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Processo n.º 1023/07
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I.Relatório
1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na
alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC – Lei
n.º 28/82, de 15 de Novembro), solicitando a apreciação da inconstitucionalidade
da “interpretação dada pelo Tribunal da Relação do Porto à norma do artigo
119.º, al. c) do Código de Processo Penal, enquanto não assegura todas as
garantias de defesa do arguido (…) — foi “violado o disposto no artº 32.º da
Constituição da República, pelo que o recorrente pretende que seja apreciada a
inconstitucionalidade dos artºs 119.º, al c), 123.º e 332.º, n.º 1 do Código de
Processo Penal, na interpretação atribuída a tais normas pelo venerando Tribunal
da Relação do Porto”.
Convidado a “indicar de forma clara o exacto sentido da norma cuja conformidade
constitucional pretende questionar”, respondeu:
“(…)
I. deve julgar-se inconstitucional, por violação do artº 32º, nº 1 da
Constituição da República Portuguesa as normas constantes do artº 123º,
conjugado com os arts. 119º, al. c) e 332º do Código de Processo Penal,
interpretadas no sentido de que a notificação por mero envio postal simples,
feita ao arguido, da decisão que revogou a suspensão da execução da pena de
prisão, traduz irregularidade e consequentemente conceder-se provimento ao
recurso, determinando-se a reformulação da decisão recorrida em conformidade com
o precedente juízo de inconstitucionalidade.
II. Mais expressamente esclarece, em directo cumprimento do despacho de
12/11/07, que entende que a norma cuja conformidade constitucional pretende
questionar tem o exacto sentido de apenas se aplicar a preterição de
formalidades ou vícios não essenciais, razão pela qual é inconstitucional se
tiver a pretensão de ser interpretada no sentido de se aplicar a violações
graves de direitos fundamentais do arguido, como seja o seu direito de defesa,
porquanto o não cumprimento dos formalismos legais na notificação da decisão que
revogou a suspensão da execução da pena de prisão implica a desprotecção dos
mesmos valores jurídicos subjacentes ao não cumprimento desses formalismos
aquando da notificação da decisão penal (e que acarreta a nulidade), tanto mais
que, ainda que se não entendesse que a preterição da formalidade que a lei impõe
nesta situação (contacto pessoal ou via postal registada com aviso de recepção)
se poderia enquadrar no clausulado tipificado no art. 119º do Cód. Processo
Civil, o que se não concede, sempre teria que se considerar que a ofensa de tais
formalidades origina vício tão intenso que acarreta a inexistência jurídica do
acto e nunca, por nunca, a sua irregularidade.
(…).”
2. Foi proferida decisão sumária, ora reclamada, através da qual não se tomou
conhecimento do objecto do recurso, com a seguinte fundamentação:
Acontece, porém, que o recorrente não suscitou atempadamente a questão de
constitucionalidade cuja apreciação visa obter no recurso interposto para este
Tribunal.
Efectivamente, é pressuposto, entre outros, do recurso de constitucionalidade
interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC que
a questão de constitucionalidade em apreço tenha sido atempadamente suscitada
durante o processo (artigo 70.º, n.º 2 da LTC e 280.º, n.º 4 da Constituição da
República) de modo a que o tribunal recorrido — no caso, a Relação do Porto —
dela pudesse conhecer antes de esgotado o seu poder jurisdicional: a questão tem
que ser suscitada enquanto a causa se encontra pendente, ou seja, antes de o
tribunal recorrido ter proferido a decisão final.
Ora, quando o recorrente interpôs recurso da sentença proferida pela 1ª
instância para a Relação não suscitou qualquer questão de constitucionalidade de
este Tribunal pudesse conhecer — basta, para tal concluir, atentar nas suas
alegações de recurso.
E, em consequência, no acórdão proferido, o Tribunal a quo não decidiu nenhuma
questão de constitucionalidade.
Ora, tal constatação permite extrair a conclusão de que nenhuma questão de
constitucionalidade foi atempadamente suscitada, nos termos estabelecidos na Lei
de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional - cfr.
artigo 72.º, n.º 2.
Como já, por diversas vezes, este tribunal fez notar, «A suscitação atempada, ou
seja durante o processo, significa que a questão deve ser levantada, em
princípio, em momento anterior ao de o tribunal recorrido proferir a decisão
final, de modo a ser-lhe ainda possível pronunciar-se a seu respeito. A
inconstitucionalidade há-de suscitar-se antes de esgotado o poder jurisdicional
do juiz sobre a matéria a que a questão de inconstitucionalidade” respeita.
3.
3.1. Inconformado, o arguido reclamou ao abrigo do disposto no
artigo 78.º n.º 3 da LTC para a conferência, nos seguintes termos:
“(…)
1.º
A douta Decisão Sumária proferida refere exemplarmente que “é pressuposto, entre
outros, do recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo do disposto na
alínea b) do nº 1 do artigo 70.º da LTC que a questão de constitucionalidade em
apreço tenha sido atempadamente suscitada durante o processo (art. 70.º, nº 2 da
LTC e 280.º, nº 4 da Constituição da República) de modo a que o tribunal
recorrido — no caso, a Relação do Porto — dela pudesse conhecer antes de
esgotado o seu poder jurisdicional: a questão tem que ser suscitada enquanto a
causa se encontra pendente, ou seja, antes de o tribunal recorrido ter proferido
a decisão final”.
2º
Contudo, acrescenta que “quando o recorrente interpôs recurso da sentença
proferida pela 1ª instância para a Relação não suscitou qualquer questão de
constitucionalidade de este Tribunal pudesse conhecer”.
3º
Ora, salvo o mais elevado respeito, o recorrente não concorda com tal posição.
4º
Na verdade, o recorrente cumpriu todos os formalismos processuais para que o
recurso ora em causa possa ser apreciado pelo Tribunal Constitucional e, se é
verdade que não cumpriu, de forma expressa, a exigência prescrita no art. 75-A,
nº 2 da LTC (indicação da norma violada e peça processual em que suscitou a
questão da inconstitucionalidade), tal omissão foi suprida pelo cumprimento
integral da notificação que foi dirigida ao recorrente ao abrigo do disposto no
art. 75º-A, nº 5 da LTC.
5.º
Apesar desse cumprimento, e dado o teor da Decisão Sumária, sempre pretende o
recorrente ainda esclarecer que, contrariamente ao decidido, a análise da
motivação de recurso apresentada pelo recorrente no Tribunal da Relação do Porto
permite verificar que efectivamente o recorrente suscitou a questão da
constitucionalidade que ora pretende seja reapreciada.
6.º
Não o fez em termos de autonomia de exposição (e nem tem que o fazer) mas fê-lo
de forma clara, inequívoca e reiterada, sendo certo que o Tribunal da Relação
fez de tal alegação letra morta rejeitando o recurso por ter sido interposto
fora de tempo e não conhecendo essa (e outras) questões.
7.º
Efectivamente, repare-se que em toda a motivação de recurso mas em especial nos
art.ºs 18º, 19º, 23º a 29º, 51º a 57º, 63º e conclusões X a XX (especialmente
conclusões XIV, XV, XVI, XVII e XVIII),
8º
O recorrente expressa e reiteradamente suscita a questão da constitucionalidade,
tal qual a vem colocar para (re)apreciação neste Meritíssimo Tribunal
Constitucional, ou seja, não vem colocar em causa a constitucionalidade em geral
de determinada norma mas coloca ostensivamente em causa determinado sentido
interpretativo que lhe foi dado pelo Tribunal de 1.ª Instância e que redunda na
inconstitucionalidade dessa norma. Tal sentido interpretativo veio a ser mantido
no Tribunal da Relação, apesar dos esforços e alegações do recorrente.
9.º
O recorrente na motivação de recurso que apresentou no Tribunal da Relação do
Porto, pugna pela alteração da decisão de ia Instância referindo que a mesma, a
manter-se fundada em determinado sentido interpretativo dos art.ºs 123º, 119º,
al. c) e 332 do Código Penal, constitui violação dos mais elementares direitos
de defesa do arguido e do seu direito à liberdade, consagrados no art. 32º da
Constituição.
10.º
Aliás que na última conclusão da motivação apresentada refere-se expressamente
como norma violada pela decisão de 1.ª Instância, o art. 32º da Constituição da
República, que é o que novamente surge nestes autos, em sede de recurso de
constitucionalidade, como parâmetro para aferir o correcto sentido
interpretativo da norma posta em crise.
11º
Por isso o esclarecimento prestado pelo recorrente que refere que a norma cuja
conformidade constitucional pretende questionar tem o exacto sentido de apenas
se aplicar a preterição de formalidades ou vícios não essenciais, razão pela
qual é inconstitucional se tiver a pretensão e for interpretada no sentido de se
aplicar a violações graves de direitos fundamentais do arguido, como seja o seu
direito de defesa.
12º
Está aqui em causa a liberdade de um indivíduo, de uma Pessoa Humana, valor tido
por fundamental e acerrimamente defendido pelo Tribunal Constitucional, razão
pela qual conta o recorrente, em última instância, com a superior intervenção
desse Tribunal para ser reposta a correcta interpretação do dispositivo
normativo jurídico-penal que lhe deve ser aplicado de forma a ser-lhe, ao menos,
permitida a sua defesa permitindo-lhe ser ouvido na decisão que lhe retire (ou
não) a sua liberdade”.
3.2. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado,
respondeu que a reclamação é manifestamente improcedente.
Cumpre apreciar e decidir.
II.
Fundamentação:
4. Condenado no processo crime que correu termos no 3.º Juízo Criminal do
Tribunal Judicial de Matosinhos, o arguido, ora reclamante, recorreu para a
Relação do Porto formulando, no que ao recurso de inconstitucionalidade releva,
as seguintes conclusões:
Vem o presente recurso do douto despacho de fls. 736, objecto da aclaração de
fls. 773.
II
No requerimento apresentado em 10/07/2006, a fls. 718 e ss. dos autos, o
recorrente limita-se, nos capítulos I, II e III e respectivas alíneas do art.º
5.º a proceder a uma mera interpretação dos despachos proferidos nos autos (de
alguns desconhecia a existência por deles não ter sido notificado), tendo-o
feito apenas e tão só, com o objectivo de demonstrar qual a finalidade da
certidão peticionada, sendo apenas dois os “requerimentos” efectuados pelo
Recorrente em tal articulado: que o Meritíssimo Juiz “a quo” proferisse decisão
sobre a arguição de nulidade invocada e que fosse passada certidão de algumas
peças que devidamente enumerou. Nada mais.
III
O Meritíssimo Juiz “a quo” não se pronuncia acerca de nenhuma das duas.
IV
Quanto à invocada nulidade, o Tribunal “a quo” remete para o despacho de fls.
657, entendendo o Recorrente que a questão a apreciar na arguida nulidade (do
douto despacho de fls. 588) é total e rigorosamente diversa da que iria ser
apreciada no pedido de “habeas corpus”, já que na arguição de nulidade tem-se em
vista o conhecimento da nulidade de um acto processual; no “habeas corpus”, o
objectivo é a apreciação da legalidade da prisão, logo, não há dependência
alguma entre os dois pedidos, devendo o mesmo ser apreciado de imediato e em
separado pelas respectivas entidades competentes – a nulidade pelo tribunal do
processo; a providência de “habeas corpus” pelo S. T. J., como veio a ocorrer,
aliás.
V
O douto despacho de fls. 657, onde o Meritíssimo Juiz “a quo”, alegadamente, se
debruça sobre a invocada nulidade, nem sequer foi notificado ao arguido ou ao
seu mandatário, que apenas dele veio a ter conhecimento – com surpresa – após o
pedido de consulta dos autos que lhe foram confiados no dia 07 de Julho de 2006,
sendo certo ainda que a decisão proferida no incidente de “habeas corpus” já foi
proferido no dia 28 de Junho, não tendo, até ao momento, sido proferido o
invocado despacho acerca da nulidade invocada.
VI
Não se debruçou, pois, o douto Tribunal “a quo” acerca da invocada questão de
nulidade do douto despacho de fls. 588, e, consequentemente, da invocada
nulidade por omissão de pronúncia, do douto despacho de fls. 657, incorrendo,
assim, na nulidade prevista no artº 379º, n° 1, al. c) primeira parte e 380°, n°
3 do Cód. Processo Penal, que se arguiu para os devidos efeitos.
VII
De igual modo, não se pronunciou o Tribunal “a quo” acerca do aludido pedido de
certidão de determinadas peças processuais dos autos, solicitado pelo Recorrente
em 10 de Julho de 2006.
VIII
O Recorrente foi notificado pela secção para proceder ao levantamento da aludida
certidão sendo certo, porém, que o douto despacho de fls. 736 e ss dos autos
nada refere quanto à dita certidão.
IX
A expressão “Indefere-se ao requerido' da douta decisão em crise, no contexto em
apreço é totalmente vaga e obscura, não se logrando descortinar – mesmo após o
douto despacho de fls. 773 – o que o Tribunal “a quo” indeferiu e a razão do seu
indeferimento.
X
O douto despacho de fl. 736 e ss, pronuncia-se, sem que tal lhe tenha sido
solicitado, sobre a bondade e as razões dos doutos despachos já proferidos a
fls.. autos.
XI
Não aprecia, contudo, a nulidade anteriormente invocada como se peticionou,
sendo omisso no que tange à requerida passagem de certidão.
XII
O arguido nada requer no “corpo” do seu articulado de 10 de Julho de 2006,
limitando-se a explanar as razões que subjazem ao, então, requerido sob a alínea
B) de tal peça.
XIII
Carece de razão o Tribunal “a quo” na condenação do Recorrente em 5 UC de custas
'pelo incidente', desconhecendo-se, porém, quais os motivos inerentes a tal
condenação.
XIV
O douto Tribunal “a quo” não fundamenta de todo a condenação em custas, e em tão
elevado montante.
XV
A necessidade de fundamentação das decisões judiciais constitui imperativo
constitucional, como resulta do art.º 205°, nº 1 da Constituição da República
Portuguesa, sendo certo que todas as decisões proferidas judicialmente carecem
igualmente de fundamentação (artº 97º, nº 4 do Cód. Processo Penal).
XVI
Não subsistirão quaisquer dúvidas de que o despacho ora em apreciação é um
despacho judicial decisório e como tal tinha necessariamente que ser devidamente
fundamentado.
XVII
A decisão em apreço, mormente no que concerne à condenação em custas, é
totalmente omissa em relação ao dever de fundamentação imposto, nomeadamente
pelos citados artºs 97º do Cód. Processo Penal e 205º, nº 1 da C.R.P.,
desconhecendo-se totalmente os motivos e fundamentos que levam a tal condenação,
e em tão elevado montante, facto que acarreta a sua nulidade, de harmonia com as
disposições conjugadas dos artºs 205º da C.R.P., 97º, nº 4, 379º, n° 1, al. a),
e 380º, n° 3 do Cód. Processo Penal, o que expressamente se arguiu para todos os
devidos e legais efeitos.
XVIII
A dita condenação em custas carece totalmente de fundamento, não sendo de modo
algum devida e muito menos no montante considerado.
XIX
O Recorrente não ficou vencido em qualquer 'incidente” que tenha deduzido nem
deu causa a qualquer incidente anómalo ou dilatório, tanto mais que na altura em
que deu entrada do requerimento em causa encontrava-se preso, logo com todo o
interesse em que o processo seguisse os seus trâmites da forma mais célere
possível.
XX
Não é aceitável que possa ser condenado em custas de um “incidente” a que não
deu lugar.
XXI
Mas mesmo considerando uma condenação em custas, que de todo não se admite e
apenas por hipótese de raciocínio se equaciona, sempre se dirá que não se
compreende qual o critério que esteve subjacente à condenação do ora Recorrente
em taxa de justiça equivalente ao máximo previsto legalmente.
XXII
Entende-se que o máximo previsto – 5 UC’s, ou seja, € 445,00 – seja aplicável
quando a questão ou incidente colocado é manifestamente infundado ou dilatório,
com vista a entorpecer a justiça, o que, claramente, não é o caso, pelo que
jamais poderia o Recorrente ser condenado no pagamento de quaisquer custas em
consequência do requerimento sub judice e muito menos no montante máximo
previsto legalmente.
XXIII
A decisão em apreço padece também de nulidade, por excesso de pronúncia, já que,
no sentido que melhor se explanou no corpo das motivações, e se dá por
reproduzido por mera economia processual, o douto Tribunal “a quo” conheceu de
questões que não foram colocadas à sua consideração, que igualmente se arguiu
para todos os devidos e legais efeitos.
XXIV
Ao decidir como decidiu, violou o douto Tribunal “a quo” o inserto nos art°s
513°, nº 1 do Cód. Processo Penal e artº 84° do Cód. Custas Judiciais, bem como
o disposto nos artºs 205º da C.R.P., 97º, nº 4, 37º, nº 1, al. a) e c), e 380°,
n° 3 do Cód. Processo Penal.
Por acórdão proferido em 28 de Março de 2006, a Relação do Porto rejeitou o
recurso por ser intempestivo, nos termos do disposto nos artigos 414.º n.º 2 e
420.º n.º 1 ambos do Código de Processo Penal, fundamentando a decisão nos
seguintes moldes:
Os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas
conclusões da sua motivação, sem embargo de outras que sejam de conhecimento
oficioso – artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal.
As questões colocadas no presente recurso são as seguintes: saber se a
notificação do despacho de fls 588 e verso, por via postal simples com prova de
depósito, constitui a nulidade prevista nos artigos 119º, alínea c), e 120º, do
C. P. Penal; e se, ao ser condenado pelo crime de detenção de arma ilegal,
durante o período de suspensão da execução da pena de prisão, o arguido revelou
que as finalidades que estavam na base da mesma suspensão não puderam ser
alcançadas, devendo, por isso, ser revogada, nos termos do artigo 56º, nº 1,
alínea b), do C. Penal.
O recorrente afirma não ter sido notificado do despacho que revogou a suspensão
da execução da pena de prisão em que foi condenado mas, da leitura do processo,
resulta que tal notificação foi efectuada.
O referido despacho foi notificado ao arguido, no dia 7.4.2006, por via postal
simples com prova de depósito, e ao então mandatário daquele, na mesma data, por
via postal registada, conforme tudo se alcança de fls. 590 a 592.
De facto, invocar a falta de notificação do despacho em crise era a única forma
que poderia, com alguma aparência de tempestividade e legalidade, justificar a
interposição do presente recurso, apenas em 29.6.2006.
As notificações efectuam-se, nos termos do artigo 113º, nº 1, alíneas a), b), c)
e d), do C. P. Penal, mediante contacto pessoal, pela via postal registada ou
simples, ou por editais.
A notificação por contacto pessoal é feita pelo funcionário de justiça
competente ou por agente policial.
As notificações por via postal registada estão reguladas no nº 5, do citado
artigo 113º, e obedecem a um certo formalismo para garantia de que a pessoa
notificada é a que efectivamente o deve ser.
As notificações por via postal simples ou por editais e anúncios só são
permitidas nos casos em que a lei expressamente o admitir. «Compreendem-se as
cautelas porque não há forma de garantir que o notificando tem efectivo
conhecimento da notificação» – Germano Marques da Silva, Curso de Processo
Penal, II, pág. 65.
Como se disse, o arguido/recorrente foi notificado por via postal simples com
prova de depósito, mas devê-lo-ia ter sido, em nosso entender, por contacto
pessoal ou por carta registada com aviso de recepção, as duas únicas que
garantiam o efectivo conhecimento da respectiva notificação.
Com efeito, como se refere no acórdão desta secção, de 18.10.2006, proferido no
recurso nº 5231/05-1, “da conjugação das normas contidas no nº 3, do artigo
113º, e nº 2, do artigo 196º, ambos do C. P. Penal, parece resultar que a
notificação por via postal simples, a que alude a alínea c), do nº 1, do artigo
113º, só deverá ser utilizada após ter sido prestado pelo arguido termo de
identidade e de residência em que declare a morada para onde pretende ser
notificado, presumindo-se efectuadas as notificações por via postal simples
remetidas para a morada ali indicada e só essas.
Nas demais situações, deverá o arguido ser notificado por contacto pessoal ou
por carta registada com aviso de recepção, as únicas que asseguram a sua
efectivação”.
Deste modo, as notificações feitas ao arguido por via postal simples antes de
ter prestado o termo de identidade e residência ou, como no caso concreto,
depois de esta medida de coacção carecer já de qualquer efeito, em virtude do
disposto no artigo 214º nº 1, alínea e), do C. P. Penal, são irregulares.
Tais notificações são irregulares e não nulas, pois, apenas se prevê a nulidade
dependente de arguição relativamente à falta de notificação do assistente e das
partes civis, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência. Nesses
casos, a falta de notificação constitui nulidade dependente de arguição, que
ficará sanada se, não obstante a falta de notificação, a pessoa interessada
comparecer ou renunciar a comparecer ao acto, salvo se comparecer apenas com a
intenção de arguir a nulidade – artigo 121º, n° 2 e 3, do C. P. Penal.
Nos demais casos, a falta de notificação constitui, em geral, mera
irregularidade. cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, pág.
66 e 67.
«Com efeito, nenhuma norma legal existe que sancione o acto de notificação por
modalidade diversa da prevista na lei ou com inobservância de formalidades
legais com a figura da inexistência jurídica, nem tão pouco com a nulidade. E,
nos termos do disposto no nº 1, do artigo 118º, do C. P. Penal, a violação ou a
inobservância das disposições da lei de processo penal só determina a nulidade
do acto quando esta for expressamente cominada na lei. Fora desses casos,
preceitua o nº 2, do mesmo artigo, que o acto ilegal é irregular. Nem do artigo
119º, relativo às nulidades insanáveis, nem do artigo 120º, relativo às
nulidades dependentes de arguição, nem de qualquer outra norma legal, consta a
situação configurada como constituindo nulidade» – citado acórdão, de
18.10.2006.
Portanto, a notificação efectuada ao arguido/recorrente, em 7.4.2006, do
despacho de revogação da suspensão da execução da pena de prisão por via postal
simples com prova de depósito é irregular. Porém, tal irregularidade há muito
que se encontra sanada, dado que, não foi arguida dentro do prazo previsto no
artigo 123º, do C. P. Penal.
E verdade que o acórdão desta Relação, de 7.6.2006, processo nº 0547071, in www.
dgsi. pt., considerou que o despacho que revoga a suspensão da execução da pena
de prisão deve ser notificado por contacto pessoal e de que a falta de tal
notificação constitui a nulidade prevista no artigo 119º, alínea c), do C. P.
Penal. Porém, pelos motivos supra referidos, não se acolheu tal posição, pois, a
alínea c), do citado artigo 119º, refere-se a uma situação bem diferente, isto
é, “à ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a
respectiva comparência”.
Em suma, a notificação do despacho que revogue a suspensão da execução da pena
de prisão deve ser feita por contacto pessoal ou por carta registada com aviso
de recepção; a notificação do mesmo despacho por via postal simples com prova de
depósito constitui mera irregularidade que, não sendo arguida dentro do prazo
previsto no artigo 123º, nº 1, do C. P. Penal, fica sanada.
Fica, em consequência, prejudicado o conhecimento da segunda questão levantada
pelo arguido e rejeita-se o recurso, por ter sido interposto fora de tempo, nos
termos do disposto nos artigos 414º, nº 2 e 420º, nº 1, ambos do C. P. Penal.”
O recorrente pediu a aclaração deste acórdão nos seguintes termos:
I. Em 13 de Junho de 2006 o Recorrente foi notificado no estabelecimento
prisional do Porto, onde à data se encontrava detido, do douto acórdão que o
condenou na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, da decisão proferida em
03/04/2006 que revogou a suspensão da execução da pena em que foi condenado
(fls. 588) e da liquidação da pena a cumprir (fls. 603 a 606), conforme
notificação junta aos autos.
II. À excepção do douto acórdão condenatório, o Recorrente jamais tinha tomado
conhecimento de tais decisões até tal momento.
III. Inconformado com tal decisão que lhe revogou a suspensão da execução
da pena em que havia sido condenado (douta decisão de fls. 588), interpôs
recurso da mesma, alegando, nomeadamente, a tempestividade do seu recurso, em
virtude da nulidade tempestivamente arguida — decorrente da ausência de
notificação pessoal da decisão aludida, que revogou a suspensão da execução da
pena de prisão e, consequentemente, ordenou a emissão de mandados de detenção do
Recorrente.
IV. Em face de tal nulidade, conclui-se que o ora Recorrente apenas teve
conhecimento da decisão em crise em 13 de Junho de 2006, por notificação pessoal
no estabelecimento prisional, data a partir da qual pôde dispor do prazo
legalmente conferido para reagir à mesma, o que fez através do recurso
apresentando em 29/6/2006.
V. Conforme decidido no Acórdão da Relação do Porto, proferido em
18/10/2006, citado no acórdão ora em apreço “da conjugação das normas contidas
no nº3 do artº 113º e nº2 do artº 196º ambos do C. P. Penal, parece resultar que
a notificação por via postal simples, a que alude a alínea c) do nº 1 do artº
113º só deverá ser utilizada após ter sido prestado pelo arguido termo de
identidade e residência em que declare a morada para onde pretende ser
notificado, presumindo-se efectuadas as notificações por via postal simples
remetidas para a morada ali indicada e só essas.
Nas demais situações, deverá o arguido ser notjficado por contacto pessoal ou
por carta registada com aviso de recepção, as únicas que asseguram a sua
efectivação”.
VI. Em conformidade, decidiu o douto acórdão em questão que a notificação
do despacho que revogue a suspensão da execução da pena de prisão deve ser feita
por contacto pessoal ou por carta registada com aviso de recepção.
VII. Não obstante, decidiu que “as notificações feitas ao arguido por via
postal simples antes de ter prestado o termo de identidade e residência, ou,
como no caso concreto, depois de esta medida de coacção carecer de qualquer
efeito, em virtude do disposto no artigo 214º, nº 1, al. e) do Cód. Processo
Penal são irregulares”.
VIII. Ora, é certo que a notificação ao arguido terá que ser efectuada
pessoalmente. O próprio Tribunal Constitucional debruçou-se já sobre a questão
das formalidades necessárias à notificação da sentença ao arguido, tendo em
conta as exigências decorrentes da protecção constitucional do direito de defesa
do arguido (art. 32º, nº 1 CRP), tendo concluído pela imperatividade da sentença
ser notificada pessoalmente ao arguido — vide, inter alia, Ac. TC nº 429/03,
publicado no DR II Série de 21/11/03.
IX. No Ac. do S.T.J. de 04/10/2006 proferido no processo nº 06P2048
disponível in www.dgsi.pt decidiu-se ainda que “(...) A falta de notificação
para o julgamento assume relevo processual intransponível, pois, não sendo caso
de realização do julgamento na ausência do arguido ao abrigo do art. 333.º, n.º
1, do CPP, dado que aquele não se encontrava notificado, a sua presença na
audiência era obrigatória, por força do disposto no art. 332.º n.º 1, do mesmo
diploma legal, sendo cometida a nulidade insanável prevista no art. 119.º, al
c), do CPP — ausência do arguido ou do seu defensor nos casos em que a
respectiva comparência é obrigatória —, que no caso conduz à anulação do
julgamento efectuado em 1ª instância, nulidade que deve ser declarada
oficiosamente em qualquer altura do processo (art. 119. º, n.º 1, do referido
diploma legal). IV - Este regime está de harmonia com a consagração dos direitos
de defesa do arguido contemplada no art. 32.º da CRP”
X. Donde se conclui, a contrario que a não observância do dito regime — falta
de notificação do arguido em virtude da notificação por via postal simples —
viola o disposto no artº 32º da Constituição da República Portuguesa por não
acautelar devidamente a garantia dos direitos de defesa do arguido, o que desde
já se arguiu para todos os devidos e legais efeitos.
XI. Ora, o art. 119º, al. c) do Código de Processo Penal dispõe que:
“constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em
qualquer fase do procedimento, além das que, como tal forem cominadas em outras
disposições legais: (...) e) a ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos
em que a lei exigir a respectiva comparência (...)”.
XII. Conforme se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de
07/06/2006 “se no artigo 113, n.º 9, se exige a notificação pessoal do arguido
em casos de aplicação de medidas de coacção, bem se compreende que as mesmas
razões, até com maior acuidade, dado que se trata de uma pena de prisão a
cumprir, levem a que o despacho de revogação da suspensão de execução de uma
pena de prisão tenha de ser notificada ao arguido de igual forma, não se
bastando a lei com a simples notificação de tal despacho ao seu defensor. Dado
que no caso em apreço apenas se procedeu à notificação de tal despacho ao
defensor do arguido, nos termos expostos, tudo se passa como se verifique a
falta do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva
comparência, o que constitui a nulidade prevista no artigo 119.º al c), do CPP a
qual rode ser, em qualquer fase do procedimento oficiosamente declarada, de
acordo com o disposto no corpo do artigo 119º ora citado. Consequentemente, não
pode ter-se por bastante a forma de notificação utilizada nos autos para dar a
conhecer ao ora recorrente o teor do despacho que lhe revogou a suspensão da
execução da pena de prisão que lhe fora aplicada (...)” — sublinhado nosso.
XIII. Parece, pois, claro ao Recorrente que a falta da notificação da decisão
que lhe revogou a suspensão da execução da pena de prisão em que havia sido
condenado, constitui a nulidade prevista no art. 119.º, al. c) do Cód. de
Processo Penal.
XIV. Na verdade, atento o supra exposto, deveria o douto Tribunal “a quo”
ordenar que se diligenciasse, de todas as formas possíveis, para que o
Recorrente fosse notificado pessoalmente da decisão em crise, a única que
forneceria garantias de efectivo conhecimento por parte do Recorrente da decisão
de revogação da suspensão de execução da pena de prisão.
XV. In casu foi omitido um acto ou formalidade que a lei prescreve, isto é, a
notificação ao Recorrente de uma decisão que lhe era desfavorável e que coloca
em causa a sua liberdade, tendo resultado na sua actual prisão, influindo a
nulidade cometida, no exame e decisão da causa.
XVI. Salvo o devido respeito por melhor opinião, não parece curial decidir-se
que, por um lado, a notificação do despacho que revoga a suspensão da execução
da pena de prisão deve ser feita por contacto pessoal ou por carta registada com
aviso de recepção e, por outro, considerar que tal falta, cometida pelo Tribunal
“a quo”, consubstancia mera irregularidade, sanada por não ter sido arguida
dentro do prazo previsto no art. 123º, nº 1 do Cód. Processo Penal.
XVII. É que, salvo o devido respeito, estão em causa os
mais elementares direitos de defesa do arguido, devendo salvaguardar-se,
nomeadamente, o seu direito à liberdade e ao recurso de decisões que contra si
sejam desfavoráveis, direitos protegidos constitucionalmente — art. 32º da
C.R.P.
XVIII. Estamos, pois, perante uma falta maior “, que afecta a
liberdade do Recorrente, e que de modo algum pode ser consubstanciada como uma
mera irregularidade, sanável pelo decurso do tempo.
XIX. Sucede que, não prescindindo do exposto, sempre se dirá que no Acórdão
dessa Relação do Porto de 21/6/2006, proferido no processo nº 0642778 disponível
in wvw.dgsi.pt decidiu-se mesmo pela inexistência do acto, numa situação de
notificação por via postal simples a um arguido que não prestou termo de
identidade e residência.
XX. Conforme se entendeu no douto acórdão que ora se pretende aclarar, o
T.I.R. prestado pelo Recorrente, no momento em que foi proferida a decisão em
recurso (fls. 588), carecia de qualquer efeito, em virtude do disposto o art.
214º, nº 1, al. e) do Cód. Processo Penal
XXI. De harmonia com o explanado no citado Ac. Relação do Porto de 21/06/2006:
“(...) questão central é a de saber-se se uma notificação efectuada através de
via postal simples prova de depósito a arguido que não prestou termo de
identidade é ou não válida para efeitos do disposto na alínea b) do nº 1 do
artigo 121º do Código Penal As regras gerais das notificações encontram-se
definidas no artigo 113º do CPP (...) O funcionamento legal e regular das
notificações dos arguidos através de postal simples com prova de depósito obriga
a que os notificados tenham prestado termo de identidade e residência nos termos
enunciados no artigo 196º do Código de Processo Penal, caso contrário a
notificação do arguido tem de se efectuar, nos termos legalmente prescritos, a
saber: contacto pessoal e via postal registada (alíneas a) e b) do nº 1 do
artigo 113º do CPP). (...) O artigo 118º do Código de Processo Penal consagra o
princípio da legalidade relativamente às nulidades dos actos processuais. Para
que um determinado acto processual padeça do vício da nulidade é necessário que
a lei tipifique como tal. As nulidades estão tipificadas nos artigos 119º e 120º
do Código de Processo Penal, concluindo-se que o legislador teve o cuidado de
tipificar como nulidade dependente de arguição a falta de notificação do
assistente e parte civis, nos casos em que a lei exigir a sua comparência, mas
nem uma nem outra norma tipificam como nulidade a falta de notificação do
arguido, mas antes a sua ausência nos casos previstos por lei (alínea c) do
artigo 119º e 332º, ambos do CPP). Se bem se entende o raciocínio do Digno
Procurador Adjunto efectuada uma notificação ao arrepio do expressamente
consagrado na lei, embora se tratasse de uma notificação irregular, tal
irregularidade deveria ser arguida pelo interessado. Com todo o respeito, não
partilhamos este entendimento. Desde logo, porque ao contrário do explanado na
motivação de recurso, não estamos em presença de um acto irregular — artigo 123º
do CPP — mas sim em presença de um acto inexistente, por lhe faltar um elemento
central e essencial à sua própria substância — ter o arguido prestado termo de
identidade e residência — daí que não possa em caso algum produzir efeitos
jurídicos [Sobre o vício da inexistência — Exmo. Cons. Maia Gonçalves, Código de
Processo penal Anotado, 15º edição, pág. 2941. A função da categoria dos actos
inexistentes e a de ultrapassar a barreira da tipicidade das nulidades e da sua
sanacão, através por exemplo, do caso julgado: a inexistência é insanável. A
inexistência jurídica de um acto tem de ser demarcada em função das nulidades,
ou seja, os vícios que geram a inexistência hão-de ser mais graves que aqueles
que determinam a nulidade [Sr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo
Penal, II, págs. 75/76]. Partindo destes ensinamentos, não podemos deixar de
concluir que sancionando a lei com “nulidade insanável” a ausência do arguido,
nos casos em que a lei exija a sua comparência — alínea c) do n.º 1 do artigo
119º do CPP [Como por exemplo nos termos do disposto no artigo 332º do CPP. A
lei só dispensa a presença do arguido desde que verificadas duas condições: a
1.ª é que esteja] — por maioria de razão deve ser sancionada com a inexistência
a notificação de uma pessoa efectuada nos termos do disposto na alínea e) do nº
1 do artigo 113º do CPP, sem que tivesse sido constituído arguido e,
consequentemente, sem ter prestado termo de identidade e residência. A
modalidade de notificação por via postal simples, não constitui uma modalidade
alternativa de notificação, mas sim uma modalidade autónoma e obrigatória de
notificação para as situações expressamente previstas na lei parecer do Conselho
Consultivo da PGR de 22.11.2001, DR II Série de 8.2.2002], o que manifestamente
não ocorre no caso em apreço” — sublinhado nosso.
XXII. Assim, a não se entender que a situação em apreço
nos autos, configura nulidade insanável — o que não se concede e apenas por
hipótese se equaciona — sempre a notificação efectuada ao Recorrente por via
postal simples padeceria do vício de inexistência jurídica, com todas as
consequências legais daí decorrentes.
XXIII. A este propósito vejamos também o Ac. Tribunal da
Relação de Guimarães, de 18/9/2006, proferido no processo nº 1055/06-1,
disponível in www.dgsi.pt …)
XXIV. Sublinhe-se que o douto Acórdão do Tribunal
Constitucional, de 17 de Agosto de 2005, in DR, II.ª Série, n.º 183, de 22 de
Setembro de 2005, pág. 13.750 sanciona mesmo com a inconstitucionalidade a
notificação por via postal para a morada constante do TIR, quando tal medida de
coacção já se mostra extinta.
XXV. Ora, é patente que a falta cometida tem que ser
considerada como um vício maior, pois que afecta gravemente os direitos legais e
constitucionalmente protegidos do arguido.”
Por acórdão de 13 de Junho de 2007, a Relação indeferiu a reclamação, relevando
do teor da decisão, para a resolução da questão ora submetida a juízo, a
seguinte fundamentação:
“O arguido A. vem pedir a aclaração do acórdão, porém, insistindo na ideia de
que «apenas teve conhecimento da decisão em crise, em 13 de Junho de 2006, por
notificação pessoal no estabelecimento prisional, data a partir da qual pôde
dispor do prazo legalmente conferido para reagir à mesma, o que fez através do
recurso apresentado em 29.6.2006».
Como claramente resulta do acórdão (fls 5), a notificação foi efectuada ao
arguido e ao anterior mandatário deste: «o referido despacho foi notificado ao
arguido, no dia 7.4.2006, por via postal simples com prova de depósito, e ao
então mandatário daquele, na mesma data, por via postal registada, conforme tudo
se alcança de fls. 590 a 592».
Aliás, o recorrente denota ter interpretado e entendido bem o acórdão, como se
vê, designadamente, do ponto XVI, quando refere que «não parece curial
decidir-se que, por um lado, a notificação do despacho que revoga a suspensão da
execução da pena deve ser feita por contacto pessoal ou por carta registada com
aviso de recepção e, por outro, considerar que tal falta, cometida pelo tribunal
“a quo” consubstancia mera irregularidade, sanada, por não ter sido arguida
dentro do prazo previsto no artigo 123º, nº 1, do C. P. Penal».
Quanto a este aspecto, refere o acórdão que «as notificações feitas ao arguido
por via postal simples antes de ter prestado o termo de identidade e residência
ou, como no caso concreto, depois de esta medida de coacção carecer já de
qualquer efeito, em virtude do disposto no artigo 214º, nº 1, alínea e), do C.
P. Penal, são irregulares.
Tais notificações são irregulares e não nulas, pois, apenas se prevê a nulidade
dependente de arguição relativamente à falta de notificação do assistente e das
partes civis, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência. Nesses
casos, a falta de notificação constitui nulidade dependente de arguição, que
ficará sanada se, não obstante a falta de notificação, a pessoa interessada
comparecer ou renunciar a comparecer ao acto, salvo se comparecer apenas com a
intenção de arguir a nulidade — artigo 121.º nº 2 e 3, do C. P. Penal.
Nos demais casos, a falta de notificação constitui, em geral, mera
irregularidade. cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, pág.
66 e 67.
Continuamos a entender que esta é a posição correcta e que deve ser mantida.
O arguido/recorrente também afirma que o acórdão não ponderou se a notificação
em apreço pode ou não ser considerada como juridicamente inexistente.
Mas não é verdade, pois, o acórdão expressamente refere que nenhuma norma legal
existe que sancione o acto de notificação por modalidade diversa da prevista na
lei ou com inobservância de formalidades legais com a figura da inexistência
jurídica, nem tão pouco com a nulidade.
No que se refere à tese defendida pelo acórdão desta Relação, de 7.6.2006, in
www.dgsi.pt, já referimos que a mesma não pode ser acolhida, pois, a alínea c),
do citado artigo 119º, refere-se a uma situação bem diferente, isto é, “à
ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a
respectiva comparência”.
A nulidade prevista na alínea c), do citado artigo 119º, do C. P. Penal,
verifica-se, por exemplo, quando um arguido preso não comparece à audiência de
julgamento, na qual foram inquiridas testemunhas indicadas pela acusação, por
ter sido omitida a sua notificação, nos termos do artigo 114º, nº 1, do mesmo
diploma legal.
Finalmente, o recorrente parece querer invocar a violação de direitos protegidos
constitucionalmente protegidos, invocando o artigo 32º, da CRP.
No recurso não foi invocada a inconstitucionalidade da decisão ou de qualquer
norma legal e, portanto, sobre tal questão nada há a esclarecer, dado que, nem o
acórdão sobre ela se pronunciou, nem o recorrente, agora, a pode levantar.”
É deste acórdão que A. recorreu para o Tribunal Constitucional.
5.
5.1. Tal como se disse na decisão sumária reclamada, o recorrente não suscitou
atempadamente a questão de inconstitucionalidade que quer discutir neste seu
recurso.
De facto, é pressuposto, entre outros, do recurso de constitucionalidade
interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC que
a questão de constitucionalidade em apreço tenha sido atempadamente suscitada
durante o processo (artigo 70.º, n.º 2 da LTC e 280.º, n.º 4 da Constituição da
República) de modo a que o tribunal recorrido – no caso a Relação do Porto –
dela pudesse conhecer antes de esgotado o seu poder jurisdicional.
Como se pode constatar, quando o recorrente interpôs recurso da sentença
proferida pela 1ª instância para o Tribunal da Relação, não suscitou qualquer
questão de inconstitucionalidade de natureza normativa, embora já fosse possível
fazê-lo, pois aborda, como tema central do seu recurso, a questão da nulidade da
notificação efectuada do despacho de fls. 588, por via postal simples com prova
de depósito, prevista no artigo 119.º alínea c) e 120.º do Código de Processo
Penal. Todavia, ao contrário do que sustenta na reclamação, em passo algum da
sua alegação suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade de natureza
normativa, tal como é exigido no recurso interposto ao abrigo da citada alínea
b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC.
5.2. É certo que no pedido de aclaração o recorrente refere-se à questão de
inconstitucionalidade que pretende ver apreciada. Contudo, como este Tribunal
também já repetidamente tem afirmado, o pedido de aclaração da decisão ou a
arguição de nulidades desta não constituem, em resultado da natureza desses
meios processuais, momento atempado e via idónea para equacionar
supervenientemente problemas de inconstitucionalidade de normas aplicadas na
decisão recorrida, por não ser então já possível ao tribunal recorrido apreciar
questões novas, anteriormente não suscitadas ao tribunal – ver, por todos, os
Acórdãos n.ºs 51/04, 269/04, 305/05 609/06, (disponíveis em
www.tribunalconstitucional.pt), sendo certo que o acórdão que recaiu sobre a
aclaração, indeferindo-a, não assumiu, como ratio decidendi, as normas
questionadas pelo recorrente.
III.
Decisão
6. Em face do exposto, indefere-se a presente reclamação.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 13 de Fevereiro de 2008
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão