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Processo n.º 70/09
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. A., S.A e Outras, ora Recorrentes, inconformadas com o despacho do Secretário
de Estado dos Assuntos Fiscais, ora Recorrido, que indeferiu os pedidos de
isenção de SISA por si apresentados e relativos à transmissão de prédios entre
empresas abrangidas pelo regime de tributação pelo lucro consolidado,
interpuseram recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul.
Por Acórdão de 21 de Novembro de 2006, proferido nesse Tribunal, foi dado
provimento ao recurso, e consequentemente, decidido anular o despacho recorrido.
Inconformado, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais interpôs recurso para
o Supremo Tribunal Administrativo. A questão colocada era a de saber qual o
momento relevante para a verificação dos pressupostos para a concessão da
isenção de SISA e quando deveria aplicar-se a norma do artigo 7.º, n.º 3, da Lei
n.º 30-G/2000. O Supremo Tribunal entendeu, e ao contrário do que tinha sido
decidido pelo TCA Sul, que o pressuposto da constituição do benefício fiscal na
esfera jurídica do contribuinte seria a transmissão dos prédios, assim
concedendo provimento ao recurso do SEAF, revogando o aresto recorrido e negando
provimento ao recurso contencioso.
Disse-se, no Acórdão, e no que ora importa:
“E a verdade é que, em nosso julgamento, a Administração Fiscal fez acertada
aplicação da lei.
Com efeito, depois da entrada em vigor da Lei n. ° 30-G/2000, de 29 de Dezembro,
e como está escrito supra — «logo que as sociedades deixem de estar abrangidas,
nos três exercícios seguintes ao da transmissão, pelo regime da tributação pelo
lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de
sociedades» — deixam «de beneficiar da isenção de imposto municipal de sisa as
transmissões anteriores à entrada em vigor da presente lei (...)».
E, assim, as transmissões operadas em momento posterior «à entrada em vigor da
presente lei» deixaram, a fortiori, de beneficiar da isenção de imposto
municipal de sisa — pois que o n. ° 31.º do artigo 11.º do Código do Imposto
Municipal de Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, norma de previsão da
isenção, como se disse, «é revogado» pelo n. ° 3 do artigo 7. ° da Lei n. °
30-G/2000, de 29 de Dezembro.
Na verdade, «à entrada em vigor da presente lei», no ano de 2001, já não
vigorava o n. ° 31 do artigo 11.º, do Código do Imposto Municipal da Sisa e do
Imposto sobre Sucessões e Doações, a conferir isenção de sisa às «transmissões
realizadas entre sociedades autorizadas (...)».
E o que é facto é que os imóveis em foco, para cuja transmissão foi requerida a
isenção de sisa, ou ainda não foram transaccionados, ou foram-no (apenas) no ano
de 2001 — consoante se assenta no probatório.
As sociedades recorridas, nas conclusões da sua contra-alegação, sugerem que
«Qualquer outra interpretação deste preceito, designadamente a empreendida pelo
Recorrente no Despacho recorrido e em todo o processo judicial nele originado, é
violadora (...) do princípio da Igualdade, para além de que, ao interferir e
revogar os direitos à isenção constituídos em 2000, estabelece uma
retroactividade em matéria de elementos essenciais do imposto, a qual é proibida
pelos artigos 103.° da Constituição (...)».
Mas nenhuma razão pode ser reconhecida ao argumento das recorridas. Desde logo,
porque, contrariamente ao que alegam as recorridas, a Administração Fiscal, no
presente caso, como se viu, não está a «interferir e revogar os direitos à
isenção constituídos em 2000». Com efeito, o direito à isenção, como beneficio
fiscal que é, e como se disse, constitui-se à data da verificação dos
respectivos pressupostos. E o que a lei revogatória (Lei n. ° 30-G/2000, de 29
de Dezembro) preceitua é que a isenção de sisa de «transmissões anteriores»
deixa de existir sim, mas precisamente e só na falta de um dos pressupostos
legais da sua existência e subsistência: o terem as sociedades deixado «de estar
abrangidas, nos três exercícios seguintes ao da transmissão, pelo regime da
tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos
lucros de sociedades».
Estamos, deste modo, a dizer, e em resposta ao thema decidendum, que as
sociedades ora recorridas não podem no caso beneficiar da isenção de sisa com
previsão no n.º 31 do artigo 11.º do Código do Imposto Municipal da Sisa e do
Imposto sobre Sucessões e Doações.”
Interpuseram então as Recorrentes recurso para o Pleno da Secção do Contencioso
Tributário do STA, invocando oposição entre o Acórdão recorrido, proferido por
aquela secção a 16/01/08, e o Acórdão da mesma secção, de 18/04/07. Aí se
decidiu que, não tendo o Acórdão invocado como fundamento do recurso transitado
em julgado, não se verificava um dos pressupostos do recurso com fundamento em
oposição de acórdãos, “pelo que o recurso fica sem efeito (artigo 766.º, n.º 2
do CPC). Termos em que acordam em julgar findo o recurso.”
Mais uma vez inconformadas, as Recorrentes interpuseram recurso para o Tribunal
Constitucional, dizendo no seu requerimento:
“A., S.A. e outras, melhor identificadas nos autos, notificadas, na sua
qualidade de Recorridas, do douto Acórdão que julgou sem efeito e findo o
Recurso com fundamento em oposição de acórdãos interposto do Acórdão que, por
sua vez, concedeu provimento ao Recurso interposto de decisão proferida pelo
Tribunal Central Administrativo por Sua. Exa. o Senhor Secretário de Estado dos
Assuntos Fiscais (SEAF), vêm, ao abrigo dos artigos 6°, 70.º, n.ºs 1, alínea b),
2 e 6, 71°, n. ° 1, 72°, n.ºs 1, alínea b) e 2, 75°, n. °s 1 e 2, 75°-A, n.ºs 1
e 2, e 76°, n. ° 1, todos da Lei n. ° 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal
Constitucional), dele interpor recurso para o Tribunal Constitucional, uma vez
que o mesmo aplicou uma norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o
processo (cfr. alínea b) do n. ° 1 do artigo 70° da Lei aludida).
A norma em causa é o n. ° 3 do artigo 7° da Lei n. ° 30-G/2000, de 29 de
Dezembro, a qual viola os Princípios Constitucionais da Igualdade, da Protecção
da Confiança, da Justiça e da Boa-fé na actuação da Administração,
sub-princípios do Princípio do Estado de Direito democrático, previstos nos
artigos 2°, 13°, 103°, n. ° 3, e 266° da Constituição da República Portuguesa,
conforme oportunamente as ora Recorrentes arguíram em sede de Recurso para o
Tribunal Central Administrativo, de Resposta às alegações de Recurso para o
Supremo Tribunal Administrativo apresentadas pelo SEAF e do Recurso com
fundamento em oposição de acórdãos (docs n.ºs 1 a 4).”
Notificadas para alegar, vieram dizer o seguinte:
A. A utilização das palavras ‘transmissões realizadas’ no n. ° 31 do artigo 31°
do CIMSISSD serve apenas para esclarecer qual o objecto da isenção em questão
(seria o mínimo exigível à lei) — de nenhum modo é possível extrapolar
automática e inequivocamente dos termos expressos da norma a consideração da
efectiva transmissão como um requisito de verificação necessária ao
reconhecimento da isenção.
B. Se assim fosse, nunca o acto de reconhecimento ministerial que deve ser
requerido poderia ser emitido (como é, por regra) antes da efectiva transmissão
— os sujeitos passivos teriam de proceder às transacções, pagar o devido imposto
e só depois requerer o reconhecimento da isenção, perante o qual teriam de
solicitar o reembolso do montante pago; ora, não é esse o modo de funcionamento
do benefício.
C. A referência às ‘transmissões realizadas’ tem, pois, de ser devidamente
contextualizada e, nessa medida, entendida no sentido que as mesmas teriam de se
realizar ‘enquanto entre as entidades envolvidas existisse uma relação de grupo
fiscal’. É que, no fundo, essa referência representa, se quisermos, uma condição
de manutenção de um benefício já concedido e não um pressuposto da sua concessão
(de resto, as sociedades beneficiárias não ficavam obrigadas a utilizar o
benefício concedido, se, já depois do despacho relevante, desistissem da
operação subjacente).
D. A isenção em causa constitui um benefício fiscal e, como tal, não deve
contrariar o regime geral do EBF, de acordo com o qual o acto administrativo de
reconhecimento de benefícios fiscais tem, por regra, ‘efeito meramente
declarativo’ (n. ° 2 do artigo 4°) e o direito ao benefício se reporta à data de
verificação dos respectivos pressupostos, ‘ainda que esteja dependente de
reconhecimento declarativo pela Administração fiscal’ (artigo 11.º).
E. Desta forma, o direito à isenção constitui-se no momento de preenchimento dos
pressupostos materiais e respectivo impulso processual (pedido escrito) — no
caso concreto, como os requerimentos foram entregues em 25/12/2000 e 29/12/2000
(durante a vigência do n. ° 31 do artigo 11° do CIMSISSD) e nesse momento todas
as sociedades envolvidas se encontravam enquadradas no mesmo perímetro de
consolidação administrativamente autorizado (o que não é contestado pelo SEAF),
é nesses dias que identificamos o momento da sua constituição.
F. Nada importam, portanto, as vicissitudes legais posteriores — o direito à
isenção estava já perfeitamente consolidado na esfera das Recorrentes e o EBF,
no n. ° 4 do seu artigo 12°, proíbe a diminuição dos direitos adquiridos dos
contribuintes por acto unilateral do Estado, se aqueles não tiverem deixado de
cumprir as suas obrigações decorrentes do benefício (o que, obviamente, não
aconteceu no caso sub judice).
G. Mais do que ser a que melhor se coaduna com o regime geral do EBF, a
interpretação das Recorrentes é também a única que respeita os princípios legais
e constitucionais da Justiça e da Boa-fé na actuação da Administração (artigos
266° da Constituição e 55° da Lei Geral Tributária — LGT), e, principalmente, os
da Igualdade (artigos 13° da Constituição e 55° da LGT) e da Segurança Jurídica
e da Protecção da Confiança, Ínsitos no Princípio do Estado de Direito (artigo
2° da Constituição).
H. Quanto ao Princípio da Igualdade (o qual é indissociável do Princípio da
Justiça), este é violado na medida em que, desde logo, a obter vencimento a
posição do SEAF e do Acórdão recorrido, dois contribuintes exactamente nas
mesmas condições veriam as suas situações decididas de forma diametralmente
oposta se, reunindo ambos todos os requisitos substanciais para a isenção e
tendo igualmente requerido o seu reconhecimento no mesmo dia (por exemplo,
29/12/2000), um o obtivesse nessa data e o outro apenas recebesse a pronúncia
ministerial algum tempo depois.
1. É precisamente por não ser, de todo, crível que o legislador permitisse esta
inconstitucionalidade e ilegalidade, esta discriminação fiscal dependente tão-só
da celeridade ou lentidão do órgão decisor, que só a interpretação das
Recorrentes pode valer quanto ao Direito em crise — o reconhecimento
administrativo do beneficio fiscal tem efeito declarativo e este constitui-se no
momento da emissão do pedido formal.
J. A concessão de uma isenção ou de qualquer outro beneficio não pode, num
sistema jurídico presidido por um princípio de tratamento igual de todos perante
a lei, estar dependente da natureza mais ou menos destemida, mais ou menos
afoita, de cada um dos notários, do perfil mais ou menos temerário dos
contribuintes, ou ainda de factores completamente alheios a estes
(designadamente, da data em que são notificados do despacho que defere ou
indefere o reconhecimento do beneficio).
K. Assim, o regime transitório do n. ° 3 do artigo 7° — ao estabelecer
literalmente que deixam de beneficiar da isenção de Sisa as transmissões
anteriores à entrada em vigor da Lei 30-G/2000 logo que as sociedades deixem de
estar abrangidas, nos três exercícios seguintes ao da transmissão, pelo regime
de tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos
grupos de sociedades — só é interpretável (ou seja, só é enquadrável no sistema
jurídico-constitucional vigente) se à referência às ‘transmissões’ dermos o
sentido de uma referência à ‘constituição do direito à isenção’.
L. Já no que diz respeito ao Princípio da Protecção da Confiança, facilmente se
compreende que a interpretação que o douto Acórdão recorrido partilha com o
SEAF, a obter vencimento, implicaria sempre a promoção de uma evidente
retroactividade de normas tributárias à categoria da mais impoluta legalidade e
constitucionalidade — com efeito, estaríamos então a admitir a aplicação de uma
determinada lei a factos ocorridos antes da entrada em vigor dessa mesma lei,
com a revogação de direitos plenamente constituídos ao abrigo de um outro quadro
normativo.
M. De resto, o Princípio da Segurança Jurídica e da Protecção da Confiança
traduz (e, por isso, encontra-se em estrita ligação com) o Princípio essencial
da Boa-fé da actuação da Administração, o qual seria igualmente violado, na
medida em que estaríamos a dar acolhimento legal à possibilidade de esta, num
determinado caso concreto, actuar de modo contraditório com uma outra sua
actuação anterior na qual o contribuinte fundadamente confiou.
N. Seja como for, a verdade é que, mesmo considerando que a efectiva transmissão
do imóvel constitui um pressuposto para o reconhecimento da isenção (tese de
que, como vimos, as Recorrentes discordam e de cuja refutação não prescindem),
nem assim esse pressuposto seria suficiente para sustentar a posição do SEAF e
do Acórdão recorrido, uma vez que a norma revogatória do n. ° 3 do artigo 7° da
Lei n. ° 30-G/2000, de 29 de Dezembro, precisamente por violar o Princípio da
Confiança, seria inconstitucional e, portanto, inaplicável ao caso concreto.
O. Se o legislador, na norma revogatória do n. ° 3 do artigo 7° da Lei n. °
30-G/2000, tiver efectivamente pretendido referir as ‘transmissões’ e não, como
atrás defendemos, a ‘constituição do direito à isenção’, ressalta então à
evidência que lhe pretendeu atribuir eficácia retroactiva.
P. A proibição constitucional da retroactividade das normas tributárias (e não
só) abrange, desde logo, os graus de retroactividade normalmente assinalados
pela Doutrina como de ‘retroactividade propriamente dita’, entre os quais se
contam os casos em que a lei nova se aplica a factos passados sem respeitar os
efeitos jurídicos já produzidos por esses factos.
Q. Ora, na situação em apreço, as entidades envolvidas encontraram-se sempre
sujeitas ao regime de tributação dos grupos de sociedades (em 2000, o regime de
tributação do lucro consolidado; posteriormente, o regime especial de tributação
dos grupos de sociedades), pelo que, da circunstância de as transmissões de bens
gozarem de isenção de SISA desde que as mesmas se operem durante o exercício em
que vigorar a autorização para a tributação segundo o regime do lucro
consolidado, resulta estar-se na mesma perante a referida situação de
retroactividade propriamente dita.
R. Ou seja, o regime introduzido pelo n. ° 3 do artigo 7° da Lei n. ° 30-G/2000,
de 29 de Dezembro, afecta indubitavelmente os efeitos jurídicos já produzidos
por factos ocorridos antes da sua entrada em vigor, sendo as Recorrentes
atingidas nos seus direitos então adquiridos — é que, para além do mais, o n. °
2 do artigo 2° do Decreto-Lei n. ° 215/89, de 1 de Julho (diploma preambular do
Estatuto dos Benefícios Fiscais), dispõe que são direitos adquiridos, entre
outros, os benefícios temporários e condicionados, e, conforme bem sublinha o
Acórdão do STA de 18/04/2007, ‘não há qualquer dúvida de que no predito artigo
11.º, n° 31 está implícita a concessão de um benefício temporário, uma vez que
só é concedida a isenção desde que, como vimos, as transmissões se operem
durante o exercício em que vigorar a autorização para a tributação segundo o
regime do lucro consolidado’.
S. Por outro lado, a aplicação do n° 3 daquele artigo 7° atinge a convicção do
contribuinte de que gozava da isenção durante este período, afectando
expectativas juridicamente criadas, o que, também por si, viola o princípio
constitucional da confiança integrante do princípio do Estado de Direito.
T. Nos termos aludidos, o n. ° 3 do artigo 7° da Lei n. ° 30-G/2000, de 29 de
Dezembro, seria materialmente inconstitucional e, dessa forma, absolutamente
inaplicável ao caso concreto.
U. Assim, em resumo, a situação decidenda permite apenas duas soluções
possíveis: ou consideramos que o n. ° 3 do artigo 7° da Lei n. ° 30-G/2000, de
29 de Dezembro, lhe é aplicável — e, então, o Tribunal a quo deveria ter
conformado a interpretação do mesmo com as regras do regime geral dos benefícios
fiscais e da Constituição de que depende, no sentido de que a efectiva
transmissão do imóvel não constitui um pressuposto para o reconhecimento da
isenção em causa —; ou, pelo contrário, consideramos aquele preceito, à partida,
materialmente inconstitucional (nos termos sobreditos) e, portanto, inaplicável
no caso concreto (situação que conduziria à constatação de que o Despacho do
SEAF em crise e o Acórdão do STA que o julgou válido estariam, afinal, feridos
de ilegalidade, por erro nos pressupostos de Direito).
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a
declaração de inconstitucionalidade do n. ° 3 do artigo 7° da Lei n. °
30-G/2000, de 29 de Dezembro, pelo menos com a interpretação que lhe é dada pelo
douto Acórdão recorrido, e todas as demais consequências legais.”
O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais contra-alegou no sentido de ser
negado provimento ao recurso.
Respondendo ao despacho do Relator convidando-as a pronunciarem-se sobre a
eventualidade de o recurso não ser conhecido pelo facto de a dimensão
interpretativa impugnada não corresponder à ratio decidendi do acórdão recorrido
bem como pelo facto de não ter ocorrido suscitação adequada da questão da
inconstitucionalidade, responderam as Recorrentes do seguinte modo:
“No nosso caso, resulta manifesto dos autos que as Recorrentes foram sempre, ao
longo de todo o processo (em primeira instância — no Tribunal Central
Administrativo — e em sede de contra-alegações de recurso para o Supremo
Tribunal Administrativo, bem como de recurso por oposição de Acórdãos deste
mesmo Tribunal), pugnando expressa e inequivocamente pela inconstitucionalidade
da norma do n.° 3 do artigo 7° da Lei n.° 30- G/2000, de 29 de Dezembro, na
interpretação segundo a qual dele resulta que a transmissão efectiva de um
imóvel constitui um pressuposto fundamental do beneficio fiscal da isenção de
SISA em causa nos autos, tendo pois sido sempre estabelecida uma distinção
explicita entre a posição das Recorrentes e aquela que se revelou partilhada
pelo Exmo. Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF) e pelo
Supremo Tribunal Administrativo (STA), no Acórdão que julgou procedente o
recurso daquele.
De resto, como facilmente se extrai dos autos, a questão da
inconstitucionalidade da norma em crise (ou da dimensão interpretativa que
acabou por vingar na instância infra-constitucional) constitui o verdadeiro
núcleo da argumentação das Recorrentes, não se tendo estas limitado a tecer
considerações genéricas ou referências não concretizadas aos princípios
constitucionais cuja violação alegam, antes descrevendo as possíveis
consequências práticas da aplicação da norma que justificam a conclusão de que
esta viola os princípios constitucionais invocados.
Portanto, desde o início do processo que as Recorrentes suscitaram uma situação
de inconstitucionalidade normativa, contestando a conformidade com a Lei
Fundamental da norma que configura o arrimo do Despacho do SEAF e do Acórdão do
STA (pelo menos na dimensão interpretativa com que a essas sedes ela serve de
suporte), de tal modo que a este último (e ao TCA) foi dada a oportunidade
processual para apreciar essa controvérsia antes de esgotado o seu poder
jurisdicional.
De facto, nunca as Recorrentes se bastaram com a mera discordância com a
interpretação recorrida, tendo pelo contrário identificado para lá de qualquer
dúvida a interpretação efectivamente aplicada e violadora da Constituição, de
forma a que os julgadores a pudessem indicar devidamente nas suas decisões.
Aliás, de tal modo assim foi que o douto Acórdão recorrido analisa efectivamente
a questão da constitucionalidade do n.° 3 do artigo 7° da Lei n.° 30- G/2000, de
29 de Dezembro, atribuindo-lhe a interpretação que as Recorrentes sempre
contestaram e considerando-a, assim, expressamente, uma norma revogatória do
beneficio fiscal em causa nos autos perfeitamente válida (desde logo, do ponto
de vista constitucional). Ou seja, é precisamente por força deste preceito que a
isenção de Sisa não é reconhecida pelo STA às Recorrentes, razão pela qual só
podemos concluir que o mesmo, na precisa interpretação que aquelas identificaram
e contestaram, constitui a verdadeira ratio decidendi da decisão recorrida.”
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
Questão Prévia
O recurso interposto funda-se no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC e cabe
das decisões dos tribunais que tenham aplicado norma cuja inconstitucionalidade
haja sido suscitada pelo Recorrente durante o processo.
Ora, verifica-se que as recorrentes não suscitaram, em termos adequados, a
questão de constitucionalidade da aludida norma.
Relembremos as conclusões da alegação produzidas para o Supremo Tribunal
Administrativo, nomeadamente as constantes de fls. 721 dos autos:
“G. Ao negar as isenções de Sisa solicitadas, o Despacho recorrido violou os
artigos 4° e 11° do EBF.
H. O mesmo confunde a constituição com o exercício do direito á isenção, ou
seja, o seu nascimento (verificação dos pressupostos materiais e impulso
processual) com a sua execução (a transmissão isenta),
I. Violando os princípios legais e constitucionais da Igualdade (artigos 13° da
Constituição e 55° da LGT), da Justiça e da Boa-fé na actuação da Administração
(artigos 266° da Constituição e 55° da LGT).
J. A admitir a interpretação errada e abusiva do SEAF, teríamos que dois
contribuintes, exactamente nas mesmas circunstâncias quanto aos pressupostos
materiais e formal da isenção, veriam as suas situações conformadas de modo
diverso, com beneficio do que fosse mais temerário (que celebra a escritura de
transmissão do imóvel antes do reconhecimento ministerial), do que encontre um
notário mais afoito (que aceite uma isenção ainda não reconhecida) ou do mais
bafejado pela sorte (que vê o seu requerimento respondido de forma mais célere).
K. O artigo 7°, n.° 3, da Lei n.° 30-G/2000 não legitima o acto recorrido, pois,
apesar de falar em ‘transmissão’, pretende significar ‘constituição do direito’,
já que entre as duas realidades não medeia, normalmente, muito tempo e esta
conduz logicamente àquela.”
E quando a última conclusão citada alude a que o artigo 7.º, n.º 3 da Lei n.º
30-G/2000 não legitima o acto recorrido, “pois apesar de falar em ‘transmissão’,
pretende significar ‘constituição do direito’”, verifica-se, claramente que as
recorrentes afrontam a decisão recorrida, em si, não apontando nenhuma questão
de constitucionalidade que, como se disse, não foi, efectivamente, suscitada.
Não pode, assim, o Tribunal conhecer do recurso.
III – Decisão
Nestes termos, acordam, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional, não tomar
conhecimento do recurso interposto.
Custas pelas Recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 12 (doze) UC.
Lisboa, 24 de Junho de 2009
José Borges Soeiro
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão
Rui Manuel Moura Ramos