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Processo nº 42/08
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal de Pequena Instância Cível de Lisboa,
em que é reclamante A., Lda. e reclamada B., vem a primeira reclamar, ao abrigo
do disposto no artigo 76º, nº 4, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo
do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho que não admitiu recurso interposto
para o Tribunal Constitucional.
2. Em audiência que teve lugar em 16 de Fevereiro de 2006, foi proferida
sentença na presença do mandatário da ora reclamante. Em 26 de Fevereiro de
2006, a ora reclamante remeteu pelo correio requerimento de interposição de
recurso para o Tribunal Constitucional, com o seguinte teor:
«A., Lda, Autora, m.i. nos autos à margem referenciados, não se conformando com
a douta Sentença, proferida, no dia 16 de Fevereiro de 2007, no processo supra
mencionado, vem, nos termos dos artigos 75°. - A, nº. 1, art°. 75°., nº. 1 e
art°. 72°., n°. 1, alínea b), da Lei n°. 28/82, de 15 de Novembro, com as
alterações introduzidas pela Lei n°. 143/85, de 26 de Novembro, pela Lei n°.
85/89, de 7 de Setembro, pela Lei n°. 88/95, de 1 de Setembro, e pela Lei n°. 13
– A/98, de 26 de Fevereiro (Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional) interpor, mediante o presente requerimento, recurso para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea g), do nº. 1, do art°. 70º., da Lei
mencionada».
3. A então recorrente foi convidada, ao abrigo do artigo 75º-A, nº 5, da LTC, a
indicar a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade pretendia que o
Tribunal Constitucional apreciasse, bem como a decisão do Tribunal
Constitucional ou da Comissão Constitucional que a julgou inconstitucional ou
ilegal. Respondeu da seguinte forma:
«Constitui, objecto do recurso em apreço, a conformidade constitucional da
interpretação da norma do art°. 796°., n°. 7, do Código de Processo Civil, com a
redacção dada pelo art°. 1°., do D.L. n°. 183/2000, de 10 de Agosto “A sentença,
julgando a matéria de facto e de direito, é sucintamente fundamentada e logo
ditada para a acta” (negrito e sublinhado nosso), acolhida na decisão recorrida,
no sentido de que, nada impede o Juiz de proceder à aplicação do princípio da
adequação formal, independentemente de proceder a prévia audição das partes, com
inegável ferimento da regra enunciada no n° 2, do art°. 2°., do Código de
Processo Civil “A todo o direito, excepto quando a Lei determine o contrário,
corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou
reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos
necessários para acautelar o efeito útil da acção” (negrito e sublinhado nosso).
(…)
Entendimento similar, tem vindo a ser definido pela jurisprudência do Tribunal
Constitucional, que tem caracterizado o direito de acesso aos tribunais como
sendo, entre o mais, um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se
deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e
independência, possibilitando, designadamente, um correcto funcionamento das
regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas
razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do
adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outra (cfr. os
Acórdãos do Tribunal Constitucional ns. 404/87, 86/88 e 222/90, in Diário da
República, 2ª série, de, respectivamente, 21.12.1987, 22.8.1988 e 17.9.1990).
(…) A violação do direito à tutela judicial efectiva, sob o ponto de vista da
limitação do direito de defesa, verificar-se-á, sobretudo, quando a não
observância de normas processuais ou de princípios gerais de processo acarreta a
impossibilidade de o particular exercer o seu direito de alegar daí resultando
prejuízos efectivos para os seus interesses (cfr. Ac. n°. 223/95 do Tribunal
Constitucional, in Diário da República, 2ª. série, de 27.6.1995)».
4. Pelo despacho agora reclamado o recurso não foi admitido, com fundamento no
seguinte:
«Respondendo ao convite para aperfeiçoamento de fls. 169, o A esclareceu que
“constitui objecto do recurso em apreço a conformidade constitucional da
interpretação da norma do artigo 796.°, n.° 7, do Código do Processo Civil, na
redacção dada pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.° 183/2000, de 10 de Agosto, “A
sentença, julgando a matéria de facto e de direito, é sucintamente fundamentada
e logo ditada para a acta (...)”.
Assim, aparentemente, o recorrente invoca a violação do disposto no artigo
796.°, n.° 7, do Código do Processo Civil, na redacção dada pelo artigo 1.º do
Decreto-Lei n.° 183/2000, de 10 de Agosto.
Em primeiro lugar, refira-se que aos presentes autos é aplicável o Código do
Processo Civil, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.° 329-A/95, de 12 de
Dezembro - nomeadamente o artigo 658.°, ex vi do artigo 464.°, dispondo que
concluída a discussão da causa, o processo é concluso ao juiz, que proferirá
sentença em 15 dias.
Sem prejuízo, consigne-se que o despacho em crise, suspendendo a audiência de
julgamento para leitura da sentença para 16.02.2007, foi proferido em
09.02.2007.
Assim, o prazo de 10 dias para recorrer (cf. artigo 75.°, n.° 1, da Lei n.°
28/82, de 15 de Novembro) terminou antes da data do envio do requerimento de
interposição do recurso (26.02.2007, cf. envelope de fls. 166)».
5. Este despacho foi objecto da presente reclamação (artigo 76º, nº 4, da LTC),
sustentando a reclamante que:
«Relativamente, à alegada intempestividade da interposição do recurso, temos
que, a ora reclamante, apresentou o requerimento de interposição do recurso para
o Tribunal Constitucional, de forma tempestiva, conforme o sustenta o
Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo “ [(...), a audiência de julgamento para
leitura da sentença para 16.02.2007 (...), envio do requerimento de interposição
do recurso (26.02.2007, cf. envelope de fls. 166)]. Ora, tendo a reclamante - em
16.02.2007 - sido notificada da douta sentença, e - em 26.02.2007 requestado a
interposição do recurso, dúvidas não haverá de que, a requestação do recurso
ocorreu de forma tempestiva (cfr. art°. 75°., nº. 1, da Lei n°. 28/82, de 15 de
Novembro)».
6. Os autos foram com vista ao Ministério Público, que se pronunciou pela forma
seguinte:
«Sendo o recurso direccionado expressamente contra a “sentença” proferida nos
autos, será de considerar tempestiva a respectiva interposição.
É, porém, evidente que se não verificam os pressupostos do recurso tipificado na
alínea g) do n.º 1 do art.º 70.º da Lei n.º 28/82, por não existir nenhuma
decisão deste tribunal que tenha julgado inconstitucional a norma a que vem
reportado o recurso (e, aliás, nem sequer aplicada pela sentença recorrida)».
7. Notificada do parecer do Ministério, a reclamante respondeu nos três
primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, nos termos previstos no
artigo 145º, nº 5, do Código de Processo Civil. Notificada para comprovar o
pagamento da multa a que se refere esta disposição legal, a reclamante não
apresentou qualquer resposta.
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação
O despacho que é objecto da presente reclamação não admitiu o recurso de
constitucionalidade interposto com fundamento na intempestividade do mesmo.
Por carta remetida em 26 de Fevereiro de 2007, a ora reclamante interpôs recurso
de constitucionalidade da sentença proferida em audiência em 16 de Fevereiro de
2007. Tendo a recorrente interposto recurso desta sentença e não de despacho
anteriormente proferido, é de concluir que foi observado o prazo de dez dias
previsto no nº 1 do artigo 75º da LTC.
Sucede, porém, que não se pode dar como verificado um dos requisitos do recurso
de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea g) do nº 1 do artigo 70º
da LTC. Com efeito, não há qualquer decisão deste Tribunal que tenha julgado
inconstitucional a norma indicada pela recorrente por referência ao artigo 796º,
nº 7, do Código do Processo Civil, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº
183/2000, de 10 de Agosto. De resto, as decisões identificadas pela recorrente
são todas elas anteriores ao diploma que deu nova redacção àquele artigo do
Código de Processo Civil.
Como este Tribunal tem vindo a entender que lhe cabe verificar os requisitos do
recurso de constitucionalidade interposto, ainda que a reclamação tenha
exclusivamente como objecto os concretos fundamentos da não admissão do recurso,
face ao que se dispõe no nº 4 do artigo 77º da LTC (Acórdão nº 480/2006,
disponível em www.tribunalconstitucional.pt), é de concluir, embora por
fundamento diverso do que sustentou a decisão reclamada, que não era admissível
recurso para o Tribunal Constitucional.
III. Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 14 de Maio de 2008
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão