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Processo n.º 946/08
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Notificado do acórdão n.º 413/2009, que confirmou decisão sumária
de não conhecimento do objecto do recurso, o recorrente A. veio pedir aclaração
e arguir nulidade por omissão de pronúncia, invocando o disposto no artigo 669.º
e na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC.
Além disso, arguiu a nulidade processual que entende decorrer de não
lhe ter sido dada oportunidade para se pronunciar sobre a resposta do Ministério
Público à reclamação.
O Ministério Público sustenta que não há razão para o pedido de aclaração, nem
se verifica a nulidade invocada.
2. Não foi cometida qualquer nulidade processual, por falta de
notificação ao recorrente para se pronunciar sobre o que o recorrente designa
por “parecer” do Ministério Público. Com efeito, a intervenção do Ministério
Público de fls. 1374 a que o recorrente se refere é de simples resposta à
reclamação. O recorrente atacou a decisão sumária; ao Ministério Público – que
em termos de estrutura processual se posiciona como “parte contrária”, sem
prejuízo do estatuto substancial de defensor da legalidade objectiva – exerceu o
contraditório relativamente à pretensão do recorrente. Como o Ministério Público
se limitou a contrariar a argumentação do reclamante, não suscitando aí qualquer
questão nova, não havia lugar a nova intervenção do recorrente.
3. O pedido de aclaração tem cabimento sempre que algum trecho
essencial da sentença – ou acórdão (artigo 716.º do Código de Processo Civil, ex
vi do artigo 69.º da LTC) – seja obscuro (por ser ininteligível o pensamento do
julgador) ou ambíguo (por comportar dois ou mais sentidos distintos).
O texto da decisão que a recorrente transcreve não sofre de qualquer dos vícios
para cuja correcção ou suprimento a lei processual institui o incidente de
aclaração, sendo perfeitamente claro e inequívoco ao enunciar as razões pelas
quais se decidiu não tomar conhecimento do recurso. O requerente procede a
longas transcrições de passagens do processo que não traduzem qualquer dúvida
objectiva. São, antes, a manifestação de divergência com o decidido. Mas para
tanto não serve o incidente deduzido.
Aliás, na decisão sumária e no acórdão que a confirmou não se ignorou que a
recorrente suscitou as questões que refere e as respostas que obteve. O que se
entendeu foi que isso não se traduzia no debate de uma questão de
constitucionalidade normativa, mas na crítica à ponderação concreta efectuada na
sentença, sem enunciação de um critério normativo que se destacasse do caso e
pudesse abrir a porta ao recurso de constitucionalidade.
Assim, o pedido de aclaração tem de ser indeferido porque não traduz uma dúvida
que seja objectivamente justificável face ao texto do acórdão.
4. O acórdão em apreço tomou posição sobre todas e cada uma das questões
suscitadas na reclamação da decisão sumária, não se conseguindo identificar a
partir da argumentação da recorrente qual a precisa questão colocada
relativamente à qual o Tribunal tenha incorrido em omissão de pronúncia.
Lembra-se que a competência do Tribunal em recurso das decisões dos demais
tribunais é a traçada pelo artigo 70.º da LTC. Ora, não se vislumbra na
exposição do recorrente questão que caiba na alínea i) do n.º 1 deste preceito,
porque não houve recusa de aplicação de qualquer norma com fundamento na sua
contraditoriedade com uma convenção internacional, nem o recorrente logrou
identificar qualquer decisão anterior do Tribunal Constitucional nesse domínio
que seja contrariada pela decisão recorrida.
Por outro lado, perante um recurso que só poderia prosseguir ao abrigo da
alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, não se verificando os respectivos
pressupostos específicos de admissibilidade, não há que ponderar o disposto na
Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Essa seria matéria já respeitante ao
mérito do recurso.
Afinal, o que o recorrente pretende é que o Tribunal Constitucional exerça as
suas competências nos moldes de uma acção constitucional de defesa, tutelando o
que entende ser a violação dos seus direitos fundamentais pelo tribunal da
causa, ao proceder como procedeu à valoração dos factos e no modo como resolveu
a concreta ponderação dos valores em conflito. Não é esse, porém, o modelo de
justiça constitucional que a Constituição estabelece, apenas conferindo ao
Tribunal poderes para apreciar a constitucionalidade das normas aplicadas ou a
que tenha sido recusada aplicação e não das decisões em si mesmo consideradas.
5. Decisão
Pelo exposto, indefere-se o pedido de aclaração e a arguição de nulidade
(processual e do acórdão).
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) UC.
Lx. 27/X/2009
Vítor Gomes
Ana Maria Guerra Martins
Gil Galvão