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Processo n.º 1091/07
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – O Vice-Reitor da Universidade Técnica de Lisboa recorre para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º
70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do Acórdão
do Tribunal Central Administrativo Sul, de 4 de Outubro de 2007, que negou
provimento ao recurso jurisdicional interposto da sentença do então Tribunal
Administrativo do Círculo de Lisboa que concedeu provimento ao recurso
contencioso interposto pelo ora recorrido A. e anulou o despacho do recorrente,
de 15.10.1997, que indeferiu o pedido do recorrido de criação de um lugar de
Professor Catedrático, ao abrigo do disposto no art.º 18.º do Decreto-Lei n.º
323/89, de 26 de Setembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
34/93, de 13 de Fevereiro.
2 – Nas suas alegações para o Tribunal Central Administrativo Sul, o
recorrente refutou a sentença da 1.ª instância, com base nas seguintes
considerações, pertinentes para a compreensão do caso:
«[…]
IIIª) – A douta sentença recorrida violou, ainda, o art. 25° da LPTA bem como o
art. 13° e 168°, nº 2, da Constituição;
Na verdade,
[…]
VIª) – O art. 18° do DL nº 323/89, com a redacção dada pelo DL nº 34/93, no
sentido de ampliar o regime decorrente deste artigo aos docentes universitários
é inconstitucional, por falta de autorização legislativa dado a autorização
constante da al. d) do nº 1 do art. 5° da Lei nº 2/92 não respeitar o regime
constante do art. 168°, nº 2 da Constituição;
Por outro lado,
VIIª) – A nomeação em categoria superior à que possuísse à data de nomeação para
dirigente, depende da verificação dos requisitos especiais consagrados no
respectivo Estatuto para os funcionários dos corpos especiais;
VIIIª) – Sendo os docentes universitários um corpo especial, a nomeação do
Recorrente, finda a comissão de serviço, ao abrigo do art. 18° do Decreto-Lei nº
323/89, depende do cumprimento, à data da nomeação, dos requisitos especiais;
IXª) – De acordo com o ECDU, os professores associados, para serem providos na
categoria de professor catedrático, para além do tempo mínimo de serviço, devem
possuir o título de agregado, ser aprovados em concurso documental sendo
reconhecido ao seu currículo mérito científico e pedagógico compatível com a
categoria de professor catedrático e ainda ser ordenados em lugar elegível em
função do número de vagas para que foi aberto o concurso;
XIª) – Assim, os docentes que pretendiam ser providos, nos termos do art. 18° do
Decreto-Lei nº 323/89, por terem desempenhado cargos dirigentes, devem para além
de tempo de serviço e do título de agregado, submeter, à data da nomeação, o seu
currículo à apreciação de um Júri a fim de este se pronunciar sobre se o
respectivo mérito científico e pedagógico é compatível com a categoria de
acesso;
XIIª) – A apreciação do mérito científico e pedagógico do currículo tendo em
vista o provimento em categoria superior é efectuada à altura do provimento
nessa categoria por um Júri designado para o efeito;
XIIIª) – As eventuais apreciações do mérito científico e pedagógico dos
currículos dos docentes no âmbito de anteriores concursos a que eventualmente se
tenham candidatado não valem fora do respectivo concurso, não podendo ser tido
em conta para efeitos do nº 2, al. a), e nº 3 do art. 18° do Decreto-Lei nº
323/89;
XIVª) – Em relação aos demais docentes a avaliação do mérito científico e
pedagógico de um currículo não vale nos próximos concursos a que se apresentem,
pois aquela aprovação apenas vale no âmbito do concurso em que for realizada;
XVª) – De igual modo se deverá verificar em relação aos docentes universitários
que forem nomeados para cargos dirigentes;
XVIª) – Viola o princípio constitucional da igualdade o entendimento de que os
docentes nomeados para cargos de chefia se podem aproveitar de aprovação em
mérito científico e pedagógico ocorrido num concurso anterior, quando tal
aproveitamento não se pode verificar em relação aos demais docentes;
XVIIª) – Não há qualquer fundamento para que os docentes nomeados para cargos
dirigentes fora da Universidade – os que exerçam cargos dirigentes na
Universidade, ainda que mais relevantes não usufruem de qualquer benefício –
vejam a sua aprovação em qualquer concurso válida fora desse concurso e
ilimitadamente enquanto em relação aos demais docentes tal aprovação apenas vale
no respectivo concurso».
Nas mesmas alegações, e a propósito da alegada violação do n.º 2 do
art.º 168.º da Constituição, o recorrente disse “estar[á] também em causa a
autonomia das universidades consagrada no art.º 76.º da Constituição e que
constitui reserva de lei”.
3 – Na parte circunstancialmente relevante para a compreensão da
questão de constitucionalidade, a decisão recorrida discreteou pelo seguinte
modo:
«6. De acordo com as conclusões das alegações, são as seguintes as questões a
apreciar no recurso:
a) Inadmissibilidade de recurso contencioso do despacho em causa nos autos
(conclusões IVª e Vª);
b) Violação do disposto nos nºs 2, alínea a) e 3 do art. 18º do DL nº 323/89, de
29 de Junho, uma vez que o recorrido não preencheria os requisitos aí exigidos
(conclusões VIIª a XVª);
c) Inconstitucionalidade do art. 18º do DL nº 323/89, de 26 de Setembro, por
falta de autorização legislativa no sentido de ampliar o regime decorrente deste
artigo aos docentes universitários (conclusão VIª);
d) Inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, ao aceitar-se
que os docentes nomeados para cargos dirigentes se podem aproveitar de aprovação
em mérito científico e pedagógico ocorrido num concurso anterior, quando tal
aproveitamento não pode ter lugar quanto aos outros docentes (conclusões XVIª e
XVIIª).
Comecemos por apreciar, em primeiro lugar, a questão da inadmissibilidade do
recurso suscitada pelo recorrente.
5.1. Esta questão foi tratada em 1ª instância nos seguintes termos:
“A autoridade recorrida alega que o acto impugnado não define a situação
jurídica do recorrente, sendo meramente preparatório do procedimento de eventual
provimento do recorrente, tal como o acto de designação do próprio júri.
O recorrente veio dizer que o acto recorrido indeferiu a sua pretensão de vir a
ser nomeado sem concurso, definindo a sua situação jurídica, sendo recorrível.
Como salienta o Ministério Público, a fls. 37, para a resolução da questão há
que averiguar do sentido da declaração contida no requerimento do recorrente,
constatando-se que o mesmo 'tem subjacente uma premissa: logo à data da
formulação da pretensão estão reunidos todos os pressupostos dos quais depende o
provimento, por nomeação, para o lugar de professor catedrático da UTL'.
Assim, perante esta premissa a pretensão do recorrente é a do seu provimento no
lugar, sem submissão à avaliação ao seu 'mérito absoluto” por parte do júri.
Ora, como defende o Ministério Público, o despacho recorrido, ao nomear o júri
para o efeito de ponderar do 'mérito absoluto' do recorrente, 'tem como
pressuposto lógico um juízo da autoridade recorrida nos termos do qual não está
preenchido tal requisito', pelo que o mesmo é lesivo da posição jurídica do
recorrente, e, como tal, é recorrível, nos termos do art. 268°, nº 5 da
Constituição da República.
Pelo exposto, julgo não verificada a questão prévia de irrecorribilidade do acto
impugnado suscitada pela autoridade recorrida”.
Concorda-se com o decidido, pelo que se julgam improcedentes as conclusões IVª e
Vª).
5.2. As questões de inconstitucionalidade acima identificadas foram apenas
suscitadas pelo recorrente em sede de recurso.
É sabido que as partes não podem suscitar questões novas em sede de recurso,
pois que estes visam apenas a reapreciação das decisões dos tribunais de grau
hierárquico inferior e não decidir questões novas.
No entanto, a alegação de inconstitucionalidade tem sido admitida em sede de
recurso, até porque se trata de questão de conhecimento oficioso (Neste sentido,
entre outros, V. o Acórdão do STA (2ª Secção), de 13.12.2000 - Recurso nº 24.319
e o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 637/99, de 23.11.1999 - Processo nº
206/99 “in” DR, II Série, de 22.03.2000, págs. 5248 e segs.; em sentido idêntico
v. os Acórdãos deste Tribunal nºs 173/88 e 41/92).
Assim sendo, vamos então conhecer das inconstitucionalidades citadas.
5.2.1. Entende o recorrente que a autorização legislativa conferida pela alínea
d) do nº 1 do art. 5º da Lei nº 2/92, de 9 de Maio, não permitia a extensão do
direito consagrado no art. 18º acima citado aos docentes universitários.
Aliás, na anterior redacção desse art. 18º, não estavam incluídos os corpos
especiais.
O recorrido, por sua vez, - alegações de fls. 92-vº - entende que tal artigo 18º
antes e depois da alteração introduzida pelo DL nº 34/93, de 13 de Fevereiro,
tem como epígrafe o direito à carreira, pelo que o objecto da autorização
legislativa era o direito à carreira, acabando por se distinguir o pessoal
oriundo da carreira geral e das carreiras especiais da função pública. Ora, a
simples clarificação dessa matéria não pode constituir violação do sentido e
alcance daquela autorização legislativa.
Quid juris?
É certo que a autorização legislativa não menciona os docentes universitários.
Porém, reportando-se o art. 18º citado ao direito à carreira na função pública,
não nos parece que a distinção ou explicitação feita quanto à carreira geral e a
corpos especiais ofenda a autorização legislativa.
É que, tanto uns como outros se incluem na função pública, facto que a
autorização tinha de ter em conta.
Por outro lado, integrando-se os docentes universitários nos corpos especiais da
função pública, a terminologia legal utilizada passou também a abrangê-los, sob
pena de discriminação relativamente a outros dirigentes, pertencentes a corpos
especiais e não docentes.
Concluímos então no sentido da inverificação da invocada inconstitucionalidade
do art. 18º, por violação da autorização legislativa ao abrigo da qual foi
publicada aquela norma, improcedendo a conclusão VIª.
5.2.2. E será que ocorre a violação do princípio constitucional da igualdade, na
interpretação dada ao art. 18º pela decisão recorrida?
Vejamos.
Sustenta o recorrente que a interpretação dada pela sentença ao art. 18º, nº 2,
alínea a) citado viola o princípio da igualdade, ao reconhecer que o mérito
anteriormente reconhecido em concurso satisfaz a exigência legal, quando é certo
que os docentes não colocados na situação de dirigentes precisam de ver o seu
mérito reconhecido de cada vez que se apresentam a concurso.
No entender do recorrente isto representaria para o recorrido um benefício de
que estariam afastados os docentes universitários que não tivessem sido
dirigentes.
Mas será que o legislador não quis mesmo estabelecer aqui um benefício aos
dirigentes da função pública?
É evidente que a norma citada quis de algum modo recompensar os dirigentes que
tivessem permanecido no cargo por determinado período de tempo e, por isso, veio
determinar que “ Os funcionários nomeados para cargos dirigentes têm direito,
finda a comissão de serviço, ainda que seguida de nova nomeação:
a) Ao provimento em categoria superior à que possuíam à data da nomeação para
dirigente….”
E o nº 6 do mesmo artigo previu ainda que fossem criados nos quadros de pessoal
dos serviços ou organismos de origem os lugares necessários à execução do
disposto na citada alínea a) do nº 2, sendo posteriormente extintos à medida que
vagassem.
Quer então dizer que a referida norma criou um direito especial para dirigentes
da função pública.
Ora, não existe nenhuma razão para este regime não se aplicar aos professores,
também eles funcionários públicos, embora constituindo um corpo especial.
Sendo assim, os professores que tivessem sido dirigentes estavam em situação de
vantagem relativamente aos que o não tivessem sido, gozando do disposto no art.
18º citado.
Então, as situações apontadas pelo recorrente são distintas.
E, como é sabido, o princípio da igualdade só é violado quando situações
idênticas são tratadas de modo diferente. No caso, o tratamento desigual de
situações diversas não contempla a violação do princípio constitucional da
igualdade.
Isto que acabou de referir-se é o que resulta claramente de uma passagem do
Acórdão do Tribunal Constitucional nº 528/2006, de 27 de Setembro de 2006 -
Processo nº 227/06, 3ª Secção, onde se escreveu o seguinte:
“Unanimemente reconhecido como princípio estruturante do Estado de Direito
Democrático, o princípio da igualdade postula, na sua formulação mais sintética,
que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e
tratamento diferente para as situações de facto desiguais (cfr. por todos, entre
inúmeros neste sentido, os Acórdãos nºs 563/96, 319/90, 232/03 e 96/2005,
disponíveis na página Internet deste Tribunal em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/, que procederam, cada um no
seu tempo, a uma síntese da abundante jurisprudência constitucional sobre o
tema). Correctamente entendido, o princípio da igualdade não proíbe as
distinções, mas apenas aquelas que se afigurem destituídas de um fundamento
racional. Como se ponderou, por exemplo, no Acórdão nº 187/01 (igualmente
disponível naquela página): “como princípio de proibição do arbítrio no
estabelecimento da distinção, tolera, pois, o princípio da igualdade a previsão
de diferenciações no tratamento jurídico de situações que se afigurem, sob um ou
mais pontos de vista, idênticas, desde que, por outro lado, apoiadas numa
justificação ou fundamento razoável, sob um ponto de vista que possa ser
considerado relevante”. Em suma e no essencial, o que o princípio constante do
art. 13º da Constituição impõe, sobretudo, é uma proibição do arbítrio e da
discriminação sem razão atendível. O que importa, como afirma, sugestivamente,
Vieira de Andrade (Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976,
2ª edição, 2001, pág. 272) e tem sido repetido em inúmeras ocasiões pelo próprio
Tribunal Constitucional, “(…) é que não se discrimine para discriminar”.
Improcedem pelo exposto, as conclusões XVIª e XVIIª.».
4 – No seu requerimento de interposição do recurso de
constitucionalidade, o recorrente disse pretender a apreciação da
constitucionalidade “do art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro,
alterado pelo Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, pelo Decreto-Lei n.º
239/94, de 22 de Setembro, e pela Lei n.º 13/97, de 23 de Maio, na interpretação
dada de que o regime dele constante se aplica aos docentes universitários das
Universidades Públicas, pois no entender do recorrente o mesmo é
inconstitucional, quer por falta de autorização legislativa, quer por violação
dos princípios constitucionais da justiça, igualdade e da autonomia
universitária”.
5 – Alegando, no Tribunal Constitucional, o recorrente concluiu as
suas alegações do seguinte jeito:
«I — O douto Acórdão recorrido do Tribunal Central Administrativo Sul, de
4 de Outubro de 2007, não fez uma correcta interpretação da Constituição e da
lei aplicáveis;
II — Com efeito, os nºs 2, alínea a), e o nº 3, do artigo 18° do
Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 34/93, de
13 de Fevereiro, pelo Decreto-Lei nº 239/94, de 22 de Setembro e pela Lei nº
13/97, de 23 de Maio, são inconstitucionais por falta de autorização
legislativa;
III — Na verdade, aquele artigo foi aprovado ao abrigo da autorização
legislativa constante da alínea d) do nº 1 do artigo 5º da Lei nº 2/92, de 9 de
Março, diploma que aprovou o Orçamento de Estado para 1992, mas esta não cumpre
os requisitos do artigo 168º, nº 2, da Constituição, na redacção em vigor à data
da publicação do diploma aqui em causa, segundo o qual as leis de autorização
legislativa devem definir “o objecto, o sentido, a extensão e a duração da
autorização”;
IV — A autorização legislativa da alínea d) do nº 1 do artigo 5º da Lei nº
2/92, de 9 de Março, limita-se a referir que o Governo é autorizado a “...
alterar o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da
administração central, regional e local … tendo em vista definir com maior
clareza o direito à carreira, bem como o direito à indemnização ….“, pelo que
não cumpre os enunciados requisitos constitucionais, pois a mesma não contém de
forma clara uma enunciação que possa servir de parâmetro e medida aos actos
delegados;
V — A expressão “definir com maior clareza o direito à carreira” é vaga e
não contém qualquer conteúdo delimitativo da autorização legislativa como exige
a Constituição;
VI — Por outro lado, mesmo a entender-se que a referida autorização
legislativa cumpre com os requisitos do artigo 168º, nº 2, da Constituição, com
o que não se concorda, o certo é que não decorre da mesma uma autorização para o
Governo legislar sobre a carreira docente universitária, matéria que está
sujeita a reserva de lei por força do artigo 76º da Constituição por se
enquadrar na autonomia das universidades;
VII — Assim, também por este facto, o citado artigo 18º do Decreto-Lei nº
323/89, de 26 de Setembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 34/93, de 13 de
Fevereiro, na interpretação do Acórdão recorrido de que o regime de progressão
extraordinária na carreira previsto no mesmo se aplica aos docentes
universitários que tenham desempenhado cargos de chefia fora das universidades é
inconstitucional;
VIII — Mas mesmo a entender-se, como no Acórdão do TCAS recorrido, que artigo
18º do Decreto-Lei nº 323/89, de 26.09, ao conceder aos funcionários nomeados
para cargos dirigentes o direito de finda a comissão de serviço serem providos
em categoria superior àquela que possuíam à data da nomeação para dirigente se
aplica aos docentes universitários, o mesmo viola ainda os princípio
constitucionais da igualdade, da justiça e da proporcionalidade, inerentes a um
Estado de direito democrático, constantes dos artigos 13º e 2º da Constituição;
IX — Tal regime viola igualmente o princípio constitucional da autonomia
das universidades, consagrado no artigo 76º da Constituição, dado que consagra a
imposição externa à universidade de um aumento dos seus quadros, com os
correspondentes encargos financeiros, pelo que também por isso a sua consagração
necessitava de autorização legislativa inequívoca, que, como ficou demonstrado,
não existe;
X — Não há, pois, qualquer fundamento para que este “direito” que
constitui um privilégio injustificado, seja concedido aos docentes
universitários nomeados para cargos dirigentes fora da Universidade, quando os
que exercem cargos dirigentes na Universidade, ainda que mais relevantes do que
aqueles, como sejam os de Reitor, Vice-Reitor, Presidente do Conselho Directivo
de Faculdade, Director de Faculdade, e outros equivalentes, não usufruem de
qualquer regalia de natureza semelhante;
XI — O reconhecimento de uma tal situação constitui uma intromissão na
autonomia universitária, permitindo a progressão na carreira universitária, à
revelia dos critérios da avaliação universitária, em que não basta ter mérito
absoluto para progredir na carreira mas é ainda necessário o mérito relativo,
como decorre do regime consagrado para a carreira docente universitária
constante do Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), aprovado pelo
Decreto-Lei nº 448/79, de 13 de Novembro, alterado, por ratificação, pela Lei nº
19/80, de 16 de Julho, concretamente dos seus artigos 37º a 52º, para além do
aumento dos encargos financeiros.
Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, que se peticiona,
deve ser considerado procedente o presente recurso e consequentemente:
(i) ser declarado inconstitucional o artigo 18º, nºs 2, alínea a) e 3, do
Decreto-Lei nº 323/89, de 26.09, na redacção do Decreto-Lei nº 34/93, de 13 de
Fevereiro, na interpretação do Acórdão recorrido de o seu regime se aplicar ao
corpo especial dos docentes universitários;
e
(ii) ser revogado o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 4 de
Outubro de 2007, devendo ser proferido novo acórdão, tendo em conta a declaração
de inconstitucionalidade referida em (i), de que artigo 18º do Decreto-Lei nº
323/89, de 26.09, na redacção do Decreto-Lei nº 34/93, de 13 de Fevereiro, não
se aplica à carreira docente universitária, com o que se fará a costumada
JUSTIÇA».
6 – O recorrido contra-alegou defendendo o julgado.
Com esse sentido, sustenta que a norma constitucionalmente impugnada
não extravasa o sentido da autorização legislativa conferida pela alínea d) do
n.º 1 do art.º 5.º da Lei n.º 2/92, de 9 de Março, como, de resto, foi decidido
nos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 65/00 e 119/02, relativamente às
carreiras especiais; que a questão da violação do princípio constitucional da
autonomia universitária não foi suscitada de modo suficiente, nas alegações de
recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul, porquanto, apenas, foi
referida “de modo marginal”, e “en passant”, e sem a ter reflectido nas
conclusões respectivas, mas que, de qualquer modo, ela não é beliscada uma vez
que a disposição se aplica a todos os corpos especiais e a autonomia
universitária está expressamente sujeita a reserva de lei; e que, finalmente,
que as situações dos docentes do ensino superior que exercem funções nos termos
do Decreto-Lei n.º 323/89 são objectivamente desiguais das exercidas na carreira
docente, reclamando por isso tratamento desigual.
B – Fundamentação
7 – Da delimitação do objecto do recurso
No seu requerimento de interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional, o recorrente diz pretender a apreciação da constitucionalidade
do “art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, alterado pelo
Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, pelo Decreto-Lei n.º 239/94, de 22 de
Setembro, e pela Lei n.º 13/97, de 23 de Maio, na interpretação segundo a qual o
regime dele constante se aplica aos docentes universitários das Universidades
Públicas, pois no entender do recorrente o mesmo é inconstitucional, quer por
falta de autorização legislativa, quer por violação dos princípios
constitucionais da justiça, igualdade e da autonomia universitária”.
Ora, constata-se que a decisão recorrida apenas aplicou o art.º
18.º, nº 2, al. a), e nº 3 do Decreto-Lei n.º 323/89, na redacção dada pelo
Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Janeiro.
Assim sendo, e constituindo o direito infraconstitucional, tal como
foi aplicado, um dado para o Tribunal Constitucional, porquanto relativo à
definição do objecto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade,
apenas dessa norma, e com o sentido com que foi aplicada, se poderá curar.
Por outro lado, questiona o recorrido a possibilidade do Tribunal
Constitucional conhecer da questão de constitucionalidade do referido preceito,
em função do princípio da autonomia universitária, já que este apenas foi
convocado “em passant”, nas alegações de recurso do recorrente e não foi levado
às conclusões.
Entende-se, porém, não ser de atender à objecção do recorrido.
Na verdade, decorre das disposições conjugadas dos art.ºs 51.º, n.ºs
1 e 5, 75.º-A, n.º 1 e 79.º-C da LTC que o Tribunal Constitucional apenas se
encontra vinculado ao pedido formulado pelo recorrente, mas, já, não aos seus
fundamentos.
O apelo à autonomia universitária reporta-se, sem dúvida, a um
parâmetro constitucional constante do art.º 76.º, n.º 2, da Constituição, tido
como aplicável para a decisão da questão de constitucionalidade cingida à norma
de direito infraconstitucional identificada, pelo que tem a natureza de um
fundamento.
8.1 – Do mérito do recurso
O art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, na
redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, e pelo Decreto-Lei
n.º 239/94, de 22 de Setembro, tem o seguinte teor:
«Artigo 18.º
Direito à carreira
1- O tempo de serviço prestado em cargos dirigentes conta para
todos os efeitos legais, designadamente para promoção e progressão na categoria
em que cada funcionário se encontrar integrado.
2 – Os funcionários nomeados para cargos dirigentes têm direito,
finda a comissão de serviço, ainda que seguida de nova nomeação:
a) Ao provimento em categoria superior à que possuíam à data da
nomeação para dirigente, a atribuir em função do número de anos de exercício
continuado nestas funções, agrupados de harmonia com os módulos de promoção na
carreira e em escalão a determinar, nos termos do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º
353-A/89, de 16 de Outubro;
b) Ao provimento na categoria de origem, caso não estejam em
condições de beneficiar do disposto na alínea anterior.
3 – A aplicação do disposto na alínea a) do número anterior aos
funcionários oriundos de carreira ou corpos especiais depende da verificação dos
requisitos especiais de acesso previstos nas respectivas leis reguladoras, bem
como das habilitações literárias exigidas.
4 – Para efeitos do cômputo do tempo de serviço estabelecido no n.º
2 releva, também, o prestado em regime de substituição.
5 – O disposto no n.º 2 não prejudica o direito de os funcionários
que exerçam funções dirigentes se candidatarem aos concursos de acesso que
ocorrerem na pendência da respectiva comissão de serviço, caso em que o
provimento respectivo é determinante para efeitos da alínea a) do n.º 2.
6 – Serão criados nos quadros de pessoal dos serviços ou organismos
de origem os lugares necessários à execução do disposto na alínea a) do n.º 2,
os quais são extintos à medida em que vagarem.
7 – O disposto no número anterior pode ter lugar, a requerimento do
interessado, independentemente da cessação de comissão de serviço, quando se
trate da categoria mais elevada da carreira.
8 – A alteração dos quadros prevista no n.º 6 será feita por
portaria dos Ministros das Finanças e da respectiva pasta a publicar na 2.ª
série do Diário da República.
9 – Os funcionários que beneficiem do disposto na alínea a) do n.º 2
do presente diploma têm direito à remuneração pela nova categoria e escalão
desde a data da cessação da respectiva comissão de serviço.
10 – No caso da cessação da comissão de serviço nos termos da alínea
b) do n.º 1 do artigo 7.º, os dirigentes têm direito, desde que contem pelo
menos 12 meses seguidos de exercício do respectivo cargo, a uma indemnização de
montante igual à diferença entre a remuneração do cargo dirigente cessante e a
remuneração da respectiva categoria calculada em função do tempo que faltar para
o termo da comissão, a qual não pode ultrapassar a diferença anual das
remunerações, nelas se incluindo os subsídios de férias e de Natal.
11 – O direito à indemnização prevista no número anterior só é
reconhecido nos casos em que à cessação da comissão de serviço não se siga
imediatamente nova nomeação em cargos dirigentes.
12 – A nomeação em cargos dirigentes no período a que se reporta a
indemnização determina a obrigatoriedade da reposição da importância
correspondente à diferença entre o número de meses a que respeite a indemnização
percebida e o número de meses que mediar até à nova nomeação.».
Por seu lado, o art.º 5.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 2/92, de 9
de Março, dispõe do seguinte jeito:
«Artigo 5.º
Regime jurídico
1 – Prosseguindo na via de aperfeiçoamento e modernização do regime
jurídico da função pública, fica o Governo autorizado a legislar no sentido de:
a) …
b) …
c) …
d) Alterar o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos
da administração central, regional e local, constante do Decreto-Lei n.º 323/89,
de 26 de Outubro, em especial os artigos 18.º e 19.º, tendo em vista definir com
maior clareza o direito à carreira, bem como o direito à indemnização prevista
nos n.ºs 7 e 8 do art.º 18.º do mesmo diploma.».
8.2 – A primeira questão que o recorrente coloca é a da
inconstitucionalidade do art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, na redacção acima
fixada, “quer por não respeitar o regime do n.º 2 do art.º 168.º da
Constituição, quer por nos termos do artigo 76.º as universidades se integrarem
na administração autónoma, e que constitui reserva de lei”. Segundo a sua
argumentação, “o legislador limitou-se a referir que pretendia clarificar o
direito à carreira e à indemnização”, nada referindo “quanto ao âmbito de tais
direitos, nem quanto a ampliar o regime legal aos corpos especiais”.
De acordo com o disposto no referido no art.º 168.º, n.º 2, da
Constituição, na redacção vigente ao tempo de edição do diploma que está em
causa, “as leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a
extensão e a duração da autorização”.
A compreensão destes elementos condicionadores da sua validade
constitucional ou “requisitos mínimos” das leis de autorização legislativa foi
já abordada, por diversas vezes, pelo Tribunal Constitucional.
Assim no Acórdão n.º 358/92, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt, escreveu-se o seguinte:
«Após 1982, o modelo constitucional português aproxima-se do vigente na Lei
Fundamental de Bonn onde, no seu artigo 80º, se exige que a lei de autorização
“contenha, em termos determinados, o conteúdo, o objecto e o alcance da
autorização outorgada'. A definição destes limites deve constar imediatamente da
lei de autorização, não podendo ser determinados apenas a partir dos próprios
diplomas autorizados, na medida em que é o próprio legislador delegante que tem
a obrigação constitucional de estatuir as normas habilitantes, e deve fazê-lo em
termos que, simultaneamente, orientem o legislador delegado e tornem
reconhecível e até previsível pelo cidadão qual o sentido da legislação que vai
ser emanada ao abrigo dos poderes delegados.
Como referem Maunz, Durig e Herzog ('Grundgesetz-Kommentar',
Munchen, 1978, comentário ao artº 80º, nota 30) 'o legislador tem que tomar
decisões, segundo uma orientação que repute conveniente, relativa a domínios
vitais do ordenamento, tem que ter querido alguma coisa e pensado no que queria,
sem poder transferir o essencial dessa decisão para a entidade que emite o
decreto.'
Analisando esta questão, António Vitorino ('As autorizações
legislativas...' cit., pág. 233), refere que 'na doutrina alemã a conjugação dos
três elementos referenciados, constantes da lei de autorização, prefiguram o
'programa normativo' da delegação, susceptível de uma interpretação uniforme que
possibilita que, a partir de uma das suas vertentes, o intérprete (ou o
julgador) determine os elementos essenciais dos outros dois pressupostos ou
limites da delegação. Essa faculdade, que relativiza a exigência de, logo na
lei, se conter em detalhe todos os limites que presidem à delegação, constitui
uma resultante do próprio posicionamento do Tribunal Constitucional Federal,
cuja jurisprudência tem vindo progressivamente a afrouxar o grau de exigência
desses elementos, em termos tais que tem tido por verificada a existência de
cada elemento ou limite da autorização à luz e no contexto do restante conteúdo
dessa autorização. Em contrapartida, a mesma doutrina alemã tem detectado que,
no domínio do Direito Penal e do Direito Fiscal, a jurisprudência do Tribunal
Constitucional Federal tem vindo a impor exigências mais rígidas quanto às leis
de autorização, atento o melindre de que revestem tais leis nesses domínios,
face à defesa dos direitos e interesses dos cidadãos.
Diversa é a situação nos ordenamentos jurídicos italiano e espanhol
onde, nos artigos 76º e 82º, respectivamente, da Constituição da República
italiana e da Constituição espanhola, o grau de exigência de especificação dos
limites materiais da lei de delegação é bastante maior do que no caso alemão,
dela devendo constar expressamente os 'princípios e critérios directivos'
orientadores do exercício dos poderes delegados, sendo, aliás, assinalável a
polémica doutrinária acerca da profundidade com que a lei de autorização pode
condicionar o exercício dos poderes autorizados.
O texto constitucional português, como já se deixou dito,
aproxima-se mais do seu congénere alemão, podendo entender-se que o sentido de
uma autorização legislativa, sendo um dos elementos do 'conteúdo mínimo
exigível' da lei de autorização, só é efectivamente observado quando as
indicações a esse título constantes da lei de autorização permitam um juízo
seguro de conformidade material do conteúdo do acto delegado em relação ao da
lei delegante, pelo que, se o 'sentido' não tem que exprimir-se em abundantes
princípios ou critérios directivos, deverá, pelo menos, ser suficientemente
inteligível para que o seu conteúdo possa preencher a função paramétrica que a
Constituição lhe confere.
Nesta ordem de ideias escreveu António Vitorino (op. cit., pág. 238
e 239): 'O sentido da autorização legislativa, sendo algo mais do que a mera
conjugação dos elementos objecto (matéria ou matérias da reserva relativa de
competência legislativa da Assembleia da República sobre que incidirão os
poderes delegados) e extensão (aspectos da disciplina jurídica daquelas matérias
que integram o objecto da autorização que vão ser modificados), não constitui,
contudo, exigência especificada de princípios e critérios orientadores (...),
mas algo mais modesto ou de âmbito mais restrito, que deve constituir
essencialmente um pano de fundo orientador da acção do Governo numa tripla
vertente :
- por um lado, o sentido de uma autorização deve permitir a
expressão pelo Parlamento da finalidade da concessão dos poderes delegados na
perspectiva dinâmica da intenção das transformações a introduzir na ordem
jurídica vigente (é o sentido na óptica do delegante) ;
- por outro lado, o sentido deve constituir indicação genérica dos
fins que o Governo deve prosseguir no uso dos poderes delegados, conformando,
assim, a lei delegada aos ditames do órgão delegante (é o sentido na óptica do
delegado) ;
- e, finalmente, o sentido da autorização deverá permitir dar a
conhecer aos cidadãos, em termos públicos, qual a perspectiva genérica das
transformações que vão ser introduzidas no ordenamento jurídico em função da
outorga da autorização (é o sentido na óptica dos direitos dos particulares,
numa zona revestida de especiais cuidados no texto constitucional – as matérias
que incluem a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da
República).'.
8.3 – O problema de inconstitucionalidade, imbricado com a falta, a
invalidade ou a violação de lei de autorização legislativa, apenas, se coloca em
relação às matérias da reserva relativa da Assembleia da República enunciadas,
então, no art.º 168.º da Constituição.
O recorrente argumenta que a matéria regulada na norma impugnada se
encontra abarcada na autonomia universitária contemplada no n.º 2 do art.º 76.º
da Constituição.
Não importa à economia da decisão sobre esta questão saber qual a
melhor qualificação a atribuir às universidades, dentro da função material
administrativa do Estado, já que a resposta há-de derivar directamente da Lei
Fundamental.
Não obstante, para enquadramento da questão, afigura-se útil uma
breve abordagem da matéria.
Na vigência da Constituição de 1933, Marcello Caetano via as
universidades como institutos públicos, do tipo de serviços personalizados, cujo
substrato “se formou, desenvolveu e adquiriu personalidade jurídica
historicamente à margem do Estado, segundo o Direito privado ou o Direito
canónico, e que só em fase avançada da sua existência foi reconhecida como
pessoa colectiva de direito público”, correspondendo essa “evolução a uma
estatização de certa iniciativa privada, em que a personalidade jurídica é
conservada à corporação para evitar que com a sua absorção no Estado este fique
sobrecarregado e se perturbem certos interesses tradicionais (patrimoniais e
morais)” (Manual de Direito Administrativo, Vol. I, 1991, pp. 188 e 189).
Freitas do Amaral, já na vigência da Constituição de 1976,
qualificou-as como institutos públicos do tipo de estabelecimentos públicos, por
disporem de serviços abertos ao público e por efectuarem prestações sociais e
culturais individuais à generalidade dos cidadãos que delas careçam (Curso de
Direito Administrativo, Vol. I, p. 401).
Para Marcelo Rebelo de Sousa (A Natureza Jurídica da Universidade no
Direito Português, Publicações Europa-América, 1991, p. 44), “As Universidades
foram, até 1976, legalmente pessoas colectivas de fins considerados decorrentes
dos fins do Estado-Administração, sujeitas a poder de direcção (envolvendo o
poder de supervisão), a poder de superintendência e a tutela de mérito e de
legalidade, ou seja, Administração directamente dependente do Estado. De 1976
até à entrada em vigor da Lei n.º 108/88, continuaram legalmente a ser tratadas
como desprovidas de interesses próprios e sujeitas a poder de direcção – embora
atenuado a partir do Decreto-Lei n.º 188/82, de 17 de Maio, mas visível em
matéria de estatuto e gestão de pessoal docente, em concreto, e de poder
disciplinar – e também poder de superintendência, isto é, continuaram a integrar
a administração directamente dependente do Estado […]”.
Pese embora a caracterização feita por este Autor, certo é que a
Constituição de 1976 viera já, pela sua revisão de 1982, consagrar, no seu art.º
76.º, n.º 2, a autonomia universitária, dispondo que “as universidades gozam,
nos termos da lei, de autonomia estatutária, científica, pedagógica,
administrativa e financeira”.
E a Lei n.º 108/88, de 24 de Setembro, veio regular essa autonomia,
prevendo uma tutela de legalidade (art.º 28.º), “aliás rigorosa em matéria de
estruturas e curricular”, uma tutela de mérito em matéria financeira (art.ºs
11.º e 13.º) e a avaliação das universidades pelo Governo, de acordo com lei a
definir pela Assembleia da República.
Perante o novo quadro legal, considerou o mesmo Autor que as
“Universidades públicas podem e devem passar a ser cumulativamente associações,
estabelecimentos públicos e Administração Autónoma”, não afastando o tipo de
autonomia em causa a possibilidade de existência de uma tutela de legalidade e
de uma tutela de mérito (cfr. op. cit. p. 48).
Por seu turno, José Casalta Nabais, discorrendo, a propósito do
problema da autonomia financeira das universidades, já depois da referida
revisão constitucional de 1982, e da sua ampliação efectuada na revisão
constitucional de 1989, considera que só “o poder, de algum modo originário para
se administrar – isto é, para regular os seus assuntos e resolver os seus
problemas da forma por si julgada adequada, dispondo para tal dos meios
necessários e gerindo com grande liberdade o seu funcionamento” é que “traduz a
ideia de uma (verdadeira) autonomia às universidades: na verdade, estas só serão
autónomas na medida em que lhes seja reconhecido um domínio de interesses
(assuntos) próprios, um domínio relativamente ao qual a administração estadual
se limite a exercer uma tutela de mera coordenação, ou seja, na medida em que
constituam algo mais que meros instrumentos (ainda que dotados de personalidade
jurídica pública – ainda que institutos públicos) da administração indirecta do
Estado, como tem sido tradicional entre nós” («Considerações sobre a autonomia
financeira das universidades portuguesas», in Estudos de Homenagem ao Prof.
Doutor A. Ferrer Correia, Boletim da Faculdade de Direito, número especial,
1991, pp. 352 e 353).
E, logo, mais adiante sustenta o mesmo Autor que essa autonomia
universitária “implica já, antes de mais, um domínio de autonomia universitária”
que “pode assumir um sentido de autonomia constituinte (estatutária) e uma
autonomia corrente (de normação corrente)”, cabendo na primeira a elaboração
“dos respectivos estatutos dentro dos parâmetros e limites que uma lei-quadro
consagre”, e, na segunda, a elaboração “dos regulamentos necessários à adequada
gestão do núcleo de interesses que constituem o seu campus autonómico, no
respeito pelas leis e pelos respectivos estatutos sem necessidade de uma prévia
normação específica”, dizendo a concluir que “as universidades portuguesas, na
sua actual configuração constitucional, participam de uma dupla natureza: são
pólos de administração autónoma (Selbstverwaltung) e pólos da administração
indirecta do Estado (Staatverwaltung), ou seja, são simultaneamente corporações
institucionais e estabelecimentos (ou institutos) públicos”.
Já para Luís Pedro Pereira Coutinho (As Faculdades Normativas
Universitárias no Quadro do Direito Fundamental à Autonomia Universitária, pp.
60 e segs.), a autonomia universitária assume na Constituição vigente a natureza
de um direito fundamental, de âmbito superior ao institucional, devendo a
Universidade pública “ser encarada como um «mixtum compositum» de duas
organizações distintas, sendo uma de natureza “institucional” ou patrimonial e
outra de natureza corporativa”, identificando-se o primeiro aspecto com a
“criação pelo Estado de um “estabelecimento público de ensino” e o segundo com a
«formação, pelos ocupantes desse “estabelecimento” que titulam liberdades
académicas (docentes, investigadores e estudantes) de uma corporação de direito
público (a Universidade em sentido estrito) dotada de capacidade jurídica para
gerir esse estabelecimento público, prosseguindo interesses de natureza
científica e pedagogicamente indiferentes».
A autonomia das universidades é, também, um valor fundamental
reconhecido em outros países e tema de vária doutrina e jurisprudência
estrangeiras.
Assim, a Espanha consagra-a no art.º 27.º, n.º 10, da sua
Constituição, de 1978.
E o Tribunal Constitucional espanhol teve, já, a ocasião de a
considerar um autêntico direito fundamental (Sentencias 26/1987 e 106/1990),
ainda que, na linguagem de Francisco de Borja López-Jurado Escribano (La
autonomía de las Universidades como derecho fundamental: La construción del
Tribunal Constitucional, Editorial Civitas, S.A., pp. 21 e segs.), um “direito
fundamental light”, já que, segundo a própria sentencia [refere-se à Sentencia
26/1987], “não é substancialmente distinto o protegido pela figura da garantia
institucional do que se protege através da figura de direito fundamental nos
termos que a lei estabeleça” (cf. também José Ramón Chaves García, Organización
y Gestión de las Universidades Públicas, PPU, Barcelona, 1993, p. 26; Tomás
Ramón Fernández, La autonomía universitaria:ámbito y limites, Editorial Civitas,
S.A., p. 39 e segs.).
A Itália consagra-a no art.º 33.º da sua Constituição (cf. Domenico
Fazio, Alberto Baretoni Arleri, Giovanni D’Addona, Fábio Matarazzo,
L’Ordinamento Universitario Italiano, Raccolta sistemática delle Fonti
Normative, vol. I).
Na Alemanha, a Lei Fundamental de Bonn reconhece o direito
fundamental da liberdade de ciência.
E o direito de autonomia está garantido pela maior parte das
Constituições dos Länder e pela Lei federal de 1976 (cf., entre vários, W.
Thieme, Deutsches Hochschulrecht, 2.ª edição, Köln, 1986).
Segundo Georges Vedel (La experiência de la reforma universitária
francesa: autonomía y participación, Cuadernos Civitas, Madrid, 1978, pp.
32-33), “o sistema universitário francês tornou-se, desde a III República, o
único serviço público autogestionado da história francesa”, tendo-se a autonomia
afirmado, na prática, muito para além do previsto na lei relativa às atribuições
ao Ministério da Educação.
A Constituição brasileira de 1988, constitucionalizando legislação
ordinária anterior, prevê, no seu art.º 207, a autonomia das universidades em
termos que não se distanciam muito dos da nossa Lei fundamental (Cf., entre
vários, Palhares Moreira Reis, «A autonomia das universidades públicas na
Constituição de 1988», Revista de Informação legislativa, Janeiro a Março 1990,
pp. 99 e segs.; Giuseppi da Costa, «A autonomia universitária e seus limites
jurídicos», Revista cit., Julho a Setembro 1990, pp. 61 e segs.; Edivaldo M.
Boaventura, «A constitucionalização da autonomia universitária», Revista cit.,
Outubro-Dezembro 1990, pp. 297 e segs).
Regressando ao sistema pátrio, temos que, recentemente, a Lei n.º
62/2007, de 10 de Setembro, veio estabelecer um regime jurídico global das
instituições do ensino superior, incluindo as universidades, nesse tipo de
instituições (art.º 5.º) e reconhecendo a todas as públicas o gozo “de autonomia
estatutária, pedagógica, científica, cultural, administrativa, financeira,
patrimonial e disciplinar face ao Estado, com a diferenciação adequada à sua
natureza (art.º 11.º, n.º 1), assumindo, no entanto que “a autonomia
estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira das
universidades encontra-se reconhecida pelo n.º 2 do artigo 76.º da
Constituição”, e recortando o âmbito dessa autonomia, em parte, em novos e
inovadores termos relativamente aos vigentes até então, possibilitando até a
transformação das instituições de ensino superior públicas em fundações públicas
com regime de direito privado (art.º 129.º).
Não importa, todavia, à economia da decisão considerar o novo regime
já que a decisão recorrida não fez dele qualquer aplicação.
Como adiante melhor se explicitará, não há dúvida que a norma
constante do n.º 2 do art.º 76.º da Constituição assume a autonomia
universitária como uma garantia fundamental cujo recorte subjectivo ultrapassa o
mero plano institucional para se projectar, também, em alguma medida, no âmbito
dos agentes universitários, nomeadamente, no que importa à liberdade de
investigação, de ensino, de pensamento e de pedagogia, com respeito pela
Constituição, abrangendo o que se costuma designar por “liberdade de cátedra”.
Mas é também certo que ela a não densifica, tendo-se limitado a
apontar os domínios materiais que a mesma abrange (autonomia estatutária,
científica, pedagógica, administrativa e financeira) e a remeter para a lei
ordinária a definição do concreto âmbito em que a mesma se consubstancia.
Todavia, do preceito constitucional pode inferir-se, pelo menos, a
ideia de que o legislador ordinário está obrigado a conferir conteúdo útil e
constitucionalmente relevante à garantia de autonomia universitária, nos
domínios enunciados, o que passa por ter de prever um regime que salvaguarde a
protecção, nessas matérias, dos interesses específicos e próprios das
universidades.
Os termos mais ou menos amplos em que essa autonomia se pode
expressar, ou o recorte geral do âmbito normativo da autonomia, foram, assim,
deixados, pelo legislador constitucional, para o legislador ordinário, a
concretizar através de lei formal (a lei quadro da autonomia universitária).
Deste modo, a autonomia universitária é exercida dentro dos
parâmetros e limites de uma lei-quadro que expressa a “delimitação geral do
quadro dos diversos aspectos ou configurações em que essa autonomia se vai
exprimir”, diga ela respeito ao seu estatuto próprio de pessoa pública, ou ao
modo como, para a prossecução dos seus interesses próprios, ela se
auto-organiza.
E aí, as universidades “[…] só serão autónomas na medida em que lhes
seja reconhecido um domínio de interesses (assuntos) próprios, um domínio
relativamente ao qual a administração estadual se limite a exercer uma tutela de
mera coordenação, ou seja, na medida em que constituam algo mais que meros
instrumentos (ainda que dotados de personalidade jurídica pública – ainda que
institutos públicos) da administração indirecta do Estado, como tem sido
tradicional entre nós” (J. Casalta Nabais, op. cit., p. 353).
Ao tempo da norma constitucionalmente sindicada, essa autonomia
universitária estava, como já se disse, regulada na Lei n.º 108/88, definindo
este diploma os termos da reserva de estatuto (art.º 5.º), da autonomia
científica (art.º 6.º), da autonomia pedagógica (art.º 7.º), da autonomia
administrativa e financeira (art.º 8.º) e da autonomia disciplinar (art.º 9.º).
O legislador estabeleceu ainda a existência de património próprio e previu quais
as receitas, financiamentos e isenções fiscais de que as universidades
beneficiavam (art.ºs 10.º a 12.º).
Dispondo sobre os “meios necessários ao exercício da autonomia” – e
cingindo-nos ao âmbito demandado pela economia do caso – o art.º 15.º de tal
diploma estabelece que “cada universidade deve dispor dos meios humanos e
técnicos necessários ao exercício da autonomia (n.º 1) e que “cabe às
universidades o recrutamento e promoção dos seus docentes e investigadores, bem
como do restante pessoal, nos termos da lei” (n.º 2).
Decorre, pois, do preceito que as universidades detêm o poder de
auto-normação do recrutamento e promoção dos seus docentes e investigadores, mas
apenas dentro “dos termos da lei”.
Por outro lado, não tem esta matéria de constituir objecto de lei
formal, bem podendo ser regulada por decreto-lei do Governo, a menos que
contenda, em algum ponto, com o âmbito da reserva da Assembleia da República,
então prevista nos art. 167.º e 168.º da Constituição.
A regulação da matéria do recrutamento e promoção dos docentes
universitários era, então, levada a cabo pelo Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de
Novembro (Estatuto da Carreira Docente Universitária), diploma este que foi
objecto de onze alterações ocorridas até ao momento da edição da norma de
autorização em causa no presente recurso (Lei n.º 19/80, de 16 de Julho;
Decretos-Leis n.ºs 316/83, de 2 de Julho; 381/85, de 27 de Setembro; 392/86, de
22 de Novembro; 145/87, de 24 de Março; 147/88, de 27 de Abril, 412/88; de 9 de
Novembro; 35/85, de 1 de Fevereiro; 456/88, de 13 de Dezembro; 393/89, de 9 de
Novembro; 408/89, de 18 de Novembro, e 388/90, de 10 de Dezembro).
8.4 – Põe-se, assim, a questão de saber se o legislador do
Decretos-Lei n.ºs 34/93, de 13 de Fevereiro, agiu a descoberto de lei de
autorização (no caso, a Lei n.º 2/92, de 9 de Março).
É de relembrar que o legislador concedeu, pelo art.º 5.º deste
diploma, autorização ao Governo para “alterar o estatuto do pessoal dirigente
dos serviços e organismos da administração central, regional e local, constante
do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Outubro, em especial os artigos 18.º e 19.º,
tendo em vista definir com maior clareza o direito à carreira, bem como o
direito à indemnização prevista nos n.ºs 7 e 8 do art.º 18.º do mesmo diploma”,
numa linha de “prosseguimento na via de aperfeiçoamento e modernização do regime
jurídico da função pública”.
Pode dizer-se, desde logo, que o legislador ordinário não
desconhecia a interpretação oficial do art.º 18.º, n.º 2, alínea a), do
Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, que fora levada a cabo pelo Parecer
da Procuradoria Geral da República, de 14 de Maio de 1992, publicado no Diário
da República II Série, de 26 de Novembro de 1992, e homologado por despacho da
Secretária de Estado Adjunta do Orçamento, de 26 de Junho de 1992, nos termos do
qual “o direito ao provimento em categoria superior reconhecido pela referida
alínea a) aos funcionários nomeados para cargos dirigentes, apenas em função do
tempo de serviço nessa norma definido, não beneficia os funcionários oriundos da
carreira de investigação científica do Laboratório Nacional de Engenharia
Científica ou da carreira de Inspecção-Geral de Finanças, se não estiverem
preenchidos os requisitos específicos a que está condicionada a progressão na
respectiva carreira” e que, sendo assim, esse regime não se aplicava aos
docentes universitários.
É sabido, por outro lado, que o legislador pretendeu, com a
conformação de um regime especial de progressão da carreira da função pública
fundado no exercício de funções em cargos dirigentes da função pública,
favorecer a disponibilidade para o exercício de tais cargos por parte dos
quadros qualificados da função pública, muitas vezes integrados em carreiras
diferentes.
Ora, a abertura do regime constante do preceito impugnado às
carreiras especiais apresenta-se, obviamente, como uma via que potencia o
“aperfeiçoamento e modernização do regime jurídico da função pública”, apontada
como orientação material pelo legislador da lei de autorização ao legislador
autorizado.
Por outro lado, tendo o legislador adoptado, ao regular a matéria no
preceito sindicado, um regime dicotómico de qualificação das carreiras dos
funcionários públicos, dividindo-os entre funcionários da carreira geral e dos
corpos especiais, na senda, aliás, do anteriormente previsto no Decreto-Lei n.º
248/85, de 15 de Julho, que distingue o regime das carreiras de regime geral da
função pública do das carreiras de regime especial, não podem os docentes deixar
de considerar-se incluídos, para tal efeito, na carreira especial.
Acresce que a expressão verbal utilizada, condensadora do cerne da
definição do sentido da autorização legislativa - “alterar o estatuto do pessoal
dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local,
constante do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Outubro, em especial os artigos
18.º e 19.º, tendo em vista definir com maior clareza o direito à carreira” –
pela referência que faz à alteração do estatuto do pessoal dirigente dos
serviços e organismos da administração central, regional e local, e em
“especial” ao seu conteúdo, então, constante do art.º 18.º, suporta inteiramente
como sentido legislativo adequado, suficientemente expresso no texto, o de que
essa alteração poderia abarcar também o pessoal da função pública integrado em
carreiras especiais, desde que levadas em conta nessa alteração, como veio a
acontecer (recorde-se que o n.º 2 do art.º 18.º, na redacção dada pelo DL. n.º
34/93 estatuiu que a aplicação do regime “aos funcionários oriundos de carreiras
ou corpos especiais depende da verificação dos requisitos especiais de acesso
previstos nas respectivas leis reguladoras, bem como das habilitações literárias
exigidas”), as especificidades de preenchimentos dos requisitos próprios
demonstrativos da competência profissional dessas carreiras.
Pode, assim, concluir-se que cabe, no sentido da lei de autorização,
a concessão, ao Governo, de poderes legislativos para estender, com as
adaptações postuladas pela natureza especial das respectivas carreiras, o regime
antes contemplado no DL. n.º 323/89, aos corpos especiais da função pública e
entre estes se podendo contar os docentes universitários.
Não padece, pois, a norma sindicada da apontada
inconstitucionalidade orgânica.
Mas mesmo que se chegasse a outra conclusão interpretativa
relativamente ao preceito do art.º 5.º da Lei n.º 2/92, sempre seria de chegar
ao mesmo resultado de não violação de competência legislativa
constitucionalmente estabelecida.
É que a alínea v) do n.º 1 do art.º 168.º da Constituição apenas
inclui na reserva relativa da Assembleia da República a definição das “bases
gerais e âmbito da função pública”.
Ora, na falta de lei que defina esses princípios gerais, tem
entendido sempre o Tribunal Constitucional que tal reserva inclui, apenas, “o
estabelecimento do quadro dos princípios básicos fundamentais” da regulação da
função pública (cf. Acórdãos n.ºs 78/84, 142/85, 190/87, e 340/92, publicados no
DR, respectivamente, II Série, de 11 de Janeiro de 1985 e de 7 de Setembro de
1985, I Série, de 2 de Julho de 1987, e II Série, de 17 de Novembro de 1992, e
n.º 494/99, in DR II Série, de 1 de Setembro de 1999).
Não pode, porém, considerar-se um princípio geral que perpasse o
regime da função pública o estabelecimento de um regime de incentivo do
exercício de funções públicas em cargos dirigentes como é aquele que subjaz à
norma impugnada.
Como se disse no Acórdão n.º 65/00, publicado no Diário da República
II Série, de 23 de Outubro de 2000, e nos Acórdãos do Tribunal Constitucional,
vol. 46.º, p. 351 (no mesmo sentido, cf. Acórdão n.º 119/02, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt), em que se analisou a mesma questão relativamente
ao corpo especial da Inspecção-Geral de Finanças, deve entender-se que “a
intervenção do legislador governamental, circunscrita e limitada como o foi, não
interferiu na área de reserva da Assembleia da República, e, portanto, não
carecia de credencial parlamentar habilitante”.
8.5 – Importa, agora, afrontar as questões de inconstitucionalidade
material invocadas, “por violação dos princípios constitucionais da justiça,
igualdade e da autonomia universitária”.
A resposta demanda que nos voltemos a debruçar sobre o sentido
constitucional da autonomia universitária e dos seus limites, agora enquanto
parâmetros que o legislador ordinário, seja ele o da autorização legislativa
seja o do diploma autorizado, está obrigado a respeitar.
E temos de regressar, necessariamente, a esta análise, desde logo
pelo facto de a abordagem do problema, nos outros domínios, pressupor a
compreensão da realidade normativa onde há que situar as questões da igualdade e
da justiça.
A autonomia universitária afirmou-se ao longo dos tempos, essencial
e prevalentemente, enquanto liberdade de pensar, de investigar e de ensinar. Mas
uma liberdade institucionalizada, na comunidade social, ou exercida, de modo
objectivo, por um concreto corpus científico.
Ao reconhecer às universidades, no n.º 2 do art.º 76.º, a autonomia
estatutária, científica e pedagógica, administrativa e financeira, a nossa
Constituição não deixou de estar a recuperar o acervo axiológico-histórico que
verdadeiramente as identifica: como instituições que praticam e assentam a sua
actividade na liberdade de pensar e de investigar e que transmitem o
conhecimento assim obtido aos estudantes universitários e à comunidade social.
O art.º 42.º da Constituição reconhece como direitos fundamentais a
liberdade de criação intelectual, artística e científica, compreendendo também
essa liberdade o “direito à invenção, produção e divulgação da obra científica,
literária ou artística, incluindo a protecção legal dos direitos de autor”.
Por seu lado, o seu art.º 43.º garante a liberdade fundamental de
aprender e ensinar, proíbe o dirigismo estadual da educação e da cultura
“segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou
religiosas” e consagra a não confessionalidade do ensino público.
Ora, a autonomia das universidades visa garantir,
institucionalmente, o exercício dessa liberdade de investigação e de ensino,
reconhecidos como direitos pessoais fundamentais.
Nesta medida, a universidade apresenta-se simultaneamente como
instituição que se afirma na liberdade científica e na liberdade de ensinar o
conhecimento assim obtido – no que se costuma designar por “liberdade de
cátedra” –, como corpo, essencialmente constituído pelos “professores
universitários” que exercem pessoalmente essa liberdade científica e de ensino e
que transmitem o conhecimento, por si alcançado, aos alunos universitários.
É certo que esse ensino concretiza, também, o direito à educação e
ao ensino, de tipo superior [cf. art.ºs 73.º, 74.º, n.ºs 1 e 2, alínea d) e
76.º, n.º 1] e que, nesta medida, ele corresponde à dimensão prestativa das
universidades enquanto serviços públicos.
Mas, trata-se de um serviço prestado em termos e de natureza
distinta dos demais estabelecimentos públicos, mesmo que integrantes do sistema
educativo.
No dizer de Tomás Ramón Fernández (La autonomía universitaria:ámbito
y limites, Editorial Civitas, S.A., p. 46), perante idêntico quadro normativo da
Constituição espanhola, a diferença “é que na Universidade se ensina e se
investiga e para a aprendizagem e a investigação, que são a razão de ser deste
particular serviço público, a liberdade é rigorosamente essencial. […]. Na
Universidade ensina-se porque se investiga. […]. O específico da universidade, e
o que a distingue das demais instituições integrantes do sistema educativo, é
que é nela que se faz a Ciência, boa ou má, de um país, onde se produz, em
consequência esse corpus científico em perpétuo fieri que as restantes
instituições se limitam a transmitir e propagar de acordo com as orientações que
os responsáveis do sistema importem. O professor universitário transmite, ao
invés, aquilo que ele mesmo está aprendendo dia a dia, é por isso algo mais que
um mero transmissor, é um sujeito activo do processo científico, cuja actuação
como tal resulta em hipótese incompatível com a existência de quaisquer
orientações, que se chegassem a impor-se desvirtuariam, pura e simplesmente, a
sua função social, transladando automaticamente o seu próprio papel de autor
daquelas”.
Essa liberdade científica ou de “cátedra”, ínsita no sentido da
autonomia científica e pedagógica, reconhecida constitucionalmente às
universidades, postula, de um lado, que o acesso à docência e à investigação
universitária e a progressão na carreira sejam feitas, apenas, segundo o
critério do mérito e da capacidade científica e pedagógica universitárias, e, do
outro, que no processo dessa avaliação, os docentes universitários, enquanto
agentes dessa liberdade científica, tenham necessariamente de intervir.
A liberdade científica, pressuposta pela autonomia científica das
universidades, não pode deixar, assim, de excluir tanto as intervenções “vindas
de fora” que tenham como efeito a limitação no exercício dessa liberdade
científica, como as próprias intervenções “vindas de dentro susceptíveis de
produzir idêntica limitação” (Tomás Ramón Fernández, Op. cit., p. 52).
Por outro lado, não pode o legislador desconhecer que a autonomia
das universidades, na sua dimensão de autonomia administrativa e financeira
confere, à instituição universitária, o poder de decidir sobre a afectação dos
seus recursos, poder esse que fica coarctado pela imposição externa de promoção
de um docente à categoria superior.
O direito fundamental de acesso aos cargos públicos em condições de
igualdade e de liberdade, consagrado no n.º 2 do art.º 47.º da Constituição,
vale, por inteiro, também, no acesso à docência e nos concursos previstos para a
progressão na carreira universitária.
Ora, não pode esquecer-se que o Tribunal Constitucional tem, a
respeito do art.º 47.º da Constituição, uma vasta jurisprudência onde afirma que
o acesso à função pública (e a progressão na mesma) compreende o direito de
nenhum cidadão ser excluído da possibilidade de acesso, seja à função pública em
geral, seja a uma determinada função em particular, por outro motivo que não
seja a falta dos requisitos adequados à função (v. g. idade, habilitações
académicas e profissionais); o respeito pela igualdade e liberdade, não podendo
haver discriminação nem diferenciações de tratamento baseadas em factores
irrelevantes, nem, por outro lado, regimes de constrição atentatórios da
liberdade e, por fim, a obrigatoriedade da adopção da regra do concurso como
forma normal de provimento de lugares, desde logo de ingresso, devendo ser
devidamente justificados os casos de provimento de lugares sem concurso (cf.,
entre muitos, os Acórdãos n.ºs n.º 53/88, publicado nos Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 11.º vol., pág. 303 e segs; 371/89, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt; 683/99, publicado no Diário da República II
Série, n.º 28, de 3 de Fevereiro de 2000; 368/00, publicado no Diário da
República I Série-A, n.º 277, de 30 de Novembro de 2000, pág. 6886; 406/2003 e
61/04, estes disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
A propósito de um caso relativo à progressão na carreira,
escreveu-se no referido Acórdão n.º 371/89 o seguinte, cuja bondade, aqui, se
reafirma:
”Na óptica deste preceito constitucional, o princípio da igualdade,
quer ao nível da liberdade de escolha de profissão quer ao nível do direito de
acesso à função pública e de progressão dentro da respectiva carreira, é
perfeitamente compatível, nestes domínios, com uma preferência, objectivamente
definida, em favor dos mais habilitados e capazes. Mais: tal preferência,
alicerçada numa maior habilitação e capacidade profissional, é
constitucionalmente considerada, nestas particulares situações, não como um
factor de discriminação mas antes como uma garantia do próprio princípio da
igualdade.
E compreende-se que assim haja de ser, pois que, se é exacto que os
homens, enquanto homens, têm algo em comum, naturalmente decorrente da sua
própria dignidade como pessoas humanas, devendo, em consequência, ser igualmente
tratados, designadamente pelo legislador, nos limites desse elemento comum, não
menos exacto é que há elementos de diferenciação que, pela sua razoabilidade
objectiva, postulam indubitavelmente uma correspondente diferenciação normativa.
Um desses elementos de diferenciação, justificativo de um desigual tratamento
legislativo ao nível das respectivas carreiras, é o da diversa habilitação e
capacidade profissional de dois grupos de seres humanos, situação essa que a
própria CRP, como se viu, declaradamente reconhece e protege”.
Deste modo, a igualdade, no acesso à docência e à progressão da
carreira, deve fazer-se, apenas, através de métodos de selecção em que relevem,
apenas, o mérito e a capacidade científicas, em provas abertas a todos aqueles
que, ao tempo, se possam a elas apresentar.
É claro que esses métodos podem ser os mais diversos.
Constituindo a autonomia um atributo de todas as universidades –
donde ter, simultaneamente, um carácter de direito pessoal e de direito
institucional colectivo (do conjunto das universidades) – não pode deixar de
reconhecer-se, ao legislador ordinário, a competência e a discricionariedade
constitutivas para conformar um método de carácter geral que “com carácter
geral, também, garanta a todos a igualdade de chance e a confrontação pública
dos seus respectivos méritos e capacidades” (referindo-se ao respectivos
sistemas, cf. Tomás Ramón Fernández, Op. cit., p. 59 e Giuseppi, A. e Op. cit.,
.p. 69).
Essa “confrontação” pressupõe o carácter aberto de toda a forma de
acesso e de progressão na carreira universitária, sob pena de claudicar o
princípio da liberdade científica e de “liberdade de cátedra” ou seja, não só do
mérito absoluto, como do mérito relativo.
Importa, então saber, se os preceitos sindicados respeitam esses
parâmetros constitucionais [Também a doutrina brasileira fala de dimensões da
autonomia (Edivaldo, A. e Op. cit.,, pp. 301 e segs) e de limites jurídicos da
autonomia (Giuseppi, A. e Op. cit., pp. 69 e segs)].
O acórdão recorrido respondeu afirmativamente à pergunta, com base,
em síntese, na consideração de que a exigência da igualdade não é igualitarismo,
pelo que “o princípio da igualdade não proíbe as distinções, mas apenas aquelas
que se afigurem destituídas de um fundamento material” e que, no caso, não
existe razão material para que não seja aplicada “aos professores, também eles
funcionários públicos, embora constituindo um corpo especial”, do “direito
especial para os dirigentes da função pública”, criado pelo legislador para os
recompensar pelo exercício de funções dirigentes durante determinado período de
tempo.
O princípio da igualdade tem tido um larguíssimo tratamento na
jurisprudência do Tribunal Constitucional, podendo considerar-se existir
consenso sobre certos termos da sua formulação.
Entre eles se contam, seguramente, os seguintes, expressos no
Acórdão nº 180/99 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 43º vol., pp. 135 e
segs.):
“(...) o princípio da igualdade impõe que situações da mesma
categoria essencial sejam tratadas da mesma maneira e que situações pertencentes
a categorias essencialmente diferentes tenham tratamento também diferente.
Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de tratamento, desde que
fundamentadas à luz dos próprios critérios axiológicos constitucionais. A
igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram destituídas de
fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos nºs 39/88, 186/90, 187/90 e
188/90, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol. (1988), p. 233 e ss., e
16º vol. (1990), pp. 383 e ss., 395 e ss. e 411 e ss., respectivamente; cf.,
igualmente, na doutrina, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, tomo
IV, 2ª ed., 1993, p. 213 e ss., Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 6ª ed.,
1993, pp. 564-5, e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República
Portuguesa anotada, 1993, p.125 e ss.]”.
E, seguindo na mesma linha axiológico-argumentativa, disse-se no
Acórdão nº 409/99 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 44º, pp. 461 e
segs.):
“O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição
da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for
essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente
diferente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo
da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que
estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam
distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente
não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional. O
princípio da igualdade enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa
ideia geral de proibição do arbítrio (cf., quanto ao princípio da igualdade,
entre outros, os Acórdãos nºs 186/90,187/90,188/90,1186/96 e 353/98, publicados
in “Diário da República”, respectivamente, de 12 de Setembro de 1990, 12 de
Fevereiro de 1997, e o último, ainda inédito).”
Discreteando, por seu lado, sobre o método de controlo negativo do
princípio da igualdade, “feito a partir do fim que [as normas] visam alcançar, à
luz do princípio da proibição do arbítrio (Willkürverbot) e, bem assim, de um
critério de razoabilidade”, afirmou-se, por sua vez, no Acórdão n.º 232/03,
publicado no Diário da República I Série, de 17 de Junho de 2003, e Acórdãos do
Tribunal Constitucional, 56.º vol., p. 7, em termos que, aqui, inteiramente, se
renovam:
«(…) é a partir da descoberta da ratio da disposição em causa que se
poderá avaliar se a mesma possui uma “fundamentação razoável” (vernünftiger
Grund), tal como sustentou o “inventor” do princípio da proibição do arbítrio,
Gerhard Leibholz (cf. F. Alves Correia, O plano urbanístico e o princípio da
igualdade, Coimbra, 1989, pp. 419 e ss). Essa ideia é reiterada entre nós por
Maria da Glória Ferreira Pinto: “[E]stando em causa (...) um determinado
tratamento jurídico de situações, o critério que irá presidir à qualificação de
tais situações como iguais ou desiguais é determinado directamente pela 'ratio'
do tratamento jurídico que se lhes pretende dar, isto é, é funcionalizado pelo
fim a atingir com o referido tratamento jurídico. A 'ratio' do tratamento
jurídico é, pois, o ponto de referência último da valoração e da escolha do
critério” (cf. «Princípio da igualdade: fórmula vazia ou fórmula 'carregada' de
sentido?», sep. do Boletim do Ministério da Justiça, nº 358, Lisboa, 1987, p.
27). E, mais adiante, opina a mesma Autora: “[O] critério valorativo que permite
o juízo de qualificação da igualdade está, assim, por força da estrutura do
princípio da igualdade, indissoluvelmente ligado à 'ratio' do tratamento
jurídico que o determinou. Isto não quer, contudo, dizer que a 'ratio' do
tratamento jurídico exija que seja este critério, o critério concreto a adoptar,
e não aquele outro, para efeitos de qualificação da igualdade. O que, no fundo,
exige é uma conexão entre o critério adoptado e a 'ratio' do tratamento
jurídico. Assim, se se pretender criar uma isenção ao imposto profissional,
haverá obediência ao princípio da igualdade se o critério de determinação das
situações que vão ficar isentas consistir na escolha de um conjunto de
profissionais que se encontram menosprezados no contexto social, bem como haverá
obediência ao princípio se o critério consistir na escolha de um rendimento
mínimo, considerado indispensável à subsistência familiar numa determinada
sociedade” (ob. cit., pp. 31-32).».
É bom de ver que a ratio do concreto preceito sindicado assenta,
como bem nota o acórdão recorrido, no desiderato de motivar os funcionários
públicos a aceitarem o exercício de funções públicas dirigentes, na medida em
que estas não se integram na sua carreira profissional. É que, terminado o tempo
de serviço no cargo dirigente, o funcionário é provido, na sua carreira de
origem, em categoria superior àquela que possuía à data da nomeação para
dirigente.
E, relativamente aos docentes universitários, poder-se-ia até
acrescentar que esse exercício de funções fora da universidade corresponderia a
uma evidente realização do sentido da referida lei de autorização legislativa,
de “prosseguimento na via de aperfeiçoamento e modernização do regime jurídico
da função pública”, por potenciar, nesses domínios materiais da administração
pública, a aplicação de diferentes competências profissionais e de elevados
conhecimentos técnicos e científicos adquiridos na função universitária que
muito podem beneficiar a administração pública, mormente quanto às
possibilidades de inovação e de adaptação às exigências de modernidade, na
medida em que se considere que as universidades deterão, por via de regra, a
ponta do conhecimento científico actual.
Todavia, o exercício nessas funções de fora, e, porventura, o mérito
nelas alcançado, apenas poderá interessar no acesso ou na progressão da carreira
universitária nos exactos termos públicos em que pode ser apreciado o mérito e a
capacidade científica dos demais docentes.
A autonomia universitária e a liberdade científica e de cátedra, que
vão nela implicadas, exigem que a avaliação para a docência e a progressão na
carreira se continue a fazer segundo o mesmo método geral, de confrontação
pública da capacidade e de mérito, ou seja, portanto, segundo a regra de
avaliação do mérito absoluto e relativo.
Nesta medida, o acquis, mesmo de natureza científico ou pedagógico,
porventura adquirido fora da universidade pelo docente que exerceu um cargo
dirigente da função pública, apenas pode alcançar alguns efeitos dentro da
própria aplicação do método geral estabelecido para a avaliação do mérito e da
capacidade científica.
Temos, portanto, de concluir que a ratio do preceito impugnado é
exterior à autonomia universitária, na sua dimensão acima caracterizada de
autonomia estatutária, científica e pedagógica.
A ratio do critério normativo que está em causa é completamente
exterior à do critério de avaliação segundo o mérito e a capacidade científica,
postulado pela autonomia universitária, não tendo, por isso, com ele qualquer
conexão.
Não existe, pois, razão material bastante para dispensar o docente
universitário do concurso em que possa ser apreciado, absoluta e relativamente,
o seu mérito e capacidade científicas.
Sendo assim, torna-se evidente que o artigo 18.º, nº 2, alínea a), e
nº 3 do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, na redacção dada pelo
Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, é inconstitucional por violar,
conjugadamente, os princípios da igualdade de acesso à função pública, enquanto
corolário do princípio constitucional da igualdade (arts. 47.º, nº2, e 13.º) e
da autonomia das universidades (art.º 76.º, n.º 2, todos da CRP).
C - Decisão
9 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide:
a) Julgar inconstitucional, por violação conjugada do princípio de
acesso à função pública, consagrado no artigo 47.º, n.º 2, da Constituição da
República Portuguesa, enquanto corolário do princípio constitucional da
igualdade consagrado no seu artigo 13.º, e do princípio da autonomia
universitária afirmado no seu artigo 76.º, n.º 2, a norma do art.º 18.º, nº 2,
alínea a), e nº 3 do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, alterado pelo
Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, na interpretação segundo a qual a
promoção dos docentes universitários, nas Universidades Públicas, pode ser feita
com dispensa de concurso em que seja apreciado o seu mérito absoluto e relativo;
b) Conceder provimento ao recurso e ordenar a reforma da decisão
recorrida em função do precedente juízo de inconstitucionalidade;
c) Condenar o recorrido nas custas, por ter contra-alegado, fixando
a taxa de justiça em 25 UCs.
Lisboa, 7 de Outubro de 2008
Benjamim Rodrigues
João Cura Mariano
Joaquim de Sousa Ribeiro
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos