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Processo n.º 630/08
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I − Relatório
1. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Santarém
interpôs recurso obrigatório para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do
disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), e 71.º, n.º1, ambos da Lei n.º
28/82, de 15 de Novembro, alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de
Fevereiro.
Invoca que “o M. Juiz, no douto despacho proferido a fls. 193 a 196, recusou a
aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade material, do artigo 4.º do
Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na interpretação de que nos
procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias
emergentes de contratos não há, no caso de citação edital, lugar a dilação.”
2. Notificado para alegar, o Exmo. representante do Ministério Público, junto
deste Tribunal veio dizer o seguinte:
“1. Questão prévia: a utilidade do presente recurso
O presente recurso obrigatório vem interposto pelo Ministério Público da decisão
proferida nos autos de acção especial de cumprimento de obrigação pecuniária, em
que figura como A. A., SA e como réu B., que considerou materialmente
inconstitucional a norma constante do artigo 4° do Decreto-Lei n° 269/98,
enquanto determina que, nos procedimentos aí regulados, não há lugar a dilação,
mesmo quando tenha sido edital a citação do réu, ausente em parte incerta.
Admitido o recurso, interposto a p. 203, no regime de subida diferida e efeito
meramente devolutivo, os autos prosseguiram o seu curso normal, culminando na
prolação de sentença condenatória contra o réu revel.
Verifica-se, deste modo, que este não contestou – nem no prazo legal de 20 dias,
nem no prazo ampliado, decorrente da aplicação das normas sobre dilação, como
consequência do juízo de inconstitucionalidade emitido a p. 194 – o que
naturalmente implica – face ao regime de subida atribuído ao recurso de
fiscalização concreta – a inutilidade da dirimição, neste momento, da questão de
constitucionalidade suscitada: na verdade, qualquer que fosse a decisão a
proferir, neste momento, por este Tribunal Constitucional manter-se-ia, em
absoluto, incólume a sentença de mérito já proferida nos autos (apenas havendo
interesse processual em dirimir tal questão se, porventura, o réu tivesse
contestado no prazo adicional, decorrente da aplicação das normas sobre
dilação).
Nestes termos – e face à inquestionável natureza instrumental da fiscalização da
constitucionalidade, reiteradamente afirmada e aplicada pela jurisprudência
constitucional, entendemos que carece de interesse a apreciação do mérito do
recurso.
2. Conclusão
Nestes termos e pelo exposto, conclui-se:
l.º
Incidindo o objecto do recurso de fiscalização concreta, interposto pelo
Ministério Público, sobre a recusa de aplicação de norma processual, com relevo
para a fixação do prazo da contestação do réu, e – como decorrência do regime de
subida e efeito atribuído ao recurso para o Tribunal Constitucional – apenas
subindo este a final, sem que o réu tenha apresentado contestação, e após ser
proferida contra si sentença condenatória, carece de interesse processual a
dirimição da questão de constitucionalidade suscitada, por nenhuma repercussão
ter sobre a referida sentença de mérito.
2°
Termos em que – face à natureza instrumental da fiscalização da
constitucionalidade – não deverá conhecer-se do recurso.”
Decorrido o prazo, o recorrido A., SA, não contra alegou.
Cumpre decidir.
II – Fundamentação
3. O Ministério Público suscitou a questão prévia da inutilidade do presente
recurso de constitucionalidade.
Uma vez que o Recorrido não contestou a decisão do Tribunal de Santarém – nem no
prazo legal de 20 dias, nem no prazo ampliado resultante das normas sobre
dilação em resultado do juízo de inconstitucionalidade formulado pelo juiz a quo
– qualquer juízo que o Tribunal Constitucional viesse a formular sobre a norma
do artigo 4.º do Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro, na dimensão
questionada, não viria alterar a decisão recorrida, pois esta sempre
subsistiria.
4. Tendo o recurso de constitucionalidade uma natureza instrumental, como é
jurisprudência uniforme deste Tribunal, se a decisão deste já não tiver
repercussão útil sobre a decisão recorrida o Tribunal não poderá dele tomar
conhecimento.
5. Conclui-se deste modo que a resolução da questão de constitucionalidade
submetida ao Tribunal Constitucional não tem a virtualidade de reflectir
qualquer efeito útil nos autos pelo que se impõe o respectivo não conhecimento.
III – Decisão
Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide
não tomar conhecimento do objecto do presente recurso.
Sem custas.
Lisboa, 22 de Outubro de 2008
José Borges Soeiro
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão
Rui Manuel Moura Ramos