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Processo n.º 232/08
Plenário
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. O Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira
requereu, ao abrigo do artigo 281.º, n.º 2, alínea g), da Constituição da
República Portuguesa, “a declaração de inconstitucionalidade e de ilegalidade,
com força obrigatória geral, do artigo 1º da Lei Orgânica nº 2/2002, de 28 de
Agosto, que acrescentou o Título V – Estabilidade Orçamental – à Lei n.º
91/2001, de 20 de Agosto” (fl. 29 e ss. dos presentes autos).
2. Em 10 de Março de 2008, o Presidente do Tribunal elaborou o seguinte
despacho:
“Nos termos do artigo 51.º, nºs 1 e 3 da Lei do Tribunal Constitucional,
solicita-se ao Requerente que concretize especificamente, em especial nos pontos
C) e D) do requerimento apresentado, as disposições da Constituição ou os
princípios nela consignados que entende terem sido violados, do mesmo modo que
os preceitos do EPARAM consagradores de direitos da Região Autónoma da Madeira
que pretende terem sido infringidos, a fim de permitir uma delimitação precisa
do âmbito e do alcance das inconstitucionalidades e ilegalidades que invoca”.
3. O requerente apresentou novo requerimento, fundamentando o pedido, em
síntese, no seguinte:
− O artigo 1.º da Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto, aditou um novo
título à Lei de enquadramento orçamental, que, por força de disposição expressa,
se aplica não só ao orçamento de Estado e aos orçamentos das autarquias, como
ainda aos orçamentos das regiões autónomas.
− Este diploma aprovado pela Assembleia da República viola os direitos e a
autonomia legislativa e financeira da Região Autónoma da Madeira.
− Nessa medida, o Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da
Madeira é parte legítima para requerer a declaração de inconstitucionalidade e
de ilegalidade da referida lei.
− A aprovação da Lei Orgânica n.º 2/2002 constitui uma flagrante violação da
autonomia legislativa e financeira regional que a Constituição consagra no
artigo 225.º, n.º 2, e nos artigos 5.º, n.º 2, e 105.º do Estatuto
Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira.
− No caso em apreço, a Região Autónoma tem competência para legislar de mote
próprio, sendo ilegítimo ao Estado fazer tal diploma legislativo.
− De facto, nos termos do artigo 227.º, n.º 1, alínea p), da Constituição,
compete a cada região: “Aprovar o plano de desenvolvimento económico e social, o
orçamento regional e as contas da região e participar na elaboração dos planos
nacionais”.
− Ora, não se compreenderia que a Constituição atribuísse essa competência
orçamental e não atribuísse, também, o poder de proceder ao respectivo
enquadramento normativo. Trata-se, pois, de uma “competência implícita” que não
pode ser negada.
− Além disso, é necessário ter em consideração que a Região tem competência
exclusiva para legislar sobre organização e funcionamento dos órgãos regionais.
− A revisão constitucional de 1997 acrescentou nas competências a serem
exercidas pela Assembleia da República, numa solução já de si muito discutível,
a competência para a elaboração do enquadramento dos orçamentos das Regiões
Autónomas. Mas o preceito do artigo 164.º, alínea r), da Constituição refere-se
apenas ao “regime geral” da elaboração e organização dos orçamentos.
− Ora a simples observação da Lei Orgânica n.º 2/2002 revela uma total
incompreensão do fenómeno da autonomia financeira regional, pois que até
desprovida ficaria − caso a tese da sua constitucionalidade por absurdo vingasse
− de poder acrescentar o que quer que fosse na edificação de um regime
legislativo que diz respeito a uma instituição financeira puramente regional,
como é o seu orçamento.
− A pretensão exclusivista de tudo regular no tocante ao enquadramento
legislativo do orçamento da Região Autónoma da Madeira viola não só o artigo
105.º, n.º 2, do EPARAM, como, ainda, o seu artigo 40.º, alínea vv), que,
conjugado com o artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, permite que a
Região Autónoma legisle, através de um regime especial, no âmbito do
enquadramento legislativo do respectivo orçamento.
− Finalmente, houve uma violação do direito de audição da Região consagrado no
artigo 229.º, n.º 2, da Constituição, nos artigos 89.º e seguintes do EPARAM e
na Lei n.º 40/96, de 31 de Agosto.
− A Assembleia da República não solicitou no tempo devido a emissão dos
pareceres da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.
− Na verdade, em 28 de Junho de 2002, o Chefe de Gabinete do Presidente da
Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira recebeu um ofício de
notificação tendo a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, alguns
dias depois e sob a alegação de que se trataria de um assunto urgente, proferido
um sumário parecer sobre aquela proposta de lei.
− Contudo, esse pedido manifestamente viola o prazo de 15 dias de que lhe
deveria ter sido permitido fazer uso. O prazo foi em tal ocasião encurtado, sem
qualquer razão, a não ser apenas por uma circunstância de encerramento da sessão
legislativa.
− Além disso, num segundo momento, “o direito de audição prévia foi igualmente
desrespeitado pelo facto de a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da
Madeira não ter sido sequer consultada sobre o aparecimento de diversas
propostas de alteração à mencionada Proposta de Lei n.º 16/IX, que foram
apresentadas em 16 de Julho e votadas definitivamente em 19 de Julho de 2002,
não obstante o pedido expresso de ser colhido tal parecer formulado pela
Comissão de Economia e Finanças da Assembleia da República”.
− “Em face de tal facto, no próprio dia da votação final global da Proposta de
Lei n.º 16/IX e das suas alterações, que foi 19 de Julho, quando a Comissão
Especializada de Planeamento e Finanças da Assembleia Legislativa da Região
Autónoma da Madeira conseguiu reunir-se, mais não fez senão lavrar o seu
veemente protesto a respeito da apresentação de um facto legislativo consumado,
ou seja, a aprovação final de um diploma em relação ao qual não teve
oportunidade de se pronunciar havendo relevantes alterações a uma proposta
inicial”.
− Foi o seguinte o teor de tal protesto: “A Segunda Comissão Especializada
permanente da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, de Planeamento e
Finanças, reuniu no dia 19 de Julho de 2002, pelas 14 horas, a fim de apreciar o
pedido de parecer da Assembleia da República relativo às propostas de alteração
ontem ao final da tarde recebidas nesta Assembleia e nesta Comissão e hoje de
manhã já votadas na Assembleia da República”. “Não tendo sido, mais uma vez,
respeitados os prazos previstos na Lei de Audição, e tendo já a Assembleia da
República aprovado a Lei de estabilidade orçamental, não poderá a Assembleia
Legislativa regional emitir o parecer solicitado”.
− O “comportamento da Assembleia da República infringiu por completo o núcleo
essencial deste direito de audição”, pondo em causa a sua efectiva utilidade.
Nestes termos, o requerente conclui pedindo a declaração de
inconstitucionalidade e de ilegalidade, com força obrigatória geral, do artigo
1.º da Lei Orgânica n.º 2/2002.
4. Notificado para se pronunciar, querendo, sobre o pedido, o Presidente da
Assembleia da República veio oferecer o merecimento dos autos, enviando cópia da
documentação relativa aos trabalhos preparatórios da Lei Orgânica n.º 2/2002 −
Lei da estabilidade orçamental − acompanhada de índice detalhado.
5. Debatido o memorando apresentado pelo Presidente do Tribunal Constitucional e
fixada a orientação do Tribunal sobre as questões a resolver, procedeu-se à
distribuição do processo, cumprindo agora formular a decisão.
II. Fundamentação
1. O requerente formulou o pedido em termos genéricos, requerendo “a declaração
de inconstitucionalidade e de ilegalidade, com força obrigatória geral, do
artigo 1.º da Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 Agosto”, disposição que aprovou os
artigos 79.º a 89.º da Lei de enquadramento do Orçamento de Estado, agrupando-os
no título V desta lei. No requerimento reformulado continuou a não impugnar
nenhum artigo específico deste título da Lei de enquadramento orçamental, mas
antes todos os artigos que o compõem no seu conjunto.
Desta forma, o Tribunal não irá analisar a constitucionalidade material de cada
uma das normas que integram o título V da Lei de enquadramento do Orçamento de
Estado, o que sucedeu no Acórdão n.º 567/2004, onde, a pedido do Presidente da
Assembleia Legislativa Regional dos Açores, foram apreciadas diversas
disposições contidas no título agora impugnado. Acórdão em que o Tribunal
decidiu, por unanimidade, que as normas contidas nos artigos 83.º, 84.º, 85.º,
88.º e 89.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, aditadas pelo artigo 1.º da Lei
Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto, não eram inconstitucionais nem ilegais
(disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
O Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, no
requerimento inicial e no reformulado, limita-se à impugnação genérica de todo o
complexo de disposições aprovadas pelo artigo 1.º da Lei Orgânica n.º 2/2002,
pelo que o Tribunal tem de concluir que o requerente não pretende a declaração
de inconstitucionalidade ou de ilegalidade de nenhum artigo específico. A
questão foi levantada a um nível de generalidade que a desloca, do plano da
apreciação da inconstitucionalidade e da ilegalidade de cada uma das diversas
normas contidas no artigo 1.º da Lei Orgânica n.º 2/2002, para o plano da
apreciação da inconstitucionalidade e da ilegalidade desse mesmo artigo à luz da
repartição de competências feita pela Constituição da República Portuguesa (CRP)
e pelo Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPARAM)
entre a Assembleia da República e as Assembleias Legislativas das regiões
autónomas.
2. O requerente pede a apreciação e declaração de inconstitucionalidade e de
ilegalidade, com força obrigatória geral, do artigo 1.º da Lei Orgânica n.º
2/2002 que aditou o título V, sobre estabilidade orçamental, à Lei n.º 91/2001,
de 20 de Agosto (Lei de enquadramento do Orçamento de Estado).
Invoca a autonomia legislativa e financeira regional, consagrada, nomeadamente,
nos artigos 225.º, n.º 2, e 227.º, n.º 1, alínea p), da CRP e nos artigos 5.º,
40º, alínea vv), e 105.º do EPARAM, para questionar a competência da Assembleia
da República para estabelecer regras relativas à elaboração do orçamento das
regiões autónomas, pelo menos nos termos em que o fez. E não há dúvida de que a
Lei Orgânica n.º 2/2002 não se limita a enquadrar o Orçamento de Estado, pois
estende a aplicação das suas disposições aos orçamentos das autarquias locais e
das regiões autónomas (artigo 80.º da Lei de enquadramento do Orçamento de
Estado, na versão aprovada pela Lei Orgânica n.º 2/2002, que corresponde ao
actual artigo 83.º daquela mesma lei, após a renumeração e republicação operadas
pelo artigo 4.º da Lei n.º 48/2004, de 24 de Agosto).
Para responder à questão posta importa ter presente que ela coloca, antes de
mais, um problema de sucessão de normas constitucionais no tempo.
3. No período que mediou entre a emissão da Lei Orgânica n.º 2/2002 e a presente
decisão entraram em vigor a Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, e a
Lei Constitucional n.º 1/2005, de 12 de Agosto, tendo a primeira introduzido
alterações relevantes no título que a CRP reserva às regiões autónomas,
alargando, nomeadamente, a competência legislativa destas pessoas colectivas
territoriais (sobre isto, cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 423/2008,
disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Considerando que o requerente questiona a competência da Assembleia da República
para estabelecer regras relativas à elaboração do orçamento das regiões
autónomas e reiterando o entendimento de que o vício de natureza orgânico-formal
ou de competência legislativa de uma norma ordinária se afere pelas normas
constitucionais vigentes no momento da sua emissão (cf. Acórdãos do Tribunal
Constitucional n.ºs 206/87, publicado no Diário da República, I Série, de 10 de
Julho de 1987, 408/89 e 246/2005, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt),
há que apreciar a norma questionada à luz das normas constitucionais vigentes no
momento da emissão da Lei Orgânica n.º 2/2002. Ou seja, à luz da redacção dada
pela Lei Constitucional n.º 1/2001, de 12 de Dezembro.
4. Importa começar por dizer que a autonomia regional não é apenas uma ideia
abstracta sem contornos jurídico-constitucionais, mas sim um conceito
juridicamente configurado pela Constituição, no quadro da unidade do Estado
Português (artigos 6º e 225.º, n.ºs 2 e 3). E que essa configuração jurídica do
conceito de autonomia regional é feita, desde logo, através da repartição de
competências que a Constituição opera entre os órgãos de soberania e os órgãos
de governo próprio das regiões autónomas. O próprio EPARAM, em congruência com o
artigo 227.º, n.º 1, da CRP, veda à Região Autónoma o poder de legislar sobre
matérias reservadas à competência própria dos órgãos de soberania (alíneas c),
d) e e) do n.º 1 do artigo 37.º).
Até à 4.ª revisão constitucional (1997), o regime geral de elaboração e
organização dos orçamentos estava contido no então artigo 168.º, n.º 1, alínea
p), da Constituição, fazendo assim parte das matérias de reserva relativa de
competência da Assembleia da República. Porém, a 4.ª revisão constitucional
viria a integrar essa matéria no quadro da reserva absoluta de competência
legislativa da Assembleia da República, mais concretamente na alínea r) do
artigo 164.º, segundo a qual é da exclusiva competência deste órgão de soberania
o regime geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado, das regiões
autónomas e das autarquias locais.
As leis de enquadramento orçamental – leis que definem o regime geral de
elaboração e organização dos orçamentos – passaram a ser uma competência
exclusiva e não delegável da Assembleia da República (no sentido de o regime dos
orçamentos ter em vista as chamadas leis de enquadramento do orçamento, Gomes
Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra
Editora, 1993, anotação aos artigos 108.º, ponto I., 109.º, ponto II., e 168.º,
ponto XVII.).
Só a Assembleia da República tinha competência para aprovar leis de
enquadramento orçamental, pelo que o artigo 1.º da Lei Orgânica n.º 2/2002
respeita a repartição constitucional e legal de competências entre os órgãos de
soberania e os órgãos de governo próprios da região autónoma, não violando nem a
CRP nem o EPARAM. E à mesma conclusão se chegaria se a norma impugnada fosse
apreciada à luz das normas constitucionais vigentes (cf. Acórdão do Tribunal
Constitucional n.º 402/2008, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
5. O Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira
sustenta, ainda, que houve, no caso, uma violação do núcleo essencial do direito
de audição, consagrado no artigo 229.º, n.º 2, da CRP e nos artigos 89.º e 90.º
do EPARAM.
Gomes Canotilho e Vital Moreira não deixam de destacar que a “Constituição é
omissa acerca do processo de audição; deve contudo entender-se que os órgãos de
soberania deverão pelo menos proporcionar que os órgãos regionais se possam
pronunciar, fixando se for caso disso um prazo razoável” (Constituição da
República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 1993, anotação ao artigo 231.º,
ponto III.) Em sentido análogo, Jorge Miranda/Rui Medeiros sublinham que “deve
ser reconhecido aos órgãos de governo regional um efectivo poder de influenciar,
com o seu parecer, a apreciação e a decisão parlamentar ou governamental que vai
recair sobre as normas do diploma que respeitam a questões regionais”
(Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III, anotação ao artigo 229.º, alínea e),
do ponto III.). Por seu turno, o Tribunal Constitucional tem entendido que para
um juízo de inconstitucionalidade o que é decisivo, “em último termo, é saber
se, em cada caso, se observou, ou não, um procedimento capaz de corresponder ao
sentido da exigência do artigo 229.º, n.º 2, da Constituição” (Acórdão n.º
529/2001 e, no mesmo sentido, Acórdão n.º 551/2007, disponíveis em
www.tribunalconstitucional.pt).
5.1. O requerente começa por sustentar que a Assembleia da República não
solicitou no tempo devido – 15 dias – a emissão de parecer por parte da
Assembleia Legislativa, não havendo qualquer razão para o encurtamento do prazo.
A Proposta de Lei n.º 16/X (Lei da estabilidade orçamental) entrou na Assembleia
da República no dia 27 de Junho de 2002, tendo sido admitida pelo respectivo
Presidente no dia 28. Nesse mesmo dia 28 de Junho, as Assembleias Legislativas
das regiões autónomas foram notificadas, por telefax, para a emissão de parecer
urgente (Ofícios 404 e 403/GAB/02). No dia 9 de Julho, a Assembleia Legislativa
da Região Autónoma da Madeira apresentou o parecer, que fora aprovado, no dia
anterior, pela Comissão Especializada de Planeamento e Finanças. Neste parecer,
de 8 de Julho, a Assembleia Legislativa pronuncia-se desenvolvidamente sobre a
Proposta de Lei n.º 16/IX, invocando a inconstitucionalidade e a ilegalidade
desta Proposta e sugerindo alterações concretas aos artigos 81.º, 82.º, n.º 1,
83.º, 84.º, 86.º, 87.º e 92.º Tal parecer entrou na Assembleia da República no
dia 9 e o debate, na generalidade, apenas se iniciou, posteriormente, na reunião
plenária do dia 10 (Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 31, de 11 de
Julho de 2002, pp. 1283-1302).
É de concluir, por conseguinte que o parecer da Assembleia Legislativa da Região
Autónoma da Madeira pôde ser considerado na discussão e na votação da Proposta
de Lei n.º 16/IX. Por outro lado, não se pode afirmar que o prazo para audição
das Regiões não tenha sido razoável. Estabelecendo a Lei n.º 40/96, de 31 de
Agosto, o prazo normal de 15 dias e admitindo prazo urgente mais curto, deve
entender-se que o prazo de 10 dias, dentro do qual a Assembleia Legislativa da
Região Autónoma da Madeira apresentou o seu parecer, é razoável para um parecer
urgente.
5.2. O requerente sustenta depois que o direito regional de audição prévia foi
igualmente desrespeitado pelo facto de a Assembleia Legislativa não ter sido
“sequer consultada sobre o aparecimento de diversas propostas de alteração à
mencionada Proposta de Lei n.º 16/IX que foram apresentadas em 16 de Julho e
votadas definitivamente em 19 de Julho de 2002”.
Na sequência de proposta de alteração ao articulado da proposta de Lei n.º 16/X,
as Assembleias legislativas das regiões autónomas foram, novamente, notificadas,
por telefax, na terça-feira, dia 16 de Julho de 2002, para se pronunciarem
(Ofícios 536 e 537/GAB/02). Os ofícios da Assembleia da República pediam “com a
máxima urgência, parecer [à] Assembleia Legislativa regional, sobre a proposta,
anexa, de alteração à proposta de Lei n.º 16/IX, a ser discutida em plenário no
próximo dia 19 do corrente”.
A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira apresentou um parecer
sobre tal matéria no dia 18 de Julho de 2002 (Doc. classificado com o n.º
10/02/01/01 e com o n.º de entrada 2532, publicado no Diário da Assembleia da
República, II Série-A, n.º 22, de 20 de Julho, p. 726 e ss.) que se inicia com o
relatório habitual:
“Aos 18 dias do mês de Julho de 2002, pelas 14 horas, reuniu a 2ª
Comissão Especializada Permanente de Planeamento e Finanças, a fim de analisar e
emitir parecer a solicitação do Senhor Presidente da Assembleia da República
sobre a Proposta de Lei n.º 16/IX – Lei da estabilidade orçamental”.
O parecer continua propondo alterações nos artigos 3.º e 4.º da Proposta de Lei
n.º 16/IX , reafirmando a posição assumida no seu anterior parecer de 8 de
Julho, nestes termos:
“Relativamente aos restantes artigos mantém as propostas de
alteração já emitidas no parecer à versão inicial da Proposta de Lei n.º 16/IX,
que se reproduzem de seguida”.
Em congruência, transcreve seguidamente as propostas de alteração aos artigos
81.º, 82.º, n.º 1, 83.º, 84.º, 86.º, 87.º e 92.º, que já antes apresentara.
Poderia, porém, dizer-se que o prazo foi curto, não dando tempo à Assembleia
Legislativa da Região Autónoma da Madeira para se pronunciar de forma a que o
seu parecer pudesse ser devidamente considerado na discussão e votação finais da
Proposta de Lei n.º 16/IX. Na verdade, a notificação enviada na terça-feira, dia
16, às 16 horas e 40 minutos, pedia parecer sobre a alteração a ser discutida em
plenário no dia 19, ou seja, na sexta-feira da mesma semana.
O facto é que a Assembleia Legislativa se pronunciou sobre a proposta de
alteração à Proposta de Lei n.º 16/IX. E pronunciou-se a tempo de o parecer
poder ser considerado na discussão e votação finais daquela Proposta.
Acresce que este segundo pedido de parecer decorreu da entrada da proposta de
aditamento de um novo artigo à Proposta de Lei n.º 16/IX − o artigo 3.º − e de
alteração do n.º 4 do artigo 87.º e que a primeira norma não é sequer objecto
deste processo.
Nestes termos, não houve qualquer violação do dever de audição dos órgãos de
governo regional, consagrado no artigo 229.º, n.º 2, da CRP e nos artigos 89.º e
90.º do EPARAM.
III. Decisão
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide não declarar a
inconstitucionalidade nem a ilegalidade do artigo 1.º da Lei Orgânica n.º
2/2002, de 28 de Agosto.
Lisboa, 20 de Janeiro de 2009
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão
João Cura Mariano
Vítor Gomes
José Borges Soeiro
Ana Maria Guerra Martins
Joaquim de Sousa Ribeiro
Mário José de Araújo Torres
Benjamim Rodrigues
Carlos Fernandes Cadilha
Rui Manuel Moura Ramos