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Proc. nº 155/01 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - Pela decisão sumária proferida a fls. 78 e segs, foi decidido não se tomar conhecimento do objecto do recurso interposto por J..., Lda., ao abrigo do artigo 70º nº. 1 alínea b) da LTC, do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, nos seguintes termos:
'1 – J... Lda, identificada nos autos, recorre para este Tribunal ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea b) da Lei nº 28/82, dizendo no respectivo requerimento de interposição:
'A norma que o recorrente pretende ver declarada inconstitucional ou a interpretação que da mesma se faz nos presentes autos, nomeadamente no douto despacho do Meritíssimo Juiz de Direito do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas e no douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, é a alínea b) do nº 1 e o nº 4 do artigo 389º do Código de Processo Civil. A recorrente considera que a decisão recorrida decidindo no sentido em que o foi, violou, pelo menos, o princípio constitucional do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva, com assento no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, direitos que no presente caso foram negados ou denegados.
................................................................................................................ A questão da inconstitucionalidade foi suscitada pela recorrente nas alegações submetidas à apreciação e apreciação deste Alto Tribunal.' Cumpre decidir, o que se faz ao abrigo do artigo 78º-A da lei nº 28/82, pois é patente que a inadmissibilidade do recurso.
2 – Resulta dos autos o seguinte: Por decisão de 29/4/97 foi decretado o arresto de bens de F...l requerido pela ora recorrente. Em 12/5/97, a recorrente propôs contra aquele F... acção de condenação sob a forma sumária onde pediu a citação edital do réu por este se encontrar ausente em parte incerta. A recorrente publicou os anúncios dos editais para citação do réu, mas não juntou aos autos estes anúncios, só o vindo a fazer depois de notificado para tal por despacho de 31/1/2000. Com data de 3/4/2000, foi proferido no procedimento cautelar o seguinte despacho: 'Uma vez que a acção sumária de que a presente providência é dependência se encontra parada há mais de 30 dias por negligência da aqui requerente em promover os ulteriores termos do processo, declara-se a caducidade da presente providência cautelar, de acordo com o disposto no art. 389º, nº 1, al. b) do CPC.' Deste despacho agravou o ora recorrente, apresentando as seguintes conclusões que interessam para o caso:
'...............................................................................................................
2 – Por mero lapso a recorrente não juntou aos autos os anúncios publicados.
3 – O Mmo Juiz não observou o disposto no nº 4 do artigo 389º do CPC, pois sem prévia audiência da recorrente, decretou a caducidade da providência, pelo que esse despacho está ferido de ilegalidade e deve ser revogado e substituído por outro que declare plenamente válida e eficaz a mesma providência.
4 – O Mmo Juiz por despacho notificado à recorrente em 3/2/200, ou seja, quase 2 anos após o termo do prazo da contestação, notificou-a para, em 10 dias, juntar os anúncios para citação edital do demandado, o que a recorrente de imediato cumpriu.
5 – Em vez de marcar a audiência de julgamento decretou, sem mais, a caducidade da providência decretada, quando deveria notificar, em prazo razoável, ou seja, ainda no ano de 1998, a recorrente para juntar aos autos os mencionados anúncios.
6 – O processo não esteve parado por culpa da recorrente, pois 3 anos passados após a propositura da acção não contestada, não é razoável e justificado que a audiência de julgamento não se tenha realizado e nem sequer tenha sido marcada, mas antes por culpa do próprio Estado, ao não organizar os serviços judiciários, nomeadamente o Tribunal Judicial de Torres Novas, de modo a garantir a todas as pessoas o direito à justiça em prazo razoável, bastando ver o andamento anormal e lentíssimo dos restantes autos apensos aos autos principais.
7 – O despacho recorrido violou, pelo menos, o disposto na al. b) do nº 1 do art. 389º do CPC e, se porventura se mantiver, tal constitui uma interpretação desta disposição não conforme ao art. 20º da Const. Rep. Port.' O acórdão recorrido, que negou provimento ao recurso, começa por justificar a medida prevista no artigo 389º nº 1 alínea b) do CPC – caducidade da providência cautelar – pelo benefício provisório que a providência garante ao requerente assente numa apreciação jurisdicional sumária, impondo-lhe em contrapartida o
ónus de propor a acção e ser diligente em promover o andamento desta acção. Salienta, depois, o incumprimento do requerente, no caso, ao não juntar os anúncios aos autos e o facto de só o ter feito dois anos depois e após notificação para tal, o que, aliás, a lei não impunha. A paragem do processo principal ocorrera por período superior 30 dias
(pressuposto objectivo da causa de caducidade) e por culpa exclusiva do requerente (pressuposto subjectivo). Entende-se no mesmo acórdão que a paragem do processo se deveu a uma omissão culposamente imputada à recorrente 'e não ao mau funcionamento do tribunal de Torres Novas'; 'os atrasos processuais verificados no processo principal (...) não constituiram obstáculos à sua inércia'. Acrescenta que a causa de caducidade tem de ser apreciada com referência ao momento em que ocorreu a inacção da recorrente. Quanto à omissão de notificação prévia, reconhece o aresto que ela se verificou mas, nos termos do artigo 201º nº 1 do CPC, ela não produz nulidade por não estar prescrita na lei nem ter influído no exame ou na decisão da causa 'pois o que a agravante afirmaria não se afastaria daquilo que disse em sede de recurso, ou seja, que foi por mero lapso que não juntou os anúncios'.
3 – Como se disse, a recorrente pretende ver apreciada a constitucionalidade de duas normas: a do nº 4 e da alínea b) do nº 1 do artigo 389º do CPC. Quanto à primeira, é manifesto que a recorrente não suscitou qualquer questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida (artigo
72º nº 1 da Lei nº 28/82. E quanto à segunda ? Em primeiro lugar, impõe-se salientar o verdadeiro fundamento em que a recorrente assenta a 'questão de constitucionalidade'. Não podendo o Tribunal Constitucional por em causa o juízo do tribunal 'a quo' sobre a inércia negligente da recorrente no impulso da acção principal durante mais de 30 dias - o que perfaz todos os pressupostos da caducidade prevista no artigo 389º nº 1 alínea b) do CPC – a discordância da recorrente tem como pano de fundo o confronto entre os efeitos da sua conduta processual e o que diz ser o atraso generalizado dos processos no Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas; este atraso justificaria que não fosse decretada a caducidade do arresto. Ora, com este recorte, a questão não é, a todas as luzes, uma questão de constitucionalidade normativa, única de que cura o Tribunal Constitucional. Não
é, em si, a caducidade prevista naquele preceito legal, nem uma qualquer interpretação da norma feita no acórdão recorrido (ela é a que claramente resulta do preceito) o que a recorrente questiona. Pura e simplesmente, a recorrente entende que a norma não deveria ser aplicada quando a sua inércia ocorre num tribunal que, segundo ela, funciona com grandes atrasos. Seria, assim, a própria decisão judicial que conflituaria com normas e princípios constitucionais, questão que está manifestamente fora da competência do Tribunal Constitucional. Não se verificam, deste modo e também quanto a esta norma, os requisitos do recurso de constitucionalidade previstos no artigo 70º nº 1 alínea b) da Lei nº
28/82.
4 - Decisão: Pelo exposto e em conclusão, decide-se não conhecer do objecto do recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 Ucs.'
Desta decisão, vem agora a recorrente reclamar para a conferência, nos seguintes termos:
'J..., Lda, recorrente nos autos acima identificados, notificada do douto despacho de fls. que não conheceu do objecto do recurso, não se conformando com tal decisão em virtude de lhe ser desfavorável, vem dela, ao abrigo do artigo
78º-A da Lei do Tribunal Constitucional, reclamar, com todas as consequências legais, para a conferência, a fim de proferir decisão sobre a questão, ordenando que se conheça expressamente do mérito do recurso, de modo a ser decidido conforme for de Direito. Pelo exposto, requer-se a V. Exa. se digne admitir a presente reclamação, a fim de ser submetida à apreciação da conferência, a decisão de não conhecer do recurso, de forma a ser proferida decisão, que ordene o conhecimento do mérito do recurso, com todas as consequências legais.'
Cumpre decidir.
2 – Do requerimento da reclamante não constam quaisquer razões ou fundamentos da discordância relativamente ao decidido, nele se limitando a reclamante a afirmar que não se conforma com a decisão por lhe ser desfavorável e que se deve ordenar o conhecimento de mérito do recurso.
Resta, pois, à conferência, reiterar o que foi julgado na decisão reclamada.
3 – Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs.
Lisboa, 18 de Abril de 2001 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa