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Processo n.º 341/09
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. Em 24 de Setembro de 2008 foi lavrada, na Relação do Porto, decisão sumária a
julgar manifestamente improcedente o recurso interposto por A., e outro, da
sentença que, no Tribunal Judicial de Valongo, o condenara como autor material
do crime de abuso de confiança fiscal – artigo 105º n.ºs 1 e 5 do RGIT – na pena
de 2 anos de prisão.
A. pretendeu então interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos
seguintes termos:
A., arguido nos presentes autos, notificado do acórdão, VEM, ao abrigo do
disposto na alínea b) do nº1 do art.º 70º, da Lei do Tribunal Constitucional,
INTERPOR RECURSO, para o Digníssimo Tribunal Constitucional, nos termos e pelos
fundamentos seguintes termos:
O arguido foi condenado no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, a 2 anos de
prisão, como autor de um crime de Abuso de Confiança Fiscal, p.p. pelo art.º
105º n.º 1 e 5 do RGIT.
Inconformado interpôs recurso para o Digníssimo Tribunal da Relação do Porto.
O arguido julgou ter requerido apoio judiciário, por confusão que fez com outro
processo, e, quando confrontado pelo Tribunal requereu a emissão de guias para
pagamento de taxa de justiça e competente multa.
Notificado para pagar a Sanção, não o fez por insuficiência económica, tendo o
Senhor Juiz dado sem efeito a interposição de recurso que havia feito.
O arguido recorreu deste despacho por entender que estando em causa a aplicação
de urna pena de prisão efectiva, o arguido está dispensado do pagamento da taxa
de justiça.
É que refere o art.º 522º n.º 2 do CPP que - « Os arguidos presos gozam de
isenção de taxa de justiça pela interposição de recurso em 1ª instância;...»
Ora a Jurisprudência tem entendido que, esta disposição deve também ser
entendida no sentido em que o seu campo de actuação abrange casos em que por
força de uma decisão condenatória, haja lugar ao cumprimento imediato de uma
pena de prisão aplicada ao arguido, ou seja, de o arguido ser preso se não
recorrer - Ac STJ de 21.10.1992, in Col. de Jur., 1992,4, 28.
Assim não entendeu o Digno Tribunal da Relação do Porto, que rejeitou o recurso.
Ora, entendemos salvo melhor opinião que a interpretação e aplicação do disposto
no art. 522º n.º 2, pelo Insigne Tribunal da Relação do Porto, na interpretação
de que «não se encontrando o arguido preso à data do acórdão, ser devido o
pagamento da taxa de justiça pela interposição do recurso, constitui uma
violação do seu direito à igualdade e consequentemente também do artigo 32º da
Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidades essas invocadas
previamente no seu recurso do Tribunal judicial de Valongo para o Tribunal da
Relação do Porto.
Com efeito, o arguido caso não recorresse, ia preso, e a não admissão do
referido recurso, conforme consta no douto despacho recorrido, implica a prisão
do recorrente, violando o seu direito à igualdade, uma vez que vai ser
prejudicado pela sua situação económica, e em violação também do art.º 32º da
CRP.
Violou assim também o douto acórdão recorrido o principio da Igualdade.
Pretende assim o recorrente a apreciação da constitucionalidade das normas
jurídicas em causa, por ambiguidade e falta de clareza dessas mesmas normas
jurídicas, por colidirem em função dessas debilidades com uma norma
constitucional.
Mas este pedido foi indeferido nos seguintes termos:
A fls. 154 e 155 destes autos, veio o recorrente interpor recurso para o
Tribunal Constitucional, por entender que o art. 522º nº 2 do C.P.P. viola o
disposto no artigo 32.º da C.R.P..
Porém, da decisão proferida a fls. 139 e segs., cabe “reclamação para a
Conferência” – n.º 8 do artº 417.º do C.P.P..
Assim, o recorrente ao interpor recurso da decisão sumária para o Tribunal
Constitucional, está a saltar um patamar na hierarquia dos recursos, sendo certo
que só é possível recorrer para o Tribunal Constitucional, quando se estiver
esgotado as vias judiciais de recurso.
Pelo exposto, não se admite o recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
Inconformado, A. reclama dessa decisão, dizendo:
A., arguido nos presentes autos, VEM, reclamar para o Presidente do Tribunal
Constitucional, ao abrigo do disposto no art.º 405º da Decisão Sumária que
decidiu indeferir a admissão do recurso para o Tribunal constitucional, por se
entender o mesmo manifestamente infundado.
O Tribunal a quo entende que “O Recurso para o Tribunal Constitucional não é
admissível pois que se saltou um patamar nas vias de recurso.
É a interpretação que a Decisão do Tribunal da Relação do Porto fez dos
preceitos invocados (artigo 522 n.º 2 do Código de Processo Penal e art.º 80º
n.º 4 CCJ) que gera o vício da inconstitucionalidade que se invocou.
Se o recorrente não pudesse invocar as inconstitucionalidades resultantes da
interpretação e aplicação das normas feitas pelos Tribunais Superiores (Relação
ou Supremo Tribunal de Justiça) ficaria fora da alçada do Tribunal
Constitucional uma grande parte da fiscalização concreta da constitucionalidade
que cabe a esse alto tribunal.
Como é óbvio, também nesta particular questão o arguido/recorrente não podia
pressupor, intuir, que o Tribunal da Relação do Porto, agiria como agiu, e
interpretaria as normas do Código de Processo Penal e da própria Constituição
como interpretou e aplicou.
É com a prolação da Decisão, e só nessa altura, que se tornam patentes os vícios
e manifesta a interpretação inconstitucional dada às normas, afrontando de
maneira gritante e inadmissível o Estado de Direito e processo Democrático,
pondo em causa princípios que deviam estar mais do que consolidados na ordem
jurídica portuguesa:
Assim sendo, o recorrente tem o Direito a ver apreciado o Recurso interposto
para o Tribunal Constitucional no sentido de controlar a constitucionalidade:
a) Ora, entendemos salvo melhor opinião que a interpretação e aplicação do
disposto no art. 522º n.º 2, pelo Insigne Tribunal da Relação do Porto, na
interpretação de que «não se encontrando o arguido preso à data do acórdão, ser
devido o pagamento da taxa de justiça pela interposição do recurso, constitui
uma violação do seu direito à igualdade e consequentemente também do artigo 32º
da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidades essas invocadas
previamente no seu recurso do Tribunal Judicial de Valongo para o Tribunal da
Relação do Porto.
Com efeito, o arguido caso não recorresse, ia preso, e a não admissão do
referido recurso, conforme consta no douto despacho recorrido, implica a prisão
do recorrente, violando o seu direito à igualdade, uma vez que vai ser
prejudicado pela sua situação económica, e em violação também do art.º 32º da
CRP.
A inconstitucionalidade resulta da interpretação dada pelo Tribunal de Recurso
às normas do artigo 522º n.º 2 Código de Processo Penal e 80º n.º4 do CCJ.
É, pois, um vício que se regista somente na Decisão que se pretende seja
analisado à luz das normas da Constituição.
Desta forma, tem o recorrente o direito a ver apreciado o Recurso interposto
para o Tribunal Constitucional.
Foi ouvido o Ministério Público, cumprindo decidir.
2. A presente reclamação, disciplinada pelo disposto no artigo 77º da LTC (Lei
n.º 28/82 de 15 de Novembro), decorre de um lapso evidente do reclamante.
O despacho que, na Relação do Porto, lhe não admitiu o recurso de
inconstitucionalidade fundamentou-se unicamente na circunstância de o despacho
recorrido – a decisão sumária proferida naquele Tribunal em 24 de Setembro de
2008 – não esgotar a recorribilidade na ordem jurisdicional respectiva. E a
verdade é que, impondo o artigo 70º n.ºs 2 e 3 da LTC que o recurso que o ora
reclamante pretende interpor apenas cabe de decisões que não admitam recurso
ordinário, ou reclamação para a conferência, e sendo absolutamente certo que da
decisão sumária impugnada cabe reclamação para a conferência do tribunal
recorrido – n.º 8 do artigo 417º do Código de Processo Penal –, o recurso não
pode ser recebido, nos termos do aludido artigo 70º n.ºs 2 e 3 da LTC por lhe
faltar o aludido pressuposto.
Este fundamento nada tem a ver com a questão da alegada inconstitucionalidade da
interpretação dada às normas do artigo 522º n.º 2 Código de Processo Penal e 80º
n.º 4 do Código das Custas Judiciais, mas, unicamente, com os pressupostos
processuais do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC.
3. Nestes termos, decide-se indeferir a reclamação. Custas pelo reclamante,
fixando-se a taxa de justiça em 25 UC.
Lisboa, 24 de Junho de 2009
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão