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Processo n.º 624/08
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Silva Rodrigues
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A. e B., notificados do Acórdão n.º 535/2008, proferido nestes
autos, que indeferiu a sua reclamação, deduzida nos termos do n.º 3 do art.º
78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), contra a
decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que decidiu
não conhecer do recurso de constitucionalidade interposto do Acórdão do Tribunal
da Relação de Coimbra, de 28 de Maio de 2008, invocando o disposto no art.º
669.º do Código de Processo Civil (CPC), vêm requerer a sua aclaração e a
reforma do decidido, alegando:
“No citado aresto, entendeu-se, entre o mais, que “na óptica dos requisitos do
presente recurso de constitucionalidade, apenas o critério normativo aplicado
como ratio decidendi pode ser objecto de decisão que conheça da sua conformidade
constitucional, sendo que, como se constatou, este não se afigura coincidente
com aquele cuja bondade constitucional foi controvertida na dimensão normativa
denunciada pelos reclamantes”.
Ao controverter a constitucionalidade da dimensão normativa suscitada perante o
Tribunal da Relação, estavam os recorrentes convictos de que a norma então em
crise fora efectivamente aplicada por aquela instância superior, ainda que aí se
tenha sustentado inexistir uma dupla imputação relativamente ao mesmo facto.
Ora, perante o decidido, crêem os recorrentes, salvo o devido respeito, que a
decisão aclaranda padece, ao menos na impressão subjectiva do seu destinatário,
no que se concede, da seguinte ambiguidade/obscuridade:
Do doutamente explicitado no Acórdão ficam os recorrentes sem saber se o
pressuposto relativo à aplicação da norma-objecto do recurso como ratio
decidendi se afere pela aplicação efectiva da norma (ainda que, por exemplo, o
Tribunal a quo sustente formalmente no a ter aplicado, quando dela faz
efectivamente aplicação material), ou, na hipótese inversa, se a verificação
desse requisito se faz apenas perante o teor da decisão recorrida, mesmo quando
seja patente que o critério em causa tenha sido efectivamente aplicado.
Na modesta perspectiva dos reclamantes, apenas a primeira hipótese poderá
encontrar-se subjacente ao critério de verificação de admissibilidade dos
recursos de constitucionalidade.
E, a ser assim, deverão considerar-se preenchidos os requisitos de
admissibilidade do recurso, razão que justifica o pedido, subsidiário, de
reforma da decisão reclamada no sentido de se tomar conhecimento do recurso de
constitucionalidade”.
2 – O Procurador-geral Adjunto, no Tribunal Constitucional
respondeu, dizendo:
“1º
Como é evidente, o ora reclamante não identifica minimamente qualquer
“obscuridade” ou “ambiguidade”, susceptível de ser aclarada, nem nenhum “lapso
manifesto”, susceptível de justificar a alteração da decisão reclamada.
2°
Na verdade, o que o reclamante deduz é um pedido de impugnação da decisão
proferida pela conferência, por dela discordar, o que naturalmente é
inadmissível, pelo facto de o acórdão proferido dirimir definitivamente o caso”.
B – Fundamentação
3 - O uso do meio processual da aclaração justifica-se quando uma
decisão é obscura ou ambígua [art.º 669º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo
Civil, aplicável ao processo constitucional por via do disposto no art.º 69º da
Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro].
A decisão é obscura quando o seu texto não dá para entender o
pensamento do julgador e é ambígua quando a decisão comporta mais de um sentido.
Diz Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, vol. V,
págs. 151), a propósito destes dois vícios formais da decisão, que “n[N]um caso,
não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro, hesita-se entre dois sentidos
diferentes e, porventura, opostos”.
A função da aclaração é, pois, a de “iluminar algum ponto obscuro da
decisão” e, sendo assim, “através dela apenas se pode corrigir a sua forma de
expressão e não modificar o seu alcance ou o seu conteúdo” (Fernando Amâncio
Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3ª edição, 2002, págs. 45/46).
Por seu lado, a reforma da decisão está prevista, apenas, nas
situações recortadas no art.º 669.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC (“quando
tenha ocorrido manifesto lapso do juiz na determinação da norma aplicável ou na
qualificação jurídica dos factos” ou “constem do processo documentos ou
quaisquer elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da
proferida e que o juiz, por lapso manifesto, não haja tomado em consideração”).
Ora, no seu requerimento, os reclamantes não identificam,
minimamente, qualquer “obscuridade” ou “ambiguidade”, reportadas à concreta
linguagem do discurso do acórdão reclamado, susceptíveis de serem aclarados, nem
nenhum “lapso manifesto”, passível de justificar a alteração da decisão
reclamada.
O que é possível inferir da sua reclamação é que os reclamantes
pretendem pôr em causa a correcção da fundamentação em que se estribou o acórdão
reclamado.
Todavia, como resulta do que vai dito, o incidente processual da
aclaração e da reforma da decisão não está funcionalizado, normativamente, para
prosseguir esse fim.
C – Decisão
4 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide indeferir os pedidos e condenar os reclamantes nas custas, fixando a taxa
de justiça em 15 UCs.
Lisboa, 20.01.2009
Benjamim Rodrigues
Joaquim de Sousa Ribeiro
Rui Manuel Moura Ramos