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Processo n.º 139/09
1ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Notificados do Acórdão nº 205/2009 – em que se decidiu indeferir as
reclamações apresentadas contra anterior decisão sumária que não conhecera do
objecto dos recursos de constitucionalidade por si interpostos –, vêm agora A. e
B. solicitar a aclaração daquele Acórdão.
2. Notificado para se pronunciar, querendo, sobre estes requerimentos, o
Ministério Público, ora recorrido, veio sustentar que o acórdão aclarando “é
insusceptível de dúvida, no padecendo de qualquer obscuridade”, que “os pedidos
de aclaração constituem apenas uma mera discordância em relação ao decidido”,
sendo certo que as questões postas nas aclarações “já tiveram resposta clara no
acórdão”.
II. Fundamentação
3. O pedido de aclaração de uma decisão judicial visa, nos termos da alínea a)
do n.º 1 do artigo 669º do Código de Processo Civil, “o esclarecimento de alguma
obscuridade ou ambiguidade” que a decisão contenha. Ora, como sumariamente se
demonstrará já de seguida, tal não acontece com o Acórdão nº 205/2009, que é
claro não só acerca do que nele se decidiu – indeferir as reclamações
apresentadas –, como também quanto aos motivos pelos quais assim se decidiu –
falta dos pressupostos legais de admissibilidade dos recursos que os recorrentes
haviam interposto. Verifica-se, aliás, que, mais do que o esclarecimento de
qualquer obscuridade ou ambiguidade daquele Acórdão, o que os requerentes
verdadeiramente pretendem é voltar a discutir as questões que ali já foram
definitivamente decididas, o que é, evidentemente, inadmissível. Vejamos.
3.1. O requerente A. começa por afirmar que “não entende (…) como efectuou o
Tribunal a concatenação da invocada norma do art. 76.º, n.º 1, da LTC, com o
disposto no n.º 6 do artigo 70.ºda LTC”, uma vez que “parece ao ora requerente
que a norma do art. 70º, n.º 6, permite e até impõe, como nos casos em apreço,
recorrer da decisão do STJ”. Nada, porém, de obscuro ou ambíguo se encontra,
nesta parte, na fundamentação do acórdão aclarando, onde claramente se explica –
inclusivamente através de remissão para jurisprudência anterior – o que o ora
requerente afirma não compreender. Refere, depois, o mesmo requerente que
“também não entende (…) o sentido global da decisão do TC (…)”, insistindo, no
entanto, em que deveria ter sido formulado um convite ao aperfeiçoamento do
requerimento de interposição do recurso. Também nesta parte, porém, nada há a
aclarar, uma vez que, quer no acórdão aclarando, quer na decisão sumária que o
antecedeu, se explicaram já, demoradamente, as razões pelas quais se não
justificava, no caso concreto, a formulação do referido convite, não cabendo,
evidentemente, voltar agora a apreciar esta questão. Afirma ainda o requerente
que “não compreende (…) a decisão constante do acórdão ora reclamado, no que se
refere à questão de constitucionalidade relativa ao artigo 126 do CPP”, pois
“lendo e relendo o texto do recurso interposto (…), não se consegue (i)
compreender como é possível afirmar que não foi colocada uma questão de
constitucionalidade e (ii) compreender como é possível afirmar que não foi
colocada uma questão normativa de constitucionalidade”. Mais uma vez, porém, as
razões constam da decisão aclaranda e da decisão sumária que a mesma confirmou,
pelo que nada há a esclarecer. Ainda quanto a esta questão, solicita o
requerente que o Tribunal indique “para que «razões» se remete no acórdão
reclamado, quanto, na p. 26, se refere o ponto 12.2.1., uma vez que tal ponto
não existe”. A referência que, nesta parte, se faz no acórdão aclarando ao ponto
12.2.1, traduz um manifesto lapso de escrita, uma vez que, como refere o
reclamante, tal ponto não sequer existe, pretendendo evidentemente referir-se
aquele acórdão, como é patente para qualquer leitor minimamente diligente, ao
ponto 10.2.1. da sua própria fundamentação (o ponto imediatamente anterior).
Finalmente, refere o requerente que “não compreende (…) a ratio decidendi do
aresto proferido nestes autos, quanto à questão tratada em 10.2.3”, nem entende
“o sentido do acórdão proferido nos autos, mais uma vez, ao considerar que o
recurso interposto para o Tribunal Constitucional não o foi da decisão que
aplicou as normas, sendo esta a primeira decisão proferida pelo Supremo Tribunal
de Justiça, em Novembro de 2008 (…)”. Também nestes pontos, porém, nada haverá a
aclarar, uma vez que do Acórdão n.º 205/2009 constam já as razões pelas quais se
concluiu o que o ora reclamante agora diz não entender.
2.2. O requerente B. começa por afirmar que “não pode aceitar” a asserção
constante do “ponto 11.2.1. na página 29 do acórdão” no sentido de que não
colocou qualquer questão de “constitucionalidade normativa — i.e., imputada a
urna norma jurídica — mas, quando muito, a uma conduta processual, o que, como
se disse, não constitui objecto idóneo de recurso de constitucionalidade”,
pretendendo ver esclarecido “o que terá faltado alegar” para que pudesse
conhecer-se do objecto do recurso e, designadamente, se “a singela utilização do
termo conduta, independentemente de qualquer controvérsia semântica, impede que
o tribunal se pronuncie sobre o que foi, de forma clara e precisa, alegado […]”.
Quer na decisão sumária, em que se decidiu não conhecer do objecto do recurso,
quer no acórdão aclarando se explicou já por que razão não foi suscitada, de
forma clara e precisa, uma questão de constitucionalidade normativa. O
requerente não concorda. Nas suas palavras, “não pode aceitar” essa conclusão.
Essa discordância, que é legítima, não torna, contudo, a decisão obscura ou
ambígua em termos de obrigar à sua aclaração. Também quanto ao ponto 11.2.3, na
página 30 do acórdão, refere o requerente que “apesar de tudo ser rotulado como
de fácil compreensão o recorrente assume não compreender”, solicitando “o
esclarecimento acerca de qual o elemento ou requisito em falta, para que esse
insigne tribunal possa conhecer do recurso aqui interposto”. Também aqui nada há
a aclarar, pois o Acórdão nº 205/2009 é já de si suficientemente claro ao
explicitar que o recorrente não colocou perante o tribunal que proferiu a
decisão recorrida, de modo processualmente adequado, qualquer questão de
constitucionalidade normativa de que o Tribunal possa conhecer. Finalmente,
conclui o requerente que “identificou as normas legais, cuja
inconstitucionalidade arguiu, por força da interpretação que lhes foi dada.
Alegou que os artigos 374/2 e 379/1/a) exigem uma fundamentação adequada das
decisões tomadas e não se satisfazem com referências genéricas, o que,
naturalmente, só poderá ser sindicado em cada caso concreto. Deste modo requer
também que seja esclarecido porque motivo o douto acórdão considera, uma vez
mais, que as questões não foram colocadas de modo processualmente adequado”.
Também neste ponto não há qualquer obscuridade ou ambiguidade no acórdão
aclarando que careça de esclarecimento. O que há é, como em pontos anteriores,
uma discordância do requerente quanto ao sentido da decisão, o que, como é
evidente, sendo legítima, não torna o Acórdão obscuro ou ambíguo, susceptível de
ser aclarado.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se desatender as presentes aclarações.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades
de conta, por cada um.
Lisboa, 24 de Junho de 2009
Gil Galvão
José Borges Soeiro
Rui Manuel Moura Ramos