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Processo n.º 224/2008
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A., S. A. veio requerer a aclaração do acórdão de 29 de Julho de 2008, que
decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 284º, n.º 5, do Código de
Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), com base na seguinte ordem de
considerações:
1. A Recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional (cf. doc. n.° 1)
pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade de duas normas:
(i) da norma sobre a competência do Tribunal a quo em verificar da oposição de
acórdãos e, com base nessa apreciação em concreto, ser in casu o próprio
Tribunal Central Administrativo decidir do prosseguimento de recurso com
fundamento nessa oposição, conforme decorre do artigo 284°, n° 5 do CPPT
introduzido pelo Decreto-Lei n.° 433/99, de 26 de Outubro, com fundamento em
inconstitucionalidade orgânica, violação do princípio da proporcionalidade e do
direito à tutela jurisdicional efectiva, aplicada pelo TCA Sul na sua decisão de
22 de Janeiro de 2008; e
(ii) da norma do artigo 62°, n.° 1 do Código do Imposto sobre o Rendimento das
Pessoas Colectivas (“Código do IRC”), na versão vigente em 1996, na
interpretação segundo a qual a «a Administração Tributária encontra-se vinculada
a aplicar o regime da neutralidade fiscal quando (...) o contribuinte não opte
pelo regime normal de tributação», com fundamento na violação dos princípios da
igualdade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé consagrados no artigos 13°,
101° e 266°, n.° 2 da CRP, bem como, ao estabelecer-se uma presunção absoluta da
adopção de um regime de natureza especial pelo contribuinte, que desvirtua o
princípio da tributação pelo lucro real previsto no artigo 104°, n.° 2 da CRP,
conforme interpretado e aplicado pelo TCA Sul na sua decisão de 26 de Setembro
de 2006.
2. A Recorrente foi notificada em 29 de Fevereiro de 2008 pelo TCA Sul da
admissão do recurso intentado e da subida nos próprios autos ao Tribunal
Constitucional (cf. doc. n° 2).
3. Subsequentemente, a Recorrente foi notificada 31 de Março de 2008 para
alegações e do despacho proferido pelo Exm.° Juiz-Conselheiro Relator de que
«não deverá tomar-se conhecimento do recurso da decisão do TC4 Sul de 26 de
Setembro de 2006, por a questão de constitucionalidade que aí é considerada
[i.e., a interpretação da norma do artigo 62°, n.° 1 do Código do IRC subjacente
à decisão do TCA Sul poder ainda ser objecto da apreciação no recurso de
uniformização de jurisprudência, caso proceda o recurso de constitucionalidade
interposto da decisão do TCA Sul de 22 de Janeiro de 2008 [i.e., a questão de
constitucionalidade da norma do artigo 284° , n.° 5 do CPPT]» (cf. doc. n.° 3).
4. Assim, nos termos do despacho do Exm.° Juiz-Conselheiro Relator, das duas
normas cujo juízo de constitucionalidade era suscitado pela Recorrente, apenas
se tomaria conhecimento primeiro de uma delas (i.e., a questão de
constitucionalidade da norma do artigo 284.° , n.° 5 do CPPT decorrente a
decisão do TCA Sul de 22 de Janeiro de 2008), em virtude da sua eventual
procedência poder determinar que a outra questão de constitucionalidade poderia
ser ainda apreciada em sede de outro recurso.
5. Em conformidade com o despacho do Exm.° Juiz-Conselheiro Relator, quer a
Recorrente (f doc. n.° 4) como a Recorrida ( doc. nº 5) em sede de alegações
apenas aludiram à questão de constitucionalidade da norma do artigo 284°, n.° 5
do CPPT decorrente a decisão do TCA Sul de 22 de Janeiro de 2008.
6. No dia 31 de Julho de 2008, a Recorrente foi notificada do acórdão n.°
403/2008 proferido peio Tribunal Constitucional (cf. cit. doc. n.° 1) em que se
decidiu «não julgar inconstitucional a norma do artigo 284 n.° 5, do Código do
Procedimento e de Processo Tributário (CPPT,)» e «negar provimento ao recurso,
confirmando o juízo de constitucionalidade formulado na decisão recorrida» (ie.,
a decisão do TCA Sul de 22 de Janeiro de 2008).
7. Logo, em virtude da decisão proferida relativamente à questão da
constitucionalidade da norma sobre a competência do Tribunal a quo em verificar
da oposição de acórdãos (i.e., o artigo 284°, n.° 5 do CPP1) não poderá mais a
outra questão de constitucionalidade suscitada pela Recorrente (ie., a
interpretação da norma do artigo 62°, n.° 1 do Código do JRC subjacente à
decisão do TCA Sul de 26 de Setembro de 2006) no seu recurso «poder ainda ser
objecto da apreciação no recurso de uniformização de jurisprudência» (cf. doc.
n.° 3), conforme admitia no seu despacho o Exmº Juiz Conselheiro Relator.
8. Ora, em conformidade com a decisão do Tribunal Constitucional, afigura-se à
Recorrente que dever-se-á agora proceder à apreciação da outra questão da
constitucionalidade suscitada no seu recurso, a saber a da interpretação da
norma do artigo 62°, n.° 1 do Código do IRC subjacente à decisão do TCA Sul de
26 de Setembro de 2006.
Termos em que se requer a V. Exas. que se dignem aclarar a decisão proferida,
esclarecendo-se se irá conhecer da questão da constitucionalidade da
interpretação da norma do artigo 62.°, n.° 1 do Código do IRC nos presentes
autos de recurso, por se entender que o Tribunal não se pronunciou sobre questão
que deveria conhecer, ou, após baixa do processo ao TCA Sul, na sequência de
novo recurso de constitucionalidade a submeter oportunamente, com as devidas
consequências legais.
Não houve resposta da entidade recorrida.
Cabe apreciar e decidir.
2. Nos presentes autos de impugnação judicial, a ora reclamante havia interposto
recurso por oposição de julgados, para o Pleno da Secção de Contencioso
Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, da decisão proferida pelo
Tribunal Central Administrativo Sul em 4 de Julho de 2007.
Tendo o tribunal recorrido, por despacho do relator, julgado findo o recurso,
com invocação do disposto no artigo 284º, n.º 5, do Código de Procedimento e de
Processo Tributário (CPPT), por ter entendido que não se verificava a identidade
de situações de facto que constituía um dos necessários pressupostos do recurso,
a impugnante deduziu reclamação para a conferência, pedindo a final que fosse
proferido acórdão que reconheça a existência de oposição de julgados, com o
consequente prosseguimento para alegações, e, em alternativa, se declare
inconstitucional o n.° 5 do artigo 284.° do CPPT por permitir que seja o
Tribunal a quo a verificar a oposição de julgados, por violação do artigo 165°,
n.° 1, alínea p), da Constituição da República, por se ter alterado a
competência dos tribunais nesta matéria sem a necessária autorização
legislativa, e ainda por violação do princípio da proporcionalidade e da tutela
jurisdicional efectiva consagrada nos artigos 2.º e 20.° da mesma Lei
Fundamental.
Em conferência, pelo acórdão de 22 de Janeiro de 2008, o Tribunal Central
Administrativo Sul julgou improcedente a reclamação, aludindo apenas, na sua
fundamentação, à questão de constitucionalidade que havia sido suscitada e que
se reportava à citada norma do n.° 5 do artigo 284.° do CPPT.
A impugnante interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do
disposto no artigo 70°, n° 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional,
pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo 284°, n.°
5, do CPPT com fundamento em inconstitucionalidade orgânica e violação do
princípio da proporcionalidade e do direito à tutela jurisdicional efectiva, e
ainda a inconstitucionalidade da norma do artigo 62°, n.° 1, do Código do IRC,
na versão vigente em 1996, na interpretação segundo a qua «a Administração
Tributária encontra-se vinculada a aplicar o regime da neutralidade fiscal,
quando (...) o contribuinte não opte pelo regime normal de tributação».
Tendo sido analisado, no acórdão reclamado, em matéria de fundo, apenas a
questão de relativa à norma do artigo 284°, n.° 5, do CPPT, concluindo-se pela
não inconstitucionalidade do preceito, pretende agora a reclamante que o
Tribunal esclareça «se irá conhecer da questão da constitucionalidade da
interpretação da norma do artigo 62.°, n.° 1 do Código do IRC nos presentes
autos de recurso, por se entender que o Tribunal não se pronunciou sobre questão
que deveria conhecer, ou, após baixa do processo ao TCA Sul, na sequência de
novo recurso de constitucionalidade a submeter oportunamente».
Ora, o acórdão ora reclamado, na rubrica «Fundamentação», começa por proceder à
delimitação do objecto do recurso, dizendo o seguinte:
Na reclamação para a conferência do despacho do relator que julgou findo o
recurso por oposição de julgados, a recorrente limitou-se a suscitar a questão
da inconstitucionalidade do n.° 5 do artigo 284.° do CPPT, com fundamento em
violação do artigo 165°, n.° 1, alínea p), e ainda em violação dos princípios da
proporcionalidade e da tutela jurisdicional consagrados nos artigos 2.º e 20.°,
todos da Constituição da República.
No requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, a
recorrente afirmou que pretendia ver ainda apreciada a constitucionalidade da
norma do artigo 62°, n.° 1, do Código do IRC, na interpretação segundo a qual a
Administração Tributária se encontra vinculada a aplicar o regime da
neutralidade fiscal, quando o contribuinte não opte pelo regime normal de
tributação.
No entanto, essa segunda questão de constitucionalidade não foi objecto de
apreciação pelo tribunal recorrido, inexistindo quanto a ela os pressupostos de
admissibilidade do recurso a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da
LTC.
O objecto do recurso deve, pois, considerar-se circunscrito à disposição do n.°
5 do artigo 284.° do CPPT, que vem arguida de inconstitucionalidade orgânica e
de violação dos princípios da proporcionalidade e da tutela jurisdicional
efectiva.
Daí que tenha apenas apreciado, quanto ao mérito, a falada questão da
inconstitucionalidade da norma do n.° 5 do artigo 284.° do CPPT.
A decisão reclamada não sofre, por conseguinte, de qualquer obscuridade que
careça de ser esclarecida, nem incorreu em qualquer omissão de pronúncia, visto
que expressamente explicitou que não poderia pronunciar-se sobre a
constitucionalidade da norma do artigo 62°, n.° 1, do Código do IRC, por essa
questão não ter sido objecto de apreciação pelo tribunal recorrido, e inexistir
quanto a ela um dos pressupostos de admissibilidade do recurso a que se refere a
alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC.
Tendo o objecto do recurso ficado circunscrito à disposição do n.° 5 do artigo
284.° do CPPT, através de decisão expressa e fundamentada do Tribunal, não pode
subsistir qualquer dúvida quer quanto ao sentido da decisão proferida quer
quanto à existência de uma pronúncia sobre a segunda questão de
constitucionalidade que fora colocada no requerimento de interposição de
recurso.
3. Termos em que se decide indeferir o pedido de aclaração.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 22 de Outubro de 2008
Carlos Fernandes Cadilha
Maria Lúcia Amaral
Vítor Gomes
Gil Galvão