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Processo n.º 986/08
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, a Relatora proferiu a seguinte decisão sumária:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorridos B., S.A. e C.,
S.G.P.S., S.A., foi interposto recurso, ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea
b), da CRP e do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da LTC, dos despachos proferidos
pelo Presidente do Tribunal da Relação de Évora, respectivamente, em 29 de Julho
de 2008 (fls. 26 a 30), em 12 de Setembro de 2008 (fls. 39 a 56) e em 03 de
Novembro de 2008 (fls. 55 a 61), para que seja apreciada a constitucionalidade
das seguintes normas:
i) “688º, nº 1, e 689º, nº 1, do CPC, por infringirem o disposto na Constituição
e o[s] princípios nela consignados, designadamente nos seus artigos 1º, 2º, 20º,
nºs 1 e 4, 32º, nº 9, 202º, 203º, 216º, nº 1, 217º, nº 1, e 218º, conforme
arguido nos requerimentos de 2.5.2008 e 29.9.2008” (fls. 73);
i) “16º do CCJ aprovado pelo Dec. Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, por
infringir o disposto na Constituição e os princípios nela consignados,
designadamente nos seus artigos 2º e 18º, nº 2, conforme arguido nos
requerimentos de 2.5.2008 e 29.9.2008” (fls. 73)
2. Tendo verificado que o recorrente não tinha precisado quais as concretas
dimensões normativas que reputava de inconstitucionais e que os requerimentos
identificados não corporizavam uma suscitação processualmente adequada de
inconstitucionalidades normativas, a Relatora proferiu convite para
aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso. Notificado para tal,
o recorrente esclareceu o seguinte:
“Interpretações normativas dos sindicados artigos 688°, nº 1, e 689°, nº 1, do
CPC, e peças processuais em que foi arguida a sua inconstitucionalidade:
4.1. O primeiro sentido normativo arguido é o da própria letra dos
preceitos sindicados, na versão que deles constava antes da Lei nº 6/2007, de 2
de Fevereiro, e do Decreto Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, segundo a qual um
acto jurisdicional pode ser praticado por uma entidade não designada pelo
Conselho Superior da Magistratura, para o efeito, à qual não podem ser aplicadas
as normas dos artigos 122° a 136° do CPC, e mediante mera “resolução”.
4.2. O segundo sentido normativo arguido é o de que no âmbito das
“resoluções” proferidas por entidade não designada para o efeito pelo Conselho
Superior da Magistratura, à qual não podem ser aplicadas as normas dos artigos
122° a 136° do CPC, não tenham de ser apreciadas e decididas as razões
justificativas da impugnação da decisão reclamada.
4.3. O terceiro sentido normativo arguido é o de que as “resoluções”
proferidas por entidade não designada para o efeito pelo Conselho Superior da
Magistratura, à qual não podem ser aplicadas as normas dos artigos 122° a 136°
do CPC, não são passíveis de impugnação nos termos do disposto nos artigos 666°.
nºs 2 e 3, 667°, nº 1, 668°, nº 1, e 669°, nºs 1, alínea a), e 2, do CPC.
4.4. As peças processuais em que se invocou a respectiva
inconstitucionalidade, foram os requerimentos de 2.5.2008 e 29.9.2008, conforme
consta, aliás, do requerimento de interposição do recurso.
5. Tais sentidos normativos foram aplicados nos despachos recorridos,
designadamente nos termos seguintes:
5.1. No despacho de 29.7.2008, indeferindo a arguição de
inconstitucionalidade das normas em causa, dizendo: “Após a sua eleição, os
presidentes e vice-presidentes mantêm inalterado, incólume o seu estatuto de
juízes, não sofrendo as garantias e incompatibilidades estabelecidas no artigo
216° da Lei Fundamental, por mínima que seja, qualquer compressão, sendo certo
que a inamobilidade e a irresponsabilidade (de todos os juízes) bem como a
dedicação exclusiva constituem componentes necessários da independência dos
juízes, garantia essencial da independência dos tribunais”.
5.2. No despacho de 12.9.2008, recusando a apreciação da denúncia de uso,
no processo objecto da reclamação e do respectivo recurso, de falsificação de
documentos, dizendo: “Recortado o seu campo de aplicação, é manifesto que a
reclamação a que alude o cit. art. 688°, não é o meio idóneo para decidir as
questões suscitadas pelo Reclamante”; e “Na presente reclamação, insiste-se, há
apenas que indagar se o recurso interposto tem subida imediata ou diferida,
havendo, por isso, de expurgar de consideração as questões pelo Reclamante
suscitadas”.
5.3. No despacho de 3.11.2008, fundamentando a respectiva “resolução” na
interpretação de que: “na presente reclamação se discute apenas se o recurso
interposto tem subida imediata ou diferida “.
6. Interpretações normativas do sindicado artigo 16° do CCJ/96, e peças
processuais em que foi arguida a sua inconstitucionalidade:
6.1. O sentido normativo arguido, é o de que as reclamações deduzidas ao
abrigo e para efeito do disposto nos artigos 667°, nº 1, 669°, nºs 1, alínea a)
e b), do CPC, e 242°, nº 1, alínea b), e 245° do CPP, em reclamações do artigo
688°, nº 1, do CPC, na redacção anterior ao Dec. Lei nº 303/2007, de 24 de
Agosto, deduzidas em processo de rectificação de registo predial instaurado em
23.11.1994, ao abrigo do disposto no artigo 127°, nº 1, do Código do Registo
Predial, cujo valor de causa é de 2 (duas) UC, as custas podem ser fixadas em 7
(sete) UC.
6.2. As peças processuais em que foi invocada essa inconstitucionalidade,
são os requerimentos de 8.9.2008 e 29.9.2008, já indicadas, aliás, no
requerimento de interposição do recurso.
7. O despacho em que tal norma foi aplicada é o de 12.9.2008, nos termos
seguintes:
7.1. “Daí também que, no montante da taxa de justiça a pagar (pelos que
podem) pela utilização dos serviços de justiça não deixe de se reflectir, de
algum modo, o carácter manifestamente improcedente (ou dilatório) das questões
incidentais”.
7.2. Esta norma foi enunciada no despacho de 3.11.2008. ” (fls. 81 a 82).
Cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo” (cfr.
fls. 75), com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula
o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal,
pelo que se deve começar por apreciar se estão preenchidos todos os pressupostos
de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
Se o Relator verificar que não foram preenchidos alguns desses pressupostos,
pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do
artigo 78º-A da LTC.
4. Tendo sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, o
presente recurso só pode ser conhecido se tiver sido cumprido o ónus processual
de prévia e adequada suscitação da inconstitucionalidade normativa perante o
tribunal recorrido.
Começando pela a norma extraída do n.º 1 do artigo 689º do CPC, é evidente que o
recorrente nunca suscitou qualquer inconstitucionalidade, seja na reclamação
deduzida em 02 de Maio de 2008 (fls. 2 e 3) – em que apenas menciona o artigo
688º, n.º 1, do CPC – seja no pedido de reforma de custas deduzido em 29 de
Setembro de 2008 (fls. 48 a 50), nem em qualquer outro requerimento junto aos
autos. Como tal, o Tribunal Constitucional não pode conhecer de tal questão de
inconstitucionalidade normativa, por força do n.º 2 do artigo 72º da LTC.
5. Quanto à norma extraída do n.º 1 do artigo 688º do CPC, o recorrente também
não suscitou adequadamente a sua inconstitucionalidade no requerimento de
reforma de custas deduzido em 29 de Setembro de 2008.
É certo que na reclamação deduzida em 02 de Maio de 2008, o recorrente
confrontou o tribunal “a quo” (neste caso, representado pelo respectivo
Presidente) com uma questão de inconstitucionalidade normativa, tendo alegado,
designadamente que:
“(…)
b) para assegurar essa independência os tribunais têm de
ser constituídos por juízes designados pelo órgão de soberania previsto no artº
218º da Constituição, por tempo indeterminado,
(…)
e) os presidentes e vice-presidentes das Relações são
designados por colégios eleitorais que não constituem órgãos de soberania,
(…)
g) as normas e princípios consagrados nos artºs 122º a 136º, do CPC, não
exequíveis relativamente à designação feita no artº 688º do CPC” (fls. 2)
Ainda que de modo pouco preciso, tal formulação poderia ser tida por suficiente,
na medida em que permitiu ao tribunal ora recorrido confrontar-se com uma
questão de inconstitucionalidade que – aliás – apreciou no despacho que
indeferiu a reclamação, proferido em 29 de Julho de 2008 (fls. 26 a 30). Resta,
porém, avaliar se a decisão recorrida aplicou efectivamente a dimensão normativa
reputada de inconstitucional pelo recorrente.
Segundo o recorrente, a decisão recorrida teria aplicado o artigo 688º, n.º 1,
do CPC, nos seguintes sentidos:
i) “(…) o da própria letra dos preceitos sindicados, na versão que deles
constava antes da Lei nº 6/2007, de 2 de Fevereiro, e do Decreto Lei nº
303/2007, de 24 de Agosto, segundo a qual um acto jurisdicional pode ser
praticado por uma entidade não designada pelo Conselho Superior da Magistratura,
para o efeito, à qual não podem ser aplicadas as normas dos artigos 122° a 136°
do CPC, e mediante mera “resolução”;
ii) “(…) o de que no âmbito das “resoluções” proferidas por entidade não
designada para o efeito pelo Conselho Superior da Magistratura, à qual não podem
ser aplicadas as normas dos artigos 122° a 136° do CPC, não tenham de ser
apreciadas e decididas as razões justificativas da impugnação da decisão
reclamada.”;
iii) “(…) o de que as “resoluções” proferidas por entidade não designada para o
efeito pelo Conselho Superior da Magistratura, à qual não podem ser aplicadas as
normas dos artigos 122° a 136° do CPC, não são passíveis de impugnação nos
termos do disposto nos artigos 666°. nºs 2 e 3, 667°, nº 1, 668°, nº 1, e 669°,
nºs 1, alínea a), e 2, do CPC”.
Começando pelo primeiro dos sentidos normativos, as decisões recorridas nunca
adoptaram aquele entendimento. Pelo contrário, o despacho que rejeita a
reclamação, proferido em 29 de Julho de 2008, é claríssimo ao afirmar que –
ainda que posteriormente eleitos – o Presidente e os Vice-Presidentes dos
Tribunais de Relação são designados para o exercício de funções jurisdicionais
(fls.28), que posteriormente são densificadas pela lei ordinária, pelo Conselho
Superior de Magistratura. Nunca aquela decisão acolheu a ideia de que “uma
entidade não designada pelo Conselho Superior de Magistratura” pode praticar
actos próprios da função jurisdicional.
É igualmente incontestável que aquele despacho nunca acolheu o entendimento de
que aqueles membros do Tribunal da Relação ficam isentos das garantias de
imparcialidade expressas nos artigos 122º a 136º do CPC, tendo antes afirmado
que “após a sua eleição, os presidentes e vice-presidentes mantêm inalterado,
incólume, o seu estatuto de juízes, não sofrendo as garantias e
incompatibilidades estabelecidas no art.º 216º da Lei Fundamental, por mínima
que seja, qualquer compressão” (fls. 28). Analisados os restantes despachos
recorridos, constata-se que os mesmos nem sequer abordam tal questão.
Não tendo sido efectivamente aplicado o primeiro sentido normativo especificado
pelo recorrente, quanto ao n.º 1 do artigo 688º do CPC, este Tribunal não pode
conhecer do presente recurso, na parte que a ele se refere, por força do artigo
79º-C da LTC.
Quanto ao segundo sentido normativo, na parte em que coincide com o primeiro
sentido normativo, importa remeter para a fundamentação já supra desenvolvida, a
esse propósito. Na parcela que constitui inovação, afigura-se igualmente
incontestável que nenhum dos despachos recorridos aplicou aquela norma no
sentido de que “não tenham de ser apreciadas e decididas as razões
justificativas da impugnação da decisão reclamada” (fls. 81), conforme pretende
o recorrente. Pelo contrário, o despacho de 29 de Julho de 2008 apreciou e
decidiu as questões colocadas pelo recorrente na reclamação, ainda que em
sentido que lhe foi desfavorável (fls. 29 e 30). Assim, mais uma vez, por força
do artigo 79º-C da LTC, não pode este Tribunal conhecer do recurso quanto ao
segundo sentido normativo extraído do n.º 1 do artigo 688º do CPC, que o
recorrente reputa de inconstitucional.
Por fim, quanto ao terceiro sentido normativo, é claro que nenhuma das decisões
recorridas aplicou o n.º 1 do artigo 688º do CPC, no sentido de que, em sede de
reclamação de despacho que rejeitou recurso, não seria admissível deduzir
“impugnação nos termos do disposto nos artigos 666°. nºs 2 e 3, 667°, nº 1,
668°, nº 1, e 669°, nºs 1, alínea a), e 2, do CPC” (fls. 81). Desde logo, o
despacho proferido em 29 de Julho de 2008 não se debruça sobre questões que
envolvessem a aplicação daqueles preceitos legais.
Para além disso, os despachos proferidos em 12 de Setembro e 03 de Novembro de
2008 nunca afirmaram ser inadmissível a impugnação de decisões proferidas em
incidentes de reclamação com fundamentos nos artigos 666° n.ºs 2 e 3, 667°, n.º
1, 668°, n.º 1, e 669°, n.ºs 1, alínea a), e 2, do CPC. O que sucedeu nos autos
foi que o tribunal recorrido entendeu que, naquelas específicas circunstâncias
do caso em apreço, não se justificava proceder a qualquer rectificação de erro
material ou a qualquer aclaração do despacho proferido em 29 de Julho de 2008.
Porém, os despachos proferidos em 12 de Setembro e 03 de Novembro de 2008 nunca
excluíram que fosse possível a rectificação material ou a aclaração de despacho
proferido em incidente de reclamação, desde que existissem fundamentos para tal.
Ora, o Tribunal Constitucional não dispõe de poderes para se substituir aos
tribunais ordinários quanto à aferição concreta do preenchimento de requisitos
legais para a rectificação material ou aclaração, na medida em que tais questões
apenas envolvem a interpretação de normas infra-constitucionais.
Pelo exposto, conclui-se que também não é possível tomar conhecimento do objecto
do presente recurso, quanto ao terceiro sentido normativo reputado de
inconstitucional pelo recorrente, na medida em que aquele não foi efectivamente
aplicado pela decisão recorrida, conforme exigido pelo artigo 79º-C da LTC.
6. Por último, atentemos na alegada inconstitucionalidade do artigo 16º do CCJ,
na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 324/2003, por permitir que sejam fixadas
custas em 7 (sete) unidades de conta pela dedução de pedidos de rectificação
material e de aclaração deduzidos em relação a despacho que indeferiu reclamação
de despacho que rejeitou a subida de recurso ordinário, cujo valor estipulado
corresponde a 2 (duas) unidades de contas, por corresponder ao valor matricial
do prédio em discussão na acção principal.
Reiterando que este Tribunal só pode conhecer da constitucionalidade de
interpretações normativas que tenham sido efectivamente aplicadas pelos
tribunais recorridos, conforme decorre do artigo 79º-C da LTC, há que averiguar
se este pressuposto se verifica. Ora, a decisão recorrida – proferida em 03 de
Novembro de 2008 – não se limita a afirmar que o artigo 16º do CCJ permite a
fixação da obrigação de pagamento de 7 (sete) unidades de conta por dedução de
pedidos de rectificação material e de aclaração. O sentido interpretativo da
decisão recorrida é bem mais amplo e profundo. A decisão recorrida foi
inequívoca ao afirmar que aquele montante de custas só foi fixado em função da
manifesta improcedência das questões suscitadas e da persistência do ora
recorrente em utilizar meios processuais inidóneos para impugnar decisões que já
não eram passíveis de impugnação. Neste sentido, veja-se:
“Não se questiona o direito do Reclamante de pedir esclarecimentos de
obscuridades ou de ambiguidades que uma sentença ou despacho detenham (…). O que
não pode consentir-se é que, sob a roupagem de um pedido de esclarecimento, o
Reclamante – na realidade – manifeste o seu inconformismo, a sua discordância
relativamente a uma decisão e peça, não a sua aclaração, as, por via oblíqua, um
aditamento.” (fls. 57 e 58);
“Diga-se, por último, que (…) na ponderação da proporcionalidade, aplicados os
critérios legais (complexidade, processado a que deu causa, natureza
manifestamente dilatória) não deve ser de todo em todo expurgada de consideração
a manifesta improcedência das questões suscitadas.” (fls. 60)
“Nos tempos que correm, em que a crise da justiça – tema recorrente – se
identifica, fundamentalmente, com a morosidade, a lentidão da justiça, não podem
os tribunais malbaratar o tempo com incidentes manifestamente improcedentes (…).
Daí que tais incidentes não possam deixar de ser tributados.
Daí também que, no montante da taxa de justiça a pagar (pelos que podem) pela
utilização dos serviços de justiça não deixe de se reflectir, de algum modo, o
carácter manifestamente improcedente (ou dilatório) das questões incidentais.”
(fls. 61).
Destes extractos decorre que a decisão recorrida não aplicou efectivamente a
interpretação normativa reputada de inconstitucional, tendo antes aplicado uma
interpretação normativa segundo a qual seria admissível a fixação de custas no
valor de 7 (sete) unidades de conta, quando os incidentes processuais – como
entendeu suceder nos presentes autos – sejam manifestamente improcedentes. Ora,
o recorrente não identificou no requerimento de aperfeiçoamento do recurso
apresentado qualquer alusão a esta interpretação normativa, razão pela qual este
Tribunal também não deve conhecer da questão relativa à inconstitucionalidade do
artigo 16º do CCJ, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 324/2003, nos termos
do artigo 79º-C da LTC.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A
da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º
13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se não conhecer do objecto do presente
recurso.
Custas devidas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 7
UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de
Outubro.» (fls. 85 a 94)
2. Após ter sido notificado da referida decisão sumária, o
recorrente veio apresentar o seguinte requerimento, referindo-se a um anterior
requerimento por si apresentado em 29 de Janeiro de 2009, ou seja, em momento
anterior à prolação da decisão sumária:
«Por via da notificação recebida em 22.6.2009, o arguente depreende que o dito
requerimento ainda não foi apreciado.
Assim, ao abrigo do disposto nos artigos 78º, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro (LTC), e 266º, nº 1, e 660º, nº 2, do Código de Processo Civil (CPC), o
Recorrente/Arguente reitera o teor do sobredito requerimento de cuja apreciação
resulta a anulação dos termos subsequentes ao cometimento da nulidade processual
arguida, ex vi o disposto no artigo 201º, nºs 1 e 2, do mesmo código – sendo que
a aplicação destes preceitos adjectivos é imposta pelo disposto no artigo 69º da
LTC.» (fls. 99)
3. Notificados deste requerimento, os recorridos deixaram esgotar o prazo de
resposta, sem que viessem aos autos reagir processualmente.
Cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
4. Apesar de dirigir expressamente o requerimento de fls. 99 à Relatora dos
presentes autos, afigura-se evidente que o recorrente apenas pretende colocar em
crise a própria decisão sumária proferida, invocando uma pretensa nulidade da
mesma (a saber: a alegada omissão de denúncia da prática de um alegado crime,
por força do artigo 245º do CPP e do artigo 201º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Justifica-se, portanto que se proceda à convolação deste requerimento em
reclamação para a conferência., como tem sido, aliás, o entendimento unânime do
Tribunal Constitucional que, para além, de proceder, invariavelmente, à
apreciação de alegadas nulidades, em sede de reclamação (a título de exemplo,
vejam-se os Acórdãos n.º 431/2000, n.º 135/2003, n.º 26/2004, n.º 67/2004, n.º
367/2004, n.º 65/2006, complementado pelo Acórdão n.º 282/2006, e n.º 283/2006,
disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt), já teve mesmo oportunidade de
frisar que a sede própria para discussão de alegadas nulidades de decisões
sumárias proferidas é precisamente a reclamação para a conferência, prevista no
n.º 3 do artigo 78º-A da LTC (assim, ver Acórdãos n.º 541/06 e n.º 709/07, ambos
disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt).
Assim sendo, restaria saber, face ao uso indevido de um meio processual que não
se encontra previsto na lei que rege a tramitação dos recursos perante o
Tribunal Constitucional, se a Relatora deveria rejeitar liminarmente tal
requerimento – por manifesta ausência de previsão legal – ou se, pelo contrário,
tal acto processual poderia ser aproveitado, mediante convolação em reclamação
para a conferência prevista no n.º 3 do artigo 78º-A da LTC.
A este propósito, o Acórdão n.º 541/06 já afirmou a seguinte linha de raciocínio
que ora se retoma:
“No caso dos presentes autos, optou‑se, em vez do não conhecimento do “falso
pedido de aclaração” com o consequente trânsito em julgado da decisão sumária,
pela qualificação do pretenso “pedido de esclarecimento” como “reclamação para a
conferência” da mesma decisão, o que ao Tribunal era lícito fazer, já que não
está condicionado pela qualificação jurídica feita dessa peça processual pela
parte apresentante, em manifesta desconformidade com a sua substância. Trata‑se,
no fundo, do cumprimento da regra, emergente do princípio da tutela
jurisdicional efectiva, constitucionalmente consagrado, que manda privilegiar as
decisões de mérito em detrimento das decisões de mera forma, e que corresponde
ao dever de os tribunais providenciarem oficiosamente pelo andamento regular e
célere do processo (artigo 265.º, n.º 1, do Código de Processo Civil – CPC),
determinando a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo
(artigo 265.º‑A do CPC), o que inclui a faculdade de convolação dos meios
processuais incorrectamente utilizados (cf., a título de exemplo, o disposto no
artigo 688.º, n.º 5, do CPC).
Nesta mesma linha jurisprudencial se inserem, por último, o Acórdão
n.º 379/2006, que decidiu tratar como reclamação para a conferência um
“requerimento de aclaração” de decisão sumária no qual não se apontava nenhum
problema de interpretação desta, mas apenas se revelava discordância quanto à
afirmação, nela contida, de que não fora definida pelo recorrente qualquer
questão de inconstitucionalidade normativa, e o Acórdão n.º 427/2006, que
desatendeu arguição de nulidade do Acórdão n.º 362/2006, arguição fundada em
este Acórdão ter decidido como reclamação para a conferência um requerimento
designado por “arguição de nulidade” de decisão sumária, referindo o Tribunal
que, não obstante tal requerimento não ter sido formalmente designado pelo
requerente como “reclamação para a conferência”, a verdade é que, atento o seu
conteúdo, era esse o meio processual a que correspondia, sendo, por outro lado,
inquestionável, desde logo por força dos princípios da economia e da adequação
processuais, que o tribunal que proferiu certa decisão tem o poder‑dever de
corrigir a incorrecta qualificação jurídico‑processual de certa pretensão do
recorrente, tratando‑a nos quadros da reclamação para a conferência quando, em
termos substanciais, apesar de invocadas pretensas ou ficcionadas nulidades, o
que se pretende é a pura e simples impugnação da decisão sumária proferida.”
Na linha da jurisprudência supra citada, reforça-se que a convolação do
requerimento apresentado em reclamação para a conferência insere-se precisamente
no pleno exercício dos poderes-deveres constitucionais que foram conferidos a
este Tribunal e, em especial, do dever de respeito e de implementação do direito
de acesso a uma tutela jurisdicional efectiva, necessariamente célere (artigo
20º, n.ºs 1 e 4, da CRP) e que se traduz, no plano infra-constitucional, nos
artigos 2º, n.º 1, 265º, n.º 1 e 266º, n.º 1, todos do CPC, aplicáveis “ex vi”
artigo 69º da LTC. Deste modo, impõe-se que este Tribunal conheça da questão
colocada, mesmo que não tenha sido deduzida – de forma expressa – reclamação
para a conferência.
E nem se diga que tal norma padece de qualquer inconstitucionalidade, pois é
manifesto que assim não é, conforme já decidido pelo Acórdão n.º 402/09
(disponível in www.tribunalconstitucional.pt).
5. Nos presentes autos, o recorrente invoca um requerimento apresentado, em 29
de Janeiro de 2009 (fls. 78 a 82), através do qual alegou que a alegada
preterição de um dever de denúncia de alegado crime, por parte da Relatora,
configuraria uma omissão de acto imposto por lei, pelo que o despacho que
convidou o recorrente a aperfeiçoar o requerimento de interposição de recurso
padeceria de nulidade e, como tal, inquinaria subsequentemente qualquer decisão
a proferir – incluindo a decisão proferida posteriormente proferida nos autos.
Diga-se, desde já, que não lhe assiste qualquer razão. Tendo o recorrente
incluído uma “QUESTÃO INCIDENTAL” (fls. 66) no requerimento de interposição de
recurso, através da qual pretendia que a Relatora procedesse à denúncia de um
alegado crime de denegação de justiça, tal questão só seria susceptível de
apreciação em sede de decisão sumária. Ora, o despacho de convite ao
aperfeiçoamento (fls. 76) não constituía o momento processual adequado ao
eventual conhecimento de tal questão. Assim, afigura-se evidente que aquele
despacho não padece de qualquer nulidade.
Após notificado da decisão sumária que rejeitou conhecer do objecto do recurso,
o recorrente vem afirmar que “o dito requerimento não foi apreciado” (fls. 99),
invocando – ainda que indirectamente a nulidade da própria decisão sumária, em
função da alegada nulidade do despacho de convite ao aperfeiçoamento. Mais uma
vez, o recorrente não tem qualquer razão. Conforme já supra demonstrado, o
despacho de convite ao aperfeiçoamento não padece de qualquer nulidade, pelo
que, consequentemente, também a decisão sumária ora reclamada não padece de
qualquer nulidade.
Aliás, ao não conhecer do objecto do presente recurso, a decisão sumária
rejeita, implicitamente, qualquer dever de denúncia do alegado crime. Conforme
bem conhecido pelo recorrido – na medida em que assim tem sido, inabalável e
reiteradamente decidido por este Tribunal, em inúmeros outros autos em que o
mesmo recorrente, por vezes até na condição de mandatário forense, colocou
questão idêntica – cfr, a mero título de exemplo, despacho de 08 de Junho de
2009, no âmbito do Proc. n.º 902/08. Assim reitera-se que:
“(…) o dever de denúncia previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 242º, do
Código Penal, apenas recai sobre os “funcionários” nela identificados quando
estes se deparem com “crimes de que tomarem conhecimento no exercício das suas
funções e por causa destas”. Ora, a Relatora não tomou conhecimento de qualquer
“crime” no exercício das suas funções. As considerações tecidas pelo recorrente
quanto à alegada falsificação de um documento devem ser por si provadas perante
um tribunal criminal, não dispondo o Tribunal Constitucional de poderes,
atribuídos pela Constituição ou pela lei, para aferir da responsabilidade penal
de indivíduos ou de pessoas colectivas. A mera afirmação pelo recorrente de que
foi praticado um crime não é geradora de qualquer dever de denúncia de factos
alegadamente constitutivos de um determinado tipo de crime. Bom seria que o
recorrente levasse esse seu temerário entendimento até às últimas consequências
e apresentasse ele próprio a respectiva queixa pela prática dos factos que
(apenas) ele reputa de criminosos.
Mais uma vez, constata-se não haver fundamento legal para a nulidade arguida. A
invocação do artigo 201º do CPC é, aliás, absurda, na medida em que aquele
preceito legal apenas se refere a omissões de actos processuais e não a deveres
externos ao processo. Como é evidente para qualquer destinatário diligente, o
dever de denúncia consagrado no artigo 242º do CPP configura um dever de
carácter pessoal que recai sobre o indivíduo que é momentaneamente titular do
título de “funcionário”, não sendo configurável como acto inserido em
determinado processo judicial, muito menos em sede de recurso de
constitucionalidade.
Por outro lado, ainda que o artigo 201º do CPC seja aplicável “ex vi” artigo 69º
da LTC, é manifesto que nem a lei comina de nula a omissão daquele dever de
denúncia – que como já demonstrado não recai sobre a Relatora –, nem tão pouco
tal omissão pode influir sobre o exame do recurso de constitucionalidade
interposto nos presentes.
Deste modo, não foi cometida qualquer nulidade processual, pelo que não se
verifica qualquer omissão a suprir.»
Posto isto, torna-se evidente que a decisão sumária proferida nos autos
rejeitou, ainda que implicitamente, o pedido do recorrente para que a Relatora
procedesse à denúncia de um alegado crime de denegação de justiça. Tanto assim é
que o próprio recorrente vem agora reclamar – ainda que de modo não confessado –
daquela mesma decisão sumária, afirmando que da alegada nulidade do despacho de
convite ao aperfeiçoamento “resulta a anulação dos termos subsequentes ao
cometimento da nulidade processual arguida” (fls. 99).
Tudo visto, conclui-se, assim, que nem o despacho de aperfeiçoamento proferido,
em 15 de Janeiro de 2009 (fls. 76), nem a decisão sumária ora reclamada padecem
de qualquer nulidade, pelo que mais não resta do que indeferir a presente
reclamação, devidamente convolada.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto no do n.º 3 do artigo
78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei
n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC’s, nos
termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 11 de Novembro de 2009
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Rui Manuel Moura Ramos