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Processo n.º 25/09
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. A. quis recorrer para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido na
Relação do Porto em 25 de Junho de 2008 pelo qual foi confirmada a sentença do
Tribunal Judicial de Montalegre que o condenou, como autor material de um crime
de difamação agravado, em multa e em indemnização ao ofendido. Apresentou, para
tal efeito, o seguinte requerimento:
A., arguido nos autos à margem referenciados, não se conformando com o Acórdão
aí proferido, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos e
com os fundamentos seguintes:
O recurso é interposto ao abrigo da al. b), do nº 1 do art. 70º da Lei nº 85/89,
com as alterações posteriores, lei 13-A/98.
Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do art. 358º, n.º 1 do
Código de Processo Penal, com a interpretação com que foi aplicada no Acórdão
recorrido, no sentido de que sendo aditados factos na sentença recorrida
correspondentes ao elemento subjectivo do tipo de crime, que não constavam do
despacho de pronúncia, o arguido não teria de ser notificado da alteração dos
factos (substancial ou não), por violação, das garantias de defesa, do princípio
do acusatório e do contraditório insertos no art. 32 n.º 1 e 5 da Constituição
da República Portuguesa; Aliás,
No Acórdão 130/98, o Tribunal Constitucional considerou que não violaria o
princípio das garantias de defesa a norma constante do artigo 358.º, n.º 1, do
Código de Processo Penal, interpretado no sentido de o Tribunal poder investigar
oficiosamente novos factos surgidos na audiência de julgamento “desde que se
faculte ao arguido a oportunidade processual de organizar, quanto a eles a sua
defesa”. (Cfr. Ac. 130/98, BMJ, 474-69)
Assim, o artigo supra citado, quando interpretado como foi pelo Venerando
Tribunal da Relação do Porto, por forma a permitir que possam constar da
sentença condenatória factos não constantes do despacho de pronúncia, sem que
tivesse sido comunicada ao Arguido qualquer alteração dos factos descritos na
mesma, nos termos do art. 358º ou do art. 359º C.P.P., sofre de vício de
inconstitucionalidade, por violar os princípios ínsitos no art. 32º, nos 1 e 5
Constituição da República Portuguesa.
A questão da inconstitucionalidade foi suscitada na motivação de recurso e nas
respectivas conclusões.
Deste modo,
Deve o presente recurso ser admitido e feito o mesmo subir com efeitos
suspensivos, seguindo-se os demais termos até final.
Todavia, o pedido foi indeferido por decisão proferida pelo Desembargador
relator, nos seguintes termos:
'[...] Por outro lado, ainda que o requerimento de recurso invoque,
expressamente, o art. 70.º n.º 1 al. b), o certo é que nas “conclusões” da
motivação não se pede a declaração de inconstitucionalidade do art. 358.º. O que
aí se diz é que “deve ser declarada a nulidade da sentença … em violação da CRP”
– citando as conclusões a fls. 368 v - n.º 12.
Mas mais. A questão foi tratada no acórdão ora recorrido, a fls. 477-479. E aí
se exara, além do mais, é que a eventual nulidade é do despacho de pronúncia e
essa encontra-se já sanada.
De qualquer maneira, o que se decidiu quanto ao art. 358.º não foi que não
resulta dele a necessidade de notificação, mas, sim, que o “caso” não integra o
dispositivo.
Por tudo, pois, é nosso entendimento de que o recurso, interposto a fls. 494-5,
para o TC não é admissível, pelo que não se admite.[...]'
Contra o despacho reclama o recorrente para o Tribunal Constitucional, dizendo:
'[...] 4º – O Venerando Desembargador Relator indeferiu o recurso interposto
pelos seguintes motivos:
a)– Ser apenas um expediente dilatório – resumo dos comentários proferidos no
primeiro parágrafo do despacho de que se reclama;
b)– Por o recorrente não ter suscitado a questão de inconstitucionalidade nas
conclusões de recurso;
c) – Por a questão já ter sido tratada no Acórdão proferido que decidiu que a
eventual nulidade a ter ocorrido não se produziu na Sentença proferida pela
primeira Instância, mas no despacho de Pronúncia.
d)– Por o vício apontado pelo recorrente não se integrar na norma cuja
inconstitucionalidade foi requerida;
5º – No que concerne ao primeiro fundamento, o recorrente apenas pretende que
este douto areópago aprecie a constitucionalidade de uma norma.
6º – Como é natural sempre que um arguido recorre para o Tribunal
Constitucional, os Venerandos Desembargadores que subscreveram o Acórdão
recorrido não partilham da tese sufragada pelo recorrente.
7º – No entanto, como ninguém é dono da verdade, por vezes os Acórdãos
proferidos padecem de vícios.
8º – Sem nos alongarmos muito, foi graças a alguns desses recursos que os
arguidos passaram a ter o direito de saber os factos que lhe são imputados no
âmbito do primeiro interrogatório, que passaram a ter direito a que o Mm.º Juiz
de Instrução analisasse num prazo efectivamente razoável a necessidade da
manutenção das escutas telefónicas ou que puderam aceder aos registos magnéticos
das escutas telefónicas consideradas irrelevantes para o processo.
9º – Sem esses recursos em oposição às convicções do Venerandos Desembargadores
que subscreveram os respectivos Acórdãos, a nossa justiça não tinha evoluído
para o patamar em que se situa.
10º – Salvo o devido respeito, os comentários tecidos no despacho de que se
reclama e com os quais não se concorda, não abonam a favor da justiça, embora os
mesmos abundem do Acórdão proferido.
Efectivamente,
11º – São várias as considerações subjectivas proferidas no mesmo e estranha-se
o facto de o acórdão ter sido publicado na Internet, no site da DGSI, muito
antes do seu trânsito em julgado. [...]
12º – Quanto aos restantes fundamentos do despacho que não admitiu o recurso,
salvo o devido respeito, não assiste razão ao Venerando Desembargador Relator.
Senão Vejamos,
13º – O arguido nas conclusões (artigos 6 a 12º) defendeu que a Sentença em
crise o condenou por factos não constantes do despacho de pronúncia, sem que lhe
sido comunicada a respectiva alteração, a fim de poder exercer a sua defesa. Ou
seja,
14º – Embora a sentença em crise não se tenha referido expressamente ao artigo
358.º, n.º l do C.P.P., entendeu que a alteração não substancial dos factos não
necessitava de ser comunicada ao arguido.
15º – Assim, o recorrente peticionou a nulidade da sentença por a mesma ter
ofendido “o princípio do contraditório (art. 32.º, n.º 5 da C.R.P.) e o artigo
32.º, n.º 1 da CRP (...)
16º – A inconstitucionalidade de uma norma pode ser suscitada por modos
diversos, no decurso de um processo; poderá sê-lo através de uma menção
expressa, como mediante alusão ou referência que permita a sua identificação.
17º – Os Venerandos Desembargadores, a fls. 17 do Acórdão que proferiram,
entenderam que os factos aditados à sentença que não constavam do despacho de
pronúncia não integravam uma alteração não substancial, pelo que, nada havia a
comunicar ao arguido.
18º – Acrescentaram ainda que no seu entender qualquer irregularidade a
acontecer, verificou-se no despacho de pronúncia, pelo que, a sentença proferida
sanou qualquer vício que pudesse ter ocorrido.
19º – Concluíram que não houve violação do princípio do contraditório e que o
mesmo foi respeitado — art. 32.º, n.ºs 1 e 5 da C.R.P..
20º – Salvo o devido respeito, o arguido entende que o vício ocorreu na sentença
que o condenou por factos sobre os quais não tinha sido pronunciado.
21º – Nos termos do artigo 358.º do C.P.P. sempre que se verifique a alteração
dos factos descritos na acusação ou pronúncia os mesmos devem ser comunicados ao
arguido.
22º – Embora a Sentença proferida na 1ª Instância não se tenha referido
concretamente ao dispositivo legal supra identificado e o Acórdão proferido pela
Tribunal da Relação do Porto tenha perfilhado o entendimento que os factos
relatados não se integram a necessidade de serem comunicados ao arguido.
23º – Caberá a V.ª Ex.ª apreciar a bondade da posição do recorrente. Posto isto,
24º – O arguido está convicto da sua razão e da procedência da
inconstitucionalidade suscitada, motivo pelo qual, sujeita a este douto areópago
a apreciação do mérito do despacho que não admitiu o recurso.
Na opinião do Ministério Público, manifestada no processo ao abrigo do artigo
77º n.ºs 2 e 3 da LTC, a reclamação é improcedente, já que 'o reclamante não
suscitou, durante o processo e em termos processualmente adequados, qualquer
questão de inconstitucionalidade normativa, susceptível de servir de base ao
recurso que interpôs para este Tribunal'.
2. Cumpre decidir, nos termos previstos no n.º 4 do artigo 76º e artigo 77º
ambos da LTC.
O recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC cabe das decisões
dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada
durante o processo, incumbindo ao recorrente a tarefa de suscitar a questão da
inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida em termos de este estar obrigado a dela conhecer –
n.º 2 do artigo 72º da LTC.
Um dos fundamentos que o tribunal reclamado encontrou para não admitir o recurso
consistiu, precisamente, na não suscitação prévia da questão.
A esta pronúncia responde agora o reclamante, sustentando que 'a
inconstitucionalidade de uma norma pode ser suscitada por modos diversos, no
decurso de um processo; poderá sê-lo através de uma menção expressa, como
mediante alusão ou referência que permita a sua identificação' – ponto 16.
Mas a verdade é que se deve entender que o modo processualmente adequado de
suscitar a questão de inconstitucionalidade implica uma acusação formal,
minimamente substanciada, de desconformidade constitucional imputada a uma
determinada norma jurídica, relevante para a decisão da causa, por forma a que o
tribunal possa decidir autonomamente essa matéria.
Ora, é patente que o modo pelo qual o recorrente colocou a questão ao tribunal
recorrido não concretiza tal exigência. Com efeito, mediante a alegação de que
'Deve ser declarada a nulidade da sentença que condenou o arguido por factos não
descritos na pronúncia, em violação do princípio do contraditório (art. 32.º,
n.º 5 da CRP), do artigo 32.º, n.º 1 da CRP e do artigo 279, n.º 1, alínea b) do
CPP', limitou-se o recorrente a imputar à decisão então em análise a violação de
determinados princípios constitucionais, por não ter dado cumprimento ao artigo
279º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal.
Pode, assim, concluir-se com segurança que nenhuma acusação de desconformidade
constitucional foi invocada pelo reclamante quanto à norma que agora pretende
impugnar, retirada do artigo 358.º do Código de Processo Penal, o que impede que
o Tribunal dê por verificado este requisito do recurso interposto.
Tanto basta para julgar improcedente a reclamação formulada.
3. Nestes termos, decide-se indeferir a reclamação, mantendo-se o despacho que
não admitiu o recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em
20 UC.
Lisboa, 28 de Janeiro de 2009
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão