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Processos n.º 9PP, 34PP e 41PP
Plenário
ACTA
Aos trinta e um dias do mês de Janeiro de dois mil e oito, encontrando-se
presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Rui Manuel Gens de Moura Ramos
e os Exmos. Conselheiros Ana Maria Guerra Martins, Joaquim José Coelho de Sousa
Ribeiro, Mário José de Araújo Torres, Benjamim Silva Rodrigues, Maria Lúcia
Amaral, Maria João da Silva Baila Madeira Antunes, Carlos José Belo Pamplona de
Oliveira, Gil Manuel Gonçalves Gomes Galvão, João Eduardo Cura Mariano Esteves,
Vitor Manuel Gonçalves Gomes e José Manuel Cardoso Borges Soeiro, foram trazidos
à conferência os presentes autos para apreciação.
Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o
seguinte:
ACÓRDÃO Nº 68/08
1. Na sequência do Acórdão n.º 1/2008 foram apresentadas, pelos partidos
políticos, diversas reclamações cujo conteúdo aqui se sintetiza.
O Partido da Terra (MPT) afirma que, no acórdão, o Tribunal
“estabelece uma cesura entre jurisdição contenciosa constitucional e o
contencioso administrativo de anulação dos acto de registo e vicissitudes do
partidos políticos”. Acrescenta que o acórdão caracterizou o procedimento em
causa como visando “a mera constatação de um facto legalmente relevante” em que
“o Tribunal Constitucional certifica um facto relativo aos partidos políticos
nele registados”. Faz notar que o Tribunal esclareceu que “serão considerados
todos os elementos que, respeitando naturalmente os preceitos constitucionais e
legais, seja adequados a habilitar o Tribunal Constitucional a verificar o
cumprimento do requisito referido na lei” e que o mesmo Tribunal acrescentou
“que os elementos em apreço se não destinam a qualquer tratamento ou utilização
que exceda a referida finalidade”. Pede, em consequência, que seja esclarecido
se os elementos exigidos para a constituição de partido político − nome completo
de eleitor, acompanhado pelos números do respectivo bilhete de identidade e do
cartão de eleitor − serão exigidos no procedimento de verificação iniciado.
O Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP) afirma
que o acórdão n.º 1/2008 não indicou as normas legais que permitiriam proceder
ao acto de notificação que deu início ao procedimento, que não esclarece que
utilização será dada ao nome completo, ao número de bilhete de identidade e ao
número de eleitor dos filiados dos partidos, nem quais as garantias que o
Tribunal oferece de que não irá proceder ao tratamento informático desses dados.
Alega, ainda, que houve omissão de pronúncia pelo facto de o Tribunal não ter
apreciado a questão da constitucionalidade do artigo 18.º, n.º 1, alínea b).
O Partido Nova Democracia (PND) vem reafirmar que o Tribunal deveria
ter admitido o pedido de fiscalização concreta da constitucionalidade e faz,
portanto, novo pedido de admissão de recurso de fiscalização concreta da
constitucionalidade.
Pede, também, em requerimento separado, que o Tribunal esclareça se
irá exigir, quanto a cada filiado, os mesmos elementos que a lei exige, no
procedimento de constituição de partido, a respeito de cada eleitor. Alega que
são “situações substancialmente distintas”, sendo o processo de angariação de
filiados diverso do processo de inscrição de partido político no registo
existente no Tribunal Constitucional. Afirma ainda que não poderá fornecer
elementos pessoais dos seus filiados, sem o seu consentimento.
2. Sobre a alegada omissão de pronúncia
No Acórdão n.º 1/2008 que decidiu as reclamações apresentadas pelos
partidos políticos no âmbito do procedimento de verificação da existência em
cada partido de um número mínimo de filiados legalmente exigido, o Tribunal
Constitucional explicou:
“o despacho em causa limita-se a iniciar o procedimento destinado a permitir o
cumprimento do disposto no artigo 19º da Lei Orgânica nº 2/2003, de 22 de
Agosto. Nem esta disposição nem qualquer outra fixam os meios a utilizar, pelos
partidos, para que o Tribunal Constitucional possa vir a verificar a não redução
do número de filiados a menos de 5000”.
Afirmou ainda o Tribunal que o procedimento em causa
“visa a mera constatação de um facto legalmente relevante − o Tribunal
certifica um facto relativo aos partidos nele registados”
Neste quadro, entendeu o Tribunal que não estando em causa, no
âmbito do referido procedimento, o efeito jurídico da extinção a que se refere a
norma do artigo 18.º, n.º 1, da Lei Orgânica nº 2/2003 − cuja conformidade aos
princípios constitucionais e aos instrumentos internacionais relativos à
liberdade de associação política (e em especial ao artigo 51.º da Constituição
da República Portuguesa e ao artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do
Homem) foi posta em dúvida − não se impunha, nesse momento, apreciar a questão
da constitucionalidade do requisito legal do artigo 18.º, n.º 1, alínea b),
enquanto critério de uma eventual extinção de partido político.
Por outro lado, não lhe foram também apresentados fundamentos que
evidenciassem a inconstitucionalidade do mero procedimento de verificação
previsto no artigo 19.º da referida Lei Orgânica nº 2/2003. Quanto a este, os
partidos limitaram-se a sustentar que determinadas formas de dar cumprimento ao
imperativo legal do artigo 19.º não seriam conformes aos preceitos
constitucionais relativos à protecção de dados pessoais, ao tratamento
informático de dados e aos princípios da imparcialidade e do contraditório que
devem reger qualquer processo jurisdicional.
O Tribunal entendeu que, no estrito âmbito do procedimento não
jurisdicional então iniciado, não era processualmente justificado conhecer da
constitucionalidade da norma do artigo 18.º, n.º 1, alínea b), cuja conformidade
aos princípios constitucionais e aos instrumentos internacionais relativos à
liberdade de associação política foi posta em dúvida, pois esta não estava a ser
aplicada. Ora também não tinham sido apresentados fundamentos suficientes que
lhe permitissem emitir qualquer juízo de constitucionalidade sobre o mero
procedimento de verificação não jurisdicional da existência em cada partido
político de um número mínimo de filiados.
Não houve, por isso, qualquer omissão de pronúncia.
3. Pedido de fiscalização concreta da constitucionalidade
O PND vem reiterar o seu pedido de fiscalização concreta da constitucionalidade.
Mas, com isso, limita-se a manifestar uma discordância com o conteúdo da decisão
constante do Acórdão n.º 1/2008 na parte em que nele se decidiu admitir os
requerimentos dos partidos políticos como reclamações para o Plenário, no quadro
de um procedimento não jurisdicional.
Ficou decidido no Acórdão n.º 1/2008: “Não estando manifestamente preenchidos os
pressupostos para que o Tribunal Constitucional proceda à fiscalização concreta
da constitucionalidade de quaisquer normas jurídicas nos termos dos artigos 69.º
a 85.º da LTC, podem, no entanto, as iniciativas processuais dos partidos em
causa ser admitidas como reclamações do acto do Presidente do TC que ordenou a
notificação a que acima se aludiu”.
Caso o Tribunal se devesse ter pronunciado, no âmbito do procedimento não
jurisdicional iniciado, sobre uma questão de inconstitucionalidade, deveria
tê-lo feito no próprio Acórdão n.º 1/2008 que decidiu as reclamações dos
partidos políticos. Decidiu não se pronunciar sobre a questão pelas razões acima
indicadas.
4. Pedido de aclaração do conteúdo da decisão constante do acórdão
n.º 1/2008
Os partidos reclamantes vieram arguir que determinados instrumentos
de comprovação da exigência legal contida no artigo 19.º da Lei Orgânica n.º
2/2003, de 22 de Agosto, não seriam conformes à Constituição e que o Tribunal
teria de dar garantias de que não haveria tratamento informático de dados.
Disse-se, efectivamente, no Acórdão n.º 1/2008:
“Nem esta disposição [o artigo 19.º] nem qualquer outra fixam os
meios a utilizar, pelos partidos, para que o Tribunal Constitucional possa vir a
verificar a não redução do número de filiados a menos de 5000.
E depois explicou-se:
“Serão pois considerados todos os elementos que, respeitando
naturalmente os preceitos constitucionais e legais, sejam adequados a habilitar
o Tribunal Constitucional a verificar o cumprimento do requisito referido na
lei. Acrescenta-se que os elementos em apreço se não destinam a qualquer
tratamento ou utilização que exceda a referida finalidade”.
Apesar de salientar que seriam “considerados todos os elementos que,
respeitando naturalmente os preceitos constitucionais e legais, sejam adequados
a habilitar o Tribunal Constitucional a verificar o cumprimento do requisito
referido na lei”, o Tribunal fez, neste contexto, referência aos elementos
exigidos para a constituição de partidos políticos no artigo 15.º, da Lei
Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Agosto, salientando assim que, a respeito de um
procedimento paralelo, o de inscrição no registo de partidos políticos existente
no Tribunal Constitucional, este mesmo Tribunal toma conhecimento do mesmo tipo
de elementos que os partidos consideram que o Tribunal não poderia, no presente
caso, pedir.
Os partidos questionam, agora, se serão realmente exigidos, no
âmbito do procedimento de verificação em decurso, todos esses elementos exigidos
a respeito de cada eleitor para inscrição no registo de partidos políticos, a
que a Lei Orgânica n.º 2/2003 faz referência no seu artigo 15.º.
O Tribunal reafirma que ao esclarecer que “serão considerados todos
os elementos que, respeitando naturalmente os preceitos constitucionais e
legais, sejam adequados a habilitar o Tribunal Constitucional a verificar o
cumprimento do requisito referido na lei”, não indicou como meio de prova
exigível o que se encontra legalmente previsto para a constituição de partidos.
5. Suspensão do procedimento
Considerando, todavia, que deram entrada na Assembleia da República,
nos passados dias 18 e 21 de Janeiro, dois Projectos de Lei (448/X/3 e 449/X/3)
que contemplam inter alia a revogação do artigo 19.º da Lei Orgânica n.º 2/2003,
de 22 de Agosto, considerando, também, que tais projectos de lei foram
admitidos, e sendo certo, ainda, que o procedimento de verificação do número
mínimo de filiados dos partidos políticos a decorrer neste Tribunal visa dar
cumprimento ao imperativo do referido artigo 19.º, da Lei Orgânica n.º 2/2003,
de 22 de Agosto, o Tribunal suspende este mesmo procedimento sem prejuízo da
possibilidade de o retomar se tal for exigido pelo cumprimento da lei.
Ana Maria Guerra Martins
Joaquim de Sousa Ribeiro
Mário José de Araújo Torres
Benjamim Rodrigues
Carlos Fernandes Cadilha
Maria Lúcia Amaral
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão
João Cura Mariano
Vítor Gomes
José Borges Soeiro
Rui Manuel Moura Ramos