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Processo n.º 820/07
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. A., inconformado com a decisão sumária proferida neste Tribunal a 26 de
Outubro de 2007, vem agora apresentar a seguinte reclamação para a conferência:
“(…) A douta decisão sumária tirada do recurso de inconstitucionalidade
interpretativa da norma contida no n.° 2 do art.° 407.° do Código de Processo
Penal por invocada violação dos imperativos constitucionais dos art.°s 20°, n.°
5. e 202.º, n.º 2, vem negar-lhe provimento com o fundamento que se pode
sumariar em que a solução da norma arguida de inconstitucionalidade concretiza a
tutela jurisdicional consagrada no artigo 20° da Lei Fundamental na medida em
que, procedendo o recurso interposto, ainda que com subida diferida, tal
determinará a anulação de todo o processado sem tanger com possibilidade de, em
momento posterior, o interessado poder exercer tal direito ao recurso para
atingir os fins nele perseguidos, não coarctando assim nos meios processuais ao
seu dispor o exercício desse direito a uma tutela jurisdicional efectiva.
E sustenta-se esta decisão em vasta jurisprudência deste Tribunal sobre a mesma
norma adjectiva penal, a qual se restringe, no entanto, a apreciar as
interpretações trazidas a juízo constitucional na esfera da violação de um único
imperativo constitucional, o do artigo 20°, n.° 5, da CRP.
Porém, tem o recorrente de trazer à douta apreciação da conferência a
substancial diferença do presente recurso carecida de solução diversa ante essa
alteração qualitativa da vexata quaestio, qual seja a interpretação a dar à
sobredita regra adjectiva quando a inutilidade superveniente advém da
circunstância de que é previsível, pelos elementos processuais disponíveis, que
antes da subida do recurso, da sua decisão ou daqueloutra definitiva oriunda de
um novo julgamento por via da eventual procedência do recurso retido, possa
ocorrer a prescrição do procedimento criminal, matéria de conhecimento oficioso,
competindo ao Tribunal dela conhecer e obstar a tal situação sob pena de violar
ainda, e também, o imperativo do artigo 202.°, n.° 2, da Constituição da
República, o que foi expressamente invocado no presente recurso, constituindo
matéria diversa da que a jurisprudência constitucional assentou nos arestos ali
convocados e não foi sequer aflorada na decisão sumária ora reclamada,
constituindo de per se uma nulidade processual a suprir.
Ou seja, a novidade da questão ora submetida à douta sapiência deste Tribunal
Constitucional assenta não só na definição legal de inutilidade superveniente
quando é patente que possa ocorrer prescrição do procedimento criminal antes de
um novo julgamento caso obtenha provimento o recurso retido, mas também, e
principalmente, que compete ao tribunal recorrido fazer tal enquadramento de
probabilidades no cumprimento do dever constitucional plasmado no n.° 2 do
artigo 202.° da CRP, de assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente
protegidos.
Sem que se tenha, in casu, requerido que seja este Superior Tribunal a dirimir e
reconhecer tal desiderato legal, apenas se invocando a violação desta regra
constitucional por ambos os Tribunais a quo, no despacho de retenção do recurso
e na decisão de improvir a respectiva reclamação.
Aliás a alteração legislativa, no quadro da norma tida por erradamente
interpretada à luz dos preceitos constitucionais, imposta pela Lei n.° 48/2007,
de 29 de Agosto, traduz já esse espírito de abrangência tutelar e cautelosa da
matéria da inutilidade superveniente, como melhor se explicitará em sede próxima
de alegações, após a admissão formal do presente recurso como se espera e é de
Justiça!!!”
O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal respondeu nos
seguintes termos:
“1.º
A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2.º
Na verdade a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da decisão
reclamada e do entendimento dos direitos de acesso à justiça e ao recurso, nela
expresso.”
2. A fundamentação constante da decisão reclamada, e no que ora importa, tem o
seguinte teor:
“A solução do artigo 407.º, n.º 2 do Código de Processo Penal concretiza, assim,
a tutela jurisdicional consagrada no artigo 20.º da Constituição na medida em
que, procedendo o recurso interposto, ainda que com subida diferida, tal
determinará a anulação de todo o processado. Assegura-se, portanto, que o
interessado, ainda que em momento ulterior, possa atingir os fins por si
desejados não sendo de qualquer modo coarctado nos meios processuais ao seu
dispor no exercício do seu direito de acesso ao direito e a uma tutela
jurisdicional efectiva.
Adiante-se ainda que não compete ao Tribunal Constitucional apreciar se, em
concreto, a subida diferida do recurso o torna ou não absolutamente inútil – os
poderes deste Tribunal em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade
restringem-se à cognição e resolução da questão de constitucionalidade,
escapando-lhe a sindicância das decisões proferidas por outros Tribunais.
Não se vislumbra, por conseguinte, de que modo é que o regime disposto no artigo
407.º, n.º 3 do Código de Processo Penal possa comportar a violação do direito a
obter a decisão da causa em prazo razoável e a um processo equitativo
(consagrados no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição), na medida em que tal regime
consubstancia uma opção legislativa enquadrada na margem de conformação do
legislador ordinário e fundamentada em valores de celeridade e economia
processuais.
Em face do exposto, improcede o recurso.”
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
3. A reclamação ora deduzida carece manifestamente de fundamento. Como resulta
da argumentação expendida na decisão sumária, nela se decidiu negar provimento
ao recurso interposto na medida em que a questão submetida a juízo se
apresentava como “simples”, tendo já sido objecto de abundante jurisprudência
por parte deste Tribunal Constitucional, a qual se reputa como firme e pacífica.
Nos termos de tal jurisprudência, a norma impugnada não afronta o direito
fundamental do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, direitos
fundamentais consagrados no artigo 20.º da Constituição. De igual modo, e ao
invés do que pretende o Reclamante, não se verifica qualquer violação do artigo
202.º, n.º 2 da Constituição na medida em que a solução legal, a que as decisões
judiciais devem obediência, se localiza, como se referiu na decisão ora
reclamada, no espaço de conformação legislativa do regime legal dos recursos.
De realçar que, como é sabido, o Tribunal não se encontra vinculado a apreciar
todos os argumentos aduzidos pelo Recorrente e sim, de acordo, com o disposto no
artigo 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a “resolver todas as questões”
que tenham sido submetidas à sua apreciação.
Reitera-se novamente, em conclusão, que não compete ao Tribunal Constitucional
apreciar se, em concreto, a subida diferida do recurso o torna ou não
absolutamente inútil – os poderes deste Tribunal em sede de fiscalização
concreta da constitucionalidade restringem-se à cognição e resolução da questão
de constitucionalidade, escapando-lhe a sindicância das decisões proferidas por
outros Tribunais.
III – Decisão
4. Assim, e, sem necessidade de maiores considerações, acordam, em conferência,
indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão
reclamada no sentido de negar provimento ao recurso.
Custas pelo Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 11 de Dezembro de 2007
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Rui Manuel Moura Ramos