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Processo n.º 915/06
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Mário Torres
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. Relatório
1.1. Fernando José da Costa Salgado (doravante designado
por primeiro impugnante) e Manuel Joaquim Duarte Santos (doravante designado por
segundo impugnante), militantes do Partido Socialista (PS), vieram, ao abrigo
do artigo 103.º‑D da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e
alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC),
impugnar as deliberações tomadas pela Comissão Nacional de Jurisdição do PS, em
12 de Outubro de 2006, que determinaram a sua expulsão, sustentando, em síntese,
que os processos disciplinares que lhes foram instaurados e as respectivas
decisões finais violaram, nomeadamente, os artigos 13.º e 51.º, n.º 5, da
Constituição da República Portuguesa (CRP), 5.º, n.º 2, e 23.º da Lei dos
Partidos Políticos, 127.º, n.º 1, alínea g), e 668.º, n.º 1, alínea a), do
Código de Processo Civil (CPC), 80.º, n.º 2, 81.º, n.º 1, alínea d), 83.º, n.º
2, e 99.º dos Estatutos do Partido Socialista, e 3.º, n.º 1, alínea d), 5.º,
n.ºs 2 e 5, 15.º, n.º 2, 21.º, n.º 3, 23.º, n.º 1, 25.º, n.º 1, 26.º, n.º 2,
34.º, n.º 1, 39.º, n.º 2, 40.º e 45.º do Regulamento Disciplinar do Partido
Socialista.
Nas respectivas petições, que originaram,
respectivamente, os Processos n.ºs 915/06 e 915/06‑A, tendo, por despacho do
Presidente do Tribunal Constitucional, sido determinada a apensação do segundo
processo ao primeiro –, referem os impugnantes, em suma:
1) São militantes do PS, o primeiro desde 1995,
encontrando‑se filiado com o n.º 30 275, e o segundo encontrando‑se filiado com
o n.º 17 335;
2) Têm sido, desde a primeira hora, militantes activos
do PS, tendo feito parte dos respectivos órgãos locais de direcção e sendo,
actualmente, dirigentes distritais (elementos da Comissão Política Distrital);
3) Foram eleitos nas listas do PS à Assembleia Municipal
de Vila Nova de Famalicão, sendo presentemente seus membros;
4) Em Novembro de 2005, após mais de três anos sem que
houvesse eleições para os órgãos concelhios, foram marcadas eleições para a
Comissão Política Concelhia do PS da secção de Vila Nova de Famalicão, para o
dia 17 de Dezembro de 2005, tendo‑se apresentado duas listas a sufrágio: a
lista A, protagonizada pelo primeiro impugnante e integrada pelo segundo
impugnante, e a lista B, encabeçada pelo Deputado à Assembleia da República,
eleito pelo PS, Nuno Sá;
5) No entanto, o referido acto eleitoral foi suspenso,
cerca de 48 horas antes, pelo Secretariado Distrital de Braga do PS, com
fundamento em suposta violação dos Estatutos do PS (artigo 116.º, n.º 4) por
parte da lista A, em relação ao preenchimento das quotas femininas;
6) Esse comportamento do Secretariado Distrital de Braga
do PS foi entendido pela maioria dos militantes do PS da Secção de Vila Nova de
Famalicão como um forma de protrair mais uma vez o acto eleitoral, por a lista
B, protegida por esse Secretariado, correr sérios riscos de ser derrotada;
7) Foi então que os impugnantes, conjuntamente com mais
de 600 militantes inscritos naquela Secção do PS, participaram num acto
eleitoral que decorreu fora da sede do partido, numa auto‑caravana;
8) Os resultados desse acto eleitoral (611 votos na
lista A, 34 na lista B, 3 votos em branco e 1 voto nulo) foram remetidos para o
órgão federativo competente (Secretariado Distrital), para dar posse à lista
vencedora e ao primeiro impugnante como Presidente da Comissão Política eleita
pelos militantes do PS;
9) Porém, ao invés, os impugnantes foram alvo de
processos disciplinares, que culminaram com as deliberações de expulsão ora
impugnadas;
10) Esses processos disciplinares estão pejados de
ilegalidades, não tendo sido respeitadas as elementares garantias de defesa dos
impugnantes;
11) O primeiro impugnante teve conhecimento formal que
contra si pendia um processo disciplinar quando recebeu uma notificação, emanada
do escritório profissional do militante António Reis (que também é advogado na
comarca de Barcelos), convidando‑o para prestar declarações, na sede distrital
do Partido Socialista;
12) Apesar de não se tratar de uma notificação formal, o
primeiro impugnante deslocou‑se no dia 10 de Maio de 2006, à sede da Federação
Distrital de Braga, para ser inquirido e colaborar com a descoberta da verdade,
conforme oportunamente declarou;
13) Nesse dia, o primeiro impugnante colocou algumas
questões prévias relativas à existência de mandato para o militante António
Reis instruir o processo e à admissibilidade de um militante do mesmo distrito
instruir o processo, tendo em consideração o estatuído no artigo 81.º, n.º 1,
alínea d), dos Estatutos do PS;
14) Não obstante o solicitado, o militante António Reis
não exibiu qualquer mandato que o habilitasse a instruir o processo disciplinar;
15) O primeiro impugnante supõe que o militante António
Reis foi “escolhido” para instruir o processo porque seria aquele que mais
motivações de ordem pessoal tinha para propor a expulsão;
16) A escolha do militante António Reis para instruir o
processo, pela Comissão Nacional de Jurisdição, viola o princípio do juiz
natural, porque não respeitou a ordem da distribuição, conforme estatui o
Regulamento Disciplinar no artigo 23.º;
17) Apesar de a participação dos queixosos ter sido
dirigida contra os dois impugnantes e contra os militantes Maria José
Gonçalves, Vereadora na Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, e Ivo Sá
Machado, Presidente de Junta de Freguesia da Vila de Joane, apenas foi aberto
processo disciplinar aos dois primeiros, ficando os demais ilibados e
absolvidos;
18) Este comportamento discriminatório viola claramente
o princípio da imparcialidade e independência (artigo 80.º dos Estatutos do
PS), bem como o princípio da igualdade, consignado no artigo 13.º da CRP;
19) Após o primeiro impugnante ter‑se disponibilizado
para cooperar com o Partido na descoberta da verdade, não mais foi ouvido, na
fase de inquérito, tendo, em 18 de Julho de 2006, o instrutor escolhido remetido
ao primeiro impugnante a “nota de culpa”;
20) O segundo impugnante só teve conhecimento formal de
que contra ele pendia um processo disciplinar quando recebeu a nota de culpa;
21) Podendo ser fixado um prazo de defesa, em relação à
nota de culpa, entre os 8 e os 30 dias, foi fixado um prazo de 10 dias, prazo
que é manifestamente curto, para o exercício cabal do direito de defesa, tendo
em consideração a complexidade do processo em análise;
22) Os impugnantes deduziram o incidente de suspeição do
instrutor, invocando essencialmente três circunstâncias: (i) inimizade entre os
impugnantes e o instrutor (que é recíproca e forte); (ii) o facto de o instrutor
ser membro da Federação Distrital de Braga do PS, em clara violação do artigo
81.º, n.º 1, alínea d), dos Estatutos do PS; e (iii) a forte amizade do
instrutor em relação a um participante queixoso, no caso, Joaquim Barreto,
Presidente da Federação;
23) Os impugnantes indicaram testemunhas, para serem
ouvidas, no que respeita ao incidente de suspeição, mas, em decisões sumárias,
o Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição decidiu indeferir os incidentes
de suspeição suscitados, não obstante os fundamentos serem pertinentes;
24) O indeferimento infundado do incidente de suspeição
é mais uma razão violadora do princípio da imparcialidade e da justeza;
25) Entretanto, mais umas eleições internas se
avizinhavam no Partido Socialista, desta feita para a constituição de listas de
Delegados ao Congresso Nacional e antes que os impugnantes patrocinassem e
participassem, mais uma vez, uma lista candidata contra o status quo, havia que
rapidamente os expulsar, mas, como a pressa é inimiga da perfeição, foi cometido
erro formal quando, através dos ofícios da CNJ, de 13 de Outubro de 2006 (que o
primeiro impugnante recebeu no dia 18 e o segundo impugnante no dia 19), lhes
foram remetido os acórdãos das decisões finais, capeados por cartas assinadas,
digitalmente, pelo Presidente da CNJ do PS, mas sem que os acórdãos estivessem
assinados, talvez porque ainda não tivessem recolhido as assinaturas bastantes
para formar quorum, existindo dúvidas quanto à existência de alguma reunião, no
dia 12 de Outubro, na Sede Nacional do PS;
26) Assim sendo, os acórdãos que decidiram as expulsões
são nulos e de nenhum efeito;
27) Acresce à nulidade dos acórdãos por falta de
assinaturas (cf. artigo 39.º, n.º 2, do Regulamento Disciplinar e artigo 668.º,
n.º 1 alínea a), do CPC, aplicado por analogia), o facto de terem sido remetidos
em correio simples (não registado), em clara violação do disposto no artigo
21.º, n.º 3, do Regulamento citado;
28) Como a recolha de assinaturas poderia atrasar a
expulsão (e esta era urgente por razões eleitorais, como se explanou), então
enviaram‑se os acórdãos mesmo não assinados, para que, internamente, produzissem
efeitos a tempo de impedir a capacidade eleitoral dos impugnantes, tendo,
assim, a irregularidade formal cometida por fundamento a urgência da decisão de
expulsão, postergando os mais elementares direitos de defesa e as regras de
tramitação processual;
29) Acerca do mérito das decisões, resulta do teor dos
acórdãos que se tratou de decisões “encomendadas”;
30) Na verdade, não há precedente no PS que numa
situação deste jaez conduzisse a tão grave efeito: a expulsão;
31) Basta ver que muitos militantes da Comissão
Concelhia de Vila Nova de Famalicão constituíram um movimento independente e
concorreram contra o PS nas eleições autárquicas, nomeadamente para a Câmara,
Assembleia Municipal e Assembleias de Freguesia, e nada lhes aconteceu;
32) Aliás, em Vila Nova de Famalicão, nas eleições
autárquicas de 2001, formou‑se um movimento denominado Movimento Agostinho
Fernandes (MAF), constituído essencialmente por militantes do PS e nada lhes
aconteceu, não obstante terem concorrido contra o partido e denegrirem
profundamente a imagem do PS;
33) Alguns desses militantes até foram premiados pelo
acto de rebeldia contra o partido, como foi o caso do próprio Agostinho
Fernandes, líder do referido movimento, que depois de concorrer à Câmara
Municipal contra o PS em 2001, em 2005 foi premiado com a candidatura a
Presidente da Assembleia Municipal de Vila Nova de Famalicão, na lista do PS, ou
o caso de Mário Martins, que concorreu contra o PS em 2001 e foi premiado com o
lugar de número dois na lista do PS à Câmara Municipal em 2005, sendo
actualmente Vereador da referida Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão,
eleito nas listas do PS, e faz parte do Secretariado concelhio (é militante e
nunca foi expulso);
34) Acresce que, nas eleições autárquicas de 2005,
vários Presidentes de Junta do PS e seus militantes concorreram contra o seu
partido e nada lhes aconteceu;
35) Com estes exemplos constata‑se que não há tradição
no PS em decretar a expulsão de militantes, mesmo naqueles casos flagrantes e
gravíssimos, sendo de perguntar se não será muito mais grave do que a atitude
dos impugnantes aquela que outros militantes fizeram ao concorrerem contra o
seu partido, violando claramente o estabelecido nos estatutos do PS, no artigo
94.º, n.º 5;
36) São estes factos que levam os impugnante a concluir
que só foi decretada a sua expulsão porque afrontaram o status quo concelhio,
distrital e, pelos vistos, também o nacional, na medida em que tudo leva a crer
que a Comissão Nacional de Jurisdição fez aquilo que o Presidente da Federação
lhe exigiu;
37) Será assim tão grave realizar umas eleições numa
auto‑caravana à porta da sede do partido, envolvendo mais de 600 militantes,
devido ao facto de o Presidente da Federação ter adiado ilegalmente as mesmas
eleições, que já andavam a ser protraídas há mais de três anos?
38) Foi o postergar sucessivo das mais elementares
regras da democracia que provocou a atitude dos impugnantes, devendo a
provocação para o acto ser considerada como atenuante e, até, como causa de
exculpação;
39) Por não existir precedente desta natureza, por não
se ter relevado a causa de exculpação dos impugnantes e por se terem violado as
regras da democracia interna, conclui‑se que as decisões de expulsão são
ilegais, imorais e injustas e, como tal, merecem ser revogadas.
1.2. Citado o Partido Socialista para responder e juntar
os processos disciplinares instaurados aos impugnantes e demais documentos por
estes requisitados, foram remetidos estes processos e elementos, constando da
resposta apresentada o seguinte:
“9.º – (…) a presente resposta cingir‑se‑á a demonstrar que a
decisão impugnada não violou qualquer norma legal, estatutária ou regulamentar;
Na verdade e antes de mais,
10.º – Dir‑se‑á que no decurso do processo disciplinar aos
impugnantes foram asseguradas as mais amplas garantias de defesa nos termos do
disposto no artigo 99.º dos Estatutos do Partido Socialista e artigo 26.º, n.º
2, do Regulamento Disciplinar;
11.º – Com efeito, e conforme decorre do processo disciplinar e dos
factos reportados no acórdão em causa, os impugnantes foram notificados por
carta registada com aviso de recepção para prestar declarações – fls. 334 e 335
do processo disciplinar –, sendo que o impugnante Manuel Joaquim Duarte Santos
recusou a recepção da notificação, conforme decorre do documento de fls. 338 do
processo disciplinar;
12.º – Por sua vez, o impugnante Fernando José Costa Salgado no dia
aprazado para prestar declarações optou por questionar o instrutor acerca do seu
mandato para a instrução do processo – fls. 336 do processo disciplinar –, não
se satisfazendo com a exibição e explicações dadas pelo instrutor a fls. 337
desse processo;
13.º – Acresce que os impugnantes, em 18 de Julho de 2006 (fls. 339
e 341 do processo disciplinar), foram notificados, cada um deles, da respectiva
nota de culpa, bem como do prazo concedido para responder à mesma,
assegurando‑se, assim, as garantias de defesa previstas no artigo 99.º dos
Estatutos do Partido Socialista e no artigo 26.º, n.º 2, do Regulamento
Disciplinar;
14.º – Pese embora essa notificação, os impugnantes entenderam não
responder à nota de culpa, o que é direito que lhes assiste,
15.º – Sendo certo que, desse modo, prescindem do seu direito de
defesa, bem como do direito de indicar testemunhas, juntar documentos e requerer
quaisquer diligências com vista ao apuramento dos factos;
16.º – Daí que não se entende que os impugnantes venham agora dizer
que houve violação do disposto no artigo 99.º dos Estatutos do Partido, bem como
do artigo 26.º, n.º 2, do Regulamento Disciplinar.
17.º – Como se não entende que digam agora que o prazo de 10 dias
fixado para a resposta à nota de culpa era «manifestamente curto para o
exercício cabal do direito de defesa».
Na verdade,
18.º – O prazo fixado está de acordo com o disposto no artigo 34.º,
n.º 1, do Regulamento Disciplinar, que estatui que «o prazo para a defesa é
fixado pelo instrutor, não podendo ser inferior a 8 nem superior a 30 dias».
19.º – Ora, se atentarmos que os impugnantes durante aquele prazo de
10 dias deduziram o incidente de suspeição contra o instrutor do processo, e que
após a recepção da notificação da decisão da Comissão Nacional de Jurisdição,
tiveram 5 dias para apresentar impugnação, o que não fizeram, não se vê como é
que não era possível ter apresentado a resposta à nota de culpa naquele prazo de
10 dias;
20.º – De resto, se o problema fosse o prazo, poderiam os
impugnantes requerer que lhes fosse concedido prazo mais dilatado para o efeito,
o que não fizeram;
21.º – Relativamente à questão relacionada com a falta de assinatura
no acórdão em causa, bem como ao facto de o mesmo ter sido remetido em correio
simples, violando o disposto nos artigos 21.º, n.º 3, e 39.º, n.º 2, do
Regulamento Disciplinar e o artigo 668.º, n.º 1, alínea a), do CPC, aplicado
por analogia, dir‑se‑á o seguinte:
22.º – As decisões proferidas pela Comissão Nacional de Jurisdição
são proferidas em reunião plenária, constando de acta, aprovada em minuta, por
forma a que o seu efeito seja imediato;
23.º – A presença dos membros da Comissão Nacional de Jurisdição é
anotada em lista de presenças, assinada por cada um dos participantes na
reunião, lista essa que é parte integrante de cada uma das actas das reuniões,
sendo que nesta se dá conta de todas as decisões, deliberações, tomadas de
posição, sentido de voto, enfim, de todos os incidentes verificados no decorrer
na respectiva reunião;
24.º – Sendo este o modus actuandi, o que se verificou no presente
caso foi que, na reunião de 12 de Outubro de 2006, onde foi decidida a aprovação
do acórdão que deliberou a expulsão dos ora impugnantes, os respectivos
acórdãos foram aprovados por unanimidade dos presentes, conforme consta da
minuta da acta de reunião que se junta – fls. 382 e seguintes do processo
disciplinar –, e cujos dizeres se dão aqui por reproduzidos para os devidos e
legais efeitos;
25.º – É certo que as notificações das decisões feitas a cada um dos
impugnantes, cuja cópia constitui os documentos juntos com o seu petitório,
comprovam que, na comunicação dos actos impugnados, não consta qualquer
assinatura nas resoluções comunicadas, estando apenas assinado o oficio de
remessa;
26.º – A verdade, porém, é que, no processo disciplinar – fls. 373 a
381 –, constam os acórdãos devidamente assinados por todos os membros
participantes na reunião, pelo que se está apenas em presença de uma mera
irregularidade de notificação, sem qualquer relevo na validade substancial das
deliberações comunicadas;
27.º – De resto, entendendo‑se que faz sentido a analogia com o
vício da falta de assinatura das sentenças – artigo 668.º, n.º 1, alínea a), do
CPC –, geradora de nulidade, o que é facto é que, nos termos do n.º 2 do artigo
668.º do CPC, a falta de assinatura pode ser suprida oficiosamente;
28.º – Daí que, e por mera cautela, o respondente remeteu agora aos
impugnantes, bem como à sua mandatária judicial, cópia assinada dos respectivos
acórdãos, através de carta registada com aviso de recepção, conforme cópias que
se juntam – fls. 384, 385 e 386;
29.º – Deste modo, e porque legal e processualmente possível, estão
supridas as irregularidades a que se reportam os artigos 39.º, n.º 2, e 21.º,
n.ºs 3 e 4, do Regulamento Disciplinar, bem como do n.º 1, alínea a), do artigo
668.º do CPC, aqui aplicado por analogia;
30.º – Acresce que os acórdãos em causa, e conforme decorre da acta
ora junta, foram votados por unanimidade dos 8 membros da Comissão Nacional de
Jurisdição presentes na reunião de 12 de Outubro de 2006, número este que
constitui a maioria dos votos dos membros da Comissão Nacional de Jurisdição,
que são 15 – artigos 15.º, n.º 2, e 5.º, n.º 1, do Regulamento Disciplinar –;
31.º – Quanto à questão da violação do n.º 1 do artigo 23.º do
Regulamento Disciplinar, dir‑se‑á que os processos em causa foram distribuídos
por escala, a exemplo do que acontece com a distribuição dos demais processos, e
por forma a que a sua repartição seja equitativa em relação a todos os membros
da Comissão Nacional de Jurisdição, sendo que no caso dos autos faz todo o
sentido que os processos pela sua similitude fossem distribuídos à mesma
pessoa;
32.º – Daí que não se vislumbra que tenha havido violação ou
preterição de formalidade na distribuição, sendo certo que, mesmo que houvesse,
o que não se concede, tal facto, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo
210.º do CPC, aplicado por analogia, nunca produziria nulidade de nenhum acto do
processo;
33.º – Como certo é que o facto de a instrução do processo ser,
conforme consta da notificação de folhas 334 e 335, realizada na sede da
Federação Distrital de Braga do Partido Socialista, à qual os impugnantes estão
organicamente adstritos, bem como de a correspondência ser feita para a morada
profissional do instrutor, não constitui irregularidade processual que determine
a nulidade do processo;
34.º – Trata‑se de procedimento que visa facilitar a vida dos
impugnantes, pois que faria pouco sentido obrigá‑los a ir a Lisboa para prestar
declarações ou para obter esclarecimentos;
35.º – Se tal fosse exigido certamente que os impugnantes estariam
agora a dizer que o que se pretendia era coarctar‑lhes os seus direitos de
defesa;
36.º – De resto, são questões procedimentais que não foram
questionadas pelos impugnantes na altura própria, pelo que terão de se
considerar como sanadas;
37.º – Aliás, o próprio artigo 25.º, n.º 1, do Regulamento
Disciplinar estatui que o local das diligências instrutórias é a sede da
Comissão Nacional de Jurisdição – Lisboa –, «se não houver conveniência em que
as diligências se efectuem em local diferente»;
38.º – Ou seja, são razões de conveniência que determinam que as
diligências possam ser efectuadas neste ou naquele local, razão porque a não
realização dessas diligências na sede da Comissão não constitui ilegalidade ou
irregularidade processual e, por conseguinte, não violam o disposto no artigo
25.º do Regulamento Disciplinar.
39.º – Relativamente à arguida questão da suspeição – artigo 127.º,
n.º 1, do CPC –, dir‑se‑á que se trata de matéria oportunamente decidida, sendo
que a decisão não foi objecto de recurso por parte dos impugnantes, pelo que a
mesma transitou em julgado;
40.º – Na verdade, os impugnantes, através dos requerimentos de fls.
344 e 346, deduziram incidente de suspeição contra o instrutor do processo,
tendo este respondido de acordo com o vertido a fls. 349 do processo;
41.º – Este incidente, autuado por apenso ao processo disciplinar,
foi apreciado e indeferido – fls.353 a 357 – pelo Presidente da Comissão
Nacional de Jurisdição, sendo que a decisão foi notificada à mandatária judicial
dos impugnantes – fls.359;
42.º – Assim, e porque não houve impugnação dessa decisão, a mesma
transitou em julgado, pelo que não poderá de novo ser objecto de apreciação;
43.º – No que às questões de mérito da decisão respeita, dir‑se‑á,
igualmente, que os impugnantes não têm razão;
44.º – Na verdade, e ao contrário do que os impugnantes alegam, não
se trata de haver ou não tradição no Partido Socialista de expulsar militantes;
45.º – A questão é saber se o comportamento de um qualquer
militante, enquanto tal, é passível ou não de procedimento e consequente sanção
disciplinar, ou seja, se esse comportamento viola as regras por que se rege a
vida partidária, nomeadamente os seus Estatutos e Regulamentos;
46.º – E sempre que isso acontece naturalmente que o respondente faz
uso do seu poder disciplinar, de acordo e no respeito pelos Estatutos e
Regulamentos, o que implica que, por vezes, tenha de aplicar a pena de
expulsão, sempre que as faltas cometidas assumam carácter de grave;
47.º – Aliás, é no mínimo caricato que os impugnantes defendam a não
aplicação da pena de expulsão recorrendo ao exemplo de outros, cuja acção é
completamente diferente da por si praticada, sendo certo que, e relativamente a
um dos casos, Agostinho Fernandes, o mesmo deixou de ser militante após as
eleições autárquicas de 2001;
48.º – De qualquer forma, o que está em causa neste processo é saber
se o comportamento dos impugnantes, à luz dos Estatutos e Regulamentos do
Partido Socialista, constitui falta grave, susceptível de justificar a pena de
expulsão;
Com efeito,
49.º – De acordo com o acórdão recorrido, resultaram provados,
relativamente ao impugnante Fernando José da Costa Salgado, os seguintes
factos:
«1. Fernando José Costa Salgado, militante do Partido Socialista n.º
30 275, inscrito na Secção de Vila Nova de Famalicão, no dia 16 de Fevereiro de
2005, na sede concelhia do Partido Socialista de Vila Nova de Famalicão,
juntamente com outros, interrompeu uma conferência de imprensa que na altura
decorria, patrocinada pelo camarada Nuno André Araújo dos Santos Sá, no âmbito
das eleições para a Comissão Política concelhia desta Secção.
2. A interrupção daquela conferência de imprensa foi acompanhada
com ditos do género de ‘testa de ferro da Federação’ e ‘palhaço’, dirigidos
àquele camarada Nuno Sá, sendo que, na altura dos factos, se encontravam
presentes vários jornalistas, quer da imprensa escrita, quer da falada.
3. Os factos descritos foram amplamente divulgados pela comunicação
social, nomeadamente, nos jornais ‘Cidade Hoje’, de 22 de Dezembro de 2005, e
‘Diário do Minho’, de 17 de Dezembro de 2005, bem como através das rádios locais
e regionais (fls. 1 e ss.).
4. Para além destes factos, o militante Fernando Salgado,
desafiando a deliberação do Secretariado da Federação de Braga do Partido
Socialista, que havia adiado as eleições para a Comissão Política de Vila Nova
de Famalicão do dia 17 de Dezembro de 2005 para 18 de Fevereiro de 2006,
juntamente com outros militantes, nomeadamente, Manuel Joaquim Duarte Santos,
militante n.º 17 335, organizou um simulacro de acto eleitoral, naquele dia 17
de Dezembro.
5. Para tanto, instalaram uma roullote em frente à sede concelhia do
Partido Socialista, onde se dirigiam pessoas, supostamente militantes
socialistas, para ‘votar’.
6. A ‘votação’ decorreu no período compreendido entre as 10 e as 18
horas.
7. A realização deste simulacro eleitoral, no dia 17 de Dezembro,
conforme resulta do processo, foi amplamente divulgada nos meios de comunicação
social, nomeadamente nos jornais ‘Jornal de Notícias’, de 18 de Dezembro,
‘Cidade Hoje’, de 22 de Dezembro, ‘Expresso’, de 23 de Dezembro, e ‘Povo
Famalicense’, edição n.º 310, bem como nas rádios locais e regionais, sendo que
as notícias reflectem, não só o estado de divisão existente no seio da Secção,
como também expressam a vergonha e indignação manifestada por alguns
entrevistados, supostamente militantes do Partido Socialista, para além de pôr
em causa a imagem e bom nome do Partido Socialista.
8. Esses mesmos órgãos de comunicação social fazem eco de
declarações de Fernando Salgado, bem como da carta que este dirigiu ao
Presidente da Federação de Braga do Partido Socialista, acusando a Federação de
parcialidade em relação ao acto eleitoral e pedindo a demissão deste por
‘ilegalmente ter desmarcado’ as eleições previstas para o dia 17 de Dezembro.
9. Aliás, essa carta (fls. 32), que tem o timbre do Partido
Socialista, Secção de Vila Nova de Famalicão, é assinada pelo arguido
militante Fernando Salgado, que aí se arroga como Presidente da Comissão
Política eleita em 17 de Dezembro de 2005, em clara usurpação de poderes.
10. O referido simulacro de acto eleitoral, da responsabilidade,
entre outros, do militante Fernando Salgado, constitui um desrespeito pela
deliberação tomada por unanimidade pelo Secretariado da Federação de Braga, no
sentido de adiar as eleições por razões que se prendiam com a interpretação do
n.º 4 do artigo 116.º dos Estatutos do PS.
11. O militante Fernando Salgado havia sido informado da
deliberação do adiamento das eleições do dia 17 de Dezembro de 2005 para o dia
18 de Fevereiro de 2006, adiamento esse que motivou as declarações por si
prestadas, aquando da interrupção da conferência de imprensa atrás referida, de
que ‘...a lista A vai até ao fim, as eleições não foram desconvocadas. Não é um
qualquer edital colocado ali na porta que vai impedir as eleições em Famalicão.
Não é o Joaquim Barreto e a sua pandilha que vão impedir as eleições em
Famalicão’.»
50.º – Por sua vez, relativamente ao impugnante Manuel Joaquim
Duarte Santos, resultaram provados nos autos os seguintes factos:
«1. Manuel Joaquim Duarte dos Santos, militante do Partido
Socialista n.º 17 335, inscrito na Secção de Vila Nova de Famalicão, no dia 16
de Fevereiro de 2005, na sede concelhia do Partido Socialista de Vila Nova de
Famalicão, juntamente com outros, interrompeu uma conferência de imprensa que
na altura decorria, patrocinada pelo camarada Nuno André Araújo dos Santos Sá,
no âmbito das eleições para a Comissão Politica Concelhia desta Secção.
2. A interrupção daquela conferência de imprensa foi acompanhada
com ditos do género de ‘testa de ferro da Federação’ e ‘palhaço’, dirigidos
àquele camarada Nuno Sá, acompanhados de acusações contra o Presidente da
Federação de Braga do Partido Socialista, que acusava de ter instalado uma
‘ditadura’ e de ser o responsável pela não existência de eleições na concelhia
de Vila Nova de Famalicão.
3. Os factos descritos foram amplamente divulgados pela comunicação
social, nomeadamente, nos jornais ‘Cidade Hoje’, de 2 de Dezembro de 2005, e
‘Diário do Minho’, de 17 de Dezembro de 2005, bem como através das rádios locais
e regionais (fls. 1 e ss.).
4. Para além destes factos, o militante Duarte Santos, desafiando a
deliberação do Secretariado da Federação de Braga do Partido Socialista, que
havia adiado as eleições para a Comissão Politica de Vila Nova de Famalicão do
dia 17 de Dezembro de 2005 para 18 de Fevereiro de 2006, juntamente com outros
militantes, nomeadamente, Fernando Salgado, militante n.º 30 275, organizou um
simulacro de acto eleitoral, naquele dia 17 de Dezembro.
5. Para tanto, instalaram uma roullote em frente à sede concelhia do
Partido Socialista, onde se dirigiam pessoas, supostamente militantes
socialistas, para ‘votar’.
6. A ‘votação’ decorreu no período compreendido entre as 10 e as 18
horas.
7. A realização deste simulacro eleitoral, no dia 17 de Dezembro,
conforme resulta do processo, foi amplamente divulgada nos meios de comunicação
social, nomeadamente, nos jornais ‘Jornal de Notícias’, de 18 de Dezembro,
‘Cidade Hoje’, de 22 de Dezembro, ‘Expresso’, de 23 de Dezembro, e ‘Povo
Famalicense’, edição n.º 310, bem como nas rádios locais e regionais, sendo que
as notícias reflectem, não só o estado de divisão existente no seio da Secção,
como também expressam a vergonha e indignação manifestada por alguns
entrevistados, supostamente militantes do Partido Socialista, para além de pôr
em causa a imagem e bom nome do Partido Socialista.
8. O referido simulacro de acto eleitoral, de que o militante Duarte
Santos foi co‑responsável, constitui um desrespeito pela deliberação tomada por
unanimidade pelo Secretariado da Federação de Braga, no sentido de adiar as
eleições por razões que se prendiam com a interpretação do n.º 4 do artigo 116.º
dos Estatutos do PS.
9. O militante Duarte Santos sabia da deliberação do adiamento das
eleições do dia 17 de Dezembro de 2005 para o dia 18 de Fevereiro de 2006.»
51.º – Ora, o comportamento dos impugnantes é objectivamente
passível de sanção disciplinar, sanção essa que é grave, conforme adiante se
demonstrará;
Com efeito,
52.º – Nos termos do disposto no n.º 5, alínea g), do artigo 56.º
dos Estatutos do Partido Socialista, é ao Secretariado da Federação que compete
organizar o processo eleitoral das Comissões Políticas Concelhias;
53.º – Por sua vez, e nos termos do disposto no n.º 1, alínea c), do
artigo 15.º dos Estatutos do Partido Socialista, é dever dos militantes
respeitar, cumprir e fazer cumprir os estatutos e os regulamentos, bem como as
decisões dos órgãos do partido, como é seu dever, nos termos do n.º 2 do mesmo
artigo, respeitar o nome e dignidade do Partido Socialista;
54.º – De acordo com o n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento
Disciplinar do Partido Socialista, «constitui infracção disciplinar a violação
dos deveres impostos pelos Estatutos do Partido e seus Regulamentos»;
55.º – Por outro lado, dispõe o n.º 2 do mesmo artigo que
«constitui, nomeadamente, falta grave o desrespeito aos princípios programáticos
e à linha política do Partido, a inobservância dos Estatutos e Regulamentos e
das decisões dos seus órgãos, a violação de compromissos assumidos e, em geral,
a conduta que acarrete sério prejuízo ao prestígio e ao bom nome do Partido»;
56.º – Ora, da matéria de facto provada nos autos resulta que os
impugnantes, ao actuarem da forma como actuaram, em claro e frontal desrespeito
das deliberações do Secretariado da Federação Distrital de Braga, órgão
estatutariamente responsável pela organização do processo eleitoral das
Comissões Políticas Concelhias;
57.º – Ao expor o Partido Socialista ao ridículo de um simulacro
eleitoral, amplamente divulgado nos meios de comunicação social locais e
nacionais, montando para o efeito uma roullote em frente à sede concelhia do
Partido Socialista;
58.º – Ao usar junto da opinião pública, através dos órgãos de
comunicação social, expressões insultuosas contra outros militantes do Partido,
tais como «testa de ferro da Federação» e «palhaço», ridicularizando esses
militantes;
59.º – Ao acusar, publicamente, o Presidente da Federação de Braga
do Partido Socialista de ter instalado uma «ditadura» para evitar as eleições no
Partido Socialista de Famalicão, afirmação esta que constitui insinuação grave;
60.º – Ao arrogar‑se, como fez o impugnante Fernando da Costa
Salgado, titular de um cargo para o qual não foi eleito, usando o timbre do
Partido Socialista para o efeito, bem como ao afirmar publicamente que o
adiamento das eleições era para «evitar estrondosa derrota da sua protegida» –
referindo‑se à lista B;
61.º – Os impugnantes cometeram infracção disciplinar grave, nos
termos do n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar do Partido Socialista,
por violação dos deveres a que se reporta o estatuído nos artigos 15.º, n.ºs 1,
alínea c), e 2, e 56.º, n.º 5, alínea g), dos Estatutos do Partido Socialista,
sendo que a sua conduta é agravada nos termos das alíneas b), e) e f) do n.º 1
do artigo 18.º daquele Regulamento Disciplinar, já que a infracção foi praticada
em conjunto, teve grande repercussão pública, causando mau ambiente para o
Partido Socialista, sendo certo que os impugnantes são dirigentes distritais do
PS;
62.º – Demonstrativo da repercussão pública dos factos praticados
pelos impugnantes é o conjunto de notícias publicadas e divulgadas nos órgãos de
comunicação social, conforme decorre dos documentos juntos ao processo
disciplinar;
63.º – Por sua vez, o mau ambiente para o Partido Socialista, a que
se reporta a alínea e) do n.º 1 do artigo 1.º do Regulamento Disciplinar, em
resultado do comportamento dos impugnantes, é comprovado pelo abaixo‑assinado
que constitui o documento de fls. 310 do processo disciplinar, no qual algumas
centenas de militantes «manifestam a sua indignação pelos actos vergonhosos
praticados pelos responsáveis da Lista A», de que o impugnante Francisco José
Costa Salgado era o primeiro subscritor e o impugnante Manuel Joaquim Duarte
Santos era um dos primeiros candidatos;
64.º – Nesse abaixo‑assinado, a incomodidade, a revolta e o
enxovalho sentido pelas centenas de militantes do Partido Socialista que o
subscreveram, está expressa na afirmação de que «Vila Nova de Famalicão não pode
continuar a ser palco de espectáculo de indisciplina e o Partido local não pode
estar sujeito a actos de perturbação que enxovalham o seu prestígio, a sua
história e os seus militantes e simpatizantes»;
65.º – De resto e finalmente, dir‑se‑á que é quase pungente a
afirmação dos impugnantes de que a realização das eleições na roullote foi uma
resposta à provocação resultante do adiamento das eleições;
66.º – Decorre de todo o exposto que a pena de expulsão aplicada aos
impugnantes, sendo efectivamente a mais severa, é, contudo, a única adequada ao
comportamento daqueles que, por militarem neste partido politico, têm direitos
que lhe são reconhecidos, mas também têm as obrigações decorrentes dos Estatutos
e Regulamentos que regem a vida do Partido Socialista;
67.º – Decorre ainda de todo o exposto que o ora respondente não
violou nenhuma das normas a que se reporta o n.º 93 do petitório do impugnante
Fernando José da Costa Salgado e o n.º 77 do impugnante Manuel Joaquim Duarte
Santos.”
1.3. Notificados da apresentação da resposta e dos
documentos anexos, incluindo cópias do processo disciplinar (e do apenso
relativo ao incidente de suspeição deduzido contra o respectivo instrutor), dos
acórdãos sancionatórios devidamente assinados, da acta da reunião da Comissão
Nacional de Jurisdição de 12 de Outubro de 2006 e das cartas registadas de
notificação das deliberações ora impugnadas, os impugnantes apresentaram adendas
às petições iniciais, nas quais, após referirem as razões de cautela que os
levaram a dar entrada aos recursos no prazo de cinco dias subsequentes ao
conhecimento ineficaz (por a notificação ter sido efectuada por correio normal)
de deliberações patentemente inválidas (por falta de assinatura dos acórdãos),
referem:
“9.º – Entretanto, por carta registada recebida no passado dia 2 de
Novembro, o impugnante recebeu o esperado acórdão assinado com 10 assinaturas.
10.º – Este facto vem sustentar ainda mais a tese do impugnante,
segundo a qual o propósito primeiro do status quo (concelhia e distrital) do
Partido era evitar que aquele patrocinasse uma lista de delegados ao Congresso
Nacional que ocorrerá nos próximos dias 10, 11 e 12 de Novembro.
11.º – Recorde‑se que a decisão de expulsão produziu efeitos
práticos (materiais) na semana em que se realizavam eleições para a constituição
de delegados ao Congresso, pela Secção de Vila Nova de Famalicão.
12.º – Mais concretamente, o prazo para a entrega das listas
terminava no passado dia 25 de Outubro e as eleições realizaram‑se no passado
dia 27 de Outubro de 2006.
13.º – O impugnante, em vez de poder apresentar, ou subscrever, uma
lista de delegados ao Congresso e exercer o seu direito de voto, teve de
apresentar uma impugnação no Tribunal Constitucional, porque havia sido
excluído da listagem de militantes do Partido Socialista.
14.º – Agora percebe‑se a razão pela qual o impugnante duvida que a
reunião da Comissão Nacional de Jurisdição se tenha realizado no passado dia 12
de Outubro (cf. n.º 61 da petição inicial).
15.º – Pois, se aquela reunião tivesse ocorrido com a presença de
todos quantos assinaram o acórdão, certamente que este teria sido remetido com
as assinaturas.
16.º – Mais, duvidamos até que o seu presidente tenha ido à sede no
Largo do Rato porque, conforme consta na petição inicial (artigo 58.º), a carta
que capeou o «acórdão» não assinado, foi assinada digitalmente.
17.º – Agora, depois de denunciadas estas questões de natureza
formal, através da comunicação social, a Comissão Nacional de Jurisdição tenta
debelar as irregularidades formais cometidas.
18.º – Depois disto, não restam dúvidas que tudo se passou conforme
se suspeitava nos itens 64 e 65 da petição inicial, ou seja, o instrutor
elaborou o acórdão e depois as assinaturas foram sendo recolhidas, até que
obtivessem o quórum mínimo exigido no artigo 14.º, n.º 4, dos Estatutos do PS e
artigo 15.º, n.º 1, do Regulamento Disciplinar.
19.º – Mas, agora há uma certeza inequívoca: o acórdão foi redigido
pelo instrutor «escolhido» António Reis.
20.º – É a própria acta da reunião, supostamente ocorrida em 12 de
Outubro de 2006, que o afirma: «Aprovar por unanimidade dos presentes e
verificado o quórum legalmente exigido para a pena de expulsão ... o projecto de
acórdão do relator António Reis».
21.º – Assim, constata‑se que a Comissão Nacional de Jurisdição do
PS conseguiu repristinar as leis da «Santa Inquisição».
22.º – Só nessa altura é que a entidade que inquiria e instruía,
também julgava!...
23.º – Ficamos agora a saber que na CNJ do PS também é assim.
24.º – Ora, esta circunstância viola claramente o princípio do
acusatório, consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da CRP.
25.º – Figueiredo Dias, in A Nova Constituição e o Processo Penal,
pág. 105, afirma que a «Estrutura acusatória do processo penal significa na
verdade duas coisas: por um lado, reconhecimento da participação constitutiva
dos suspeitos processuais na declaração do direito do caso; por outro lado,
reconhecimento do princípio da acusação, segundo o qual terá de haver uma
diferenciação material (e não simplesmente formal) entre o órgão que instrui o
processo e dá a acusação e o órgão que vai julgar».
26.º – Assim, a decisão tomada pela CNJ do PS, supostamente em 12 de
Outubro passado, é inconstitucional, porque limita‑se a aprovar o projecto de
acórdão elaborado pelo instrutor que, para o efeito, assumiu o papel também de
relator.
27.º – Na sua essência e substância, os factos constantes do
processo não foram objecto de valoração por duas entidades distintas: o acusador
e o julgador.
28.º – O instrutor «escolhido» acusou e julgou!... (os demais
membros CNJ do PS limitaram‑se a subscrever o acórdão).
29.º – Nos itens 83.º a 91.º da petição inicial o impugnante aflorou
uma causa de exculpação do seu comportamento porque, no seu entender, a decisão
do Secretariado da Federação de Braga do PS cancelou ilegalmente as eleições que
estavam marcadas para o dia 17 de Dezembro de 2005.
30.º – Agora, depois de melhor estudada a questão, o impugnante
sustenta que eleições levadas a cabo numa auto‑caravana em frente à sede do PS
de Vila Nova de Famalicão, que foi a causa eficiente do processo disciplinar que
terminou com a decisão que nestes autos se impugna, mais do que legais, foram
constitucionais.
31.º – Na verdade, o impugnante actuou ao abrigo do direito de
resistência, consignado no artigo 31.º da CRP.
32.º – Com efeito, Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição
Anotada, vol. I, pág. 183, afirmam que «o direito de resistência tanto pode
proteger os direitos, liberdades e garantias de carácter pessoal (a integridade
física, a liberdade, o domicílio, etc.) como os de participação política (o
direito de voto, etc.) …».
33.º – Assim sendo, o comportamento do impugnante que, segundo o
acórdão, «desafiou» uma decisão de órgãos distrital secretariado, foi praticado
ao abrigo constitucional de direito de resistência.
34.º – Em complemento ao descrito nos itens 71 a 81 da petição
inicial, o impugnante pretende invocar a seu favor a violação do princípio da
proporcionalidade.
35.º – O impugnante crê que o seu pedido vai obter provimento no
Tribunal Constitucional e irá ser reintegrado no seu Partido sem quaisquer
sanções.
36.º – Mas, se porventura alguma sanção houver que aplicar o
impugnante, nunca poderá ser a expulsão.
37.º – Pois o comportamento do impugnante não foi assim tão grave
que merecesse essa decisão.
38.º – Relembre‑se que alguns violaram frontalmente o artigo 94.º,
n.º 5, dos Estatutos do PS e não foram expulsos.
39.º – Acresce que na «luta» política verificam‑se, assiduamente,
comportamentos vigorosos e vive‑se momentos de «calor» e emotividade.
40.º – E repare‑se que todo o comportamento do impugnante, que
esteve na base da decisão de expulsão, foi denominado por uma grande dose de
emoção.
41.º – Saliente‑se que a desmarcação das eleições do dia 17 de
Dezembro de 2005 foi sentido pelo impugnante como a ruína de um processo
eleitoral que era almejado por centenas de militantes há mais de três anos!...
42.º – A pseudo decisão do Secretariado da Federação Distrital do PS
foi a provocação para todos os comportamentos do impugnante.
43.º – Assim, o comportamento do impugnante está justificado,
verifica‑se uma causa de exculpação.
44.º – Mas, se culpa houver do impugnante, sempre se dirá que esta
será muito reduzida, não sendo suficiente para sustentar e fundamentar a decisão
de expulsão.
45.º – Tanto mais que, conforme se alegou, outros tiveram atitudes
mis gravosas para o Partido e não foram sancionados.”
1.4. Notificado da apresentação destas adendas às
petições iniciais, o Partido Socialista apresentou resposta, onde, com
relevância para a decisão da causa, aduz o seguinte:
“1.º – A presente resposta cingir‑se‑á a demonstrar que a decisão
impugnada não violou qualquer norma legal, estatutária ou regulamentar;
Na verdade e antes de mais,
2.º – Dir‑se‑á que no decurso do processo disciplinar aos
impugnantes foram asseguradas as mais amplas garantias de defesa nos termos do
disposto no artigo 99.º dos Estatutos do Partido Socialista e artigo 26.º, n.º
2, do Regulamento Disciplinar;
3.º – Mais uma vez se afirma que as decisões proferidas pela
Comissão Nacional de Jurisdição são proferidas em reunião plenária, constando de
acta, aprovada em minuta, por forma a que o seu efeito seja imediato;
4.º – A presença dos membros da Comissão Nacional de Jurisdição é
anotada em lista de presenças, assinada por cada um dos participantes na
reunião, lista essa que é parte integrante de cada uma das actas das reuniões,
sendo que nesta se dá conta de todas as decisões, deliberações, tomadas de
posição, sentido de voto, enfim, de todos os incidentes verificados no decorrer
da respectiva reunião;
5.º – Sendo este o modus actuandi, o que se verificou no presente
caso foi que, na reunião de 12 de Outubro de 2006, onde foi decidida a aprovação
do acórdão que deliberou a expulsão dos ora impugnantes, os respectivos
acórdãos foram aprovados por unanimidade dos presentes, conforme consta da
minuta da acta de reunião já junta aos autos;
6.º – É certo que as notificações das decisões feitas a cada um dos
impugnantes, cuja cópia constitui os documentos juntos com o seu petitório,
comprovam que, na comunicação dos actos impugnados, não consta qualquer
assinatura nas resoluções comunicadas, estando apenas assinado o oficio de
remessa;
7.º – A verdade, porém, é que no processo disciplinar – fls. 373 a
381 – constam os acórdãos devidamente assinados por todos os membros
participantes na reunião, pelo que se está apenas em presença de uma mera
irregularidade de notificação, sem qualquer relevo na validade substancial das
deliberações comunicadas;
8.º – De resto, entendendo‑se que faz sentido a analogia com o vício
da falta de assinatura das sentenças – artigo 668.º, n.º 1, alínea a), do CPC –,
geradora de nulidade, o que é facto é que, nos termos do n.º 2 do artigo 668.º
do CPC, a falta de assinatura pode ser suprida oficiosamente;
9.º – Daí que, e por mera cautela, o recorrido tenha remetido aos
ora impugnantes, bem como à sua mandatária judicial, cópia assinada dos
respectivos acórdãos, através de carta registada com aviso de recepção,
conforme cópias já juntas aos autos;
10.º – Deste modo, e porque legal e processualmente possível, estão
supridas as irregularidades a que se reportam os artigos 39.º, n.º 2, e 21.º,
n.ºs 3 e 4, do Regulamento Disciplinar, bem como do n.º 1, alínea a), do artigo
668.º do CPC, aqui aplicado por analogia;
11.º – Acresce que os acórdãos em causa, e conforme decorre da acta
junta, foram votados por unanimidade dos 8 membros da Comissão Nacional de
Jurisdição presentes na reunião de 12 de Outubro de 2006, número este que
constitui a maioria dos votos dos membros da Comissão Nacional de Jurisdição,
que são 15 – artigo 15.º, n.ºs 2 e 5, e n.º 1 do Regulamento Disciplinar –;
12.º – Assim, a argumentação dos ora impugnantes em nada abala os
fundamentos da decisão impugnada;
13.º – É caricato que os impugnantes defendam a não aplicação da
pena de expulsão recorrendo ao exemplo de outros, cuja acção é completamente
diferente da por si praticada;
14.º – De qualquer forma, o que está em causa neste processo é saber
se o comportamento dos ora impugnantes, à luz dos Estatutos e Regulamentos do
Partido Socialista, constitui falta grave, susceptível de justificar a pena de
expulsão;
Com efeito,
15.º – De acordo com o acórdão recorrido, resultaram provados,
relativamente ao impugnante Fernando José da Costa Salgado, todos os factos
descritos no artigo 49.º da oposição;
16.º – Por sua vez, relativamente ao impugnante Manuel Joaquim
Duarte Santos, resultaram provados todos os factos descritos no artigo 50.º da
oposição;
17.º – Ora, o comportamento dos impugnantes é objectivamente
passível de sanção disciplinar, sanção essa que é grave, conforme já largamente
demonstrado nos próprios autos;
18.º – Os impugnantes cometeram infracção disciplinar grave, nos
termos do n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar do Partido Socialista,
por violação dos deveres a que se reporta o estatuído no artigo 15.º, n.º 1,
alínea c), e n.º 2, e artigo 56.º, n.º 5, alínea g), dos Estatutos do Partido
Socialista, sendo que a sua conduta é agravada nos termos das alíneas b), e) e
f) do n.º 1 do artigo 18.º daquele Regulamento Disciplinar, já que a infracção
foi praticada em conjunto, teve grande repercussão pública, causando mau
ambiente para o Partido Socialista, sendo certo que os impugnantes são
dirigentes distritais do PS;
19.º – Demonstrativo da repercussão pública dos factos praticados
pelos impugnantes é o conjunto de notícias publicadas e divulgadas nos órgãos de
comunicação social, conforme decorre dos documentos juntos ao processo
disciplinar;
20.º – Finalmente, dir‑se‑á que é quase comovente a afirmação dos
impugnantes de que a realização das eleições na «caravana» foi uma resposta à
provocação resultante do adiamento das eleições;
21.º – Decorre de todo o exposto que a pena de expulsão aplicada aos
impugnantes, sendo efectivamente a mais severa, é, contudo, a única adequada ao
comportamento daqueles que, por militarem neste partido político, têm direitos
que lhe são reconhecidos, mas também têm as obrigações decorrentes dos Estatutos
e Regulamentos que regem a vida do Partido Socialista;
22.º – Decorre ainda de todo o exposto que o ora recorrido não
violou nenhuma das normas invocadas pelos impugnantes no seu petitório;
23.º – Face ao supra exposto, a argumentação dos ora impugnantes em
nada abala os fundamentos da decisão impugnada.”
Em 30 de Novembro de 2007, os impugnantes requereram a
junção aos autos de um parecer jurídico. Notificado da apresentação deste
parecer, o Partido Socialista nada disse.
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
2. Fundamentação
2.1. Dos elementos constantes dos autos, resulta provada
a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão da causa:
1) Por deliberação da Federação Distrital de Braga do
Partido Socialista, de 11 de Novembro de 2005, foi marcado o dia 17 de Dezembro
de 2005 para a eleição da Comissão Política Concelhia de Vila Nova de Famalicão
para o biénio 2006/2007 (doc. de fls. 151/152);
2) A essa eleição apresentaram‑se duas candidaturas: a
lista A, tendo por primeiro subscritor Fernando José da Costa Salgado, e a
lista B, tendo por primeiro subscritor Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá;
3) Em reunião extraordinária realizada em 15 de Dezembro
de 2005, o Secretariado da Federação de Braga do Partido Socialista,
considerando, por um lado, que a comissão encarregada de acompanhar o referido
processo eleitoral entendera que a lista A não respeitava o n.º 4 do artigo
166.º dos Estatutos do PS por, sendo composta por 93 elementos, apenas integrar
11 mulheres nos 61 efectivos, e concedera o prazo de 48 horas para suprimento
dessa irregularidade, mas que o primeiro subscritor dessa lista comunicara
entender que ela cumpria os Estatutos e por isso a mantinha, e, por outro lado,
que cometia à Comissão Nacional de Jurisdição dar parecer sobre a interpretação
das disposições estatutárias (artigo 81.º, n.º 1, alínea h), dos Estatutos),
deliberou adiar a realização do acto eleitoral para o dia 18 de Fevereiro de
2006 e solicitar o parecer da Comissão Nacional de Jurisdição sobre o
cumprimento, ou não, pela lista A, na sua composição, do mencionado n.º 4 do
artigo 166.º dos Estatutos (doc. de fls. 116);
4) Em 16 de Dezembro de 2005, quando estava a decorrer,
na sede do PS de Vila Nova de Famalicão, uma conferência de imprensa convocada
pela lista B, encontrando‑se presentes vários jornalistas da imprensa escrita e
falada, entraram na sala alguns candidatos da lista A, entre eles os ora
impugnantes, que acompanharam a interrupção com ditos do género de ‘testa de
ferro da Federação’ e ‘palhaço’, dirigidos ao primeiro subscritor da lista B,
que procedia à leitura de texto de apoio à conferência, tendo estes incidentes
sido divulgados pela comunicação social, nomeadamente, nos jornais ‘Cidade
Hoje’, de 22 de Dezembro de 2005, e ‘Diário do Minho’, de 17 de Dezembro de
2005, bem como através das rádios locais e regionais (participação de fls. 98 e
docs. de fls. 99 e 100);
5) Em 17 de Dezembro de 2005, os ora impugnantes,
juntamente com outros militantes, instalaram uma roullote em frente à sede
concelhia do Partido Socialista, onde promoveram a votação para a Comissão
Concelhia, no período compreendido entre as 10 e as 18 horas, o que foi
divulgado em diversos meios de comunicação social escrita e em rádios locais e
regionais (docs. de fls. 114 e 120 a 126);
6) O primeiro subscritor da lista B, Nuno Sá, endereçou,
em 16 de Dezembro de 2205, ao Presidente do Conselho Nacional de Jurisdição do
Partido Socialista a participação disciplinar de fls. 98, cujo teor se dá por
reproduzido,
7) A Comissão de Gestão Administrativa da Secção de Vila
Nova de Famalicão do Partido Socialista endereçou, em 18 de Dezembro de 2005,
ao Presidente da Federação Distrital de Braga, a participação disciplinar de
fls. 117 a 119, cujo teor se dá por reproduzido;
8) Em 22 de Dezembro de 2005, o Presidente da Federação
Distrital de Braga enviou ao Presidente da Comissão Federativa de Jurisdição de
Braga cópia de carta que lhe fora remetida, em 19 de Dezembro de 2005, pelo ora
primeiro impugnante, invocando a qualidade de “Presidente da Comissão Política
eleita em 17 de Dezembro de 2005” (docs. de fls. 127 a 131, cujo teor se dá por
reproduzido);
9) Em 22 de Dezembro de 2005, a Comissão Federativa de
Jurisdição de Braga deliberou remeter as participações referidas em 7) e 8) à
Comissão Nacional de Jurisdição, por, nos termos do artigo 81.º, n.º 1, alínea
d), dos Estatutos do PS, ser a competente para a instrução e decisão dos
processos disciplinares, uma vez que os ora impugnantes eram membros da
Comissão Política da Federação (doc. de fls. 96);
10) Em 12 de Janeiro de 2006, o Presidente da Comissão
Nacional de Jurisdição exarou despacho designando o membro dessa Comissão, Dr.
António Reis, para proceder à instrução dos processos disciplinares (doc. de
fls. 97);
11) Em 1 de Fevereiro de 2006, o Presidente da Comissão
de Gestão Administrativa da Secção de Vila Nova de Famalicão do Partido
Socialista remeteu ao Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição um abaixo
assinado, subscrito por 731 militantes, em que “manifestam a sua indignação
pelos actos vergonhosos protagonizados pelos responsáveis da lista A e reclamam
dos órgãos distritais e nacionais do PS uma actuação disciplinadora clara, que
dignifique o Partido e o trabalho de todos os seus representantes e
simpatizantes” (doc. de fls. 438 a 488, cujo teor se dá por reproduzido);
12) Em 26 de Abril de 2006, o instrutor remeteu, através
de cartas registadas com aviso de recepção, convocatórias para os ora
impugnantes serem ouvidos na qualidade de arguidos nos respectivos processos
disciplinares, nos termos do artigo 26.º, n.º 2, do Regulamento Disciplinar do
Partido Socialista, tendo o segundo impugnante recusado a recepção da carta que
lhe foi dirigida (docs. de fls. 520 a 523 e 526 a 528);
13) Em 10 de Maio de 2006, o primeiro impugnante
compareceu perante o instrutor do processo disciplinar, tendo ditado para o auto
de inquirição requerimento em que reclamava a exibição de mandato bastante
conferido ao dito instrutor, referindo não responder enquanto não fosse
convencido que as suas declarações podiam ser ouvidas pelo referido instrutor,
tendo, em sequência, este exarado despacho em que consignou não desconhecer o
requerente ser o instrutor membro da Comissão Nacional de Jurisdição, tendo‑lhe
sido exibido o ofício emanado da Presidência da Comissão Nacional de Jurisdição
que o nomeia relator do processo, pelo que, perante a recusa do respondente,
considerou cumprida a obrigação da sua audição (doc. de fls. 524 e 525);
14) Em 18 de Julho de 2006, o instrutor dos processos
disciplinares remeteu aos ora impugnantes, através de cartas registadas com
aviso de recepção, as notas de culpa contra eles deduzidas, cujo teor se dá por
reproduzido (docs. de fls. 529 a 540);
15) Em 31 de Julho de 2006, os ora impugnantes deduziram
incidente de suspeição contra o instrutor dos processos disciplinares, nos
termos dos requerimentos de fls. 545 a 551 e 555 a 560, cujo teor se dá por
reproduzido;
16) Por despachos de 26 de Setembro de 2006, o
Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição indeferiu os incidentes de
suspeição (docs. de fls. 573‑575 e 576‑577);
17) Contra estes despachos, notificados à mandatária dos
impugnantes (doc. de fls. 579), não foi deduzida impugnação;
18) De acordo com a acta de fls. 602, em 12 de Outubro
de 2006, reuniu, na sede nacional, a Comissão Nacional de Jurisdição do Partido
Socialista, na presença dos dez membros que assinaram a lista de presenças de
fls. 603, que aprovaram por unanimidade o projecto de acórdão do relator, no
sentido da aplicação, aos ora impugnantes, da pena de expulsão do Partido
Socialista;
19) Através de cartas simples, datadas de 13 de Outubro
de 2006, o Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição notificou os ora
impugnantes do teor dos acórdãos proferidos, remetendo, em anexo, cópias dos
acórdãos sem conterem as assinaturas dos membros que os subscreveram (docs. de
fls. 19 a 24 deste processo e de fls. 19 a 22 do processo apenso n.º 915/06‑A);
29) Por cartas registadas, com aviso de recepção,
expedidas em 31 de Outubro de 2006, o Presidente da Comissão Nacional de
Jurisdição notificou os ora impugnantes do teor dos acórdãos, remetendo cópias
dos mesmos, contendo as assinaturas dos dez membros dessa Comissão que os
subscreveram (docs. de fls. 604 a 607);
30) O acórdão relativo ao primeiro impugnante é do
seguinte teor:
“A Comissão de Jurisdição da Federação de Braga do PS remeteu à
Comissão Nacional de Jurisdição as participações apresentadas pelo Camarada Nuno
André Araújo dos Santos Sá (fls. 3), militante n.º 48 518, inscrito na Secção de
Vila Nova de Famalicão, pela Comissão de Gestão Administrativa da Secção de Vila
Nova de Famalicão (fls. 22), pelo Presidente da Federação de Braga do Partido
Socialista, Joaquim Barreto (fls. 31) e pelo Secretário Coordenador da Secção de
Residência de Ribeirão da Concelhia de Vila Nova de Famalicão (fls. 309), contra
o militante n.º 30 275, Fernando José Costa Salgado, inscrito na Secção de Vila
Nova de Famalicão e membro da Comissão Política Distrital de Braga do Partido
Socialista.
Além das participações, foram juntos aos autos um conjunto de
documentos (fls. 1 e ss.), concretamente recortes de jornais e um
abaixo‑assinado contendo centenas de assinaturas (fls. 310).
ENQUADRAMENTO FACTUAL:
Das participações apresentadas resulta que os factos imputados
àquele militante relacionam‑se com as eleições para a Comissão Política
Concelhia de Vila Nova de Famalicão, marcadas pelo Secretariado da Federação de
Braga para o dia 17 de Dezembro de 2005, através de deliberação de 11 de
Novembro de 2005 (fls. 55 e 56).
Ao acto eleitoral apresentaram‑se duas listas identificadas pelas
letras A e B, sendo que a lista A era encabeçada pelo militante Fernando José
Costa Salgado e a lista B pelo militante Nuno André Araújo dos Santos Sá.
Após a apresentação das candidaturas, e porque surgiram dúvidas
relativas à interpretação do n.º 4 do artigo 116.º dos Estatutos do Partido
Socialista, o Secretariado da Federação de Braga deliberou adiar o acto
eleitoral para o dia 18 de Fevereiro de 2006, por forma a permitir que a
Comissão Nacional de Jurisdição emitisse parecer interpretativo daquele
preceito.
Em consequência desta deliberação, e após parecer interpretativo
emitido pela CNJ, o acto eleitoral realizou‑se no referido dia 18 de Fevereiro
de 2006, sendo certo que ao mesmo foi admitida apenas a lista B, uma vez que a
lista A, por não respeitar o disposto no n.º 4 do artigo 116.º, foi excluída do
acto eleitoral.
As participações apresentadas denunciam a prática pelo arguido de um
conjunto de actos que atentam contra o bom nome, credibilidade, honorabilidade
e imagem pública do Partido Socialista, susceptíveis de constituírem falta
grave, o que o faz incorrer em infracção disciplinar, por violação dos deveres
impostos pelos Estatutos do Partido Socialista, nomeadamente o artigo 15.º, n.º
1, alínea c), artigo 56.º, n.º 5, alínea g), e artigo 94.º, n.º 4.
Foram recolhidos os depoimentos e testemunhos de fls. 328, 329, 330,
332 e 333.
Notificado para prestar declarações (fls. 335), o militante arguido,
através da sua declaração de fls. 336, alegou que «não responde enquanto não
for convencido que as suas declarações podem ser ouvidas pelo camarada António
Reis bem como a condução do processo possa por si ser continuada», requerendo
que seja exibido «mandato bastante conferido ao camarada António Reis para
continuidade das diligências», posição esta que manteve, pese embora ter‑lhe
sido exibido ofício emanado pelo Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição
que nomeia o camarada António Reis como instrutor/relator do processo, conforme
se refere no documento de fls. 337 dos autos.
Em 18 de Julho de 2006, foi o militante arguido notificado da nota
de culpa (fls. 341), fixando‑se prazo de 10 dias para a resposta à mesma,
assegurando‑se assim as garantias de defesa previstas no artigo 99.° dos
Estatutos do Partido Socialista.
Pese embora esta notificação, o arguido não quis exercer o seu
direito de defesa, limitando‑se, no terminus do prazo, a deduzir incidente de
suspeição contra o instrutor (fls. 344), o qual foi enviado e decidido
(indeferido) pelo Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição e corre por
apenso aos presentes autos, sendo certo que, nos termos do disposto nos termos
do artigo 132.º do CPC, aqui aplicado por analogia, apesar da arguição de
suspeição, a causa principal segue os seus termos, como certo é que, desde a
data da arguição da suspeição até à decisão da mesma, não foram efectuadas
nenhumas diligências processuais.
Dos autos resultaram os seguintes
FACTOS PROVADOS:
1. Fernando José Costa Salgado, militante do Partido Socialista n.º
30 275, inscrito na Secção de Vila Nova de Famalicão, no dia 16 de Fevereiro de
2005, na sede concelhia do Partido Socialista de Vila Nova de Famalicão,
juntamente com outros, interrompeu uma conferência de imprensa que na altura
decorria, patrocinada pelo camarada Nuno André Araújo dos Santos Sá, no âmbito
das eleições para a Comissão Política concelhia desta Secção.
2. A interrupção daquela conferência de imprensa foi acompanhada
com ditos do género de «testa de ferro da Federação» e «palhaço», dirigidos
àquele camarada Nuno Sá, sendo que, na altura dos factos, se encontravam
presentes vários jornalistas, quer da imprensa escrita, quer da falada.
3. Os factos descritos foram amplamente divulgados pela comunicação
social, nomeadamente, nos jornais Cidade Hoje, de 22 de Dezembro de 2005, e
Diário do Minho, de 17 de Dezembro de 2005, bem como através das rádios locais e
regionais (fls. 1 e ss.).
4. Para além destes factos, o militante Fernando Salgado,
desafiando a deliberação do Secretariado da Federação de Braga do Partido
Socialista, que havia adiado as eleições para a Comissão Política de Vila Nova
de Famalicão do dia 17 de Dezembro de 2005 para 18 de Fevereiro de 2006,
juntamente com outros militantes, nomeadamente, Manuel Joaquim Duarte Santos,
militante n.º 17 335, organizou um simulacro de acto eleitoral, naquele dia 17
de Dezembro.
5. Para tanto, instalaram uma roullote em frente à sede concelhia do
Partido Socialista, onde se dirigiam pessoas, supostamente militantes
socialistas, para «votar».
6. A «votação» decorreu no período compreendido entre as 10 e as 18
horas.
7. A realização deste simulacro eleitoral, no dia 17 de Dezembro,
conforme resulta do processo, foi amplamente divulgada nos meios de
comunicação social, nomeadamente nos jornais Jornal de Notícias, de 18 de
Dezembro, Cidade Hoje, de 22 de Dezembro, Expresso, de 23 de Dezembro, e Povo
Famalicense, edição n.º 310, bem como nas rádios locais e regionais, sendo que
as notícias reflectem, não só o estado de divisão existente no seio da Secção,
como também expressam a vergonha e indignação manifestada por alguns
entrevistados, supostamente militantes do Partido Socialista, para além de pôr
em causa a imagem e bom nome do Partido Socialista.
8. Esses mesmos órgãos de comunicação social fazem eco de
declarações de Fernando Salgado, bem como da carta que este dirigiu ao
Presidente da Federação de Braga do Partido Socialista, acusando a Federação de
parcialidade em relação ao acto eleitoral e pedindo a demissão deste por
«ilegalmente ter desmarcado» as eleições previstas para o dia 17 de Dezembro.
9. Aliás, essa carta (fls. 32), que tem o timbre do Partido
Socialista, Secção de Vila Nova de Famalicão, é assinada pelo arguido
militante Fernando Salgado, que aí se arroga como Presidente da Comissão
Política eleita em 17 de Dezembro de 2005, em clara usurpação de poderes.
10. O referido simulacro de acto eleitoral, da responsabilidade,
entre outros, do militante Fernando Salgado, constitui um desrespeito pela
deliberação tomada por unanimidade pelo Secretariado da Federação de Braga, no
sentido de adiar as eleições por razões que se prendiam com a interpretação do
n.º 4 do artigo 116.º dos Estatutos do PS.
11. O militante Fernando Salgado havia sido informado da
deliberação do adiamento das eleições do dia 17 de Dezembro de 2005 para o dia
18 de Fevereiro de 2006, adiamento esse que motivou as declarações por si
prestadas, aquando da interrupção da conferência de imprensa atrás referida, de
que «...a lista A vai até ao fim, as eleições não foram desconvocadas. Não é um
qualquer edital colocado ali na porta que vai impedir as eleições em Famalicão.
Não é o Joaquim Barreto e a sua pandilha que vão impedir as eleições em
Famalicão».
DO DIREITO:
Nos termos do artigo 56.º, n.º 5, alínea g), dos Estatutos do Partido
Socialista, é ao Secretariado da Federação que compete organizar o processo
eleitoral das Comissões Politicas concelhias.
Por sua vez, e nos termos do disposto no artigo 15.º, n.º 1, alínea c), dos
Estatutos do PS, é dever dos militantes respeitar, cumprir e fazer cumprir os
estatutos e os regulamentos, bem como as decisões dos órgãos do partido, como é
seu dever, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, respeitar o nome e dignidade do
Partido Socialista.
De acordo com o n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar do Partido
Socialista, «constitui infracção disciplinar a violação dos deveres impostos
pelos Estatutos do Partido e seus Regulamentos».
Por outro lado, dispõe o n.º 2 do mesmo artigo que «constitui, nomeadamente,
falta grave o desrespeito aos princípios programáticos e à linha política do
Partido, a inobservância dos Estatutos e Regulamentos e das decisões dos seus
órgãos, a violação de compromissos assumidos e, em geral, a conduta que acarrete
sério prejuízo ao prestígio e ao bom nome do Partido».
Da matéria de facto provada nos autos resulta que o arguido ao actuar da forma
como actuou, em claro e frontal desafio às deliberações assumidas pelo
Secretariado da Federação Distrital de Braga,
ao expor o Partido ao ridículo de um simulacro eleitoral, amplamente divulgado
nos meios de comunicação social locais e nacionais;
ao arrogar‑se titular de um cargo para o qual não foi eleito, usando o timbre do
Partido Socialista para o efeito;
ao usar junto da opinião publica, através dos órgãos de comunicação social,
expressões insultuosas contra outros militantes do Partido, tais como «testa de
ferro da Federação» e «palhaço»;
ao fazer insinuações graves contra o Presidente da Federação, nomeadamente
acusando‑o de ter tido uma actuação parcial em favor de uma das listas no
processo eleitoral para a Comissão Política Concelhia,
e ao propalar que o adiamento das eleições era para «evitar a estrondosa derrota
da sua protegida»,
o militante Fernando José Costa Salgado cometeu infracção disciplinar grave,
nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar do Partido, por
violação dos deveres a que se reporta o estatuído no artigo 15.º, n.º 1, alínea
c), e n.º 2, e artigo 56.º, n.º 5, alínea g), dos Estatutos do Partido, sendo
que a sua conduta é agravada nos termos das alíneas b), e) e f) do n.º 1 do
artigo 18.º daquele Regulamento Disciplinar, já que a infracção foi praticada em
conjunto com outros, teve grande repercussão pública, causando mau ambiente para
o Partido e o infractor é dirigente distrital do PS.
A repercussão pública dos factos praticados pelo militante Fernando Salgado é
comprovada pelo conjunto de notícias divulgado nos órgãos de comunicação social,
conforme documentos juntos aos autos.
Por sua vez, o mau ambiente no partido é comprovado pelo abaixo‑assinado que
constitui o documento de fls. 310 dos autos, e no qual algumas centenas de
militantes «manifestam a sua indignação pelos actos vergonhosos praticados
pelos responsáveis da Lista A» de que o militante Fernando Salgado era o
primeiro candidato, afirmando ainda que «Vila Nova de Famalicão não pode
continuar a ser palco de espectáculo de indisciplina e o Partido local não pode
estar sujeito a actos de perturbação que enxovalham o seu prestígio, a sua
história e os seus militantes e simpatizantes».
DECISÃO:
Assim, e porque as infracções cometidas não poderão deixar de ser qualificadas
como de graves, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento
Disciplinar do Partido Socialista, ao militante Fernando José Costa Salgado é
aplicada, pela Comissão Nacional de Jurisdição, nos termos do disposto no n.º 1
do artigo 15.º daquele Regulamento Disciplinar, bem como no n.º 4 do artigo 94.º
dos Estatutos, a pena de expulsão do Partido Socialista.”
31) O acórdão relativo ao segundo impugnante é do
seguinte teor:
“A Comissão de Jurisdição da Federação de Braga do PS remeteu à
Comissão Nacional de Jurisdição as participações apresentadas pelo Camarada Nuno
André Araújo dos Santos Sá (fls. 3), militante n.º 48 518, inscrito na Secção de
Vila Nova de Famalicão, pela Comissão de Gestão Administrativa da Secção de Vila
Nova de Famalicão (fls. 22), contra o militante n.º 17 335, Manuel Joaquim
Duarte dos Santos, inscrito na Secção de Vila Nova de Famalicão e membro da
Comissão Política Distrital de Braga do Partido Socialista.
Além das participações, foram juntos aos autos um conjunto de
documentos (fls. 1 e ss.), concretamente recortes de jornais e um
abaixo‑assinado contendo centenas de assinaturas (fls. 310).
ENQUADRAMENTO FACTUAL:
Das participações apresentadas resulta que os factos imputados
àquele militante relacionam‑se com as eleições para a Comissão Política
Concelhia de Vila Nova de Famalicão, marcadas pelo Secretariado da Federação de
Braga para o dia 17 de Dezembro de 2005, através de deliberação de 11 de
Novembro de 2005 (fls. 55 e 56).
Ao acto eleitoral apresentaram‑se duas listas identificadas pelas
letras A e B, sendo que a lista A era encabeçada pelo militante Fernando José
Costa Salgado, da qual o arguido fazia parte como n.º 3, e a lista B pelo
militante Nuno André Araújo dos Santos Sá.
Após a apresentação das candidaturas, e porque surgiram dúvidas
relativas à interpretação do n.º 4 do artigo 116.º dos Estatutos do Partido
Socialista, o Secretariado da Federação de Braga deliberou adiar o acto
eleitoral para o dia 18 de Fevereiro de 2006, por forma a permitir que a
Comissão Nacional de Jurisdição emitisse parecer interpretativo daquele
preceito.
Em consequência desta deliberação, e após parecer interpretativo
emitido pela CNJ, o acto eleitoral realizou‑se no referido dia 18 de Fevereiro
de 2006, sendo certo que ao mesmo foi admitida apenas a lista B, uma vez que a
lista A, por não respeitar o disposto no n.º 4 do artigo 116.º, foi excluída do
acto eleitoral.
As participações apresentadas denunciam a prática pelo arguido de um
conjunto de actos que atentam contra o bom nome, credibilidade, honorabilidade
e imagem pública do Partido Socialista, susceptíveis de constituírem falta
grave, o que o faz incorrer em infracção disciplinar, por violação dos deveres
impostos pelos Estatutos do Partido Socialista, nomeadamente o artigo 15.º, n.º
1, alínea c), artigo 56.º, n.º 5, alínea g), e artigo 94.º, n.º 4.
Foram recolhidos os depoimentos e testemunhos de fls. 328, 329, 330,
332 e 333.
Notificado para prestar declarações (fls. 334), por carta registada
com aviso de recepção, o militante arguido não recebeu a respectiva notificação,
uma vez que devolveu ou recusou a mesma, conforme decorre dos documentos de fls.
338.
Em 18 de Julho de 2006, foi o militante arguido notificado da nota
de culpa (fls. 339 e ss.), fixando‑se prazo de 10 dias para a resposta à mesma,
assegurando‑se assim as garantias de defesa previstas no artigo 99.° dos
Estatutos do Partido Socialista.
Pese embora esta notificação, o arguido não quis exercer o seu
direito de defesa, limitando‑se, no terminus do prazo, a deduzir incidente de
suspeição contra o instrutor (fls. 346), o qual foi enviado e decidido
(indeferido) pelo Presidente da Comissão Nacional de Jurisdição e corre por
apenso aos presentes autos, sendo certo que, nos termos do disposto nos termos
do artigo 132.º do CPC, aqui aplicado por analogia, apesar da arguição de
suspeição, a causa principal segue os seus termos, como certo é que, desde a
data da arguição da suspeição até à decisão da mesma, não foram efectuadas
nenhumas diligências processuais.
Dos autos resultaram os seguintes
FACTOS PROVADOS:
1. Manuel Joaquim Duarte dos Santos, militante do Partido Socialista
n.º 17 335, inscrito na Secção de Vila Nova de Famalicão, no dia 16 de
Fevereiro de 2005, na sede concelhia do Partido Socialista de Vila Nova de
Famalicão, juntamente com outros, interrompeu uma conferência de imprensa que
na altura decorria, patrocinada pelo camarada Nuno André Araújo dos Santos Sá,
no âmbito das eleições para a Comissão Politica Concelhia desta Secção.
2. A interrupção daquela conferência de imprensa foi acompanhada
com ditos do género de «testa de ferro da Federação» e «palhaço», dirigidos
àquele camarada Nuno Sá, acompanhados de acusações contra o Presidente da
Federação de Braga do Partido Socialista, que acusava de ter instalado uma
«ditadura» e de ser o responsável pela não existência de eleições na concelhia
de Vila Nova de Famalicão.
3. Os factos descritos foram amplamente divulgados pela comunicação
social, nomeadamente, nos jornais Cidade Hoje, de 2 de Dezembro de 2005, e
Diário do Minho, de 17 de Dezembro de 2005, bem como através das rádios locais e
regionais (fls. 1 e ss.).
4. Para além destes factos, o militante Duarte Santos, desafiando a
deliberação do Secretariado da Federação de Braga do Partido Socialista, que
havia adiado as eleições para a Comissão Politica de Vila Nova de Famalicão do
dia 17 de Dezembro de 2005 para 18 de Fevereiro de 2006, juntamente com outros
militantes, nomeadamente, Fernando Salgado, militante n.º 30 275, organizou um
simulacro de acto eleitoral, naquele dia 17 de Dezembro.
5. Para tanto, instalaram uma roullote em frente à sede concelhia do
Partido Socialista, onde se dirigiam pessoas, supostamente militantes
socialistas, para «votar».
6. A «votação» decorreu no período compreendido entre as 10 e as 18
horas.
7. A realização deste simulacro eleitoral, no dia 17 de Dezembro,
conforme resulta do processo, foi amplamente divulgada nos meios de
comunicação social, nomeadamente, nos jornais Jornal de Notícias, de 18 de
Dezembro, Cidade Hoje, de 22 de Dezembro, Expresso, de 23 de Dezembro, e Povo
Famalicense, edição n.º 310, bem como nas rádios locais e regionais, sendo que
as notícias reflectem, não só o estado de divisão existente no seio da Secção,
como também expressam a vergonha e indignação manifestada por alguns
entrevistados, supostamente militantes do Partido Socialista, para além de pôr
em causa a imagem e bom nome do Partido Socialista.
8. O referido simulacro de acto eleitoral, de que o militante Duarte
Santos foi co‑responsável, constitui um desrespeito pela deliberação tomada
por unanimidade pelo Secretariado da Federação de Braga, no sentido de adiar as
eleições por razões que se prendiam com a interpretação do n.º 4 do artigo 116.º
dos Estatutos do PS.
9. O militante Duarte Santos sabia da deliberação do adiamento das
eleições do dia 17 de Dezembro de 2005 para o dia 18 de Fevereiro de 2006.
DO DIREITO:
Nos termos do artigo 56.º, n.º 5, alínea g), dos Estatutos do Partido
Socialista, é ao Secretariado da Federação que compete organizar o processo
eleitoral das Comissões Politicas concelhias.
Por sua vez, e nos termos do disposto no artigo 15.º, n.º 1, alínea c), dos
Estatutos do PS, é dever dos militantes respeitar, cumprir e fazer cumprir os
estatutos e os regulamentos, bem como as decisões dos órgãos do partido, como é
seu dever, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, respeitar o nome e dignidade do
Partido Socialista.
De acordo com o n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar do Partido
Socialista, «constitui infracção disciplinar a violação dos deveres impostos
pelos Estatutos do Partido e seus Regulamentos».
Por outro lado, dispõe o n.º 2 do mesmo artigo que «constitui, nomeadamente,
falta grave o desrespeito aos princípios programáticos e à linha política do
Partido, a inobservância dos Estatutos e Regulamentos e das decisões dos seus
órgãos, a violação de compromissos assumidos e, em geral, a conduta que acarrete
sério prejuízo ao prestígio e ao bom nome do Partido».
Da matéria de facto provada nos autos resulta que o arguido ao actuar da forma
como actuou, em claro e frontal desafio às deliberações assumidas pelo
Secretariado da Federação Distrital de Braga,
ao expor o Partido ao ridículo de um simulacro eleitoral, amplamente divulgado
nos meios de comunicação social locais e nacionais;
ao usar junto da opinião publica, através dos órgãos de comunicação social,
expressões insultuosas contra outros militantes do Partido, tais como «testa de
ferro da Federação» e «palhaço», ridicularizando esses militantes,
ao acusar, publicamente, o Presidente da Federação de Braga do Partido
Socialista de ter instalado uma «ditadura» para evitar as eleições no PS de
Famalicão, o que constitui uma insinuação grave,
o militante Manuel Joaquim Duarte dos Santos cometeu infracção disciplinar
grave, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento Disciplinar do Partido,
por violação dos deveres a que se reporta o estatuído no artigo 15.º, n.º 1,
alínea c), e n.º 2, e artigo 56.º, n.º 5, alínea g), dos Estatutos do Partido,
sendo que a sua conduta é agravada nos termos das alíneas b), e) e f) do n.º 1
do artigo 18.º daquele Regulamento Disciplinar, já que a infracção foi praticada
em conjunto com outros, teve grande repercussão pública, causando mau ambiente
para o Partido e o infractor é dirigente distrital do PS.
A repercussão pública dos factos praticados pelo militante Duarte Santos é
comprovada pelo conjunto de notícias divulgado nos órgãos de comunicação
social, conforme documentos juntos aos autos.
Por sua vez, o mau ambiente no partido é comprovado pelo abaixo‑assinado que
constitui o documento de fls. 310 dos autos, e no qual algumas centenas de
militantes «manifestam a sua indignação pelos actos vergonhosos praticados
pelos responsáveis da Lista A» de que o militante Fernando Salgado era o
primeiro candidato, afirmando ainda que «Vila Nova de Famalicão não pode
continuar a ser palco de espectáculo de indisciplina e o Partido local não pode
estar sujeito a actos de perturbação que enxovalham o seu prestígio, a sua
história e os seus militantes e simpatizantes».
DECISÃO:
Assim, e porque as infracções cometidas não poderão deixar de ser qualificadas
como de graves, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento
Disciplinar do Partido Socialista, ao militante Manuel Joaquim Duarte dos Santos
é aplicada, pela Comissão Nacional de Jurisdição, nos termos do disposto no n.º
1 do artigo 15.º daquele Regulamento Disciplinar, bem como no n.º 4 do artigo
94.º dos Estatutos, a pena de expulsão do Partido Socialista.”
2.2. Como se recordou no recente Acórdão n.º 258/2008,
desta 2.ª Secção, a competência do Tribunal Constitucional para julgar as acções
de impugnação de deliberações (designadamente punitivas) de órgãos de partidos
políticos foi introduzida na revisão constitucional de 1997, que aditou a
alínea h) do n.º 2 do artigo 223.º (“2. Compete ao Tribunal Constitucional: (…)
h) Julgar as acções de impugnação de eleições e deliberações de órgãos de
partidos políticos que, nos termos da lei, sejam recorríveis”) e o n.º 5 do
artigo 51.º (“5. Os partidos políticos devem reger‑se pelos princípios da
transparência, da organização e da gestão democráticas e da participação de
todos os seus membros”), na sequência do que o artigo 103.º‑D da Lei do Tribunal
Constitucional, aditado pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro, veio estatuir
que “qualquer militante de um partido político pode impugnar, com fundamento em
ilegalidade ou violação de regra estatutária, as decisões punitivas dos
respectivos órgãos partidários, tomadas em processo disciplinar em que seja
arguido, e, bem assim, as deliberações dos mesmos órgãos que afectem directa e
pessoalmente os seus direitos de participação nas actividades do partido”.
Os fundamentos em que se pode basear a impugnação da
decisão punitiva são, assim, a violação de regra estatutária e a ilegalidade.
Actualmente, a única norma legal especialmente dedicada à disciplina interna
dos partidos políticos é a constante do artigo 22.º da Lei Orgânica n.º 2/2003,
de 22 de Agosto, alterada pela Lei Orgânica n.º 2/2008, de 14 de Maio
(correspondente, sem alterações, ao artigo 23.º da redacção originária), que se
limita a determinar, no n.º 1, que essa disciplina interna “não pode afectar o
exercício de direitos e o cumprimento de deveres prescritos na Constituição e na
lei”, e, no n.º 2, que “compete aos órgãos próprios de cada partido a aplicação
das sanções disciplinares, sempre com garantias de audiência e defesa e
possibilidade de reclamação ou recurso”.
No entanto, o Acórdão n.º 185/2003 já salientou que “no
«bloco de legalidade» a que estão sujeitas as deliberações punitivas dos
partidos se devem integrar, por força da sua aplicação directa, os comandos
constitucionais pertinentes, em matéria de direitos, liberdades e garantias – em
particular, as garantias de audiência e defesa aplicáveis, nos termos do artigo
32.º, n.º 10, da Constituição, «em quaisquer processos sancionatórios»”.
2.3. Entrando na apreciação dos vícios imputados pelos
impugnantes às deliberações questionadas, atendendo não apenas aos fundamentos
expostos nas primeiras petições mas também àqueles que, na sequência da
repetição das notificações dos acórdãos sancionatórios, foram desenvolvidos nas
adendas a esses requerimentos iniciais, cumpre, desde já, assinalar que se
consideram supridas as irregularidades das primeiras notificações, expedidas em
13 de Outubro de 2006 através de correio normal (não registado), e inserindo
acórdãos não assinados pelos membros da Comissão Nacional de Jurisdição do PS
(CNJ/PS).
Na verdade, posteriormente, por cartas registadas com
aviso de recepção, expedidas em 31 de Outubro de 2006, foram os impugnantes
notificados dos acórdãos sancionatórios, contendo as assinaturas dos membros da
CNJ/PS que os subscreveram, e bem assim de cópias da acta da reunião dessa
Comissão onde tais deliberações foram tomadas.
Os impugnantes, na adenda às petições iniciais, não
questionam a validade formal destas segundas notificações, pelo que as
irregularidades inicialmente cometidas são de considerar sanadas.
2.4. A designação do instrutor dos processos
disciplinares, feita por despacho do Presidente da CNJ/PS, não se mostra
violadora das regras do artigo 23.º do Regulamento Disciplinar do Partido
Socialista (RD/PS), pois resulta do seu n.º 1 que só “na falta de acordo” é que
há lugar à distribuição “por escala”, ao que acresce que nada aduzem os
impugnantes visando demonstrar o hipotético desrespeito da ordem da escala de
distribuição.
Por outro lado, não resulta do artigo 81.º, n.º 1,
alínea d), dos Estatutos do PS – que atribui à CNJ/PS competência para “instruir
e julgar os processos disciplinares em que sejam arguidos membros dos órgãos
nacionais ou das federações do Partido” – qualquer impedimento a que seja
designado como instrutor de processo disciplinar um membro da CNJ/PS que seja
membro da mesma Federação Distrital a que pertencem os arguidos.
2.5. Como se referiu, os arguidos não impugnaram,
designadamente através de reclamação para o CNJ/PS, o despacho do respectivo
Presidente que julgou improcedentes os incidentes de arguição suscitados.
De qualquer forma, nunca competiria ao Tribunal
Constitucional, atentos os fundamentos admissíveis da acção prevista na primeira
parte do n.º 1 do artigo 103.º‑D da LTC, reapreciar o mérito dessa decisão,
essencialmente assente em juízos de facto (não se deu por provada a existência
de inimizade do instrutor relativamente aos arguidos e considerou‑se que a
alegada amizade entre o mesmo instrutor e o Presidente da Federação Distrital de
Braga do Partido Socialista não era fundamento de suspeição por os requerentes
não terem alegado quaisquer factos concretos que criassem o receio de
parcialidade do instrutor).
2.6. A fixação em 10 dias do prazo para a resposta à
nota de culpa respeita o quadro estabelecido no artigo 34.º, n.º 1, do RD/PS,
que atribui ao instrutor competência ara fixar esse prazo entre o mínimo de 8 e
o máximo de 30 dias, e sendo certo que, no presente caso, os factos imputados
aos arguidos (essencialmente dois: interrupção da conferência de imprensa da
outra lista e realização da “votação” nos termos descritos) eram bem delimitados
e a sua imputação já era dos mesmos conhecida desde a data dos incidentes.
2.7. Nas adendas às petições iniciais suscitaram os
impugnantes novo vício, por alegada violação do princípio do acusatório,
consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, por o instrutor dos processos
disciplinares ter participado, na condição de relator, na reunião da CNJ/PS que
deliberou a aplicação das sanções disciplinares. Uma vez que a completa
percepção dos factos em que se baseia esta arguição só terá ocorrido após a
repetição das notificações dos acórdãos sancionatórios, com cópia da acta,
considera‑se ainda oportuna a suscitação deste vício nas aludidas adendas à
petição inicial.
No entanto, nem os Estatutos nem o Regulamento
Disciplinar do Partido Socialista integram qualquer disposição que impeça o
membro do CNJ/PS que foi designado como instrutor de processo disciplinar que
esse órgão deva julgar de participar na deliberação final do processo. O artigo
81.º, n.º 1, alínea d), dos Estatutos, reproduzido no artigo 3.º, n.º 1, alínea
d), do RD/PS, cometem à CNJ/PS o encargo de “instruir e julgar” os processos
disciplinares em que sejam arguidos membros dos órgãos nacionais ou das
federações do PS, sendo óbvio que a função de instrução, por razões de
praticabilidade, há‑de ser atribuída a um membro individual desse órgão, que,
porém, por essa circunstância, não fica impedido de participar na decisão final
do processo.
Esta solução não padece de qualquer
inconstitucionalidade, não sendo atendível a tese dos impugnantes que, com
apoio no n.º 10 do artigo 32.º da CRP, pretendem estender à generalidade dos
processos sancionatórios (e, em especial, aos processos disciplinares) o
princípio do acusatório que o n.º 5 do mesmo preceito consagra especificamente
para o processo criminal.
Como se demonstrou no Acórdão n.º 659/2006:
“Com a introdução dessa norma constitucional [n.º 10 do artigo 32.º]
(efectuada, pela revisão constitucional de 1989, quanto aos processos de
contra‑ordenação, e alargada, pela revisão de 1997, a quaisquer processos
sancionatórios) o que se pretendeu foi assegurar, nesses tipos de processos, os
direitos de audiência e de defesa do arguido, direitos estes que, na versão
originária da Constituição, apenas estavam expressamente assegurados aos
arguidos em processos disciplinares no âmbito da função pública (artigo 270.º,
n.º 3, correspondente ao actual artigo 269.º, n.º 3). Tal norma implica tão‑só
ser inconstitucional a aplicação de qualquer tipo de sanção,
contra‑ordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer
outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa
defender‑se das imputações que lhe são feitas (direito de defesa),
apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a
apurar a verdade (cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa
Anotada, tomo I, Coimbra, 2005, p. 363). É esse o limitado alcance da norma do
n.º 10 do artigo 32.º da CRP, tendo sido rejeitada, no âmbito da revisão
constitucional de 1997, uma proposta no sentido de se consagrar o asseguramento
ao arguido, “nos processos disciplinares e demais processos sancionatórios”, de
“todas as garantias do processo criminal” (artigo 32.º‑B do Projecto de Revisão
Constitucional n.º 4/VII, do PCP; cf. o correspondente debate no Diário da
Assembleia da República, II Série‑RC, n.º 20, de 12 de Setembro de 1996, pp.
541‑544, e I Série, n.º 95, de 17 de Julho de 1997, pp. 3412 e 3466).”
Este Tribunal já teve, aliás, oportunidade de
expressamente se pronunciar pela não inconstitucionalidade de normas do
Regulamento de Disciplina Militar de acordo com as quais o chefe que instruir o
processo disciplinar militar é competente para aplicar a respectiva sanção
(Acórdão n.º 33/2002).
No presente caso, cumpre igualmente concluir que não
fere qualquer regra estatutária, legal ou constitucional a possibilidade de o
membro do órgão colegial competente para instruir e julgar infracções
disciplinares partidárias, que foi designado como instrutor de determinado
processo, participar na respectiva decisão final.
2.8. Resta, assim, a questão do próprio mérito das
decisões sancionatórias.
Neste domínio, impõe‑se naturalmente ao Tribunal
Constitucional uma especial contenção, não lhe cabendo substituir por outros os
critérios sancionatórios que os órgãos partidários estatutariamente competentes
adoptaram, mas tão‑só sindicar a eventual violação de regras estatutárias ou
legais que atinja gravidade tal, na perspectiva dos direitos de defesa dos
filiados em partidos políticos, que imponha a anulação das correspondentes
deliberações punitivas, designadamente por ocorrência de erro grosseiro ou
manifesto.
Ora, no presente caso, face à factualidade apurada e à
fundamentação jurídica das deliberações impugnadas, dúvidas não existem – nem,
aliás, os impugnantes, em rigor, as questionam – de que as condutas que lhes são
imputadas constituíram, à luz das normas estatutárias, infracções disciplinares
e infracções disciplinares qualificadas de graves.
O cerne da crítica dos impugnantes dirige‑se, pois, ao
tipo da sanção aplicada – a mais grave das sanções disciplinares –, que se
revelaria especialmente desajustada face à ocorrência de uma “causa de
exculpação”, que consistiria na “provocação” traduzida na desmarcação e
adiamento ilícitos das eleições, motivada pelo propósito de favorecimento da
lista adversária da dos impugnantes, e que justificaria o exercício do “direito
de resistência”, constitucionalmente consagrado.
Acontece, porém, que não só não se provou esta motivação
do acto de adiamento das eleições, como a razão invocada para o efeito –
necessidade de consulta da CNJ/PS sobre interpretação da norma do n.º 4 do
artigo 116.º dos Estatutos do PS (que impõe a garantia, nas listas concorrentes
aos órgãos partidários, de uma representação não inferior a 33% de militantes de
qualquer dos sexos) – se veio a revelar fundamentada, pois o parecer emitido
confirmou o entendimento da comissão no sentido de que a lista em que os
impugnantes se integravam não respeitava essa regra e, consequentemente, não
podia ser admitida ao acto eleitoral em causa.
Não ocorrendo, assim, qualquer “causa de exculpação”, as
condutas adoptadas pelos arguidos e os efeitos, internos e externos, que tiveram
para o Partido Socialista, tal como foram expostos nas decisões punitivas, não
permitem concluir pela manifesta, flagrante ou intolerável desproporcionalidade
ou injustiça das sanções aplicadas, não competindo ao Tribunal Constitucional,
até porque dos autos não constam elementos nesse sentido, proceder a
comparações, em sede de justiça relativa, entre as sanções aplicadas aos
impugnantes e as aplicadas (ou não aplicadas) a outros filiados noutros
processos, por factos distintos.
Não se tendo apurado nenhuma das violações das regras
estatutárias ou legais invocadas pelos impugnantes, impõe‑se concluir pela
improcedência das presentes acções.
3. Decisão
Em face do exposto, acordam em julgar improcedentes as
presentes acções de impugnação.
Lisboa, 19 de Junho de 2008.
Mário José de Araújo Torres
Benjamim Silva Rodrigues
João Cura Mariano
Joaquim de Sousa Ribeiro
Rui Manuel Moura Ramos