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Processo n.º 991/08
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Tribunal da
Relação de Lisboa que confirmara a anterior decisão de primeira instância, que o
condenara, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de
embriaguez, em pena acessória de proibição de conduzir, em aplicação do disposto
no artigo 69º do Código Penal.
O recurso foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do
Tribunal Constitucional (LTC) e fundava-se na inconstitucionalidade do artigo
69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, por violação do artigo 30º, n.º 4, da
Constituição da República.
Por decisão sumária proferida ao abrigo do disposto no artigo 78º-A da LTC, o
relator julgou não inconstitucional a norma impugnada por remissão para os
fundamentos do acórdão do Tribunal Constitucional n.º 53/97.
O recorrente veio então reclamar para a conferência nos termos e com os
seguintes fundamentos:
1. Nos termos do n° 2 do artigo 78°-A da Lei do Tribunal Constitucional,
aplica-se o disposto n° 1 quando o recorrente, depois de notificado nos termos
do nº 2 do artigo 75°-A, não indique integralmente os elementos exigidos pelos
seus n°s 1 a 4.
2. O recorrente respeitou integralmente o disposto no citado preceito legal:
- indicou a alínea do artigo 70° ao abrigo da qual o recurso é interposto;
- indicou, porque o recurso foi interposto ao abrigo da alínea b) do n° 1, do
artigo 70°, a norma ou princípio constitucional que considera violado pela douta
sentença condenatória;
- indicou a peça processual na qual o recorrente suscitou a questão da
inconstitucionalidade.
3. Razão pela qual não foi recorrente convidado a indicar quaisquer elementos
adicionais.
4. Devia pois o recorrente ter sido notificado para apresentar as suas alegações
do recurso.
5. Porquanto mantém e reitera que a douta decisão condenatória violou o artigo
30°, n° 4 da Constituição da República Portuguesa, uma vez que aplicou a norma
contida na alínea a) do n° 1 do artigo 69° do Código Penal, que no entender do
recorrente está ferida de inconstitucionalidade.
O Exmo magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido do
indeferimento da reclamação.
Cabe apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Através de decisão sumária, com invocação do disposto no artigo 78º-A, n.º 1, da
Lei do Tribunal Constitucional, o relator julgou não inconstitucional a norma do
artigo 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, por remissão para os fundamentos
do acórdão n.º 53/97, cuja doutrina fora entretanto reiterada pelos acórdãos n.º
s 149/01 e 630/04.
Pretende o recorrente, através da presente reclamação, que, por força do n° 2 do
artigo 78°-A da Lei do Tribunal Constitucional, a faculdade de proferir decisão
sumária nos termos do n.º 1 só teria lugar se o impugnante não tivesse indicado
integralmente os elementos exigidos nos n°s 1 a 4 do artigo 75º-A; vindo a
concluir que, tendo o recorrente cumprido os referidos requisitos formais e não
tendo sido convidado para indicar quaisquer outros, o processo deveria ter
prosseguido para alegações.
O argumento é, no entanto, inteiramente improcedente.
O n° 2 do artigo 78°-A da Lei do Tribunal Constitucional, ao estipular que «o
disposto n° 1 é aplicável quando o recorrente, depois de notificado nos termos
do nºs 5 e 6 do artigo 75°-A, não indique integralmente os elementos exigidos
pelos seus n°s 1 a 4», não pretende significar que a decisão sumária apenas pode
ser emitida quando o recorrente, tendo sido convidado para completar o
requerimento de interposição de recurso, não tenha satisfeito integralmente esse
convite.
O que esse preceito quer dizer é, antes, que o regime do n.º 1 do artigo 78º-A é
também aplicável, e torna-se por isso extensivo, às situações em que não haja
cumprimento integral do despacho de aperfeiçoamento. Sendo, aliás, certo que no
caso de o recorrente não responder ao convite a solução legal não é a do não
conhecimento do objecto do recurso, prevista nesse preceito, mas a de deserção
do recurso (artigo 75º-A, n.º 7).
E, sendo assim, contrariamente ao que vem afirmado pelo reclamante, a
possibilidade de prolação de decisão sumária não se circunscreve aos casos de
incumprimento parcial dos requisitos formais do requerimento de interposição de
recurso, mas, como resulta do próprio contexto verbal do n.º 1 do artigo 78º-A,
aplica-se em primeira linha às situações aí previstas, a saber: (a) quando se
entenda que se não pode conhecer do objecto do recurso; (b) quando a questão a
decidir seja simples, designadamente por a mesma já ter sido objecto de decisão
anterior do Tribunal Constitucional ou ser manifestamente infundada.
Por outro lado, só quando não deva aplicar-se o disposto n.º 1 do artigo 78º-A
(isto é, quando se não verifique nenhuma das situações aí contempladas ou aquela
a que se refere o n.º 2) é que o processo prossegue para alegações, como prevê o
n.º 5 do mesmo artigo. O que bem se compreende: se não se conhecer do objecto
do recurso ou se a questão de fundo poder ser logo resolvida no exame preliminar
pelo relator, através de decisão sumária, não faz sentido que se ordene que o
processo continue para alegações, fase processual que apenas tem lugar quando a
questão de fundo deva ser apreciada pelo pleno da secção.
No caso vertente, o relator, como se expôs, proferiu decisão sumária, nos termos
do artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, por considerar que o
Tribunal Constitucional tinha já emitido pronúncia sobre a questão de
constitucionalidade que vinha suscitada, e, por conseguinte, decidiu a questão
de fundo por remissão para os fundamentos do acórdão n.º 53/97. O relator
aplicou, portanto, o regime do n.º 1 do artigo 78º-A, por entender que a questão
a decidir era simples por ter sido já objecto de jurisprudência anterior.
E como se emitiu uma decisão de fundo, no uso da referida faculdade processual,
não havia que remeter para alegações.
O reclamante, no entanto, parece discordar também do sentido da decisão
proferida, ao afirmar, no ponto 5 do seu requerimento, que «mantém e reitera que
a decisão condenatória violou o artigo 30°, n° 4, da Constituição da República
Portuguesa, uma vez que aplicou a norma contida na alínea a) do n° 1 do artigo
69° do Código Penal, que no entender do recorrente está ferida de
inconstitucionalidade».
Entendendo esta alegação como constituindo um pedido de reapreciação, pela
conferência, da decisão de fundo, ela não é de molde a implicar uma alteração do
julgado.
De facto, o reclamante não pôe em causa minimamente os argumentos que
determinaram a formulação de um juízo de não constitucionalidade e limitou-se a
manifestar a sua convicção de que a solução legislativa viola disposições
constitucionais.
E, assim, na ausência de uma alegação fundamentada ou da invocação de novos
argumentos, é de considerar como válido o entendimento jurisprudencial já
firmado sobre essa matéria e a que a decisão reclamada se limitou a aderir.
III. Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 11 de Fevereiro de 2009
Carlos Fernandes Cadilha
Maria Lúcia Amaral
Gil Galvão