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Processo n.º 596/08
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de reclamação, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, A.
reclama para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76.º da Lei
da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do
despacho daquele Tribunal, de 29.05.2008, que não admitiu o recurso, por si
interposto, para o Tribunal Constitucional.
Para tanto, invoca o seguinte:
«[…] O despacho objecto da presente reclamação rejeitou o recurso interposto
pelo reclamante por considerar que não há lugar a “recurso para o Tribunal
Constitucional de decisões do relator, mas tão só de acórdãos”. E, mais adiante
pode ler-se no despacho reclamado que “ a decisão sumária não é um acórdão.”
Perante o conteúdo do despacho supra indicado proferido pelo Exmo. Senhor
Conselheiro Relator, há primeiramente que referir que não se compreende como
podem ser tão friamente violados os direitos de defesa do arguido, transgredindo
desta forma o dispostos no artigo 32.° n.° 1 da C.R.P. que assegura ao arguido
todos os direitos de defesa incluindo o direito ao recurso.
Porém, tem o reclamante de colocar esta questão — que como acima já se escreveu,
é respeitante à rejeição do recurso interposto — num patamar mais formal e até
mais específico.
Assim,
Foi o recurso rejeitado, nesta fase por entender o Exmo. Juiz Conselheiro
relator que “não há recurso para o Tribunal Constitucional de decisões do
Relator, mas tão-só de acórdãos. A decisão sumária não é um acórdão.”
Com tal entendimento não se conforma o ora Reclamante, como se passará a
demonstrar.
O arguido, ora reclamante interpôs recurso com base no disposto no artigo 70.°
n.° 1 al. f) da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.° 28/82, de 15 de
Novembro, com actual redacção da Lei n.° 13-A/98, de 26 de Fevereiro).
Mais se pode ler no artigo acima indicado, mais especificamente no n.° 2, que
contém a seguinte redacção:
“2. Os recursos previstos nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de
decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já
haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam, salvo os destinados a
uniformização de jurisprudência.”
Ora, depois de analisado o artigo que se referenciou supra, é límpido que cabe
recurso para o Tribunal Constitucional, na medida em que no caso em apreço já
haviam sido esgotadas todas as instâncias possíveis, como de resto é simples de
constatar aquando da observação pormenorizada do caso sub judice.
Deste normativo — e agora fazendo-se o raciocínio inverso — não é possível
extrair a conclusão de que não cabe recurso para o Tribunal Constitucional.
Desta forma, salvo melhor opinião e com todo o devido respeito, entende o
Recorrente que tal decisão se mostra prematura, na medida em que, decide, desde
logo, não tomar conhecimento do recurso por uma questão formal, sem sequer levar
em conta o artigo 70.º n.° 2 da Lei do Tribunal Constitucional e até a
jurisprudência que se pronunciou já no sentido na admissão do recurso nos casos
idênticos ao que ora se trata.
Na sequência, e para corroborar o acima indicado, passa-se a transcrever infra o
entendimento do Tribunal Constitucional no Acórdão de 20 de Dezembro de 2007 com
o proc, n.° 941/07, disponível in www.pgdlisboa.pt,
“É sabido que a Lei n.° 28/82 apenas impõe a prévia exaustão das vias de recurso
no âmbito dos recursos interpostos ao abrigo do disposto nas als. b) e f) do n.°
1 do artigo 70.° da Lei n.° 28/82, ou seja, interpostos de decisões que
aplicaram norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade foi suscitada durante
o processo; e que, diferentemente, abre recurso directo para o Tribunal
Constitucional de decisões não definitivas (ainda susceptíveis de recurso
ordinário) de recusa de aplicação de normas (...)”[…]»
2. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional emitiu
parecer, nos seguintes termos:
«A presente reclamação é manifestamente improcedente.
Na verdade, cumpria ao ora reclamante o ónus de esgotar os meios impugnatórios
ordinários existentes na lei processual – no caso, deduzindo a pertinente
reclamação para a conferência, provocando a formação de um acórdão em que se
apreciasse a admissibilidade do recurso interposto perante o STJ (n.º 3 do art.
70.º da Lei nº 28/82).
Não o tendo feito – e fundando o recurso de fiscalização concreta na al. b) do
n.º 1 daquele art. 70.º − é evidente a inverificação dos respectivos
pressupostos.»
3. Com relevância para a presente decisão resulta dos autos o seguinte:
− Por sentença da 6ª Vara Criminal do Tribunal Judicial de Lisboa, A. foi
condenado, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto no
artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de seis
anos de prisão.
− Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por
acórdão de 01.11.2007, negou provimento ao recurso, mantendo o decidido.
− Ainda inconformado, o arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que,
por decisão sumária de 08.05.2008, rejeitou o recurso interposto, com fundamento
na irrecorribilidade da decisão, em conformidade com o disposto no artigo 400.º,
n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal.
− Notificado desta decisão sumária, o arguido interpôs recurso para o Tribunal
Constitucional, com vista à «fiscalização concreta da constitucionalidade da
alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do Código de Processo Penal, na interpretação
que lhe foi dada pela decisão sumária recorrida do STJ, segundo a qual em
virtude da nova redacção da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP
introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, o arguido ora recorrente
perdeu o direito ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, direito esse que
lhe era conferido pela lei processual penal anterior (…) Tal interpretação é, no
entendimento do recorrente, inconstitucional por violação do n.º 4 do artigo
29.º e do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição».
− Por despacho de 29.05.2008, do Relator no Supremo Tribunal de Justiça, o
recurso não foi admitido com o seguinte fundamento: «não há recurso para o
Tribunal Constitucional de decisões do Relator, mas tão-só de acórdãos. A
decisão sumária não é um acórdão».
− É deste despacho que vem interposta a presente reclamação.
4. É manifesta a falta de razão do reclamante.
Na verdade, apesar de o reclamante não identificar expressamente qual a alínea
do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual pretende interpor o recurso de
constitucionalidade (limitando-se a invocar a sua legitimidade com base na
alínea b) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 72.º da LTC), o certo é que do teor do
respectivo requerimento, extrai-se que pretende a apreciação da
constitucionalidade da norma do artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do Código de
Processo Penal, na interpretação que lhe foi dada na decisão sumária do Supremo
Tribunal de Justiça, que o recorrente reputa inconstitucional.
Ou seja, o recurso que o reclamante pretende interpor para o Tribunal
Constitucional é o previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Ora, como se salienta no parecer do Ministério Público, cumpria ao reclamante,
de acordo com o previsto no n.º 2 do artigo 70.º da LTC, o ónus de esgotar os
meios impugnatórios ordinários existente na lei processual, no caso, deduzindo a
pertinente reclamação para a conferência, da decisão sumária do Relator no
Supremo Tribunal de Justiça (artigo 417.º, n.º 6 e 8 do CPP).
Não o tendo feito, não se mostram verificados os pressupostos do recurso de
fiscalização concreta da constitucionalidade.
5. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação do despacho que não admitiu o
recurso de constitucionalidade.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 31 de Julho de 2008
Joaquim de Sousa Ribeiro
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel de Moura Ramos