Imprimir acórdão
Processo n.º 18/08
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é
recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi proferido o seguinte
acórdão:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, A. reclama (fls. 1 a 3), ao abrigo do n.º 4 do artigo
76º da LTC, do despacho proferido em 15 de Novembro de 2007, pelo Relator junto
do Supremo Tribunal de Justiça (fls. 38), que rejeitou recurso de
inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional (fls. 35 a 37), interposto
ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, com fundamento na
intempestividade do mesmo. Os fundamentos que presidem à reclamação são os
seguintes:
“1º- Os Venerandos Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça proferiram
no âmbito do presente processo douto Acórdão que foi notificado ao ora
Reclamante.
Sendo que,
2°- O Acórdão em causa foi expedido para o signatário a 07 de Maio de 2007,
considerando-se o mesmo notificado a 10 do dito mês.
3°- A 25 do aludido mês, o Reclamante arguiu a nulidade do Acórdão.
4°- Nessa sequência, o Venerando Juiz Conselheiro Relator indeferiu o
requerimento anterior, considerando que o prazo se havia esgotado a 24 de Maio
de 2007, atendendo à falta de fixação de prazo no Código de Processo Penal para
a arguição em causa, aplicava a regra geral do art°. 105°. nº. 1 do C.P.P..
5°- No modesto entender do signatário, solicitou-se a reparação do despacho
anterior, atendendo-se a que o direito em questão do Recorrente não poder ser
coarctado para um prazo inferior ao trânsito em julgado do Acórdão em apreço.
Pois,
6°- Qualquer prazo inferior é incompatível com a possibilidade consagrada das
nulidades serem conhecidas pela via e no prazo do recurso.
7°- Ordenou o Venerando Juiz Conselheiro Relator o desentranhamento do último
requerimento e sobre tal despacho requereu o ora Reclamante que o assunto fosse
submetida à conferência.
8°- Esta última pretensão do Recorrente foi indeferida igualmente por alegada
falta de fundamento.
9°- A reclamação, entretanto, apresentada também foi indeferida.
10°- Interposto recurso para o Venerando Tribunal Constitucional nos termos e
para os efeitos do disposto nos art°s. 70°. alínea b); 71°. no. 1; 72°. nºs. 1
alínea b) e nº. 2; 75º, n°. 1; 78°. nº. 3 todos da Lei nº. 28/ 82 de 15 de
Novembro (com as alterações introduzidas pela Lei nº. 143/ 85 de 17 de Novembro,
pela Lei nº. 85/ 89 de 07 de Setembro, pela Lei nº. 88/ 95 de 01 de Setembro e
pela Lei nº. 13 – A/98 de 26 de Fevereiro) o mesmo não foi admitido.
11°- O ora Reclamante pretendia ver apreciada a inconstitucionalidade do art°.
105º. do C.P.P. na interpretação aplicada na decisão recorrida, no sentido em
que se impediu apreciação de um requerimento de arguição de nulidades,
determinando-se a prática de um prazo inferior incompatível com a possibilidade
consagrada legalmente das ditas nulidades serem conhecidas pela via e no prazo
do recurso, sendo que a reclamação apresentada pelo Recorrente não tem sido
conhecida por alegada falta de fundamento.
Ora,
12°- Conforme se invocou a fls., considerando o facto das aludidas normas legais
na mencionada interpretação violarem as garantias de defesa de qualquer cidadão
consagradas no art°. 32°. da C.R.P., está a ser violado o PRINCIPIO DA PRESUNÇAO
DE INOCENCIA e todos os direitos e deveres ao mesmo inerentes.”
2. Em sede de vista, o Ex.mo Magistrado do Ministério Público (fls. 44-verso)
pronunciou-se no sentido da manifesta improcedência da reclamação ora em apreço,
nos seguintes termos:
“A presente reclamação é manifestamente improcedente.
Na verdade, o recurso de fiscalização concreta, reportada ao “acórdão” proferido
nos autos pelo STJ, é:
- em primeiro lugar, intempestivo, já que à data da interposição, se mostrara
longamente ultrapassado o respectivo prazo legal, sendo evidente que as manobras
dilatórias levadas a cabo pelo ora reclamante (invocação de pretensas
“nulidades” para além do prazo legalmente consentido e dedução de “reclamação”
perante o Presidente do Supremo, num caso em que foi obviamente tal meio
impugnativo era inadequado) não originam qualquer prorrogação do prazo previsto
no nº 1 do art. 75º da Lei nº 28/82;
- em segundo lugar, inadmissível, porque naquele acórdão não se faz obviamente
aplicação da norma questionada.”
Cumpre agora apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO
3. A decisão ora reclamada considerou intempestivo o recurso com fundamento em
inconstitucionalidade por aquele ter excedido o prazo de 10 dias fixado no n.º 1
do artigo 75º da LTC. Sendo expectável que o reclamante viesse aduzir argumentos
que fossem aptos a colocar em crise aquele entendimento, acaba por constatar-se
que aquele não logra esboçar um só fundamento que demonstre a tempestividade do
acto processual de interposição de recurso.
Pelo contrário, o reclamante insiste em procurar justificar a apresentação
intempestiva de um requerimento de arguição de nulidade de acórdão proferido em
03 de Maio de 2007, sem atacar especificamente a decisão de intempestividade
expressamente dirigida ao requerimento de interposição de recurso para o
Tribunal de Constitucional. Só por isso, a presente reclamação já seria
improcedente.
Por outro lado, admitindo que a decisão recorrida é o acórdão de 03 Maio de
2007, é forçoso concluir que um recurso interposto, em 08 de Novembro de 2007 de
um tal acórdão, notificado em 10 de Maio de 2007 e já transitado em julgado, por
força da arguição intempestiva de nulidade, não cumpre o prazo fixado pelo n.º 1
do artigo 75º da LTC.
Acresce ainda que o “douto Acórdão de fls.”, ou seja, o Acórdão proferido em 03
de Maio de 2007, não aplica – em parte alguma – a norma constante do artigo 105º
do CPP, pelo que, por força do artigo 79º-C da LTC, este Tribunal também não
podia conhecer do recurso interposto.
4. Admitindo, porém, que a decisão recorrida é o despacho proferido, em 31 de
Maio de 2007, pelo juiz relator do STJ – única decisão que aplica efectivamente
o referido artigo 105º do CPP – a conclusão quanto à intempestividade seria
idêntica.
É que, conforme nota o despacho proferido em 31 de Novembro de 2007, por ter
sido directamente dirigida ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de
despacho que ordenou desentranhamento de requerimento que visava a “reforma” do
despacho de 31 de Maio de 2007, a “reclamação” era processualmente inadmissível,
à luz do artigo 405º do CPP. Isto porque, nos termos daquele preceito legal, só
cabem reclamações para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de despachos
proferidos por Juízes dos Tribunais de Relação e não de despachos proferidos por
Juízes-Relatores junto do Supremo Tribunal de Justiça.
Daqui decorre que, constituindo aquela um “acto processual inidóneo”, a
reclamação do despacho de desentranhamento não opera qualquer suspensão ou,
muito menos, interrupção do prazo de interposição do recurso para o Tribunal
Constitucional, em relação ao despacho de 31 de Maio de 2007, conforme resulta
de jurisprudência reiterada deste Tribunal (cfr. Acórdãos n.º 1/2004, de 07 de
Janeiro de 2004, n.º 173/2007, de 30 de Março de 2007 e n.º 437/2007, de 03 de
Agosto de 2007, todos disponíveis em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/).
Assim, ainda que se entendesse que o recurso para este Tribunal, interposto em
08 de Novembro de 2007 (fls. 35 a 37), visava colocar em crise o despacho de 31
de Maio de 2007 e não o “douto Acórdão de fls.”, proferido em 03 de Maio de
2007, sempre se concluiria que o prazo de interposição de recurso para o
Tribunal Constitucional, fixado em 10 dias pelo n.º 1 do artigo 75º da LTC, já
havia expirado.
III – DECISÃO
Nestes termos, e ao abrigo do disposto no do n.º 3 do artigo 77º da
Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º
13-A/98, de 26 de Fevereiro, e pelo fundamentos expostos, decide-se indeferir a
presente reclamação.
Fixam-se as custas devidas pelo reclamante em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º
do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.»
2. Alegando ter dúvidas quanto ao sentido decisório constante da referida
decisão sumária, o recorrente veio solicitar a sua aclaração nos seguintes
termos:
«1º - O Reclamante enquanto cidadão ao requerer uma aclaração do despacho de
fls. de indeferimento da arguição de nulidades, foi confrontado com o despacho
de fls. de indeferimento.
2º - Quando requereu a submissão da primeira decisão em apreço à conferência, o
pedido do Reclamante foi indeferido sem justificação plausível.
3º - Socorreu-se o Reclamante do próprio Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça, sem sucesso.
Ora,
4º - Conforme resulta da sucessão dos diversos actos encetados pelo Reclamante
nunca a decisão objecto de recurso para o Venerando Tribunal Constitucional
transitou em julgado.
Termos em que,
Requer-se a V. Exªs. se dignem esclarecer em que medida se expirou o prazo de
recurso do ora Reclamante atendendo ao encadeamento sucessivo de diligências que
o mesmo conduziu desde o primeiro momento de discórdia com o douto despacho de
indeferimento da arguição de nulidades.» (fls. 58 e 59)
3. Notificado deste pedido de aclaração, o Ministério Público veio pronunciar-se
no seguinte sentido:
«1º
O Acórdão proferido é perfeitamente claro e insusceptível de dúvida objectiva
quanto ao que nele se decidiu.
2°
Pelo que uma leitura atenta de tal douta decisão dará seguramente resposta à
dúvida subjectiva formulada no pedido que antecede, o qual naturalmente terá de
ser rejeitado.» (fls. 61)
Cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
4. Nos termos do n.º 2 do artigo 716º do CPC, aplicável “ex vi” artigo 69º do
CPC, o pedido de aclaração (fls.58 e 59) do acórdão proferido, em conferência,
por este Tribunal, deve ser alvo de apreciação na mesma sede, razão pela qual se
impõe a prolação do presente acórdão.
5. Conforme resulta inequivocamente, o acórdão é claro, perceptível e exaustivo.
Por um lado, foi demonstrado que a arguição de nulidade do acórdão proferido, em
03 de Maio de 2007, foi intempestiva, pelo que, à data da interposição do
recurso para este Tribunal, aquele acórdão já havia transitado há muito mais do
que 10 dias. Por outro lado, foi demonstrado que a “reclamação” (assim apelidada
pelo recorrente), para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, do despacho
proferido, em 31 de Maio de 2007, constituiu meio processual inidóneo, pelo que
à data da interposição do recurso para este Tribunal, aquele acórdão já havia
transitado há muito mais do que 10 dias.
Face à clareza do acórdão alvo de pedido de aclaração, forçoso é concluir que
não resta nada por esclarecer.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1
do artigo 669º, no n.º 1 do artigo 670º e no n.º 2 do artigo 716º do CPC,
aplicáveis, respectivamente, “ex vi” artigo 69º da Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro,
decide-se indeferir o presente pedido de aclaração.
Custas devidas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UC’s, nos
termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 10 de Março de 2008
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Gil Galvão