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Processo n.º 577/08
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, A. reclama (fls. 2 a 5), ao abrigo do n.º 1 do artigo
77º da LTC, do despacho do Ex.mo Senhor Juiz de Instrução junto do Tribunal
Judicial de Mafra, proferido em 20 de Maio de 2008, que rejeitou o recurso de
inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional (fls. 12 a 14), interposto
ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea b), da CRP, e dos artigos 70º, n.º 1,
alínea b) da LTC, com fundamento na falta de suscitação adequada da questão de
inconstitucionalidade, por parte do próprio recorrente.
2. Em sede de vista, o Procurador-Geral-Adjunto neste Tribunal (fls. 19-verso e
20) pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação ora em apreço, nos
seguintes termos:
“A presente reclamação é, a nosso ver, claramente improcedente.
Na verdade, decorre expressamente do nº 2 do art. 72º da Lei nº 28/82 que – no
tipo recusório previsto na alínea b) do nº 1 do art. 70º - só tem legitimidade
para recorrer para este Tribunal Constitucional a “parte” que haja suscitado, de
forma tempestiva e adequada, a questão de inconstitucionalidade normativa que
pretende submeter a este Tribunal.
Esta norma – que nada tem a ver com a problemática da eventual extensão do
recurso aos restantes interessados, não recorrentes, regulada no art. 74º da
norma Lei – é plenamente aplicável, independentemente da natureza do
“processo-pretexto” em que se insere o recurso de fiscalização concreta,
valendo, deste modo, no âmbito do processo penal: o arguido - que é “parte” no
recurso de constitucionalidade, face ao preceituado no art. 69º da Lei nº 28/82,
que o molda segundo as regras dos recursos cíveis – só tem legitimidade para,
ele próprio, recorrer para o TC quando tiver decaído na questão de
constitucionalidade que suscitou, não podendo naturalmente fundar a sua
legitimidade para recorrer no decaimento ou vencimento do outro sujeito
processual, não recorrente.”
Cumpre agora apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. A decisão ora reclamada fundou-se quer na ilegitimidade processual do (então)
recorrente, por não ter suscitado previamente a questão de inconstitucionalidade
– antes pretendendo aproveitar de uma alegada suscitação de
inconstitucionalidade provocada por outro co-arguido –, quer na falta de
suscitação processualmente adequada desse outro co-arguido, no caso, B..
4. Em primeiro lugar, deve notar-se quanto ao pretendido aproveitamento de uma
pretensa suscitação de incidente de inconstitucionalidade por parte de outro
co-arguido, que o n.º 2 do artigo 72º da LTC exige que seja a própria parte
processual a suscitar a questão de inconstitucionalidade. Não tendo suscitado,
por si mesmo, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, não pode vir
agora o recorrente pretender recorrer de decisão proferida a pedido de outro
sujeito processual.
E nem se diga que os co-arguidos beneficiam de uma espécie de ficção de
unicidade processual, sendo assim configurados como uma só “parte”. Tal é
prontamente desmentido pela própria lei processual, em todas as fases da
tramitação processual, sendo desde logo ilustrado pela simples circunstância de
o n.º 1 do artigo 65º do CPP apenas permitir que os co-arguidos sejam
representados pelo mesmo defensor, “se isso não contrariar a função da defesa”.
A individualização dos co-arguidos enquanto partes processuais constitui, aliás,
uma garantia de defesa dos mesmos, na medida em que, não raras vezes, aqueles
são titulares de interesses contraditórios que urge acautelar.
A circunstância de o reclamante não poder recorrer para o Tribunal
Constitucional, por não ter suscitado qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa em requerimento subscrito pelo seu próprio defensor, nem tão pouco
limita as suas garantias de defesa. É que, em última instância,
independentemente da questão de saber se lhe aproveita o recurso interposto pelo
co-arguido, sempre se tratou de uma decisão estratégica sua.
5. Aliás, acrescente-se ainda que a alegada questão de inconstitucionalidade
invocada pelo co-arguido A. nem sequer coincide com a que pretensamente o ora
reclamante pretende invocar.
III – DECISÃO
Nestes termos, pelos fundamentos supra expostos e ao abrigo do disposto no n.º 3
do artigo 77º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada
pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente
reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do
artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 30 de Julho de 2008
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Gil Galvão