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Processo n.º 29/09
1ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Inconformado com o despacho de arquivamento do inquérito criminal que tinha
sido aberto contra A. e outros, na sequência de uma denúncia crime por si
apresentada, veio B. requerer a abertura da instrução. Realizada a instrução,
foi proferido pelo Juiz Conselheiro instrutor do processo no Supremo Tribunal de
Justiça, em 12 de Março de 2008, despacho de não pronúncia.
2. Inconformado com este despacho, o assistente e ora recorrente apresentou, em
1 de Abril de 2008, um requerimento (fls. 479/489) onde veio pedir:
“I — que esclareça em que ponto do processo o assistente requereu a ordem ao M°
P° e a devolução do inquérito ao referido magistrado – insinuada e mesmo
expressamente referida em I do despacho — na qual vem a fundamentar-se a recusa
da prova.
(Pelo contrário, no despacho de 20/2 era da falta de contornos crimes que se
tratava)
II— Mais requer:
a) - que, por falta de notificação de despacho sobre requerimento de arguição de
nulidades e para que fosse dada sem efeito a marcação do debate instrutório,
referido em I — sejam anulados os actos posteriores ao referido requerimento,
entre eles, o debate, o encerramento da instrução e o despacho de não pronúncia.
b) — que seja proferido esse despacho — deferindo-se a produção da prova
constante do rol.
E que tal despacho lhe seja notificado.
c) - que se conheça das nulidades atrás apontadas sob a designação de
contradições, entretanto ocorridas.
d) - vista a reconhecida relevância das pontuações nos factores da graduação —
que seja deferido o requerimento de 14 de Fevereiro, conforme foi agora indicado
pelo senhor Vice-Procurador-Geral, no documento junto com esse requerimento.
Mandando V. EX,ª notificar o senhor Vice-Presidente do CSM para que, após melhor
busca do documento, o forneça ao processo;
e) - que seja anulada a fixação de honorários ao defensor dos denunciados, pois
que tal nomeação não tem fundamento legal, antes que se haja praticado o acto de
constituição de arguidos”.
3. Por despacho de 18 de Abril de 2008 (fls. 494/497), foi este requerimento
totalmente indeferido. Notificado, o requerente veio novamente aos autos,
através de requerimento (fls. 499/501), desta vez para, em síntese, solicitar:
“a) - que seja esclarecido o conteúdo das referidas folhas 462 e 463, sobre a
pretensa notificação do despacho referido em I, à mandatária do assistente — a
fim de se saber qual o meio de notificação que foi utilizado.
b) — Caso se refira a telecópia - que o senhor funcionário seja mandado
informar:
- se a mandatária do assistente consta da lista (condicionante da validade do
uso desse meio de notificação) a que se refere o Decreto-Lei n° 28/92,
organizada pela Ordem dos Advogados e enviada aos tribunais.
c) - que o despacho (que terá indeferido a arguição das nulidades) lhe seja
notificado por carta registada — uma vez que tal notificação não foi recebida.
d) — que sejam anulados os actos subsequentes a esse despacho — por estarem
prejudicados, por falta da respectiva notificação, e visto ainda o disposto no
artigo 122° n° 1 do CPP.
Uma vez que não se trata de reclamação de indeferimento de alguma ou algumas
diligências — mas de arguida nulidade por (absoluta) insuficiência da
instrução”.
4. Este requerimento foi totalmente indeferido pelo despacho, proferido em 21 de
Maio de 2008 (fls. 509/511). Para assim decidir, ponderou o Juiz Conselheiro
Relator:
“Um dos princípio(s) fundamentais do direito adjectivo é o da preclusão com o
significado preciso de que, decorrido o momento processual próprio para a
prática do acto processual, terminou o ciclo em que era possível a mesma prática
e o procedimento processual avança para a fase seguinte. A preclusão tem o
significado concreto da uma proibição de retrocesso no andamento processual que,
a existir, sujeitaria o processo a uma inadmissível recuperação de prazos
terminados.
O requerimento deduzido pelo assistente é atípico nesta fase processual pois que
em última análise, e após esclarecimento prestado relativamente a decisão final
de arquivamento, vem requerer novamente a nulidade de actos processuais
praticados e relativamente a matéria em relação à qual já existiu uma pronúncia
deste tribunal.
Nota-se, ainda, a inatendível mudança de argumentário, pretendendo configurar
como notificação para convocação de diligência a notificação do despacho que
incidiu sobre o requerimento por si formulado a fls 450 e seguintes. Omite o
requerente que a notificação para a diligência designada se efectuou por carta
registada com a.r. emitida em 28 de Fevereiro de 2008 e, não existindo qualquer
decisão em sentido contrário, era óbvia a manutenção da data da mesma
diligência.
Por qualquer forma, e precludido o prazo de arguição de nulidade não há agora
lugar ao seu conhecimento, -artigo 120 do Código de Processo Penal.
Lateralmente, para esclarecimento do requerente, dir-se-á, ainda, que em termos
de regras gerais de notificação válidas em processo penal dispõe o artigo 113
n°10 do diploma citado que as notificações aos advogados, quando outra coisa não
resultar da lei podem, também, ser feitas por telecópia.
Relativamente ao esclarecimento de fls. 462 e 463 o requerente esclarecer-se-á
através da consulta do processo quando entender por conveniente
Indefere-se, assim, o requerido”.
5. Notificado deste despacho, o requerente veio, em 17 de Junho de 2008 (fls.
517/537), recorrer para a secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça. Na
mesma peça processual aproveitou ainda para recorrer do “não notificado despacho
que terá incidido sobre a arguição de nulidades da instrução” e do “prejudicado
despacho de não pronúncia”. Por despacho de 8 de Outubro de 2008 (fls. 557) foi
decidido não admitir “o recurso interposto do despacho que incidiu sobre a
arguição de nulidades da instrução, proferido em 11 de Março de 2008, bem como
do despacho de não pronúncia, proferido em 12 de Março de 2008”, em ambos os
casos por se encontrar “excedido o prazo a que alude o artigo 411º do Código de
Processo Penal”, bem como por “do despacho que indefere os actos requeridos nem
sequer existir a possibilidade legal de recurso – artigo 291 do mesmo diploma
legal”. Foi ainda decidido admitir o recurso interposto do despacho proferido em
21 de Maio de 2008, para subir imediatamente e em separado.
6. Desta decisão reclamou o requerente para o Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça (fls. 571/575) que, por despacho de 3 de Dezembro de 2008 (fls. 695),
decidiu não conhecer daquela reclamação.
7. Notificado desta decisão, o recorrente apresentou, em 11 de Dezembro de 2008,
um recurso para o Tribunal Constitucional, através do seguinte requerimento:
“[...], notificado do despacho do senhor Presidente do STJ, de 3/12/2008 — que
não conheceu da reclamação a que se refere o artigo 405° n° 1 do CPP, do
despacho de V. Ex.ª., de 8/10/2008 - na parte em que não admitiu os recursos,
para a secção criminal, do não notificado despacho que terá incidido sobre
arguição da nulidade por insuficiência da instrução (de ora em diante
simplesmente designado por despacho sobre a arguida nulidade) e do prejudicado
despacho de não pronúncia — vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional,
nos termos seguintes.
I - Esgotamento dos meios ordinários e despacho recorrido
[...]
Por segurança processual, o recorrente assim procedeu — na reclamação renovando
a arguição de inconstitucionalidades, já arguidas perante a instância recorrida.
Visto o não conhecimento da reclamação — despacho recorrido é:
- o despacho do senhor Juiz Conselheiro de Instrução Criminal, de 8/10/2008 -
quanto à interpretação do artigo 291° do CPP que o fundamentou, considerando
inadmissível o recurso do despacho sobre nulidades da instrução.
-O despacho recorrido invocou ainda o decurso do prazo legal sobre a notificação
do despacho.
Este é objecto do recurso no Proc° n° 3455/08/3ª secção criminal - agora também
interposto - o que é mais uma razão do requerimento de apensação de ambos os
recursos que no final se apresenta.
Além da falta de notificação (no escritório da mandatária, não havia o aparelho
de fax, de que, só depois da interposição do recurso, o M° P° veio falar) - a
nenhuma referência, no despacho de não pronúncia, à arguida insuficiência da
instrução — e por contraste com a única referência à arguida insuficiência do
inquérito — foram razões fortes para fazer crer que nem tal despacho fora
proferido. E daí o requerimento de 31/3, para que fosse proferido e declarado
prejudicado o despacho de não pronúncia. (Conclusão 9ª)
E, enquanto subsistir esta nulidade da instrução (falta de notificação) não pode
iniciar-se o prazo de impugnação dessa eventual decisão. (Acórdão do TC, n.º
186/2004, de 23/3/2004 — DR II série de 11/5/2004)
Sem a notificação — o processo não poderia avançar.
II - Este recurso tem efeito suspensivo e sobe nos próprios autos.
E é interposto nos termos do artigo 70° n° 1 b) da LOTC.
III - Os preceitos constitucionais ofendidos são os artigos 13º, 20º nºs 1, 4 e
5 da CR. Sem prejuízo dos poderes de cognição do douto Tribunal Constitucional,
nos termos do artigo 79°-C da LOTC, conforme jurisprudência do TC.
Preceito cuja inconstitucional interpretação foi arguida é o artigo 291º nºs 1 e
2. E foram-no ainda os dos artigos 120º n.º 2 d) e n.º 3, e 399º do CPP.
O despacho recorrido só fez expressa citação do artigo 291°.
IV - A inconstitucionalidade na interpretação dos referidos preceitos foi
arguida no acto de interposição (3° parágrafo) do recurso para a secção criminal
— aí se remetendo para a sua motivação, nomeadamente em III, VI e nas conclusões
2ª, 3ª e 4ª.
Perante o tribunal a quo, o assistente alegou a distinção entre:
- a rejeição de actos inúteis ou dilatórios, que não é impugnável por via de
recurso — mas por reclamação (artigo 291° do CPP).
- e a arguição de nulidade, por insuficiência da instrução, cujo indeferimento é
susceptível de recurso, caindo na previsão do artigo 399° do CPP.
E considerou que ofende os artigos 13° e 20° nºs 1, 4 e 5 da CR. - uma
interpretação que considere esta última insusceptível de recurso, confundindo
tal nulidade com a rejeição de actos inúteis.
(O artigo 291° não é do CC, como por manifesto lapso se indicou na conclusão 4ª
(3 linha) mas do CPP, como logo se corrigiu na mesma conclusão.)
A mesma distinção é feita no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 719/2005, de
20/12/2005, no processo n° 1000/05, 2ª secção.
Tal como no douto Acórdão, e nas suas palavras textuais:
- «... objecto do recurso ...não é o despacho que indeferiu as diligências de
prova, mas sim o despacho que indeferiu a arguição de nulidade do anterior
despacho...»
Para tal recorda que «em processo penal, a regra é a recorribilidade «dos
acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não estiver
prevista na lei.» (artigo 399° do CPP).
E cita ainda o assento do STJ n.º 6/2000, decidindo que é recorrível o despacho
sobre arguição de nulidades arguidas no inquérito ou na instrução.
E, no mesmo sentido, o Acórdão de fixação de jurisprudência n° 7/2004 — segundo
o qual «sobe imediatamente o recurso da parte da decisão instrutória respeitante
às nulidades arguidas no decurso do inquérito ou da instrução e às demais
questões prévias ou incidentais, mesmo que o arguido seja pronunciado pelos
factos constantes da acusação do Ministério Público.
Por maioria de razão, quando o despacho seja de não pronúncia.
E ainda os despachos do Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, nos seus
despachos de 27/11/2003) processo nº 8941/2003-9) e de 2/11//2004 (processo n°
5996/2004-6), segundo os quais «cabe recurso ordinário do despacho que indeferiu
a arguição de nulidade por insuficiência de instrução...»
Não prejudica o requisito da adequada arguição da inconstitucionalidade, no
tribunal recorrido, se este, apesar de tal arguição, evita o seu conhecimento —
como é também jurisprudência do douto Tribunal Constitucional.
Requer ao Tribunal Constitucional que — em conformidade com a citada
jurisprudência — seja feita a apreciação da inconstitucionalidade do preceito do
artigo 291° do CPP, quando interpretado segundo o entendimento constante do
despacho de 8/10/2008, do Exm° Juiz Conselheiro de Instrução Criminal”.
8. Por despacho de 15 de Dezembro de 2008, foi o recorrente notificado para
“esclarecer qual a decisão objecto de recurso para o Tribunal Constitucional”,
tendo respondido a esta solicitação através do requerimento apresentado em 12 de
Janeiro de 2009 (fls. 698/699). Na sequência, foi o recurso de
constitucionalidade referido em 7. supra, interposto do despacho de 8 de Outubro
de 2008, admitido no Supremo Tribunal de Justiça através de despacho em 14 de
Janeiro de 2009 (fls. 701).
9. Entretanto, na sequência do despacho proferido em 8 de Outubro de 2008 (fls.
557), em que havia sido decidido, entre o mais, admitir, para subir em separado,
o recurso interposto do despacho proferido em 21 de Maio de 2008, foi proferido
pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 19 de Novembro de 2008, acórdão a negar
provimento a este recurso. Em síntese, fundamentou assim o Tribunal a sua
decisão:
“[...] Decidindo, dir-se-á que o requerimento do assistente B. A. ora em
apreciação, atenta a fase procedimental em que foi apresentado, ou seja, após a
prolação da decisão instrutória, mostra-se processualmente descontextualizado,
sendo notoriamente extemporâneo e absolutamente descabido.
Com efeito, com tal requerimento o assistente pretende pôr em causa actos
processuais praticados na fase inicial da instrução, todos eles produzidos antes
do debate instrutório, actos que há muito se sedimentaram, os quais, obviamente,
são agora insusceptíveis de impugnação.
Conforme preceito do artigo 120º, n.°s 1, 2, alínea d) e 3, do Código de
Processo Penal, a nulidade resultante da insuficiência de inquérito ou da
instrução deve ser arguida até ao encerramento do debate instrutório, sob pena
de sanação.
Por outro lado, a falta de notificação do assistente relativamente a despacho
judicial, constitui mera irregularidade do processo, que só determina a
invalidade — artigo 118°, n.°s 1 e 2 e 123°, n. ° l, do Código de Processo Penal
— quando arguida pelo interessado nos três dias seguintes a contar daquele em
que haja sido notificado para qualquer termo do processo ou intervindo em algum
acto nele praticado.
Por outro lado, ainda, certo é que proferida a decisão instrutória, sem embargo
da possibilidade de dedução do incidente de correcção e/ou de aclaração e da
arguição de nulidade da decisão instrutória por pronúncia do arguido por factos
que constituam alteração substancial dos factos descritos na acusação ou no
requerimento para abertura da instrução, a impugnação daquela decisão e das
decisões interlocutórias, quer incidam ou não sobre questões procedimentais, tem
de ser exercida mediante recurso a interpor nos termos gerais, com a limitação
prevista no n.° 1 do artigo 310° do Código de Processo Penal.
Para além disso, não é admissível o pedido de aclaração de decisão aclaratória —
artigos 669° e 670°, do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi artigo
4°, do Código de Processo Penal[...].
E de acordo com os artigos 668° a 670°. do Código de Processo Civil, o pedido de
aclaração da decisão e a arguição de nulidades, têm de ser apresentados com o
recurso, sendo deduzidos na respectiva motivação.
O despacho recorrido não merece, pois, qualquer censura ou reparo”.
10. O recorrente, em 5 de Dezembro de 2008, apresentou recurso deste Acórdão
para o Tribunal Constitucional, através de um requerimento que tem o seguinte
teor:
“[...], notificado do douto acórdão de 19/11/08— vem dizer a V. Ex.ª:
I - O recurso agora julgado é incindível dos restantes, interpostos pelo mesmo
requerimento – cuja não admissão está pendente de decisão de reclamação, para o
senhor Presidente do STJ (Doc 1).
Já que todos têm por fundamento a nulidade por não notificação do despacho que
terá incidido sobre a arguição de nulidade por insuficiência da instrução.
Não notificação que é fundamento directo, do presente recurso – e conexo, dos
restantes.
Só a separação do conhecimento desses recursos – obrigando à reclamação -
possibilitou a invocação de fundamentos como o da preclusão, para a
improcedência deste recurso.
Razão porque
A subida ao Tribunal Constitucional, do recurso que agora interpõe, terá de
aguardar a decisão sobre a admissão desses outros recursos.
Sob pena de se reincidir na divisão do conhecimento das mesmas questões — com
nova perversão dos princípios processuais – não se assegurando a defesa dos
direitos das partes.
II - O assistente vem interpor, para o Tribunal Constitucional, recurso do
acórdão de 19/11/2008.
Tem efeito suspensivo e sobe nos próprios autos.
O recurso é interposto nos termos do artigo 70° n° 1 b) da LOTC.
Os preceitos cuja inconstitucional interpretação foi arguida são os dos artigos
111º a 113° do CPP e 259° do CPC, aplicável ex vi artigo 4° do CPP.
Os preceitos constitucionais ofendidos são os artigos 13º, 20º nºs 1, 4 e 5da
CR.
Sem prejuízo dos poderes de cognição do douto Tribunal Constitucional, nos
termos do artigo 79°-C da LOTC, conforme jurisprudência do TC.
O assistente não foi notificado do despacho que terá indeferido a arguida
nulidade por insuficiência da instrução. (conclusão 1ª da motivação do recurso)
Insuficiência absoluta, já que, na instrução, (como no inquérito) não foi
admitida a produção da totalidade da prova documental e testemunhal.
[...]
Objecto do acórdão recorrido é aquela não notificação (referida na conclusão lª)
constituindo nova nulidade da instrução - nulidade que foi também
tempestivamente arguida, por requerimento de 31 de Março (artigos 1°- a), 2° e
4° desse requerimento) - e prejudicando o despacho de não pronúncia (artigo 122°
n° 1 do CPP).
[...]
Não notificada foi também a fundamentação do indeferimento daquela notificação –
por remissão para o que se disse constar de certas folhas do processo, que o
assistente pretendeu lhe fosse esclarecido (informado) - cujo conteúdo foi
recusado notificar, convidando-se o assistente a consultar o processo.
Questão que é a do cumprimento do artigo 259° do CPC.
[...]
III - A inconstitucionalidade na interpretação dos referidos preceitos foi
arguida na motivação do recurso para a secção criminal — nomeadamente em II,
III, IV, V, XXIII, XXIV e XXV, dessa motivação, e nas conclusões 1ª a 10ª, 33ª e
34ª — nos seguintes termos:
O assistente não recebeu, por qualquer meio, (como alegado) notificação do
despacho que tenha decidido sobre a arguição de nulidade da instrução.
E da decisão que indeferiu a notificação desse despacho – o assistente não
recebeu cópia da sua fundamentação, feita por remissão para folhas 462 e 463.
Sem que o assistente a conheça – está impossibilitado de arguir os vícios de que
enferme o meio que tenha sido utilizado.
Sendo que o despacho em causa é nuclear no processo de instrução.
Já que se arguiu a nulidade por insuficiência de instrução.
Sem as notificações destes dois despachos, o processo caiu em impasse – não
sendo possível falar-se do princípio da preclusão.
Para quebrar esse impasse processual - interpôs o presente recurso para a secção
criminal. (conclusão 1ª daquela motivação)
Arguida a falta de notificação de despacho, requerida essa notificação, e
indeferida, com fundamentação por remissão para o que se diz constar a certas
folhas do processo – um entendimento, na interpretação dos artigos 111º a 113°
do CPP e do artigo 259° do CPC, que sustente a admissibilidade do não envio, ao
assistente, de cópia dessa fundamentação, ofende o direito de efectiva tutela
jurisdicional (artigo 20º n°s 1, 4 e 5 da CR).
Na medida em que priva o assistente do conhecimento dos vícios do meio que tenha
sido utilizado e da possibilidade da sua impugnação. (conclusão 8ª)
- Foi arguida nulidade da insuficiência da instrução.
E arguida em tempo útil. (artigo 120° n°3 c) do CPP)
E pelo meio legalmente admissível. (citado artigo)
Dado que não lhe foi notificado o respectivo despacho – o assistente desconhece
que decisão foi tomada, ou se conheceu ou não conheceu das nulidades.
E com que fundamento ?
O assistente desconhece sequer se algum despacho houve.
- Indeferida a notificação do despacho que teria indeferido arguição de nulidade
da instrução com fundamentação por remissão para folhas 462 e 463 – a secção não
enviou a cópia dessa fundamentação.
Assim incumprindo o artigo 259° do CPC.
Requerida a notificação da mesma fundamentação – foi indeferida.
Com a seguinte justificação: - que «o assistente poderá conhecê-la, quando
quiser consultar o processo. (conclusão 5ª)
- Foram ofendidos os artigos 111º a 113° do CPP e o artigo 259° do CPC – que
visam assegurar às partes a notificação das decisões e da sua fundamentação, com
garantias da sua recepção. (conclusão 7ª)
- Apelando ao direito de consulta do processo – para negar o da notificação dos
fundamentos de um despacho – o tribunal nega rotundamente o direito de
notificação dos despachos.
- Do que se trata é de saber se foram cumpridas normas fundamentais do processo
- como são as que obrigam à notificação das decisões.
Não pode falar-se em preclusão, relativamente a qualquer decisão, enquanto esta
não puder ter-se como notificada.
Esta é jurisprudência uniforme.
De tal modo que seria ocioso citar a inúmera jurisprudência a este respeito.
(conclusão 6ª).
IV - Em conformidade com o exposto - perante o tribunal a quo, foi arguida a
inconstitucionalidade dos artigos 111º a 113° do CPP, conjugados com o artigo
259° do CPC, quando interpretados com o seguinte entendimento:
- arguido o não recebimento de notificação de decisão judicial (sobre arguição
de nulidade por insuficiência da instrução) tal arguição (falta de notificação)
foi indeferida, com fundamento por remissão para certas folhas do processo -
fundamentação que não foi enviada ao assistente; e requerida a indicação do meio
que se considerava utilizado, foi de novo indeferida, convidando-se o assistente
a consultar o processo. Assim se negando o direito à notificação.
Tal interpretação ofende o artigo 20º nºs 1, 4 e 5 da CR. Já que não assegura a
efectiva recepção da notificação e o efectivo conhecimento da decisão.
E impede o exercício de direitos fundamentais com o são os do contraditório e o
direito ao recurso — conforme jurisprudência do Tribunal Constitucional, de que
são exemplos os doutos Acórdãos adiante citados.
E a não indicação do meio utilizado impede a arguição de vício desse meio —
questão que o Acórdão recorrido evitou, falando de aclaração.
(Aclaração só pode ser de algo obscuro que foi notificado - não de uma não
notificação: a recusada indicação do fundamento da indeferida notificação.)
Incorrendo ainda o acórdão recorrido na mesma inconstitucionalidade,
considerando simples irregularidade, a falta de notificação de decisão judicial
— e invocando o princípio da preclusão.
Mesmo neste entendimento, a arguição foi feita tempestivamente, porque no 5° dia
posterior à primeira notificação que se seguiu, dentro dos 3 dias previstos nos
artigos 107° n.º 5 do CPP e 145° n°s 5 e 6 do CPC).
Liquidação oficiosa que o tribunal de instrução fez — para cobrança da sanção
legal, pelos dois outros recursos, referidos em I.
Deveria proceder do mesmo modo - caso tivesse o mesmo entendimento do acórdão.
O assistente é que não pode ser penalizado por omissão do tribunal.
E ainda que de irregularidade se tratasse — esta cairia na previsão do n° 2 do
artigo 123º do CPP - mandando que, a todo o tempo, o tribunal ordene
oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, quando ela puder afectar o
valor do acto praticado.
Ora, a decisão não notificada não produz efeitos.
É jurisprudência uniforme.
Assim se tendo contrariado a lei e a jurisprudência corrente.
O artigo 121° n° 2 do CPP refere a nulidade por falta ou vício de notificação. E
o artigo 122° n.º 1 prescreve a invalidade do acto por ela viciado e os que dele
dependerem.
E a jurisprudência é unânime, na consideração da nulidade por falta de
notificação de decisão judicial
Uma questão de bom senso — ao alcance de qualquer leigo.
Quem poderia entender que a lei fixasse em 10 dias, o prazo para reagir à
notificação de uma decisão judicial — e o reduzisse a 3 dias, para reagir à
falta de notificação?
Tão surpreendente entendimento - sofre da arguida inconstitucionalidade.
Só para falar na jurisprudência do TC – basta citar o Acórdão n° 444//91, de
20/11, no DR II série, n° 78-S de 2/4/92 e BMJ, 411-155 segundo o qual - quanto
à interpretação do artigo 259° do CPC:
- «O direito de acesso aos tribunais é, entre o mais, o direito a uma solução
jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável, e com as
observâncias das garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se,
designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório... »
- «no direito fundamental de acesso aos tribunais vai implicado o direito que
assiste às partes de um processo judicial de conhecerem efectivamente as
decisões judiciais e respectivos fundamentos»
E - quanto à invocada preclusão - o Acórdão do TC n° 186/2004, de 23/3, no DR II
série de 11/5/2004:
- «o direito ao recurso, pressupondo um total conhecimento do teor da decisão
recorrida... impõe que o prazo para a interposição do recurso só se conte a
partir do momento em que o recorrente tenha possibilidade efectiva de apreender
o texto integral da decisão que pretende impugnar. »
«Á contagem do prazo de recurso a partir de momento anterior consubstancia pois
uma limitação injustificada do direito ao recurso... » Pois antes disso não sabe
se quer recorrer (se tem fundamento legal para tal) ...»
Não prejudica o requisito da adequada arguição da inconstitucionalidade, no
tribunal recorrido, se este se esquiva ao conhecimento da arguição — como é
também jurisprudência do douto Tribunal Constitucional.
Requer ao Tribunal Constitucional que — em conformidade com a citada
jurisprudência — seja feita a apreciação da (in)constitucionalidade dos
preceitos dos artigos 111º a 113° do CPP e 259° do CPC, quando interpretados
segundo o entendimento constante dos despachos do Exm° Juiz Conselheiro de
Instrução Criminal e do Acórdão recorrido.
Este recurso foi admitido através do despacho de 7 de Janeiro de 2007 (fls.
120).
11. Já neste Tribunal, após uma primeira distribuição, foi determinado que os
recursos deveriam “ser processados conjuntamente num único processo”,
ordenando-se a sua redistribuição.
12. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao
abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro,
na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão
sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na
parte agora relevante, o seu teor:
“13. Um primeiro recurso, apresentado em 11 de Dezembro de 2008 e referido em 7.
supra, vem interposto, conforme esclarecido pelo recorrente, do despacho de 8 de
Outubro de 2008, em que foi decidido não admitir “o recurso interposto do
despacho que incidiu sobre a arguição de nulidades da instrução, proferido em 11
de Março de 2008, bem como do despacho de não pronúncia, proferido em 12 de
Março de 2008”, em ambos os casos por se encontrar “excedido o prazo a que alude
o artigo 411º do Código de Processo Penal”, bem como por, “do despacho que
indefere os actos requeridos, nem sequer existir a possibilidade legal de
recurso – artigo 291º do mesmo diploma legal”. Requer o recorrente, nos termos
do requerimento de interposição do recurso, que “seja feita a apreciação da
inconstitucionalidade do preceito do artigo 291º do CPP, quando interpretado
segundo o entendimento constante do despacho de 8/10/2008 (…)”. Não pode, porém,
conhecer-se do objecto deste recurso.
Com efeito, tem este Tribunal repetidamente afirmado (cf., entre muitos outros
nesse sentido, os Acórdãos nºs 337/94, 498/96 e 3/2000 – publicados,
respectivamente, no Diário da República, II Série, de 4 de Novembro de 1994, de
22 de Julho de 1996 e de 8 de Março de 2000 -, e os Acórdãos nºs 283/97, 556/98,
490/99 – disponíveis na página Internet do Tribunal, em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), que o recurso de
constitucionalidade, tal como previsto no artigo 280º da Constituição e nos
artigos 70º e seguintes da LTC, desempenha uma função instrumental. Isso
significa, como se afirmou, por exemplo, no Acórdão n.º 498/96, já citado, que
há-de aferir-se da “sua utilidade no concreto processo de que emerge, de tal
forma que o interesse no conhecimento de tal recurso há-de depender da
repercussão da respectiva decisão na decisão final a proferir na causa”. Como
então se acrescentou “não visando os recursos dirimir questões meramente
teóricas ou académicas, a irrelevância ou inutilidade do recurso de
constitucionalidade sobre a decisão de mérito torna-o uma mera questão académica
sem qualquer interesse processual, pelo que a averiguação deste interesse
representa uma condição de admissibilidade do próprio recurso”. Em síntese, e
retomando agora as palavras do acórdão n.º 556/98, também já citado, só tem
sentido conhecer do recurso de constitucionalidade quando a decisão aí proferida
“se pode projectar com utilidade sobre a causa”, concluindo-se, assim, “que dele
se não deve conhecer quando se não verifique qualquer efeito útil do mesmo sobre
ela”.
Ora, é justamente o que acontece nos presentes autos, em que se verifica,
precisamente, que um eventual juízo de inconstitucionalidade sobre a norma que
vem questionada não seria susceptível de se projectar em termos úteis na decisão
recorrida, uma vez que na mesma se considerou, em termos que a este Tribunal
está vedado sindicar, que uma outra razão sempre obstaria ao conhecimento dos
recursos; a saber: o seu carácter intempestivo: Nesse sentido, pode ler-se no
despacho recorrido:
“[…] Não se admite o recurso interposto do despacho que incidiu sobre a arguição
de nulidades da instrução, proferido em 11 de Março de 2008, bem como do
despacho de não pronúncia, proferido em 12 de Março de 2008. Relativamente a
qualquer um dos mesmos despachos encontra-se excedido o prazo a que alude o
artigo 411º do Código de Processo Penal”.
Do transcrito decorre, pois, que um eventual juízo de inconstitucionalidade que
o Tribunal viesse a formular sobre a norma questionada – o artigo 291º do CPP –,
não seria susceptível de se projectar em termos úteis sobre a decisão recorrida,
invertendo o seu sentido. É certo que a decisão recorrida chega a pronunciar-se
sobre a admissibilidade do recurso face ao disposto no artigo 291º do CPP.
Porém, a não se entender que se trata de um mero obiter dictum, sempre haverá
que concluir que se está perante um fundamento alternativo que, pelas razões
supra expostas, impede, só por si, o conhecimento do presente recurso de
constitucionalidade.
14. O segundo recurso de constitucionalidade vem interposto do acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Novembro de 2008, que indeferiu o recurso
interposto do despacho de 21 de Maio de 2008, supra identificado em 4.. Nos
termos do respectivo requerimento de interposição pretende o recorrente ver
apreciada a constitucionalidade “dos artigos 111º a 113º do CPP e 259º do CPC,
aplicável ex artigo 4º do CPP”, por alegada violação dos artigos “13º, 20º, nºs
1 e 4 e 5 da CRP”.
Ora, independentemente da questão de saber se vem colocada adequadamente neste
requerimento – e se foi adequadamente colocada durante o processo – qualquer
questão de constitucionalidade normativa, a verdade é que, também neste caso,
não pode conhecer-se do objecto do recurso. É que, para decidir como decidiu, a
decisão recorrida não aplicou, como ratio decidendi, nenhum dos preceitos
identificados pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso,
limitando-se a, como já havia sido considerado na decisão então sob recurso,
concluir que “o requerimento em apreciação “atenta a fase procedimental em que
foi apresentado, ou seja, após a prolação da decisão instrutória, [se mostra]
processualmente descontextualizado, sendo notoriamente extemporâneo e
absolutamente descabido”. É, por isso, que, de acordo com outros preceitos, que
cita e que constituem, esses sim, a sua verdadeira ratio decidendi (como é o
caso dos artigos 120º nºs 1 e 2, alínea d), 118º, nº 1 e 2 e 123º do CPP, ou
668º a 670º do CPC), nega provimento ao recurso.
Nestas circunstâncias, forçoso é também concluir pela impossibilidade de
conhecer do objecto deste recurso.”
13. Inconformado com esta decisão o recorrente apresentou, ao abrigo do disposto
no artigo 78º-A, nº 3, da LTC, a presente reclamação para a Conferência, que
fundamenta, em síntese, nos seguintes termos:
“[...] 40ª — Em síntese:
Foi interposto recurso para a secção criminal do no STJ da recusa de notificação
de despacho proferido sobre a arguição de nulidade por insuficiência da
instrução — invocando como fundamento o que se disse constar de certa folha do
processo.
Fundamentação esta cuja notificação foi também recusada — impedindo o assistente
da arguição de vícios do meio que se dissesse utilizado.
Sem essa notificação — tal despacho não pode produzir efeitos.
E mesmo que o assistente não tivesse interposto recurso do não notificado
despacho.
É esta, nem mais nem menos, a jurisprudência, constante daqueles citados
Acórdãos do TC , n° 444/91, de 20/11, e n° 186/2004, de 23/3.
Jurisprudência do TC, que o despacho reclamado agora contraria.
41ª- Ao que se vê — indeferindo a requerida notificação, o senhor juiz
conselheiro de instrução do STJ pretendia criar o impasse processual — impedindo
o assistente de recorrer.
Para depois vir invocar a preclusão.
Foi por isso que
42ª- Para quebrar tal impasse processual como declarou – o assistente interpôs
também recurso desse não notificado despacho.
E não esqueceu mencionar o prejudicado despacho de não pronúncia. (artigo 122°
nº 1 do CPP)
43ª— Sendo que — como já se disse — nem do despacho que recusara a notificação,
o assistente tinha que interpor recurso — antes que tal despacho lhe fosse
integralmente notificado.
E com a inclusão do fundamento constante da folha do processo, cujo conteúdo lhe
foi omitido.
É o que pode ver-se nos dois citados Acórdãos do TC – adiante transcritos.
44ª O despacho reclamado está em claríssima contradição com os doutos Acórdãos
desse TC, nº444/91, de 20/11, e nº 186/2004, de 23/3.
45ª - No Acórdão nº 444//91, de 20/11, no DR II série; e n° 78-S de 2/4/92 e
BMJ, 411-155 — diz-se com transparente clareza:
- «O direito de acesso aos tribunais é, entre o mais, o direito a uma solução
jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável, e com as
observâncias das garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se,
designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório... »
- «no direito fundamental de acesso aos tribunais vai implicado o direito que
assiste às partes de um processo judicial de conhecerem efectivamente as
decisões judiciais e respectivos fundamentos».
E — quanto à invocada preclusão — o Acórdão do TC n° 186/2004, de 23/3, no DR II
série de 11/5/2004:
- «o direito ao recurso, pressupondo um total conhecimento do teor da decisão
recorrida.., impõe que o prazo para a interposição do recurso só se conte a
partir do momento em que o recorrente tenha possibilidade efectiva de apreender
o texto integral da decisão que pretende impugnar. »
«A contagem do prazo de recurso a partir de momento anterior consubstancia pois
uma limitação injustificada do direito ao recurso... » Pois antes disso não sabe
se quer recorrer (se tem fundamento legal para tal) . . . »
46ª - São, pelo menos, dois os Acórdãos do TC, no mesmo sentido da
inconstitucionalidade da interpretação que foi dada às normas reguladoras da
notificação das decisões.
Acórdãos do TC, citados e transcritos no requerimento de interposição do recurso
para o TC — assim se cumprindo o requisito previsto no n°3 do artigo 75°-A da
LOTC.
Do que decorre mais um fundamento da inconstitucionalidade do Acórdão recorrido
— e do despacho reclamado: o de contradizerem os citados Acórdãos do TC.
E o requerimento de interposição do recurso respeita os requisitos processuais
para que o TC possa conhecer também deste fundamento do recurso.
É que, no caso da alínea g) do artigo 70° da LOTC — o n.º 3 do artigo 75°-A -
somente exige que o requerimento indique os Acórdãos do TC que fundamentam essa
inconstitucionalidade.
O n° 2 do mesmo artigo só relativamente aos fundamento da alª b) e f) - exige a
indicação da peça processual em que tal fundamento tenha sido invocado perante o
tribunal a quo.
E, para cumprimento do n° 1 do mesmo artigo, basta a indicação duma alínea
artigo 70° — no caso, a alínea b).
Donde que
47ª - Ambos os recursos para o TC cabem também na previsão da al. g) do artigo
70º — por em ambos se ter feito citação de Acórdãos do TC, que contradizem a
interpretação das normas aplicadas, nos despachos e Acórdão recorridos.
48ª - O assistente ignora a existência de um terceiro Acórdão, nesse mesmo
sentido.
Na eventualidade da existência de um terceiro Acórdão no mesmo sentido — o
assistente REQUER que seja declarada a inconstitucionalidade, com força
obrigatória geral, da interpretação dada aos artigos 111º a 113° do CPP e 259°
do CC).
Declaração que se afigura ser oficiosa, nos termos do artigo 281º nº 3 da CR.
DEVE:
1 - ser revogado o despacho reclamado:
Porque, na apreciação dos recursos, não aplicou correctamente as normas
processuais.
E porque, também ele, está em clara contradição com a jurisprudência do TC,
citada nos requerimentos de interposição de ambos os recursos – e assim, também
ele inconstitucional.
18. Notificado para responder, querendo, à reclamação, disse o Ministério
Público, ora reclamado:
“1º - A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2º - Na verdade, o longo arrazoado ora apresentado em nada abala os fundamentos
da decisão reclamada, no que toca à evidente inverificação dos pressupostos dos
recursos interpostos.”
Corridos os vistos da Conferência, cumpre decidir.
II – Fundamentação
19. Na decisão sumária reclamada, concluiu-se no sentido da impossibilidade de
conhecer do objecto de dois recursos que o ora reclamante interpôs para este
Tribunal, ambos ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1, do art. 70º da Lei
do Tribunal Constitucional (LTC). Para concluir dessa forma, considerou-se, no
essencial, como resulta da transcrição supra, que as decisões recorridas não
tinham aplicado, como ratio decidendi, as normas que o recorrente pretendia ver
apreciadas e que, pelo menos no que se refere ao primeiro dos recursos de que se
não tomou conhecimento, existia na decisão um fundamento alternativo que sempre
conduziria à mesma solução, por inutilidade do conhecimento do recurso de
constitucionalidade. Como então, mais longamente, se explicou, qualquer destas
razões impede, só por si, o conhecimento de qualquer dos recursos interpostos ao
abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC. Com a presente reclamação, o
ora reclamante pretende contestar que assim seja.
Vejamos.
20. O recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade previsto na alínea
b) do n.º 1 do artigo 280º da Constituição e no artigo 70º da LTC tem por
objecto admissível, única e exclusivamente, a apreciação da constitucionalidade
de normas jurídicas - ou, se for o caso, de uma determinada interpretação
normativa. Está, por conseguinte, constitucionalmente vedada a este Tribunal a
apreciação das decisões judiciais em si mesmas consideradas, ainda que venha
invocada a sua inconstitucionalidade, e, naturalmente, a apreciação da matéria
de facto objecto de pronúncia na decisão judicial para ele recorrida. Além
disso, o recurso em causa - previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da
Constituição e no artigo 70º da LTC - pressupõe, nomeadamente, não só que o
recorrente tenha suscitado “de modo processualmente adequado perante o tribunal
que proferiu a decisão recorrida” (cf. artigo 72º, n.º 2, do mesmo diploma) a
exacta questão de constitucionalidade normativa que pretende ver apreciada mas
também que, não obstante, a decisão recorrida tenha aplicado tal norma ou
interpretação normativa, como ratio decidendi, no julgamento do caso. Ao que
acresce que, dada a natureza da intervenção do Tribunal Constitucional no âmbito
do processo de fiscalização concreta, restrita à apreciação da questão de
constitucionalidade da norma ou interpretação normativa efectivamente aplicada
na decisão recorrida, tal norma surge a este Tribunal como um dado, não estando
em causa no recurso para ele interposto, nem podendo estar, a determinação de
qual a “melhor interpretação” das normas infraconstitucionais questionadas. Ao
Tribunal Constitucional cumpre apenas aferir a compatibilidade com a
Constituição da interpretação normativa efectivamente aplicada pela decisão
recorrida.
Ora, tudo isto inviabiliza a apreciação não só dos elementos de facto referidos
mas também dos argumentos de direito infraconstitucional aduzidos pelo ora
reclamante, conduzindo, nessa parte, à manifesta improcedência da reclamação.
21. Por outro lado, a decisão sumária concluiu pelo não conhecimento do objecto
dos recursos porque as decisões recorridas não tinham aplicado, como ratio
decidendi, as normas que o recorrente pretendia ver apreciadas, sendo certo que,
pelo menos no que se refere ao primeiro dos recursos, existia na decisão
recorrida um fundamento alternativo que sempre conduziria àquela solução.
Entende o ora reclamante que tal decisão deve ser revogada “porque, na
apreciação dos recursos, não aplicou correctamente as normas processuais.” Não
aduz, contudo, um único argumento que permita justificar tal revogação. Na
verdade, em momento algum da extensa reclamação é desautorizada a demonstração,
efectuada na decisão ora reclamada, de que as normas questionadas não constituem
ratio decidendi das decisões recorridas. Nem, tão-pouco é abalada a demonstração
de que existe, na primeira das decisões recorridas, um fundamento jurídico
alternativo para a decisão então tomada. O que, iniludivelmente, conduz à
impossibilidade de conhecer dos recursos e, consequentemente, à manifesta
improcedência da presente reclamação, também neste ponto.
22. Aduz ainda o ora reclamante, para fundar a sua pretensão de revogação da
decisão sumária, o argumento – sucessivamente repetido e desenvolvido ao longo
da reclamação – no sentido de que “o despacho reclamado está em claríssima
contradição com os doutos Acórdãos desse TC, nº 444/91, de 20/11, e nº 186/2004,
de 23/3”. Mais uma vez, porém, sem razão. É que, como é patente, não há
contradição possível entre acórdãos - como é o caso dos citados - que,
conhecendo do objecto dos recursos por estarem preenchidos os respectivos
pressupostos de admissibilidade, se pronunciaram do ponto de vista substantivo
sobre a constitucionalidade das normas que então vinham questionadas e uma
decisão sumária – como é o caso da ora reclamada – que, constatando a manifesta
falta dos pressupostos legais de admissibilidade dos recursos interpostos pelo
ora reclamante, se limita a verificar a impossibilidade, legal e constitucional,
de este Tribunal conhecer do respectivo objecto. Improcede também aqui a
reclamação apresentada, sendo manifesta a falta de fundamento da invocação de
inconstitucionalidade da decisão reclamada.
23. Porque o ora reclamante lhe faz referência expressa, entendendo que isso
justificaria uma decisão favorável da reclamação, importa considerar a menção
que é feita à alínea g) do nº 1 do artigo 70º da LTC como possível fundamento
dos recursos, cujo objecto foi impossível conhecer. Mais uma vez, todavia, para
ter de concluir que em nada aproveita ao ora reclamante tal referência. Na
verdade, tendo os recursos sido interpostos, de acordo com os respectivos
requerimentos, “nos termos do artigo 70° n° 1 b) da LOTC”, está inteiramente
excluída a possibilidade de, agora, no contexto da presente reclamação, vir
alterar – ou aditar – o tipo de recurso que foi interposto. Improcede, por isso,
a reclamação.
Acresce que, manifestamente, também não estariam reunidos os pressupostos de
admissibilidade do recurso de constitucionalidade previsto naquela alínea g). Na
verdade, o recurso interposto ao abrigo desta alínea, como resulta da própria
Lei (alínea g) citada) e o Tribunal Constitucional repetidamente tem afirmado,
só é admissível quando a decisão recorrida aplicou uma norma já anteriormente
julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional (cfr., por exemplo, quanto
ao âmbito, pressupostos e razão de ser deste recurso o acórdão n° 586/98,
publicado no Diário da República, II Série, de 1 de Março de 1999). Sendo que,
como se afirmou no Acórdão n.º 293/2005, “para preenchimento dos pressupostos do
recurso previsto naquela alínea, é legalmente exigida a identidade da norma (e
não apenas do preceito ou de uma determinada questão de constitucionalidade).” A
verdade, porém, é que, no presente caso, é evidente que a dimensão normativa dos
preceitos que foi efectivamente aplicada pela decisão recorrida não coincide
exactamente, como é legalmente exigido, com as que foram objecto dos juízos de
inconstitucionalidade tirados nos Acórdãos que o reclamante vem invocar como
eventual fundamento de um outro, agora inadmissível, recurso.
Nem tão-pouco vale tal invocação para fundar uma alegada inconstitucionalidade
da decisão reclamada, já que é evidente não ter esta aplicado qualquer norma já
anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional.
24. Finalmente, afirma o ora reclamante na sua peça processual: “o assistente
REQUER que seja declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral
[...]”. Trata-se de uma afirmação que só como manifesto lapso pode ser
entendida. De facto, não só não possui o reclamante legitimidade para formular
tal pedido, como tal declaração, caso estivessem preenchidos os respectivos
pressupostos, não resultaria de nenhum mecanismo de funcionamento oficioso.
25. Assim, não constituindo o recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade uma instância adicional de apreciação de elementos de facto
ou de argumentos de direito infraconstitucional, não estando em causa qualquer
aplicação de norma já anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal
Constitucional, não tendo sido abalada a demonstração, efectuada na decisão ora
reclamada, da falta de pressupostos de admissibilidade dos recursos, há que
concluir, pelas razões constantes da decisão reclamada, que mais uma vez agora
se reiteram, pelo não conhecimento do objecto dos recursos que o recorrente
interpôs.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto dos
recursos.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em (20) vinte unidades de
conta.
Lisboa, 12 de Maio de 2009
Gil Galvão
José Borges Soeiro
Rui Manuel Moura Ramos