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Processo n.º 560/07
Plenário
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. A. recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo
70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal
Constitucional), do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Setembro de
2006.
Por decisão sumária do Relator, lavrada em 22 de Junho de 2007, decidiu-se não
conhecer do objecto de tal recurso. Desta decisão interpôs o ora Reclamante
reclamação para a conferência, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3
daquela Lei. Pelo Acórdão n.º 423/2007, de 24 de Julho de 2007, a conferência
confirmou a decisão reclamada.
Pretendeu, então, o Reclamante interpor recurso deste último aresto para o
Plenário do Tribunal, invocando para o efeito o disposto no artigo 79.º-D da Lei
do Tribunal Constitucional. Este pedido foi indeferido, em 17 de Setembro de
2007, por despacho com o seguinte teor:
“Considerando o disposto no artigo 79.º-D, n.º 1, da L.T.C., não admito o
recurso para o Plenário, porquanto não só não vem suscitada qualquer contradição
de julgados, como, para além do mais, não foi decidida qualquer questão de
constitucionalidade, face à evidência de questões prévias ou pressupostos que
obstaram ao seu conhecimento.”
Deste despacho, interpôs agora o interessado a presente Reclamação para a
conferência, dizendo:
“1. São estes os argumentos do despacho reclamado: não foi decidida no acórdão
recorrido qualquer questão de constitucionalidade; não vem suscitada qualquer
contradição de julgados.
2. No entanto, o despacho é nulo por omissão de pronúncia, justamente porque foi
suscitada no pedido de interposição do recurso o problema de este caber não só
nos casos em que o acórdão recorrido decide uma qualquer questão de
constitucionalidade, tanto como das decisões tabelares, sobretudo as que neguem
a via de recurso: … .a interpretação da norma de recebimento ou de não
recebimento inclui-se afinal numa estrutura decisória de constitucionalidade.
3. Repete-se, ainda mais, do requerimento indeferido: quando o Tribunal
Constitucional dá interpretação diferente ao artigo de Lei sobre o recebimento
do recurso, alargando-lhe ou diminuindo-lhe um certo âmbito ou alcance, está a
decidir sobre o âmbito ou alcance do controlo de constitucionalidade, que é
definido e imposto pela CRP.
4. Por conseguinte, está a julgar no âmbito normativo de conformidade
constitucional.
5. Mas, a esta questão não foi dada resposta, sendo certo que em si mesmos os
argumentos, que o recorrente não deixou aqui de repetir, valem contra o despacho
de indeferimento da admissão do recurso, reclamado para a Conferência.
6. Depois, foi claramente alegada contradição de julgados, a saber:
7. A decisão recorrida entendeu, diz-se no requerimento indeferido, que a
questão de constitucionalidade normativa não tinha sido arguida durante o
processo [dando aos artigos 280°/1 b) CRP e 70º/1 b) LTC uma interpretação
restritiva] ao arredar a fase da aclaração da sentença do conceito de momento
anterior ao esgotamento do poder jurisdicional do tribunal recorrido.
8. Contudo, o Ac. TC 674/99/T. Const. - PN 24/97, 2.ª Sec, pub. DR II. N°.47,
00.02.25, foi alegado no dito requerimento como decisão contrária: [o momento
crítico].. .ocorre …. naqueles casos em que... na própria decisão se vai
apreciar o requerimento de arguição de uma nulidade ou pedido de aclaração...
9. Por fim, a questão normativa constitucional que hegemoniza o sistema do
recurso constitucional português foi, na verdade, objecto de controvérsia nas
instâncias: problema do modo particular de entendimento do processo e do
despacho judicial com infracção da garantia de uma sentença culminante ao modo
típico e constitucional do contencioso da jurisdição cível, redundando numa
decisão judicial meramente arbitrária que tenha posto de parte, tal como pôs a
sentença recorrida, a lógica do debate judiciário segundo a Constituição.
10. Com efeito, no caso concreto, uma intenção criminosa, segundo o modelo
argumentativo da parte contrária, pôde ser tida como declaração contratual
eficiente, sem que a intensidade da defesa tivesse conseguido alguma vez
perspectivar o debate de uma solução diversa e de natural acordo com o
ordenamento subordinado à Constituição.
11. Ora, é também o Ac. TC 674/99/T. Const. - PN 24/97, 2.ª Sec, pub. DR II.
N°.47, 00.02.25, que nos diz: [é bastante]... que se esteja perante uma decisão
judicial na qual tenha sido resolvida implicitamente uma questão de
inconstitucionalidade, o que há-de procurar-se, para o efeito do disposto nos
artigos 277° ss CRP... num conceito funcionalmente adequado ao sistema de
fiscalização da constitucionalidade, instituído e consonante com a sua
justificação e sentido...: ocorre... naqueles casos em que a questão da
inconstitucionalidade se refira a normas processuais aplicáveis a título
principal ou incidental.
12. Por conseguinte, não há razão alguma para barrar o recurso para o Plenário,
tanto mais que o problema nem sequer é de relevância meramente teórica, mas
central, pode dizer-se, às boas práticas da garantia de supervisão
constitucional pelo vértice do Tribunal Constitucional.”
Decorrido o prazo legal, os Recorridos nada disseram.
Cumpre decidir.
II – Fundamentação
2. A reclamação não merece acolhimento. Por outro lado, também o despacho
reclamado não padece de qualquer omissão de pronúncia como vem imputada pelo
Reclamante porquanto conheceu da questão que lhe foi colocada, consubstanciada
na admissão do recurso para o Plenário.
Com efeito, pretende o Reclamante que o artigo 79.º-D da Lei do Tribunal
Constitucional abrange não só as situações em que existe pronúncia efectiva do
Tribunal relativamente a questões de constitucionalidade normativa como também
os casos em que, alegadamente, existam divergências da jurisprudência
constitucional relativamente a decisões que não admitem o conhecimento dos
recursos interpostos.
A presente Reclamação é improcedente. Com efeito, e nos termos de firme e
reiterada jurisprudência deste Tribunal (assente, aliás, na própria letra da
norma em questão), o recurso previsto no citado artigo 79.º-D da Lei do Tribunal
Constitucional tem por objecto decisões que julguem questão de
inconstitucionalidade ou de ilegalidade em sentido divergente do anteriormente
adoptado.
Assim, tal recurso só cabe de decisões que, efectivamente, conheçam da questão
de constitucionalidade ou legalidade que é objecto de recurso. Tal não sucedeu,
no entanto, no caso em apreço uma vez que o Tribunal decidiu não tomar
conhecimento do objecto do recurso.
Falha, por conseguinte, um dos pressupostos essenciais ao conhecimento do
recurso interposto ao abrigo do artigo 79.º-D da Lei do Tribunal Constitucional
e, por conseguinte, à procedência da presente Reclamação.
3. Ainda assim, adianta-se também que não existe qualquer contradição entre a
decisão sumária proferida pelo Relator e posteriormente confirmada pelo citado
Acórdão 423/2007 e os Acórdãos que vêm mencionados na reclamação.
Em primeiro lugar, e no que se refere ao Acórdão n.º 674/99, publicado no Diário
da República, II Série, de 5 de Fevereiro de 2000, explicitou-se não só o que
deve ser tido como conceito de norma para efeitos de fiscalização da
constitucionalidade, cotejando-se o conceito funcional de norma que, amplamente,
vem sendo desenvolvido e explicitado pela jurisprudência constitucional, como
aqueles casos-limite que, reportando-se a situações verdadeiramente excepcionais
e anómalas, deve o Tribunal Constitucional considerar que há dispensa do ónus
processual de suscitação atempada de questão de constitucionalidade normativa.
No caso em apreço não se verifica, no entanto, nenhuma factualidade que pudesse,
legitimar tal dispensa. Pelo que, não tendo ocorrido suscitação da questão de
constitucionalidade durante o processo, não poderia o Tribunal tomar
conhecimento do objecto do mesmo.
Por sua vez, também o Acórdão n.º 669/2005, publicado no Diário da República, II
Série, de 2 de Fevereiro de 2006, se reporta a uma situação em que a decisão
recorrida havia adoptado um entendimento que, face às normas legais e à
dogmática e jurisprudência desenvolvidas até à data, não podia deixar de ser
considerada como uma verdadeira decisão-surpresa. Um dos referidos casos-limite,
por conseguinte.
Para finalizar, e como foi esclarecido nas pronúncias deste Tribunal que o
Reclamante vem impugnando, a questão de constitucionalidade suscitada nos autos
não foi objecto de concretização ou especificação em termos de ser ter como
preenchido o ónus de suscitação adequada de tal questão. Com efeito, limitou-se
o Reclamante a imputar a inconstitucionalidade, em bloco, às normas processuais
convocadas pela decisão recorrida não tendo, assim, sequer existido suscitação
de questão normativa.
III – Decisão
4. Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente
reclamação, confirmando a decisão do Relator de não admissão do recurso para o
Plenário.
Custas pelo Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC.
Lisboa, 6 de Novembro de 2007
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Ana Maria Guerra Martins
Joaquim Sousa Ribeiro
Mário José de Araújo Torres
Maria Lúcia Amaral
Vítor Gomes
Carlos Fernandes Cadilha
Benjamim Rodrigues
João Cura Mariano
Rui Manuel Moura Ramos