceitos que fazem depender a atribuição da pensão de
sobrevivência por morte do respectivo, a quem com ele convivia em união de facto,
também da prova do direito do companheiro sobrevivo a receber alimentos da
herança do companheiro falecido, direito esse a ser invocado e reclamado na
herança do falecido, com o prévio reconhecimento da impossibilidade da sua
obtenção nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º do Código Civil ? cf.
Acórdãos n.os 195/03, 88/04, 159/05, 233/05, 614/05, 644/05, 705/05, 707/05 e
517/06, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.
Sobre a questão, atente-se na fundamentação do referido Acórdão n.º 233/05 :
«4. (...) no seu Acórdão n.º 195/2003 (Diário da República, II série, de 22 de
Maio de 2003), o Tribunal Constitucional decidiu ?não julgar inconstitucional a
norma do artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90 (...) na parte em que faz
depender a atribuição da pensão de sobrevivência por morte do beneficiário da
segurança social a quem com ele convivia em união de facto de todos os
requisitos previstos no n.º 1 do artigo 2020º do CC'.
Tal norma ? na parte relativa à atribuição de pensões de sobrevivência ? foi
então apreciada à luz da alegada violação dos direitos tutelados pelo artigo 26º
da Constituição e do princípio da igualdade, ao qual foi reconduzido o ultimo
dos direitos englobados pelo artigo 26º, que entendeu não violado, e do n.º 1 do
artigo 36º, conjugado com o princípio da proporcionalidade.
No que toca à primeira questão, isto é, à alegada violação do princípio da
igualdade pela norma do artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90, afirmou-se
o seguinte:
?(...) será que a distinção entre cônjuges (contemplados como titulares do
direito às prestações em questão no artigo 7º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º
322/90) e pessoas em situação de união de facto, para efeitos de fixação das
condições de atribuição da pensão de sobrevivência, requerendo para estas que
não possam exigir alimentos aos seus familiares mais próximos, é violadora do
princípio da igualdade?
A perspectiva da recorrente parece ser a de que a distinção entre pessoas
casadas e pessoas em situação de união de facto, para efeitos de atribuição da
pensão de sobrevivência, viola o princípio da igualdade por ser destituída de
fundamento razoável, constitucionalmente relevante, considerando, designadamente,
que ?sempre será necessário fazer prova da já referida vivência há mais de dois
anos em condições análogas às dos cônjuges?.
Cumpre, porém, reconhecer que este último argumento dá por pressuposto o
reconhecimento de uma imposição constitucional, por força do princípio da
igualdade, de um mesmo tratamento para cônjuges e pessoas que vivem em união de
facto (ainda que há mais de dois anos). Ora, numa certa perspectiva pode, é
certo, admitir-se que uma certa caracterização da situação de união de facto,
pela sua duração e por outras circunstâncias (por exemplo, a existência de
filhos comuns) a aproxima da situação típica dos cônjuges. No caso, porém, a
exigência de uma convivência há mais de dois anos em condições análogas às dos
cônjuges serve apenas para caracterizar de forma mínima a situação de união de
facto que poderá ser juridicamente relevante, para lhe serem reconhecidos ?
embora, segundo o Código Civil, em medida bastante limitada e muito distinta da
relação entre os cônjuges ? alguns efeitos jurídicos. É que, diversamente do que
acontece com a relação matrimonial, em que um acto revestido de uma forma
jurídica solene marca a criação de uma nova relação jurídica, no caso da
convivência entre pessoas não casadas, justamente por estar em causa uma
situação de união de facto, o tempo mínimo de convivência é considerado
relevante pelo legislador para o efeito de reconhecimento de efeitos jurídicos (assim,
por exemplo, o artigo 1º, n.º 1, das citadas Lei n.ºs 135/99 e 7/2001
condicionam ambos os efeitos jurídicos que reconhecem à circunstância de se
tratar de pessoas ?que vivem em união de facto há mais de dois anos?).
O problema não pode, pois, ficar resolvido logo com a mera invocação da
existência de uma convivência há mais de dois anos, em condições análogas às dos
cônjuges. Antes está, precisamente, em saber se uma situação de união de facto,
assim caracterizada, pode ser tratada de forma diversa do casamento, para o
efeito em causa.
Ora, como este Tribunal tem reconhecido, existem diferenças importantes, que o
legislador pode considerar relevantes, entre a situação de duas pessoas casadas,
e que, portanto, voluntariamente optaram por alterar o estatuto jurídico da
relação entre elas ? mediante um ?contrato celebrado entre duas pessoas de sexo
diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida,
nos termos das disposições deste Código?, como se lê no artigo 1577º do Código
Civil ?, e a situação de duas pessoas que (embora convivendo há mais de dois
anos ?em condições análogas às dos cônjuges?) optaram, diversamente, por manter
no plano de facto a relação entre ambas, sem juridicamente assumirem e
adquirirem as obrigações e os direitos correlativos ao casamento.
Assim, como se salientou, por exemplo, também no referido Acórdão n.º 275/2002,
?não se pode excluir a liberdade do legislador de prever um regime jurídico
específico para os cônjuges, visando, por exemplo, a prossecução de objectivos
políticos de incentivo ao matrimónio?. Pelo que, ?considerando desde logo a
existência de especiais deveres entre os cônjuges?, se pode dizer, como se
afirmou no citado Acórdão n.º 14/2000, que ?(...) de harmonia com o nosso
ordenamento (ainda suportado constitucionalmente), o regime das pessoas unidas
pelo matrimónio confrontadamente com a união de facto não permite sustentar que
nos postamos perante situações idênticas à partida e, consequentemente, que
requeiram tratamento igual.?
Ora, um dos pontos em que o tratamento jurídico diverso entre ambas as situações
pode relevar é, justamente, o das condições, ora em causa, para o reconhecimento
do direito à pensão de sobrevivência no caso da união de facto.
Importa, aliás, recordar que, por exemplo, quem vive em situação de união de
facto também não é herdeiro (nem legitimário, nem legítimo) do de cujus com quem
convivia, apenas tendo um direito a exigir alimentos da herança, se não os puder
obter das pessoas referidas no artigo 2009º, n.º 1, alíneas a) a d) do Código
Civil. E, se é certo poder sustentar-se que os fundamentos e a natureza dos
direitos à pensão de sobrevivência e a alimentos são distintos, não pode deixar
de notar-se o paralelo entre a situação sucessória do convivente em união de
facto ? reduzida ao referido direito a exigir alimentos da herança ? e a
situação decorrente da norma em causa, quanto à condição questionada para
atribuição da pensão de sobrevivência.
Ora, nem esta diferenciação de tratamento pode considerar-se destituída de
fundamento razoável ou arbitrária, nem, por outro lado, se baseia num critério
que tenha de ser irrelevante, considerando o efeito jurídico visado. Na verdade,
trata-se, aqui, tal como na distinção da posição sucessória do cônjuge e do
convivente em união de facto, justamente de um daqueles pontos do regime
jurídico em que o legislador trata mais favoravelmente a situação dos cônjuges,
não só visando objectivos políticos de incentivo ao matrimónio ? enquanto
instituição social que tem por criadora de melhores condições para assegurar a
estabilidade e a continuidade comunitárias ?, mas também como reverso da
inexistência de um vínculo jurídico, com direitos e deveres e um processo
especial de dissolução, entre as pessoas em situação de união de facto.
Tal diverso tratamento jurídico não pode considerar-se destituído de fundamento
constitucionalmente relevante, não podendo divisar-se na norma em apreço
violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Lei Fundamental.?
No que toca à segunda questão, isto é, à alegada violação do n.º 1 do artigo 36º
da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, escreveu-se no
mesmo Acórdão n.º 195/03:
?8. A conclusão a que chegámos é certamente sufragada também por quem não
considere que o legislador constitucional dispensa no artigo 36º, n.º 1,
protecção à família, enquanto 'elemento fundamental da sociedade', distinguindo-a,
no n.º 1 e no n.º 2 desse artigo, do casamento, incluindo igualmente uma família
não fundada no casamento ? e que, portanto, pode retirar-se desta imposição, em
conjugação com o princípio da proporcionalidade, um parâmetro autónomo,
susceptível de conduzir a decisões de inconstitucionalidade, como foi o caso do
citado Acórdão n.º 275/2002.
Mesmo, porém, à luz de outro entendimento do artigo 36º, n.º 1, da Constituição
conjugado com o princípio da proporcionalidade ? como o que fundou o citado
aresto ?, não se é, porém, conduzido a um juízo de inconstitucionalidade da
norma ora em causa. É que, no presente caso, não se está perante uma exclusão de
plano, e em abstracto, do direito do convivente, por contraposição ao direito do
cônjuge, e antes a norma em questão (que não trata de qualquer indemnização, ou
?compensação? de danos pessoais), o artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90,
de 18 de Outubro, visou justamente, pelo contrário, conceder também protecção,
pela extensão de prestações na eventualidade da morte dos beneficiários do
regime geral de segurança social, ?às pessoas que se encontrem na situação
prevista no n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil?. Mesmo o condicionamento da
pensão à impossibilidade de obter alimentos (nos termos da norma em causa e do
citado artigo 3º do Decreto Regulamentar n.º 1/94) representa, ainda, a prova,
justamente, da necessidade de protecção da pessoa em causa, por não a poder
obter dos seus familiares directos.
E já se viu que existe fundamento constitucionalmente relevante para a distinção
de tratamento em causa. Não pode, pois, afirmar-se que, desse condicionamento do
direito à pensão de sobrevivência (tal como, por exemplo, da não atribuição da
qualidade de herdeiro legítimo ou legitimário), resulte violação de um ?dever de
não desproteger, sem uma justificação razoável, a família que se não fundar no
casamento?, que se afirmou no citado Acórdão n.º 275/2002, quanto àqueles pontos
do regime jurídico que directamente contendam com a protecção dos seus membros ?e
que não sejam aceitáveis como instrumento de eventuais políticas de incentivo à
família que se funda no casamento? (itálico aditado).?
5. Sobre esta questão, e referindo estes dois acórdãos do Tribunal
Constitucional, Rita Lobo Xavier, em ?Uniões de Facto e Pensão de Sobrevivência?,
in Jurisprudência Constitucional, 3, Julho-Setembro 2004, págs. 17 e segs,
observou que «em ambos os casos o problema é similar, decorrendo da
circunstância de os textos legais, embora admitindo a pessoa que vivia em união
de facto com o beneficiário falecido no conjunto das pessoas com direito a
pensão de sobrevivência, parecerem exigir para o reconhecimento desse direito a
verificação de determinadas condições que não são impostas quando se trata da
habilitação do cônjuge sobrevivo a semelhante pensão. Para o cônjuge sobrevivo,
a sua habilitação à pensão de sobrevivência basta-se com a prova da qualidade de
cônjuge. O companheiro sobrevivo só é ?herdeiro hábil? se estiver nas ?condições
do artigo 2020º do Código Civil? (artigo 40º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º
142/73, de 31 de Março), se se encontrar ?na situação prevista no n.º 1 do
artigo 2020º do Código Civil? (artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90)» (cfr.
?Uniões de Facto...?, cit., pág. 18).
O que está em causa é, pois, saber se, com esta remissão para o artigo 2020º do
Código Civil, não será discriminatório ou desproporcionado exigir ao companheiro
sobrevivo, para além da prova da convivência em condições análogas às dos
cônjuges por mais de dois anos, o reconhecimento judicial do direito a receber
alimentos.
Posta a questão nestes termos, não pode deixar de se reconhecer que ?uma união
de facto não implica forçosamente solidariedade patrimonial, logo não basta a
prova dessa relação para se considerar verificada a diminuição da capacidade
económica que é pressuposto da atribuição da pensão?. Pelo contrário, no caso do
cônjuge sobrevivo esta diminuição é pressuposta (cfr. ?Uniões de Facto...?, cit.,
pág. 21).»
Tal aresto concluiu, pois, no sentido da não inconstitucionalidade das ditas
normas.
Não se olvida que no Acórdão n.º 88/2004, onde estava em causa um bloco
normativo análogo ? relativo à função pública ?, o Tribunal julgou
inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, a norma que se
extrai dos artigos 40º n.º 1 e 41º n.º 2 do Estatuto das Pensões de
Sobrevivência no funcionalismo público, quando interpretada no sentido de que a
atribuição da pensão de sobrevivência por morte de beneficiário da Caixa Geral
de Aposentações, a quem com ele convivia em união de facto, depende também da
prova do direito do companheiro sobrevivo a receber alimentos do companheiro
falecido, com o prévio reconhecimento da impossibilidade da sua obtenção nos
termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º do Código Civil.
Todavia, posteriormente (Acórdão n.º 159/05), o Tribunal reiterou o julgamento
de não inconstitucionalidade, estribando-se na seguinte fundamentação:
«[...] na óptica do princípio da igualdade, a situação de duas pessoas que
declaram a intenção de conceder relevância jurídica à sua união e a submeter a
um determinado regime (um específico vínculo jurídico, com direitos e deveres e
um processo especial de dissolução) não tem de ser equiparada à de quem,
intencionalmente, opta por o não fazer. O legislador constitucional não pode ter
pretendido retirar todo o espaço à prossecução, pelo legislador infra-constitucional,
cujo programa é sufragado democraticamente, de objectivos políticos de incentivo
ao matrimónio enquanto instituição social, mediante a formulação de um regime
jurídico próprio ? por exemplo, distinguindo entre a posição sucessória do
convivente em união de facto (reduzida ao referido direito a exigir alimentos da
herança) e a do cônjuge.
A diferenciação de tratamento em causa na presente norma não pode, assim, ser
considerada como destituída de fundamento razoável ou arbitrária, verificando-se,
por outro lado, um indiscutível paralelo entre ela e o tratamento sucessório de
ambas as situações (introduzido pela reforma de 1977 e cuja conformidade com a
Lei Fundamental não é aqui questionada).
7. Superada a objecção que se pudesse pretender extrair do princípio da
igualdade, e admitida a presente diferenciação à luz da política legislativa que
o legislador democrático entenda dever prosseguir, não ficam, porém, dissipados
todos os argumentos conducentes a uma conclusão de inconstitucionalidade. Aliás,
o acórdão recorrido baseou o seu julgamento de inconstitucionalidade,
decisivamente, na invocação do princípio da proporcionalidade (conjugado com o
reconhecimento constitucional da ?família não fundada no casamento?), tal como o
havia feito (e invocando) o citado acórdão n.º 88/2004.
Também neste plano se considera, porém, que é de reiterar a fundamentação
transcrita, do acórdão n.º 195/2003.
Com efeito, o que está em causa no confronto de uma solução normativa com o
princípio da proporcionalidade não é simplesmente a gravidade ou a dimensão das
desvantagens ou inconvenientes que pode acarretar para os visados (com, por
exemplo, a necessidade da prova da carência de alimentos, ou, mesmo a exclusão
total de certos direitos). O recorte de um regime jurídico ? como o da
destruição do vínculo matrimonial ou o dos seus efeitos sucessórios ? pela
hipótese do casamento, deixando de fora situações que as partes não pretenderam
intencionalmente submeter a ele, tem necessariamente como consequência a
exclusão dos respectivos efeitos jurídicos. O que importa apurar é se tal
recorte é aceitável ? se segue um critério constitucionalmente aceitável ? tendo
em conta o fim prosseguido e as alternativas disponíveis ? sem deixar de
considerar a ampla margem de avaliação de custos e benefícios e como de escolha
dessas alternativas, que, à luz dos objectivos de política legislativa que ele
próprio define dentro do quadro constitucional, tem de ser reconhecida ao
legislador (e que este Tribunal reconheceu, por exemplo, no acórdão n.º 187/01,
publicado no Diário da República, II série, de 26 de Junho de 2001).
Ora, como revela o paralelo da solução normativa em causa com a posição
sucessória do cônjuge sobrevivo e da união de facto ? não equiparada, aliás,
pelas Leis n.ºs 135/99 e 7/2001 ?, o tratamento post mortem do cônjuge é,
justamente, um daqueles pontos do regime jurídico em que o legislador optou por
disciplinar mais favoravelmente o casamento.
Esta distinção entre a posição post mortem do cônjuge e a do companheiro em
união de facto ? que, aliás, podem concorrer entre si depois da morte do
beneficiário ? é adequada à prossecução do fim de incentivo à família fundada no
casamento, que não é constitucionalmente censurável ? e antes recebe até (pelo
menos numa certa leitura) particular acolhimento no texto constitucional. A
conveniência de tal distinção de tratamento post mortem, com os concomitantes
reflexos patrimoniais, pode ser, e será com certeza, diversamente apreciada a
partir de diversas perspectivas, no debate político-legislativo ? em que poderão
vir a encontrar acolhimento argumentos como o da distinção entre o direito a
alimentos e a pensão de sobrevivência, a existência e o sentido dos descontos
efectuados pelo companheiro falecido, à luz do regime então vigente e da sua
situação pessoal, ou a maior ou menor conveniência em aprofundar consequências
económicas específicas de uma relação familiar como o casamento. Mas a
Constituição não proscreve essa distinção, ainda quando ela tem como
consequência deixar de fora do regime estabelecido para a posição sucessória do
cônjuge o companheiro em união de facto.
8. Entende-se ser justamente isto o que se passa com a interpretação em causa,
segundo a qual os requisitos para o direito à pensão de sobrevivência são
diversos, dependendo, no caso de união de facto, e tal como em geral para o
direito a alimentos nos termos do artigo 2020º do Código Civil, de aquele ter
direito a obter alimentos da herança, por não os poder obter das pessoas
referidas no artigo 2009º do mesmo Código.
Aliás, não é só para o companheiro sobrevivo que existem condições específicas
para ser reconhecido o direito à pensão: o ex-cônjuge ou cônjuge separado de
pessoas e bens só dela beneficia se tiver sido casado com o beneficiário pelo
menos um ano e se na data da morte tiver direito a uma pensão de alimentos; os
pais e os avós têm de estar ?a cargo? do contribuinte à data da morte para terem
direito a pensão, etc.. E a pensão cessa quando os titulares do direito
obtiverem outras fontes de rendimento. Apenas ao cônjuge não são exigidas
condições adicionais, pois os cônjuges estão ligados por específicos deveres de
solidariedade patrimonial ? o dever de assistência e, na constância do casamento,
o dever de contribuir para os encargos da vida familiar (artigos 1672º e 1675º
do Código Civil). Diversamente, a união de facto não implica forçosamente, por
opção das partes, deveres patrimoniais, ou uma geral solidariedade patrimonial,
admitindo-se mesmo que quem vive em união de facto continue a ter direito a
alimentos do ex-cônjuge ou, até, mantenha uma pensão de sobrevivência (e podendo,
mesmo ser este o motivo para continuar na situação de união de facto, e não
casar). Recorde-se, aliás, que os próprios diplomas que introduziram medidas de
protecção das pessoas que vivem em união de facto (Leis 135/99, de 28 de Agosto
e 7/2001, de 11 de Maio) não obrigaram os membros da união de facto a deveres de
assistência recíprocos ou a deveres de alimentos em caso de ruptura, ou, sequer,
alteraram os preceitos do Código Civil sobre alimentos em caso de morte.
Por outro lado, e como se notou no acórdão n.º 195/2003, na solução normativa em
apreço não se verifica qualquer ?exclusão de plano, e em abstracto, do direito
do convivente, por contraposição ao direito do cônjuge?. Antes a norma em
questão (que não disciplina qualquer ressarcimento, ou ?compensação? de danos
pessoais) ?visou justamente, pelo contrário, conceder também protecção, pela
extensão de prestações na eventualidade da morte dos beneficiários do regime
geral de segurança social, ?às pessoas que se encontrem na situação prevista no
n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil??. O sentido da remissão para o artigo
2020º do Código Civil, com a exigência de provar os requisitos exigidos neste
normativo, como ?condicionamento da pensão à impossibilidade de obter alimentos?,
mais não é do que ?a prova, justamente, da necessidade de protecção da pessoa em
causa, por não a poder obter dos seus familiares directos?, sendo, portanto,
coerente com o objectivo visado pela prestação social em causa: para o cônjuge,
considerando os deveres de solidariedade patrimonial e a obrigação de alimentos
em caso de ruptura, presume-se essa situação; para o caso da união de facto, é
necessário fazer prova da necessidade de protecção, tal como quando se pretende
obter alimentos.
Da exigência daqueles requisitos (tal como, por exemplo, do não reconhecimento
da qualidade de herdeiro legítimo ou legitimário) não resulta, pois, qualquer
violação do princípio da proporcionalidade ? sendo de notar, aliás, que, para
além da possível conveniência em distinguir a posição do cônjuge, pode verificar-se
também, no caso concreto, um problema de concurso entre aquele e o companheiro
em união de facto.»
E esse juízo foi posteriormente confirmado pelo Acórdão n.º 614/05, tirado no
Plenário deste Tribunal.
A isto se acrescentou, no Acórdão n.º 517/06, que:
?(...) o Tribunal reitera o julgamento de não inconstitucionalidade proferido
nos citados arestos. Tal como se disse no Acórdão n.º 233/2005, cabe aqui
assinalar o seguinte:
?Em primeiro lugar, e no que toca ao princípio da igualdade, também em relação
às normas desaplicadas se verifica um indiscutível paralelo com a diferenciação
entre o tratamento sucessório do companheiro e do cônjuge sobrevivos; quanto ao
princípio da proporcionalidade, e atendendo à circunstância de à união de facto
ser alheia a existência de um dever de solidariedade patrimonial entre os
companheiros, não se afiguram excessivas as condições específicas previstas nas
normas agora desaplicadas para ser reconhecido o direito à pensão ao companheiro
sobrevivo. Diferentemente, tais condições específicas são uma simples
decorrência da circunstância de a união de facto não implicar forçosamente, por
opção das partes, deveres patrimoniais, ou uma geral solidariedade patrimonial,
como sucede com o casamento.
Em segundo lugar, e como se referiu no acórdão n.º 159/05, e apesar de este
argumento ser menos relevante, não é só quanto ao companheiro sobrevivo que
existem condições específicas para ser reconhecido o direito à pensão: o próprio
cônjuge sobrevivo, não havendo filhos do casamento, só tem direito à pensão se
tiver casado com o beneficiário pelo menos um ano antes do falecimento deste,
salvo se a morte tiver resultado de acidente ou doença contraída ou manifestada
depois do casamento (artigo 9º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90); o ex-cônjuge,
em caso de casamento declarado nulo ou anulado, só tem direito à pensão se à
data da morte do beneficiário recebesse pensão de alimentos decretada ou
homologada judicialmente (artigo 9º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 322/90); os
ascendentes têm de estar ?a cargo? do beneficiário falecido, não podendo existir
cônjuges, ex-cônjuges e descendentes com direito às mesmas prestações (artigo 14º
do Decreto-Lei n.º 322/90).
Atendendo, pois, à necessidade de diferenciar entre o estatuto das diferentes
classes de pessoas com direito às prestações previstas no Decreto-Lei n.º 322/90,
com base no grau de ?solidariedade patrimonial? verificado entre essas pessoas e
o beneficiário, não parece excessivo exigir ao companheiro sobrevivo o
reconhecimento judicial do direito a alimentos da herança do falecido, nos
termos do n.º 1 do artigo 2020º do Código Civil, ou da qualidade de titular
daquelas prestações, em caso de insuficiência ou inexistência de bens da herança,
em acção proposta nos termos do disposto no artigo 3º do Decreto Regulamentar n.º
1/94?.
Esta orientação, subscrita pelo relator no Acórdão tirado em Plenário, tem
integral pertinência para o caso sub judicio, remetendo-se por isso para os
arestos supra transcritos cuja fundamentação aqui se acolhe e reitera.
5 ? Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide:
a) Não tomar conhecimento do objecto do recurso relativamente à matéria
constante das alíneas c) a e) do requerimento de interposição do recurso;
b) E, no restante, negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 7 (sete) UCs».
4 ? O reclamado não respondeu.
B ? Fundamentação
5 ? Como se denota da argumentação desferida na reclamação, a reclamante nada
esgrime contra o bem fundado do não conhecimento das questões de
constitucionalidade identificadas nas alíneas c) e d) do seu requerimento de
interposição de recurso, decidido na decisão reclamada.
E não havendo razões para concluir em sentido diverso, impõe-se manter o
decidido quanto a tal matéria.
Mas igualmente não se vêem fundamentos para alterar a pronúncia de não
conhecimento do recurso de constitucionalidade relativo à questão identificada
na alínea e) do mesmo requerimento.
Na verdade, neste ponto, independentemente de estar em causa a decisão judicial
em si própria, não se tratando de uma questão de constitucionalidade normativa,
a reclamante mais não faz do que controverter a correcção da interpretação do
direito ordinário levada a cabo pelo Supremo Tribunal de Justiça, bem como a
posição do mesmo Supremo Tribunal de aplicar, ao caso, o entendimento normativo
sobre o ónus de alegação e prova da impossibilidade de obter os alimentos da
herança do falecido por parte da reclamante, defendendo esta que deveria ter
sido notificada para os ?efeitos previstos no artigo 508.º do CPC, nomeadamente
para a parte aperfeiçoar os seus articulados para depois o Tribunal poder
decidir em conformidade?.
Como é consabido, não cabe na competência do Tribunal Constitucional sindicar a
correcção da interpretação do direito ordinário levada a cabo pelos tribunais de
instância nem da aplicação ao caso concreto desse direito, mesmo que, nesta
tarefa, os tribunais apliquem directamente normas ou princípios constitucionais,
como seja o alegado artigo 13.º da Constituição.
E também não procede a reclamação relativamente ao juízo de constitucionalidade
feito pela decisão reclamada sobre as questões constantes das alíneas a) e b) do
requerimento de interposição de recurso.
Pese, embora, a longa alegação da reclamante, esta ocupa-se, essencialmente, a
defender a bondade, no plano do direito ordinário, da solução oposta àquela que
o acórdão recorrido sufragou.
No que a mais se alega, não se vêem, aí, aduzidos quaisquer argumentos novos que
determinem que deva dar-se uma resposta diferente à questão de
constitucionalidade que já não tenham sido sopesados pela diversa jurisprudência
constitucional convocada como lugares paralelos.
Neste âmbito cumpre notar que já depois de proferida a decisão sumária aqui
reclamada, o Tribunal Constitucional reiterou, no sentido por ela seguido, a
resposta dada à mesma questão de constitucionalidade, no Acórdão n.º 651/09,
disponível em www.tribunalconstitucional.pt, tirado em Plenário.
Impõe-se, pois, concluir pela improcedência da reclamação.
C ? Decisão
6 ? Destarte, atento tudo o exposto o Tribunal Constitucional decide indeferir a
reclamação e condenar a reclamante nas custas, fixando a taxa de justiça em 20
UCs.
Lisboa, 4/02/2010
Benjamim Rodrigues
João Cura Mariano
Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido, quanto às questões das alíneas a) e b) do
requerimento de interposição de recurso, pelas razões constantes da declaração
de voto apensa ao Acórdão n.º 651/09)
Rui Manuel Moura Ramos