Imprimir acórdão
Processo n.º 601/07
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da
Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro:
“1. Num recurso para uniformização de jurisprudência, pendente no Pleno da
Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, no
âmbito de um procedimento cautelar, o recorrente A. foi notificado, para se
pronunciar sobre o pedido da sua condenação como litigante de má fé, apresentado
nas contra-alegações do contra-interessado B. [ corrigido já o lapso na
indicação do nome, pelo despacho de fls 927 ]. O recorrente reclamou para a
conferência do segmento do despacho da Exma. Conselheira Relatora que ordenou
essa notificação (cfr. despacho de 17/11/06 – fls. 824v).
A reclamação foi indeferida por acórdão de 29 de Março de 2007, com a seguinte
fundamentação:
“(…)
2. Sem vistos, cumpre decidir.
Como resulta do antecedente relato, sustenta-se na presente reclamação que o
despacho da Relatora (transcrito em 1.3) que ordenou a notificação ao Recorrente
para, querendo, se pronunciar sobre o pedido de condenação como litigante de
má-fé, formulado pelo contra-interessado B., não devia ter sido ordenada antes
de ser proferido acórdão no presente recurso para uniformização de
jurisprudência, dada a natureza urgente do processo.
No entender do reclamante, tal despacho era desnecessário no momento processual
em que foi proferido, pois, alega, só deveria ser ouvido após o decretamento das
providências requeridas.
O despacho reclamado teria violado os preceitos e princípios constitucionais
constantes do requerimento referenciado em 1.4, designadamente, os art.ºs 131.º
nº 3 do CPTA, 1º, 3º, n.º 3 e 137.º ambos do C. P. Civil, 2.º, 3.º, 20.º, n.º
4.º e n.º 5 e 268.º, n.º 4 todos da C.R.P.
Não tem, como se afigura evidente, qualquer razão.
Efectivamente:
Dispõe o art.º 456.º do C. P. Civil:
“Artigo 456°
(Responsabilidade no caso de má-fé – Noção de má-fé)
1. Tendo litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização
à parte contrária, se esta a pedir.
2. Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia
ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a
decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente
reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da
verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o
trânsito em julgado da decisão.
3. Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido
recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má-fé.”
Conforme o Tribunal Constitucional se pronunciou, por diversas vezes, a
interpretação, conforme à Constituição da República Portuguesa, do art.º 456.º
do Código do Processo Civil, respeitante à condenação como litigante de má-fé,
pressupõe a prévia audição do interessado, em termos de este poder alegar o que
tiver por conveniente sobre uma possível condenação (v. entre outros, acºs do T.
Constitucional de 7.6.94, P. 510/92, in B.M.J. 438, pág 84 e segs e ac. de
12.5.98, no Processo 24.971 do Pleno da ia secção deste STA, citado no acórdão
de 5.6.00, in AD 466, pág 1302 e segs).
Na mesma linha de entendimento, pode ler-se no sumário da secção do contencioso
administrativo, de 30.1.02. rec. 47.301: «Por obediência ao princípio do
contraditório, a decisão de condenação como litigante de má-fé, pressupõe,
obrigatoriamente, a prévia audição do visado sobre essa requerida ou previsível
condenação»
Ora, como linearmente resulta do preceituado no citado art.º 456.º do C. P.
Civil, o juízo sobre a violação do dever de probidade imposto às partes, em que
se traduz, afinal, a má-fé processual, não deve ser desligado da análise da
pretensão deduzida em juízo, não fazendo sentido, designadamente, apreciar, o
pedido de condenação como litigante de má-fé a que se fez referência em 1.2 do
presente aresto – e, consequentemente, ordenar a notificação do interessado para
se pronunciar sobre esse pedido – após a prolação da decisão final do recurso.
A circunstância de, na origem do presente recurso para uniformização de
jurisprudência, estar em causa um pedido formulado como urgente, em nada altera
os dados e solução da questão em debate.
Na verdade, nada há na lei ou nos princípios constitucionais, designadamente nos
que são apontados como infringidos pelo reclamante, que imponha uma orientação
diferente da que foi seguida no despacho reclamado, que não foram, pois,
violadas.
3. Nos termos expostos, face à legalidade do despacho reclamado, acordam em
indeferir a presente reclamação e confirmar o despacho de fls. 824 v.º.”
2. O recorrente interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional,
ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro.
Identifica a norma cuja inconstitucionalidade quer ver apreciada e as normas e
princípios constitucionais violados nos seguintes termos:
“(..)
18°.
O Recorrente pretende ver apreciada pelo T.C. a inconstitucionalidade da norma
extraída do n.º 3 do artigo 3.º do C. P. Civil em conjugação com a norma
extraída do n.º 3 do artigo 131.º do CPTA, na interpretação aplicada no Acórdão
Recorrido, segundo a qual na instância de recurso para uniformização de
jurisprudência interposto por / oposição de julgados para decidir qual seja o
Tribunal competente para apreciar providências cautelares requeridas ao abrigo
das normas constantes do artigo 131.º do CPTA, é evidente que o momento para
ordenar a notificação do Recorrente para ser ouvido pelo tribunal no exercício
do contraditório para decidir o incidente de litigância de má fé suscitado na
instância de recurso é antes e não depois de se proferir Acórdão que, para além
de decidir o Recurso interposto para uniformização de jurisprudência nos termos
requeridos pelo Recorrente, decretar também as providências requeridas na P. I.
Reclamadas em reclamação para a conferência, porque, como linearmente resulta do
preceituado no artigo 456.º do C. P. Civil, o juízo sobre a violação do dever de
probidade imposto às partes, em que se traduz, afinal, a má fé processual, não
deve ser desligado da pretensão deduzida em juízo, não fazendo sentido,
designadamente, apreciar, o pedido de condenação como litigante de má fé ( ... )
– e, consequentemente, ordenar a notificação do interessado para se pronunciar
sobre esse pedido – após a prolação da decisão final do recurso, sendo que, a
circunstância de na origem do recurso para uniformização de jurisprudência estar
um pedido formulado como urgente, in casu formulado em Procedimento Cautelar ao
abrigo das normas constantes do artigo 131.º do CPTA, em nada altera os dados e
a solução da questão em debate, pois, na verdade nada há na lei ou nos
princípios constitucionais, designadamente nos apontados como infringidos pelo
reclamante, que imponha uma orientação diferente da que foi seguida no despacho
reclamado,
19.º
Tal interpretação, aplicada no acórdão de 29/03/2007, viola o princípio do
contraditório, constante do disposto no n.º 5 do artigo 32.º da CRP, viola os
direitos de acesso ao direito, à plena efectividade da tutela jurisdicional, à
decisão em prazo razoável, à justiça material mediante processo justo e
equitativo, viola o princípio constitucional da proporcionalidade, o direito à
fundamentação do Acórdão de 29/03/2007 na forma expressa prevista na lei, viola
a confiança, a certeza e segurança jurídicas, viola o direito à celeridade e
prioridade, viola o princípio da proibição da prolação de decisões
jurisdicionais parciais, bem como o direito a obter as adequadas providências
requeridas, constantes da P. I. e Reclamadas, em conformidade com as normas
constantes do artigo 131.º do CPTA e, assim, viola o direito de igualdade no
acesso ao exercício das funções de presidente do Conselho de Administração do
Hospital, sem discriminação negativa, por proibida, no mesmo acesso, por forma a
assegurar o efeito útil da decisão final a proferir no Processo do qual depende
o Procedimento Cautelar, enfim, viola a regra do contraditório, viola o direito
ao processo administrativo em bom ordenamento processual, viola a lei, viola a
igualdade perante a lei
20.º
Assim, violando as normas, princípios e direitos constantes dos artigos 1.º,
2.º, 3.º, 18.º, 20, n.º 1, n.º 4 e n.º 5, 32.º, n.º 5, 48.º, n.º 2, 50.º, n.º 1,
205.º, n.º 1, 268.º, n.º 4, entre outros preceitos constitucionais,
(…).”
3. Importa começar por recordar que, no sistema português de fiscalização de
constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Constitucional se
restringe ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das
questões de desconformidade constitucional imputada a normas jurídicas (ou a
interpretações normativas, hipótese em que o recorrente deve indicar, com
clareza e precisão, qual o sentido da interpretação que reputa
inconstitucional), e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas
directamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas.
A distinção entre os casos em que a inconstitucionalidade é imputada a
interpretação normativa daqueles em que é imputada directamente a decisão
judicial radica em que na primeira hipótese é discernível na decisão recorrida
a adopção de um critério normativo (ao qual depois se subsume o caso concreto
em apreço), com carácter de generalidade, e, por isso, susceptível de
aplicação a outras situações, enquanto na segunda hipótese está em causa a
aplicação dos critérios normativos tidos por relevantes às particularidades do
caso concreto.
Ora, a enunciação do objecto do recurso a que o recorrente procede (n.º 18 do
requerimento de interposição) não é mais do que a transcrição da fundamentação
de direito do acórdão recorrido, com ligeiras adaptações, não se diferenciando
da concreta ponderação das particularidades do caso efectuada pelo acórdão
recorrido. O juízo de desconformidade à Constituição que se pede ao Tribunal
Constitucional não respeita a um acto normativo (ainda que em determinada
interpretação mediatizada pela decisão recorrida mas sempre susceptível de
generalização), mas ao acto judicial, na concreta ponderação entre a observância
do contraditório sobre uma questão que entendeu competir-lhe resolver e a
alegada urgência no decretamento provisório da providência cautelar.
Consequentemente, face ao disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 280.º da
Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o recurso não pode
prosseguir porque não tem objecto idóneo.
4. Aliás, um outro obstáculo ao conhecimento do objecto do recurso se coloca e
que resulta de o recorrente não ter suscitado a questão de constitucionalidade,
como questão de constitucionalidade normativa, perante o tribunal que proferiu a
decisão recorrida (n.º 2 do artigo 72.º da LTC).
Na verdade, o que o recorrente alegou na reclamação para a conferência foi que
(n.º 12.º do requerimento de fls. 832):
“(…)
Aplicar a norma constante do artigo 3.º, n.º 3, do C.P. Civil, quando devia ter
sido aplicado o artigo 131.º, n.º 3, do CPTA – como in casu sucedeu no aqui
reclamado segmento do despacho de 17/11/2006, por todos os fundamentos expostos
supra – não se conforma com o princípio da legalidade, com direito à decisão
jurisdicional em prazo razoável, com o princípio da celeridade, com o princípio
da prioridade, com o direito do Recorrente à plena tutela jurisdicional
efectiva, isto é, com o direito às Providências cautelares adequadas requeridas,
princípios e direitos constantes dos artigos 2.º, 3.º, 20.º, n.º 4 e n.º 5, e
268.º, n.º 4, todos da CRP, o que aqui vai arguido para os legais efeitos,
designadamente os previstos nos artigos 280.º, n.º 1, alínea b) da CRP e 70.º,
n.º 1, alínea b) da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro devendo, em consequência, o
STA anular o aqui reclamado segmento do despacho de 17/11/2006, com as legais
consequências.”
Com este modo de suscitar a questão, apesar do protesto ou ressalva contida na
parte final quanto aos preceitos relativos ao recurso de fiscalização concreta
de constitucionalidade, não se colocou o tribunal da causa perante a necessidade
de resolver uma questão de constitucionalidade reportada a uma norma jurídica,
isto é, perante o dever processual de ponderar a recusa de aplicação com
fundamento em inconstitucionalidade, na solução do problema processual que lhe
era submetido, a uma norma precisamente identificada no uso do poder-dever
conferido pelo artigo 204.º da Constituição, mas perante uma questão de escolha
entre o comando de duas normas infra-constitucionais na sequência de actos
relativos à tramitação concreta do processo. A afronta a normas ou princípios
constitucionais que se censurava ao despacho reclamado resultava de neste se ter
optado por notificá-lo para o exercício do contraditório sobre a acusação de
litigância de má fé, em vez de se ter passado ao decretamento imediato das
providências. E foi, aliás, como questão de ponderação concreta entre o
princípio do contraditório e o da concentração da decisão, por um lado, e o da
celeridade na tramitação da providência cautelar, por outro, que a alegação foi
interpretada pelo acórdão recorrido.
Assim, também o facto de não ter sido suscitada a questão de constitucionalidade
de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão
recorrida obsta ao conhecimento do recurso.
5. Decisão
Pelo exposto, no uso dos poderes consagrados pelo n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC,
decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso e condenar o recorrente
nas custas, fixando a taxa de justiça em 8 (oito) unidades de conta.”
2. O recorrente reclamou desta decisão, ao abrigo do n.º 3 do
artigo 78.º-A da LTC, os termos seguintes:
“ [….]
6º
Já quando no identificado segmento se refere que o pedido da condenação do
Recorrente, como litigante de má fé foi apresentado nas contra-alegações do
contra interessado, entende o Recorrente que aí já não se trata de um lapso mas
de um juízo, respeitante à matéria de facto, contido no despacho reclamado
7º
Na verdade em nenhum local dos autos – maxime quer no despacho proferido no STA
em 17/11/2006, que ordenou a notificação ao Recorrente para se pronunciar sobre
a questão de má fé, quer no Acórdão proferido pelo STA em 29/03/2007 — se contem
ou se decidiu que o pedido de má fé foi apresentada nas contra‑alegações do
interessado
8º
No STA nunca foi discutido, maxime pelo Recorrente, aqui Reclamante, e, em
consequência, nunca foi decidido, se o contra-interessado B. apresentou
contra-alegações ou se não as apresentou
9º
Mas o T C, na decisão sumária, já inovou quando aí decidiu, ainda que só
implicitamente, que o mencionado pedido foi feito nas contra-alegações do
contra-interessado, por isso que o T. C., na decisão, aqui reclamada, emitiu
pronuncia sobre questão da qual não podia ter tomado conhecimento, o que faz
nula, neste aspecto, a decisão sumária reclamada, nos termos previstos no último
segmento da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do C. P. Civil
10º
A nulidade em referência, que foi cometida, deve ser declarada pelo T. C, em
conferência, porquanto a questão em análise não é uma questão académica sem
qualquer utilidade prática nos Autos,
11º
Inversamente, existe utilidade e muita porquanto – porque nenhuma dúvida existe
que a decisão em referência inovou relativamente ao decidido antes no STA – a
ser reconhecido – e o Reclamante entende que deve ser reconhecido – em
conferência que o T. C. não deve dar por verificado que foi decidido no STA que
o pedido de litigante de má fé foi apresentado nas contra-alegações do
contra-interessado, então, não devia constar tal afirmação da matéria de facto
constante da decisão reclamada
12º
Isto porque, as decisões proferidas pelo T. C., mesmo quando não se conheça do
recurso de constitucionalidade, constituem caso julgado que as instâncias terão
depois que obrigatoriamente observar para cumprimento cabal da decisão do T.C.
13º
Ora na decisão sumária reclamada, foi decidido, inovatoriamente, ainda que só
implicitamente, que o pedido de condenação do Recorrente foi apresentado nas
contra-alegações do contra-interessado, quando esse não foi o objecto do pedido
que o aqui Reclamante fez no Recurso que interpôs para o T.C., por isso que,
também por este motivo, foi o Recorrente, na decisão sumária, condenado em mais
e em objecto djferente do pedido, o que faz a decisão aqui reclamada nula nos
termos previstos na alínea e) do n.º 1 do artigo 668.º do C. P. Civil, aplicável
ex vi da Lei do T. C.
14º
Deve, em consequência, o T.C., nesta parte, declarar a nulidade da decisão
sumária, nos termos previstos no artigo 668.º, n.º 1, alíneas d) e e)
15º
Contem-se em 1., na decisão sumária, que (transcreve-se «o recurso não pode
prosseguir porque não tem objecto idóneo»
16º
Para assim decidir foi entendido, na decisão sumária, que «a enunciação do
objecto do recurso a que o recorrente procede (n.º 18 do requerimento de
interposição) não é mais do que a transcrição da fundamentação de direito do
acórdão recorrido, com ligeiras adaptações, não se diferenciando da concreta
ponderação das particularidades do caso efectuada pelo acórdão recorrido, O
juízo de desconformidade à Constituição que se pede ao Tribunal Constitucional
não respeita a acto normativo (ainda que em determinada interpretação
mediatizada pela decisão recorrida mas sempre susceptível de generalização), mas
ao acto judicial, na concreta ponderação entre a observância do contraditório
sobre uma questão que entendeu competir-lhe resolver e a alegada urgência no
decretamento provisório da providência cautelar»
17º
Ora, também neste aspecto o reclamante discorda da decisão sumária porquanto:
18º
Primeiro, se o requerimento de interposição de recurso para o T.C. não
satisfazia os requisitos legais, maxime quanto à identificação do objecto do
recurso, então, devia o Meritíssimo Relator ter convidado o Recorrente nos
termos e com os efeitos previstos no n.º 6 do artigo 75.º – A da Lei do T. C.
19º
Na verdade o artigo 75.º – A da Lei do T.C. dispõe, no n.º 5, que «Se o
requerimento de interposição do recurso não indicar algum dos elementos
previstos no presente artigo, o juiz convidará o requerente a prestar essa
indicação no prazo de 10 dias» e, no n.º 6, que «O disposto nos números
anteriores é aplicável pelo relator no Tribunal Constitucional, quando o juiz ou
o relator que admitiu o recurso de constitucionalidade não tiver feito o convite
referido no n.º 5.»
20º
Ora, ao recorrente não foi feito o mencionado convite e inexiste qualquer motivo
razoável para a inexistência do mesmo,
21º
Porquanto, dado que a lei do T. C. prevê, no n.º 5 do artigo 75.º – A, que
quando não são indicados os elementos previstos no mesmo artigo deve ser feito o
convite, então, por maioria de razão, também quando os elementos foram indicados
mas sem satisfazer totalmente os requisitos legais deve o Recorrente ser
convidado para corrigir o seu requerimento
22º
O que no caso dos autos não sucedeu, por isso que foram violados os n.º 5 e 6 do
artigo 75º – A da Lei do T.C., devendo ser anulada decisão reclamada
Pelo que precede,
23°.
O reclamante corrige aqui, neste aspecto o requerimento de interposição do
Recurso esclarecendo que
«pretende ver apreciada pelo T.C. a inconstitucionalidade da norma extraída do
n.º 3 do artigo 3.º do C. P. Civil em conjugação com a norma extraída do n.º 3
do artigo 131.º do CPTA, na interpretação segundo a qual na instância de recurso
para uniformização de jurisprudência interposto por oposição de julgados para
decidir qual seja o Tribunal competente para apreciar providências cautelares
requeridas ao abrigo das normas constantes do artigo 131.º do CPTA, o momento
ordenar a notificação do Recorrente para ser ouvido pelo tribunal no exercício
do contraditório para decidir o incidente de litigância de má fé suscitado na
instância de recurso é antes e não depois de decidir, mediante Acórdão, o
Recurso interposto para uniformização de jurisprudência»
24º
Como se vê o Reclamante cortou parte do indicado no requerimento de interposição
do recurso
25º
E não é obrigado a cortar mais quando concorda com os termos concretos usados no
Acórdão do STA
26º
O Recorrente, com o devido respeito, não é obrigado é inovar termos, até porque,
perante mais termos novos que o recorrente porventura tivesse elegido ou viesse
a eleger, e porque é consabido que, em tese, perante determinada palavra ou
frase, o mesmo conteúdo linguístico é sempre susceptível de interpretações
diversas, o recorrente corria o risco de depois o T. C. vir dizer que não foi
esse o sentido da norma aplicada no acórdão recorrido,
27º
Assim indicado, como acima explicitado, o objecto do recurso é idóneo
28º
Assim – ao inverso do que aparentava o recurso interposto para o T.C. – já não é
imputada qualquer inconstitucionalidade directamente à decisão recorrida em si
mesmo considerada
29º
Contem-se também na decisão reclamada que «o juízo de desconformidade à
Constituição que se pede ao Tribunal Constitucional não respeita a acto
normativo»
30º
O Reclamante discorda porquanto, como se contem no recurso interposto para o T.
C. e acima aqui se reiterou esclarecendo, é a questão do momento para ordenar a
notificação do Recorrente que é crucial no caso dos autos
31º
Ora, decidir qual o momento para ordenar a notificação do Recorrente, se antes
se depois de proferir o Acórdão requerido no STA, quando para tal decisão teriam
que ser convocadas a normas constantes do n.º 3 do artigo 3.º do C.P. Civil e do
n.º 3 do artigo 131.º do CPTA, impõe a interpretação das mesmas, pelo Tribunal
Recorrido, a fim de as aplicar ao caso dos autos
32º
Ora, foi exactamente essa interpretação, aplicada, ainda que só implicitamente,
que não se conformou com as normas constitucionais invocadas na reclamação para
a conferência no STA e indicadas no requerimento para o T. C.
33º
Na verdade decidir qual é o momento... é, por inerência, tomar uma decisão no
tempo, por isso que, tomar tal decisão, é, por inerência, decidir questão de
prioridade, é, por inerência, imprimir celeridade ou, inversamente, torpor nos
autos, é fazer escolha que seja razoável para o prazo que pedem as normas legais
que regulam a tramitação processual, ou inversamente, escolha que não caiba no
conceito de razoabilidade em referência ao prazo, é, enfim, fazer escolha que
seja adequada, ou, inversamente, que não se seja adequada a decretar as
providências cautelares requeridas, naturalmente, para neutralizar o periculum
in mora, pois o processo principal do qual depende o procedimento cautelar vai,
naturalmente, demorar o seu tempo a ser decidido
34º
Os princípios constitucionais são, efectivamente, normas constitucionais,
35º
São normas constitucionais abertas
36º
Ora, o Tribunal recorrido, o STA, no Acórdão, de 29/03/2007, sopesou, ainda que
só implicitamente, os princípios constitucionais invocados na reclamação para a
conferência
37º
Vejam-se os termos da reclamação para a conferência apresentada no STA, que, com
o devido respeito, apesar de transcrita no Acórdão proferido no STA em
29/03/2007, foi cortada, em parte, na decisão aqui reclamada em 1.
(transcreve‑se)
«O artigo 27.º do CPTA que estabelece os poderes do Relator, e que no n.º 1
elencou as competências do Relator, determina, na alínea a) que compete ao
relator «deferir os termos do processo ... » e na alínea g) que compete ao
Relator « conhecer das nulidades dos actos processuais e dos próprios despachos»
O artigo 131.º do CPTA estabelece, no n.º 3, que «quando a petição permita
reconhecer a possibilidade de lesão iminente e irreversível do direito,
liberdade ou garantia invocado ou outra situação de especial urgência, o juiz ou
relator pode, colhidos os elementos a que tenha acesso imediato e sem quaisquer
formalidades ou diligências, decretar provisoriamente a providência requerida
(...)»
O mesmo artigo 131.º do CPTA estabelece, no n.º 6, que «decretada a providência
provisória, a decisão é notificada de imediato às autoridades que a devam
cumprir, nos termos gerais para os actos urgentes, e é dado às partes o prazo de
cinco dias para se pronunciarem sobre a possibilidade do levantamento,
manutenção ou alteração da providência, (...)»
Sendo as normas do artigo 131.º do CPTA, como são, as normas legais aplicáveis
in casu, devia o Tribunal ter decretado, neste Procedimento Cautelar, todas as
Providências que nele foram Requeridas, nos termos do artigo 131.º, n.º 3, do
CPTA em vez de, pelo despacho de 17/11/2006, aqui reclamado, ter determinado a
notificação do Recorrente, aqui Reclamante para se pronunciar, querendo nos
termos do mesmo
É certo que o Recorrente tem direito a pronunciar-se sobre o teor de fls. 770 e
segs., exercendo o contraditório nos termos previsto no artigo 3.º, n.º 3, do
C.P. Civil, mas este não é o momento para o efeito porquanto outra prioridade
nesta fase processual está erguida, a saber, decretar todas as Providências
Cautelares que foram requeridas, tal porquanto,
As normas do C. P. Civil, são aplicáveis ao presente Procedimento Cautelar mas
só supletivamente, com as necessárias adaptações, como determina o artigo 1.º do
CPTA
Ora,
O n.º 3 do artigo 3.º do C. P. Civil estabelece que «o juiz deve observar e
fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não
lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de
direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes
tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.» (itálico nosso)
Assim,
Dado que o artigo 131.º do CPTA – e é ao abrigo desta norma que o presente
Procedimento Cautelar está a correr – que disciplina os termos do Procedimento
Cautelar Urgente não prevê a audição do Recorrente nesta fase mas, inversamente,
só prevê a audição do Recorrente, aqui Recorrente, nos termos das normas
constantes do seu n.º 6, então, a conclusão necessária que dele se retira é que
o Recorrente, aqui Reclamante, só deve ser ouvido sobre matéria concernente ao
Procedimento Cautelar depois de decretadas as Providências Requeridas
O artigo 131º do CPTA que regula um Procedimento Cautelar Urgente, como é o
presente Procedimento Cautelar nesta fase, prevê no seu n.º 6 o momento em que o
Requerente, aqui Reclamante deve ser ouvido, esse momento é após o Tribunal
decretar as Providências Requeridas, por isso que notificar o Recorrente do
despacho de 17/11/2006 antes de decretar todas as Providências Requeridas é
precisamente um caso de manifesta desnecessidade, previsto no artigo 3.º, n.º 3,
do C.P. Civil
Proferir actos processuais manifestamente desnecessários, como é o caso, do
despacho de 17/11/2006, no segmento aqui reclamado que ordenou a notificação do
Recorrente, sem que nenhuma lei, considerado o ordenamento jurídico no seu
conjunto, haja que os permita, e quando a decisão adequada era conceder todas as
Providências Cautelares que foram requeridas, ofende o princípio da limitação
dos actos processuais – que é uma manifestação do princípio da economia
processual – constante do artigo 137.º do C.P. Civil aplicável ex vi do artigo
1.º do CPTA e arrasta o presente Procedimento Cautelar sem causa justificante
adequada por isso que não se conforma com o princípio da legalidade, com o
direito à decisão jurisdicional em prazo razoável, com o princípio da
celeridade, com o princípio da prioridade, nem com o direito do Recorrente à
plena tutela jurisdicional efectiva, com o direito às Providências cautelares
adequadas que foram requeridas, princípios e direitos constantes dos artigos
2.º, 3.º, 20.º, n.º 4 e n.º 5, e 268.º, n.º 4, todos da CRP entre outros
princípios constitucionais,
Por tudo quanto precede o despacho de 17/11/2006, no segmento aqui reclamado que
ordenou a notificação ao Recorrente, ao aplicar o artigo 3.º, n.º 3, do C.P.
Civil, quando o Tribunal, porque outra prioridade, como se disse, está erguida
neste Procedimento Cautelar, devia ter aplicado o artigo 131.º, n.º 3, do CPTA
e, assim, decretar todas as Providências Requeridas, laborou em erro de
julgamento, porque violou o artigo 131.º, n.º 3, do CPTA e 1.º, 3.º, n.º 3 e
137.º, ambos do C.P. Civil, pelo que deve ser anulado, o aqui reclamado
segmento, com as legais consequências, ou se assim não for entendido, o que não
se acha mas em todo o caso aqui se coloca como hipótese, então, foi cometida
nulidade processual pois falta decretar todas as Providências Requeridas quando
foi ordenada, prematuramente, a notificação do Recorrente, para ser ouvido,
devendo em todo o caso ser anulado o aqui reclamado segmento despacho de
17/11/2006, com todas as legais consequências
Aplicar a norma constante do artigo 3.º, n.º 3, do C. P. Civil, quando devia ter
sido aplicado o artigo 131.º, n.º 3, do CPTA – como in casu sucedeu no aqui
reclamado segmento do despacho de 17/11/2006, por todos os fundamentos expostos
supra – não se conforma com o princípio da legalidade, com o direito à decisão
jurisdicional em prazo razoável, com o princípio da celeridade, com o princípio
da prioridade, com o direito do Recorrente à plena tutela jurisdicional
efectiva, isto é, com o direito às Providências cautelares adequadas requeridas,
princípios e direitos constantes dos artigos 2.º, 3.º, 20.º, n.º 4 e n.º 5, e
268.º, n.º 4, todos da CRP, o que aqui vai arguido para os legais efeitos,
designadamente os previstos nos artigos 280.º, n.º 1, alínea b) da CRP e 70.º,
n.º 1, alínea b) da Lei N.° 28/82, de 15 de Novembro devendo, em consequência, o
STA anular o aqui reclamado segmento do despacho de 17/11/2006, com as legais
consequências.» (fim de transcrição)
38º
Lida, em conferência, órgão para o qual aqui se reclama, – com melhor atenção,
em ordem à promoção da tutela jurisdicional efectiva – a reclamação apresentada
no STA, entende o aqui Reclamante, pelo menos que o T. C. deve fazer uso do
princípio in dubio pro iure que J. J. Gomes Canotilho proclama
39º
Efectivamente no Acórdão de 29/03/2007 foi transcrita toda a reclamação
apresentada para a conferência, acima transcrita, por isso que no Acórdão de
29/03/2007, foram decididas, ainda que só implicitamente, as
inconstitucionalidades, aí suscitadas, na exacta medida em que foi decidido, no
Acórdão de 29/03/2007, qual era o momento para ordenar a notificação do
Recorrente
40º
Tinham que ser aí decididas e foram decididas, embora só implicitamente, porque
a questão da inconstitucionalidade é de conhecimento oficioso
41º
Ora, o Tribunal recorrido, o STA, no Acórdão, de 29/03/2007, sopesou, ainda que
só implicitamente, os princípios constitucionais invocados na reclamação para a
conferência
42º
Ora, o Tribunal recorrido, o STA, no Acórdão, de 29/03/2007, sopesou, ainda que
só implicitamente, os princípios constitucionais invocados na reclamação para a
conferência
43º
E porque sopesou, ainda que só implicitamente, os princípios constitucionais
invocados na reclamação para a conferência, então, erigiu prioridade entre um
bem, a fé (boa) processual, e outro bem, a celeridade processual destinada a
decretar as adequadas providências requeridas
44º
Por isso, inversamente do que se contem na decisão reclamada, no Acórdão de
29/03/2007, em consequência da decisão das questões de inconstitucionalidade, aí
proferidas, ainda que só implicitamente, surgiram efeitos
45º
Esses efeitos são, por um lado, considerar o Recorrente notificado do despacho
de 17/11/2007, em consequência do que – a manter-se a decisão sumária, aqui
reclamada, após transito em julgado do Acórdão a proferir em conferência no T.C.
– o Recorrente, aqui Reclamante terá que ir responder ao conteúdo concreto do
despacho de 17/11/2007, proferido no STA
46º
Outro efeito é que o Procedimento Cautelar instaurado ao abrigo do disposto no
artigo 131.º do CPTA pelo Requerente não incorpora o bem celeridade processual
em ordem a decretar as adequadas providências requeridas
47º
Assim, em consequência das inconstitucionalidades arguidas, decididas,
implicitamente, no STA, há efeitos
48º
E dado que há efeitos, porque foram sopesados bens e princípios constitucionais,
como foi o caso, então, com o máximo respeito, forçoso é concluir que foi
suscitada questão de inconstitucionalidade normativa
49º
Perante o acima alegado, decidir, como se contem na decisão sumária, que «não se
colocou o tribunal da causa perante a necessidade de resolver uma questão de
constitucionalidade reportada a uma norma jurídica, ...» quando as questões de
constitucionalidade são de conhecimento oficioso e quando, ainda que só
implicitamente, no Acórdão de 29/03/2007, pelos motivos expostos supra, foram
decididas as questões de inconstitucionalidade suscitadas, foram sopesados os
princípios (que são normas) constitucionais invocados e os bens em referencia,
decidir, como se contem na decisão sumária, ia-se a dizer, não é justo, não é
razoável, nem adequado em ordem à máxima eficácia das normas constitucionais
invocadas tendo em vista a promoção da efectividade plena da tutela
jurisdicional requerida
50º
Alias, a decisão sumária, com o devido respeito, acaba por reconhecer isto
(transcreve-se)
«A afronta a normas ou princípios constitucionais que se censurava ao despacho
reclamado resultava de neste se ter optado por notificá-lo para o exercício do
contraditório sobre a acusação de litigância de má fé, em vez de se ter passado
ao decretamento imediato das providências. E foi, aliás, como questão de
ponderação concreta entre o princípio do contraditório e o da concentração da
decisão, por um lado, e o da celeridade na tramitação da providência cautelar,
por outro, que a alegação foi interpretada pelo acórdão recorrido.» (fim de
transcrição)
51º
Ora, o que precede, contido no despacho reclamado, visto à luz de tudo quanto o
Recorrente, aqui Reclamante, alegou supra, nesta reclamação, deve – com o devido
respeito, sublinha-se, que o Reclamante tem perante a decisão sumária aqui
reclamada – ser interpretado no sentido de que o Recurso interposto para o T. C.
deve ser admitido
52º
E, ainda que dúvidas pudessem ou possam eventualmente existir, o que o aqui
reclamante entende que não deva ser o caso, atento o conteúdo da presente
reclamação, então, ainda assim, deve ser concedido ao aqui Reclamante o
beneficio da dúvida, anulando a decisão sumária reclamada e, assim, dando
oportunidade ao Recorrente, aqui Reclamante, de, em alegações a produzir,
explicitar cabalmente e, sem margem para quaisquer dúvidas o quanto tem de
razão, porque in dubio pro iure, por ser essa a justa medida
Termos em que deve o T. C. em conferência:
a) corrigir o nome do contra interessado, fazendo constar o nome correcto:
B.,
b) declarar a nulidade da decisão sumária, nos termos previstos no artigo 668.º,
n.º 1, alíneas d) e e), pelos motivos acima alegados,
c) anular, pelos restantes motivos acima alegados, o decisão sumária, fazendo
prosseguir os autos e, assim, convidar o Recorrente, aqui Reclamante a
apresentar alegações no Recurso interposto para o T. C.”
Não houve resposta.
3. O nome do contra-interessado já foi corrigido, pelo que resta apreciar as
demais questões suscitadas pelo reclamante.
A) Quanto à arguição de nulidade
Sustenta o recorrente que na decisão reclamada “ foi decidido, inovatoriamente,
ainda que só implicitamente, que o pedido de condenação do Recorrente foi
apresentado nas contra-alegações do contra‑interessado”, o que a faria incorrer
nas nulidades previstas nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 668.º do Código
de Processo Civil.
Para tanto, argumenta que no Supremo Tribunal Administrativo
nunca foi discutido e, em consequência, nunca foi decidido se o
contra-interessado B. apresentou contra-alegações ou não as apresentou e que tal
questão não é objecto do pedido formulado no recurso de constitucionalidade,
pelo que a decisão emitiu pronúncia sobre questão de que não podia tomar
conhecimento e condenou o recorrente em mais e em objecto diferente do pedido.
Esta arguição de nulidade não tem qualquer fundamento sério.
Com efeito, a afirmação da decisão reclamada, ao identificar o incidente onde se
enxertou a questão de constitucionalidade, de que o pedido de condenação do
recorrente como litigante de má fé fora formulado em “ contra-alegações”, nada
efectivamente decide, nem pretendeu decidir, acerca da qualificação de tal peça
processual. Limita-se a adoptar, no relatório, a designação genérica e corrente
da intervenção típica do recorrido nessa fase processual. É fantasioso atribuir
a essa designação qualquer conteúdo decisório, ainda que implícito. Se a
referida peça processual merece ou não a designação de “contra-alegações” é
questão que, se relevar para algum fim, o tribunal a que a questão respeite
apreciará.
Deste modo, constituindo as decisões judiciais caso julgado nos precisos limites
e termos em que julgam (artigo 673.º do CPC) e estando os efeitos da decisão do
Tribunal em recursos de fiscalização concreta estabelecidos no artigo 80.º da
LTC, é ostensivamente destituído de fundamento atribuir a uma decisão que se
limita a não conhecer do objecto do recurso qualquer outro efeito vinculativo ou
conteúdo decisório, senão os que decorrem desse não conhecimento.
Tanto basta, para julgar improcedente a arguição de nulidade.
B) Quanto à verificação dos pressupostos do recurso
A argumentação do recorrente não logra abalar os fundamentos da decisão sumária,
qualquer deles susceptível de suportar autonomamente a decisão de não
conhecimento do objecto do recurso, que se mantém.
B.1. Quanto ao primeiro fundamento, apenas importa notar que
não se trata de o requerimento de interposição do recurso ser omisso ou enfermar
de deficiências na indicação da norma cuja inconstitucionalidade se quer que o
Tribunal aprecie.
O que a decisão reclamada considerou foi que o recorrente se propôs discutir no
Tribunal Constitucional a decisão recorrida, na irrepetível singularidade do
caso concreto, e não um critério normativo de decisão susceptível de
generalização. O que obsta ao conhecimento do recurso interposto é, portanto, a
falta de um pressuposto – o facto de o seu objecto (em sentido material) não ser
idóneo, face ao sistema de fiscalização concreta de constitucionalidade
instituído no nosso sistema jurídico –, e não a falta de requisitos do
requerimento de interposição.
Ora, só estes são remediáveis ao abrigo dos n.º s 5 e 6 do artigo 75.º-A da LTC,
pelo que improcede a imputação de que a decisão reclamada violou o disposto
nestes preceitos legais.
B.2. Por outro lado, mesmo que o enunciado agora apresentado
no artigo 23.º da reclamação correspondesse a uma norma para efeito do recurso
de constitucionalidade, a correcção pretendida pelo recorrente não é admissível.
Materializaria uma alteração do objecto do recurso e não a simples correcção ou
suprimento de requisitos que estivessem em falta no respectivo requerimento.
Ora, como resulta do respectivo regime jurídico (cfr. artigo 75.º-A da LTC e
artigo 684.º, n.º 3, do CPC) e este Tribunal tem repetidamente afirmado, o
objecto do recurso de constitucionalidade fixa-se com o requerimento de
interposição, podendo ser posteriormente restringido mas não ampliado ou
alterado para objecto diverso.
Assim, interposto recurso de fiscalização concreta visando obter do Tribunal
Constitucional a apreciação de uma questão que não caiba na sua competência, não
pode o interessado substituir o objecto do recurso em fase de reclamação da
decisão de que o tenha rejeitado com fundamento na inidoneidade do objecto.
B.3. E também nada diz o reclamante que infirme o segundo
fundamento adoptado pela decisão reclamada para não conhecer do recurso.
Como na decisão reclamada se refere, quando reclamou para a conferência do
despacho da Relatora no Supremo Tribunal Administrativo, o recorrente não
colocou uma questão de constitucionalidade normativa, de modo processualmente
adequado, em termos de o órgão jurisdicional a que então se dirigia ficar
obrigado a dela conhecer (cfr. n.º 2 do artigo 72.º da LTC). Referiu a violação
de normas ou princípios constitucionais à concreta opção efectuada pela decisão
então reclamada entre o regime de um preceito legal, em vez daquele que entendia
dever ter sido adoptado.
A circunstância de a inconstitucionalidade das normas
aplicadas ser de conhecimento oficioso não dispensa o recorrente do ónus de
suscitar de modo processualmente adequado a respectiva questão de
constitucionalidade normativa para poder aceder ao Tribunal Constitucional de
eventual decisão negativa, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da
LTC. Em primeira linha, é da própria Constituição que essa exigência resulta, ao
prever recurso para o Tribunal Constitucional de decisões que apliquem norma
“cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo” (alínea b)
do n.º 1 do artigo 280.º). Apesar de os tribunais, nos feitos submetidos a
julgamento, terem o dever de não aplicar normas que infrinjam a Constituição ou
os princípios nela consignados (artigo 204.º), não basta o eventual
incumprimento desse dever funcional para abrir a via de recurso para o Tribunal
Constitucional. A Constituição subordina o acesso ao Tribunal Constitucional, na
lógica do sistema de recurso, à prévia colocação da questão de
constitucionalidade normativa perante o tribunal da causa.
4. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o
recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 25 (vinte e cinco) unidades
de conta.
Lisboa, 17 de Setembro de 2007
Vítor Gomes
Ana Maria Guerra Martins
Gil Galvão