Imprimir acórdão
Processo n.º 812/08
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
Por decisão sumária de fls. 781 e seguintes, não se tomou conhecimento do
recurso interposto para o Tribunal Constitucional por A., no que diz respeito à
norma do artigo 121º, n.º 3, do Código Penal, e, bem assim, negou-se provimento
a esse mesmo recurso, relativamente à norma do artigo 64º, n.º 1, alínea d), do
Código de Processo Penal. É a seguinte, em síntese, a fundamentação da decisão
sumária:
“Deduz-se da resposta ao despacho de aperfeiçoamento que o recorrente pretende
ver apreciadas duas questões de constitucionalidade: uma reportada ao artigo
121º, n.º 3, do Código Penal e outra ao artigo 64º, n.º 1, alínea d), do Código
de Processo Penal.
A primeira delas não se encontra minimamente identificada, pois que resulta
apenas da mencionada resposta que o recorrente censura uma determinada contagem
do prazo prescricional sem, todavia, se alcançar que modo de contagem é esse e
qual a concreta interpretação normativa em que ele assenta.
Assim sendo, não pode tomar-se conhecimento do objecto do presente recurso, no
que diz respeito ao artigo 121º, n.º 3, do Código Penal, por inidoneidade desse
mesmo objecto (veja-se, a este propósito, o disposto no artigo 193º, n.º 2,
alínea a), do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável nos termos do
artigo 69º da Lei do Tribunal Constitucional).
Quanto à segunda questão, foi a mesma já apreciada pelo Tribunal Constitucional
– como, aliás, se menciona no acórdão de 16 de Abril de 2008 do tribunal
recorrido (acima parcialmente transcrito) –, o que permite a prolação de decisão
sumária, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal
Constitucional, remetendo para a fundamentação respectiva.
Com efeito, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 578/2001, de 18 de
Dezembro (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), concluiu-se no sentido
da não inconstitucionalidade das normas dos artigos 61º, 62º e 64º, todos do
Código de Processo Penal, quando interpretados por forma a que deles decorra que
em processo crime é imposto que ao arguido seja nomeado um advogado, dessa arte
decorrendo também que ao dito arguido é vedado representar-se a si mesmo, ainda
que entenda que essa «auto-representação» seja a melhor forma de assegurar a sua
defesa.
E é a seguinte a fundamentação do Acórdão n.º 578/2001:
[…]
É para esta fundamentação que, também agora, se remete, concluindo-se, como tal,
no sentido da não inconstitucionalidade da interpretação do artigo 164º, n.º 1,
alínea d), do Código de Processo Penal que o recorrente censura.”.
Notificado desta decisão sumária, A. apresentou o seguinte requerimento junto do
Tribunal Constitucional (cfr. fls. 796 e seguintes e 809 e seguintes):
“[…] Recorrente com os sinais nos autos, interpôs, na oportunidade, recurso de
amparo constitucional, mas ficou ainda mais desamparado.
Na verdade, a identificação da 1ª questão não podia ser outra, pois, por um
lado, o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa contabiliza um prazo máximo de
prescrição que nunca chega a ser máximo, porque está constantemente a ser
suspenso e interrompido, qual comboio que nunca mais chega ao seu destino; por
outro lado, o recorrente sempre entendeu ao longo de todo o processo, que um
prazo máximo não sofre suspensões ou interrupções ou, no limite sofre apenas o
prolongamento da suspensão e não da interrupção, isto é, seria ajuizado apenas o
facto suspensivo, mas não o facto interruptivo da prescrição, não ocorrendo
novos prazos, mas apenas um prazo suspenso.
O que o recorrente sempre disse é que relativamente ao prazo máximo da
prescrição contabiliza-se apenas o tempo de suspensão, mas não o tempo de
interrupção, na verdade, a norma do artº 121, nº 3, do CP ressalva apenas e
tão-só o tempo de suspensão e o decurso do prazo normal de prescrição acrescido
de metade.
Enfim, esta opção do legislador deve ser interpretada em termos restritivos para
não ser inconstitucional, porque um prazo que está continuamente a ser renovado,
a recomeçar, nunca é um prazo máximo, mas um prazo que está sempre a recomeçar e
jamais tem termo, o que é contraditado pela Constituição, com balizas temporais
razoáveis e mediante processo equitativo, de harmonia com a norma do artº 20º,
nºs 4 e 5 da Lei Fundamental, que utiliza para além da expressão “em prazo
razoável” também a locução “em tempo útil”, o que não se compagina com uma
renovação constante do prazo.
Assim, de harmonia com o disposto no artº 669º, requer o esclarecimento desta
questão adequadamente colocada ao longo dos autos, mas que a decisão sumária,
com o devido respeito, obscureceu ou, pelo menos, contém um grau acentuado de
ambiguidade, na medida em que constam do processo elementos suficientes que, só
por si, implicam necessariamente decisão diversa da proferida e que o julgador,
por lapso manifesto, não tomou em consideração ou então não nos fizemos
compreender, apesar de termos sobejamente repisado esta tese e esta questão.
Aliás, o recorrente sobre esta problemática assentou sempre baterias no
adjectivo máximo: superlativo de grande; o maior de todos, que está acima de
todos os da sua espécie e género; excelso; sumo; aquilo que é mais alto ou mais
intenso.
Donde o prazo máximo: é um tempo determinado, não um tempo sempre
recomeçado/renovado.
Consequentemente, a indicação da causa de pedir e do pedido é bem expressa,
explícita e inteligível. Poderá estar eventualmente errada, mas isso é outra
perspectiva.
Por isso não se aplica subsidiariamente a este caso o conceito de ineptidão
(artº 193º, nº 2, al. a)).
Termos em que se requer o esclarecimento/reforma da decisão sumária”.
Notificado do requerimento que o recorrente dirigiu ao Tribunal Constitucional,
veio o representante do Ministério Público junto deste Tribunal dizer o seguinte
(cfr. fls. 839):
“O representante do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado do
pedido de esclarecimento deduzido no processo em epígrafe, vem responder-lhe nos
termos seguintes:
1º A decisão reclamada é perfeitamente clara e insusceptível de dúvida sobre o
que nela se decidiu — não identificando, aliás, o ora reclamante qualquer
“obscuridade” que pretenda ver aclarada, o que toma inidóneo o meio processual
utilizado.
2° Sendo evidente que — se discordasse da decisão reclamada — tinha a
possibilidade de a impugnar, mediante a pertinente reclamação para a
conferência”.
Cumpre apreciar.
II. Fundamentação
O reclamante não suscita qualquer questão de obscuridade ou ambiguidade que
careça de ser esclarecida e limita-se, na sua reclamação, a explicitar a questão
de constitucionalidade reportada ao artigo 121º, nº 3, do Código Penal, e
relativamente à qual o relator entendeu não ser de tomar conhecimento do
recurso.
Nesse sentido, na reclamação não se pretende mais do que discutir a própria
validade da decisão sumária, pelo que deve ser entendida como uma reclamação
para a conferência nos termos do artigo 78º-A, nº 3, da LTC.
Ora, no que se refere à parte da decisão sumária que não conheceu do objecto do
recurso, constata-se que o ora reclamante não demonstra que, na resposta que deu
ao despacho de aperfeiçoamento, tenha identificado suficientemente a
interpretação normativa (reportada ao artigo 121º, n.º 3, do Código Penal) por
si submetida à apreciação do Tribunal Constitucional.
E seria imprescindível tal demonstração, atendendo a que é esse o fundamento da
decisão de não conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade.
Recorde-se, a este propósito, o teor da resposta ao despacho de aperfeiçoamento,
no que se refere à norma do artigo 121º, n.º 3, do Código Penal (cfr. fls. 773 e
seguintes):
“[…]
a. Quanto ao artigo 121º/3º do Código Penal foi violada a contagem do termo do
prazo máximo de prescrição, sem prejuízo de ocorrer em 29.11.08, o prazo
prescricional indicado, no nosso entender tardiamente, pelo Tribunal, pelo que
por uma contagem ou por outra está inequivocamente atingido o prazo
prescricional e o procedimento criminal deve ser extinto, como vai ser
requerido, mais uma vez, ao Tribunal da Relação de Lisboa.
[…]
Pelas contas feitas pelo Tribunal eram inúmeras e intermináveis as suspensões e
interrupções que conduziam à impossibilidade e inutilização do termo do prazo
máximo de prescrição (artigo 121º/3/do CP), o que é uma interpretação desregrada
contra a Lei e contra a Constituição.
[…]”.
Limita-se, com efeito, o reclamante a sustentar que, do seu ponto de vista, é
inconstitucional o artigo 121º, n.º 3, do Código Penal, na medida em que
contabilize, para o prazo máximo de prescrição, o tempo de interrupção da
prescrição: ora, o esclarecimento a que o reclamante agora efectua na reclamação
para a conferência quanto à interpretação que pretende que o Tribunal
Constitucional aprecie, não só não ilustra que, na resposta ao despacho de
aperfeiçoamento, esse esclarecimento tenha também sido prestado, como é já
obviamente tardio (era na resposta ao despacho de aperfeiçoamento e não neste
momento processual que o objecto do recurso de constitucionalidade devia ter
sido delimitado: cfr. o artigo 75º-A, n.º 6, da Lei do Tribunal Constitucional).
Não aduzindo o reclamante qualquer outro argumento susceptível de abalar a
fundamentação da decisão sumária, nem configurando o seu pedido de aclaração e
reforma desta mais do que infundada discordância com o respectivo teor, nenhuma
razão há para alterar o sentido da decisão sumária ou proceder ao esclarecimento
do respectivo conteúdo.
III. Decisão
Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, mantém-se a decisão sumária de fls.
781 e seguintes.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 10 de Dezembro de 2008
Carlos Fernandes Cadilha
Maria Lúcia Amaral
Gil Galvão