Imprimir acórdão
Processo n.º 1066/07
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. A., Recorrente no presente recurso de constitucionalidade, notificado da
decisão sumária proferida a fls. 246 a 249, veio reclamar para a conferência, ao
abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional,
invocando, no que ora importa:
“Os dois despachos a considerar são os de fls. 134 e o de fls. 158, pois este
último foi proferido por juiz que já não tinha poder jurisdicional para o fazer
– art°. 666.1 do C.P.C.
Como não foram assim equacionadas pelas instâncias as duas decisões, houve
violação do princípio da legalidade:
1 – sujeição à lei – estabelecida no art°. 203 da C.R.P..
2 – Também constitui violação do preceito constitucional de sujeição à lei as
seguintes situações que se verificam ao longo do processo:
– Falta de originais de várias peças processuais, substituindo-as por duplicados
sem qualquer explicação (precedente n°. 2 desta reclamação);
– Falta de adequada notificação à contraparte de peças essenciais – cfr. n.º 2.1
da presente reclamação e especialmente do requerimento apresentado em 30.1.06,
fls. 127 dobrada;
– Falta de oportunidade dada à contraparte para contraditar em tempo
requerimentos autónomos e outras peças, essenciais do processo – cfrs. resulta
de fls. 95 dos autos e decisão de fls. 96. E particularmente GRAVE A FALTA DE
NOTIFICAÇÃO dos requerimentos de fls. 40 (de 28.04.05), fls. 43 (de 20. 05.05) e
de fls. 49 (de 1.09.05) pelo seguinte:
- Pretendem os AA, recorridos, exercer preferência, como locatários.
- O prazo para exercício deste direito é o que consta do art°. 1091 do Código
Civil que remete para os art°s. 416 a 418 e 1410 do Código Civil.
- Ora, a qualidade de inquilinos foi determinada pelo Supremo em 04.02.03 (fls.
87 dos autos) tendo-se esse Venerando Tribunal Constitucional pronunciado em
18.05.94 (fls. 90).
MAS os AA. SO ACORDARAM para a preferência MAIS DE DOIS ANOS sobre a decisão do
Supremo, e mais de UM ANO sobre a decisão desse Venerando Tribunal.
MANIFESTAMENTE FORA DO PRAZO LEGAL (dos art°s. 416, 109 1.4 e 1410 do Código
Civil) quando havia CADUCADO DESDE HA MUITO o prazo de exercício de tal direito.
– ver fls. 155 dos autos.
A CADUCIDADE É DE CONHECIMENTO OFICIOSO - art°. 333 do Código Civil
Certamente por isso não notificaram a contraparte dessa pretensão. Os Tribunais
Comuns, violaram estas disposições.
– Não pode dizer-se que tal anomalia quadre com a EQUIDADE exigível no processo;
– Não conhecimento pelo S.T.J. de questões de que devia conhecer, como sejam as
questões que constam das conclusões 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.ª, 9a e 10.ª da minuta
de recurso de agravo (fls. 211 a fls. 212).
5.º
O reclamante sente-se atingido por, no processo, não ver que tenham sido
respeitados os princípios da universalidade e da igualdade consagrados nos
art°s. 12.1 e 13.1 da C.R.P..
6°.
Por isso não lhe parece que o processo tenha sido equitativo como impunha o n°.4
(final) do art°. 20 da C.R.P.”
A fundamentação constante da decisão reclamada tem o seguinte teor:
“2. Não obstante o presente recurso ter sido admitido pelo Tribunal a quo, o
certo é que tal decisão não vincula este Tribunal, de acordo com o disposto no
artigo 76.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional. Cumpre portanto aferir,
desde logo, se se encontram preenchidos os pressupostos de conhecimento do
presente recurso de constitucionalidade − suscitação, pelo recorrente, de
inconstitucionalidade de uma norma durante o processo, constituindo essa norma
fundamento (ratio decidendi) da decisão recorrida, bem como o prévio esgotamento
dos recursos ordinários.
A questão de constitucionalidade vem imputada à decisão recorrida, portanto a
uma decisão judicial e não a qualquer norma jurídica.
Falha, por conseguinte, requisito essencial ao conhecimento do recurso.
3. Com efeito, um dos pressupostos de conhecimento dos recursos interpostos ao
abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, é a
suscitação de uma questão de constitucionalidade normativa. Ao Tribunal
Constitucional, em fiscalização concreta, compete apreciar normas jurídicas, ou
segmentos de normas, ou dimensões interpretativas, que consubstanciem a ratio
decidendi da decisão recorrida. Tal resulta expressamente do disposto nos
artigos 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição e 70.º, n.º 1, alínea b), da
Lei do Tribunal Constitucional, nos termos dos quais cabe recurso para este
Tribunal das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja
inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
Não configurando o recurso de constitucionalidade, em qualquer uma das suas
modalidades, uma espécie de “amparo constitucional”, o objecto do mesmo apenas
poderá incidir sobre a apreciação, às luz das regras jurídico-constitucionais,
de um juízo normativo efectuado pelo tribunal recorrido. Com efeito, o nosso
sistema de fiscalização de normas jurídicas não permite que se indague da
constitucionalidade da decisão judicial, sendo apenas sindicáveis as normas (ou
interpretações normativas) que configurem a ratio decidendi do litígio
No entanto, o Recorrente limita-se a afrontar a decisão recorrida, imputando-lhe
o vício de inconstitucionalidade, e não invocando, em momento algum do processo,
qualquer questão de constitucionalidade de qualquer norma (ou uma sua dimensão
interpretativa) de forma a adequadamente convocar a pronúncia do Tribunal
Constitucional ao abrigo do recurso previsto na citada alínea b).
De facto, como resulta da transcrição supra, a violação dos artigos 12.º n.º1,
13.º n.ºs 1 e 2, 20.º n.ºs 4 e 5 e 203.º, todos da Constituição, é imputada ao
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, isto é, à decisão judicial propriamente
dita.
5. De realçar, igualmente, que não se verificam os pressupostos necessários ao
conhecimento do recurso interposto ao abrigo das alíneas c) e f) do artigo 70.º,
n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional. Com efeito, não se verificou qualquer
recusa de aplicação de norma com fundamento em ilegalidade por violação de lei
com valor reforçado nem, sobejamente, foi aplicada norma cuja ilegalidade, por
violação de lei com aquele valor, haja sido suscitada durante o processo.
5. Em face do exposto, por falta de pressupostos, não pode conhecer-se do
objecto do presente recurso.”
II – Fundamentação
Na reclamação para a conferência, o Recorrente não aduz qualquer argumento novo
dos já produzidos quando da interposição do recurso de constitucionalidade para
este Tribunal.
Antes, reitera, a fls. 258 que “os dois despachos a considerar são o de fls. 134
e o de fls. 158, pois este último foi proferido por juiz que já não tinha poder
jurisdicional para o fazer – artigo 668.º n.º 1 do Código de Processo Civil.
Como não foram assim equacionadas pelas instâncias as duas decisões, houve
violação do princípio da legalidade (…)”
Isto é, vem o Reclamante pôr apenas em crise o decidido, nomeadamente pelo
Supremo Tribunal de Justiça, não suscitando qualquer questão de
constitucionalidade normativa.
Razão pela qual não se antevêem motivos para alterar a decisão sumária
proferida.
III – Decisão
Acordam, assim, em negar provimento à reclamação, confirmando a decisão sumária
proferida.
Custas pelo Recorrente, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) UCs.
Lisboa, 30 de Janeiro de 2008
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Rui Manuel Moura Ramos