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Processo n.º 304/09
3.ª Secção
Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão e em
que é recorrente o Ministério Público, foi proferida a seguinte decisão:
[…] ao abrigo do disposto do art. 204.º, da CRP, recuso a aplicação das normas
que a seguir se referem com fundamento na respectiva inconstitucionalidade e
ilegalidade nos termos infra enunciados:
– Inconstitucionalidade orgânica e material da norma constante do art. 17.º,
n.º 1, da Portaria n.º 114/2008 (alterada pelas Portarias n.º 457/2008, de 20 de
Junho, 1538/2008, de 30 de Dezembro) por violação do disposto nos art. 164.º,
al. m) (reserva legislativa absoluta da AR), art. 215º, n.º 1 (unidade do EMJ),
art. 2.º (separação de poderes) e 203.º (independência dos tribunais e dos
juízes), todos da CRP;
– Inconstitucionalidade material da norma constante do art. 138.º A do CPC
interpretada no sentido de que a mesma remete para Portaria do Ministro da
Justiça a regulação das disposições processuais relativas a actos dos
magistrados nos termos depois regulados no art. 17.º, n.º 1, da Portaria n.º
114/2008, por violação do disposto nos arts. 112º, n.º 5 (tipicidade) da CRP.
– Ilegalidade da norma constante do art. 17º, n.º 3, da Portaria n.º
114/2008, interpretada à luz do art. 2.º, al. c) do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de
2 de Agosto (substituição da assinatura autógrafa pela assinatura electrónica),
por violação do disposto no art. 157.º, n.ºs 1 e 3, do CPC.
(…)
2. Desta decisão interpôs recurso o Ministério Público, em requerimento com o
seguinte teor:
O presente recurso tem em vista a apreciação da inconstitucionalidade:
– Do artigo 17.º, n.º 1 da Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro (alterada
pelas Portarias n.º 457/2008, de 20 de Junho e n.º 1538/2008, de 30 de
Dezembro), cuja aplicação foi recusada no referido despacho com fundamento na
violação dos artigos 2.º, 164.º, alínea m), 203.º e 215.º, n.º 1, todos da
Constituição da República Portuguesa;
– Do artigo 138.º‑A do Código de Processo Penal, na parte em que remete para
portaria a regulação das disposições processuais relativas a actos dos
magistrados, cuja aplicação foi recusada no referido despacho com fundamento na
violação do disposto no artigo 112.º, n.º 5 da Constituição da República
Portuguesa.
O presente recurso tem ainda em vista a apreciação da legalidade da norma
constante do art. 17º nº 3, da Portaria nº 114/2008, interpretada à luz do art.
2º, al. c), do Decreto-Lei nº 290-D/99, de 2 de Agosto – substituição da
assinatura autografa pela assinatura electrónica – por violação do disposto no
art. 157º nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil.
3. Admitido o recurso no Tribunal e ordenada a produção de alegações, o
Ministério Público, após abandonar a questão de (i)legalidade colocada no
requerimento de interposição do recurso, concluiu assim as suas:
1.º A norma constante do artigo 138º-A, do Código de Processo Civil, ao admitir
que constem de diploma meramente regulamentar – portaria do Ministério da
Justiça – aspectos atinentes ao regime dos actos processuais, nomeadamente a
previsão da sua prática em suporte electrónico e a respectiva regulamentação
adjectiva, não viola o princípio constante do artigo 112º, nº 5, da Constituição
da República Portuguesa.
2º A norma constante do nº 1 do artigo 17º da Portaria nº 114/08, alterada pelas
Portarias nºs 457/08 e 1538/08, ao prever que os actos dos magistrados devam ser
praticados em suporte electrónico, através do sistema CITIUS (sem,
naturalmente, precludir ou pôr em causa os princípios estruturante, afirmados,
nomeadamente, pelos artigos 265º e 265º-A do Código de Processo Civil) não tem
natureza estatutária, versando apenas sobre a matéria da forma de actos
processuais, não pondo em causa os princípios constitucionais da independência
dos tribunais, da separação de poderes e da unidade estatutária dos juízes dos
tribunais judiciais.
3º Termos em que deverá proceder o presente recurso.
II
4. A questão de constitucionalidade colocada pelo presente recurso foi
entretanto julgada pelo Tribunal Constitucional. No Acórdão n° 293/2009
(disponível em www.tribunalconstitucional.pt), tirado em Plenário, em que
estavam em causa precisamente as mesmas normas desaplicadas em caso idêntico ao
dos autos, decidiu o Tribunal “não julgar inconstitucional a norma constante do
artigo 138°-A, do Código de Processo Civil, com a redacção resultante do
Decreto-Lei n° 303/2007, de 24 de Agosto, na parte em que remete para portaria a
regulação das disposições processuais relativas a actos dos magistrados”, nem “a
norma constante do artigo 17°, n° 1, da Portaria n° 114/2008, de 6 de
Fevereiro”, e, em consequência, determinar a “reforma da decisão recorrida, em
conformidade com o presente julgamento”.
Esta decisão do Plenário é integralmente transponível para os presentes autos.
Assim, pelas razões constantes do Acórdão n° 293/2009, para as quais se remete e
que aqui se reiteram, há que conceder provimento ao recurso.
III
Decisão
Em face do exposto, decide o Tribunal Constitucional:
a) não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 138.º- A, do Código
de Processo Civil, com a redacção resultante do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24
de Agosto, na parte em que remete para Portaria a regulação das disposições
processuais relativas a actos dos magis8trados;
b) não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 17.º, n.º 1, da
Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro; e, em consequência,
c) conceder provimento ao recurso, determinando-se a reforma da decisão
recorrida, em conformidade com o presente julgamento.
Sem custas.
Lisboa, 8 de Julho, de 2009
Maria Lúcia Amaral
Vítor Gomes
Carlos Fernandes Cadilha
Ana Maria Guerra Martins
Gil Galvão