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Processo n.º 553/07
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., arguido em processo-crime que correu termos no 5º Juízo Criminal do
Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa, interpôs recurso da respectiva decisão
condenatória perante o Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando, além do mais,
a inconstitucionalidade do artigo 127º do Código de Processo Penal.
Tendo sido invocada, pelo Ministério Público, a extemporaneidade do recurso, o
arguido, na resposta a essa questão prévia, suscitou a inconstitucionalidade das
normas dos artigos 113º, 334º e 373º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando
interpretadas no sentido da desnecessidade de a decisão condenatória ser
pessoalmente notificada ao arguido ausente, e ainda a inconstitucionalidade das
normas dos artigos 7º do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, 107º, n.º 2,
do Código de Processo Penal, e 146º, n.º 1, do Código de Processo Civil, quando
interpretadas no sentido de que a impossibilidade de acesso às cópias das
gravações da audiência, para efeito do exercício do direito de recurso, deve ser
alegado pelas partes e não conhecido oficiosamente pelo Tribunal.
O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 27 de Março de 2007, rejeitou o
recurso, por extemporaneidade, dizendo o seguinte:
No dia 28-10-2005, após a respectiva leitura, a sentença ora em causa foi
depositada na secretaria (cfr. Fls. 124 e 125);
Por requerimento, entrado em 04-11-2005, o supra mencionado arguido, pretendendo
interpor recurso de tal aresto, solicitou que lhe fosse entregue cópia da
gravação da prova produzida a fim de efectuar a sua transcrição (cfr. Fls. 127);
Por despacho, datado de 17-11-2005, em virtude de se não dispor de meios para
esse efeito, foi determinado que se procedesse à entrega ao Exm.° advogado do
requerente das cópias existentes na secção (cfr. Fls. 139);
Tal entrega foi efectuada, por termo, em 06-12-2005 (cfr. Fls. 144)
O recurso interposto pelo supra aludido arguido deu entrada no Tribunal a quo no
dia 21-12-2005 (cfr. Fls. 145).
Ora, dispõe o art.° 411º, n. ° 1, do Código de Processo Penal que o prazo para
interposição do recurso é de 15 dias e conta-se a partir da notificação da
decisão ou, tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria.
Em face deste comando legal, resulta, pois, óbvio que, no que se reporta a
sentenças, a contagem do sobredito prazo não se opera a partir da notificação
mas sim do inerente depósito.
Ora, conforme decorre da análise do caso concreto, é forçoso concluir que foi,
precisamente, por não se entender indispensável a presença do arguido que se
veio a proceder, publicamente, à leitura da sentença apenas perante o respectivo
defensor constituído (cfr. Art.° 332°, n.° 5, do CPP).
Deste modo, sempre o recorrente se teria de considerar notificado da sentença em
causa depois dessa ocorrência (cfr. Art.° 373°, n.° 3, do supramencionado
Código).
Contudo, de acordo com o que deixámos exarado supra, verifica-se que a lei
passou a fazer depender a contagem do prazo de recurso do depósito na
secretaria, isto, de certo, para evitar incertezas acerca do início do mesmo,
atendendo a alguma prática de publicação de sentenças sem que fosse
correspondente e simultaneamente facultado às partes o acesso ao seu teor.
Aliás, neste sentido se pronunciou já o colendo S.T.J., segundo o qual: “1 – o
prazo para interposição de recurso conta-se a partir da data da leitura e
depósito na secretaria, ainda que tenha sido deferido o requerimento do
assistente para ser notificado por carta registada no seu escritório, como foi
feito. II — A carta registada remetida a comunicar o teor do acórdão não tem a
virtualidade de transferir o início do prazo para a interposição do recurso.”
(cfr. Acórdão de 15-01-1997, C. J. – Acórdãos do S.T.J., Ano V, Tomo 1—1997,
págs. 200 e seg.).
E não se nos afigura que este entendimento seja susceptível de atentar contra
qualquer exigência de ordem constitucional respeitante às garantias de defesa do
arguido (cfr. Art.° 32°, n.° 1, da C.R.P.).
Por outro lado, é certo que, quando impugne a decisão proferida sobre matéria de
facto, o recorrente deve especificar os pontos de facto que considera
incorrectamente julgados, as provas que impõem decisão diversa da recorrida e as
provas que devem ser renovadas, devendo as duas últimas especificações serem
feitas por referência aos suportes técnicos quando as provas tenham sido
gravadas (cfr. Art.° 412°, n° 3, alíneas a), b) e c), e n.º 4, do supra aludido
diploma de direito adjectivo penal).
Porém, o prazo de interposição de recurso é sempre o mesmo (o acima indicado),
quer se trate de recurso que incida exclusivamente sobre matéria de direito,
quer se trate de recurso que vise somente a impugnação da decisão sobre matéria
de facto, quer, ainda, se trate de recurso que, simultaneamente, verse matéria
de direito e impugne a decisão sobre matéria de facto e conta-se, em qualquer
dos casos, do depósito da sentença na secretaria.
E dizemos isto porque, seguramente, a lei não estabelece qualquer distinção, nem
quanto ao prazo, nem quanto ao momento a partir do qual se inicia a respectiva
contagem.
[…]
Daí que, só se possa, legitimamente, concluir que, relativamente aos recursos em
processo penal que visem a impugnação da decisão proferida em matéria de facto,
não se aplica o supra mencionado normativo de direito adjectivo civil (cfr.
Acórdão de fixação de jurisprudência n.° 9/2005, de 11 de Outubro de 2005, in
D.R. Série 1-A de 6 de Dezembro do mesmo ano).
E que, outrossim, não se pode olvidar que, conforme vem assinalado na
fundamentação de tal acórdão, a gravação da prova, enquanto meio que permite
proporcionar a reapreciação da decisão em matéria de facto pelo tribunal de
recurso, está submetida a modos regulamentados de execução (cfr. Artigos 3° a 9°
do Decreto-Lei n.° 39/95, de 15 de Fevereiro), avultando, no que para estes
autos importa, a circunstância de os suportes técnicos respectivos deverem ser
colocados pelo tribunal à disposição das partes no prazo máximo de oito dias a
contar da respectiva diligência.
Nesta conformidade, estatui o art.° 7° do sobredito diploma que o tribunal
facultará cópia das gravações, devendo o mandatário, com a respectiva
solicitação, fornecer as fitas magnéticas necessárias, sendo que a resposta do
tribunal no prazo máximo que a lei impõe (oito dias) se harmoniza, por modo
adequado, com o exercício do direito ao recurso nos prazos fixados, isto até por
que, em caso de demora na disponibilidade das cópias, o interessado sempre
disporá da faculdade de invocar justo impedimento.
Aliás, entendendo-se, como se deixou já exarado supra, inexistir qualquer lacuna
no regime dos recursos penais em matéria de facto que cumpra suprir, não poderá
nunca obter-se alargamento do prazo da respectiva interposição com o fundamento
na necessidade prévia de obtenção de cópias dos registos magnéticos.
Até porque a motivação em processo penal constitui, quando bem interpretada na
sua função e finalidade processual, apenas uma delimitação do objecto do recurso
e a enunciação dos fundamentos, sendo o desenvolvimento dos fundamentos do
recurso objecto de intervenções posteriores, seja nas alegações na audiência
seja, quando o recorrente o requeira, em alegações escritas (cfr., nomeadamente,
Acórdão do S.T.J. de 03-03-2005, Processo 335/05-V Secção, in www.pgdlisboa.pt).
Em regra, o recorrente, logo após a entrega das cópias, poderá facilmente
elaborar as motivações de recurso, mediante a especificação reportada aos
suportes técnicos, tal como lhe é exigido pelo estabelecido no art.° 412°, n.°
4, com referência ao seu n.° 3, alíneas b) e c), do CPP.
Na medida em que, podendo os suportes técnicos referentes à prova gravada estar
à disposição do recorrente desde o início do prazo de interposição do recurso,
não se consegue vislumbrar motivo válido para entendimento diverso,
designadamente para o alargamento do respectivo prazo, sendo certo que de tal
entendimento não advém o cercear de quaisquer garantias de defesa
constitucionalmente consagradas.
O Tribunal Constitucional teve mesmo oportunidade de se pronunciar já pela
constitucionalidade da norma processual penal respectiva – art.° 411º do CPP -,
no caso do recurso visar a reapreciação da prova gravada, tendo considerado que
o prazo de 15 dias estabelecido naquele dispositivo não ofende as garantias de
defesa consagradas na Lei Fundamental por não constituir um encurtamento
inadmissível das possibilidades de defesa do arguido (cfr. Acórdão n.° 542/04 de
15 de Julho, em que foi relator o Exm.° Conselheiro Benjamim Rodrigues).
Porém, quando a ultimação das motivações de recurso não for susceptível de
ocorrer, mormente por demora na disponibilidade das pretendidas cópias, sempre
poderá o recorrente usar da faculdade de invocar justo impedimento e de assim
vir a ser admitida a prática do acto fora do prazo “normal” de 15 dias
legalmente previsto para a interposição do recurso em processo penal.
Todavia, in casu, no requerimento de fls. 127, o arguido nada invocou,
permanecendo sem explicação a razão pela qual apenas solicitou cópias das
gravações quando se estava já no sétimo dia do prazo legalmente previsto para a
interposição do recurso e há muito expirara, quer o prazo máximo de 8 dias a
contar de cada uma das sessões de audiência de julgamento (a última sessão em
que se registou produção de prova teve lugar em 18-10-2005), quer o prazo de 3
dias de que dispunha para reclamar quanto à qualidade da própria gravação.
Destarte, torna-se até imperioso salientar que, nos termos do art.° 70, n.° 1,
do Decreto-Lei n.° 39/95, de 15 de Fevereiro, durante a audiência, são gravadas
simultaneamente uma fita magnética destinada ao tribunal e outra destinada às
partes.
Assim, dificilmente se concebe – nem vem sequer invocada – uma efectiva
impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada, geradora de
justo impedimento, relativamente à não apresentação das motivações de recurso no
decurso do prazo de 15 dias previsto na lei para esse efeito.
Daí que, por força do que acaba de se expender, não se vislumbre a existência de
qualquer interpretação inconstitucional do estatuído nos artigos 107°, n.° 2, do
CPP e 146°, n.° 1, do CPC, reportada ao consagrado no art.° 32°, n.° 1, da CRP.
Nestes termos, impõe-se concluir que o recurso deduzido pelo arguido A. é
manifestamente extemporâneo, uma vez que, à data da sua interposição, estava já
precludida, de forma irremediável, a faculdade de reapreciação da matéria
objecto do mesmo.
[…].
O arguido interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da
alínea b), do n.º 1, do artigo 70º, da Lei do Tribunal Constitucional, nos
seguintes termos:
Suscitou o recorrente perante o Tribunal da Relação, na resposta ao parecer do
Ministério Público relativamente ao qual foi notificado, que os artigos 334º,
373º, nº 3, e 113º, todos do Código de Processo Penal, quando interpretados no
sentido da decisão condenatória não ser notificada ao arguido ausente, por
ofender as garantias de defesa, eram inconstitucionais, face ao disposto no
artigo 32º, nº 1, da CRP, por entender tratar-se de um direito inalienável.
Também suscitou o recorrente a inconstitucionalidade dos artigos 107º do Código
de Processo Penal, 146º, nº 1, do Código de Processo Civil e 7º do Decreto-Lei
nº 39/95, por ofender de igual forma o artigo 32º, nº 1, da CRP, quando
interpretados no sentido da impossibilidade de acesso às cópias da gravação,
para além do prazo legal, por inobservância deste prazo por parte da secção de
processos, dever ser alegada pelas partes, e não conhecida oficiosamente pelo
Tribunal, por dispor nos autos de todos os elementos para desse vício conhecer.
Nestes termos requer que o recurso seja admitido.
Tendo sido o recurso admitido no tribunal recorrido, o relator, no Tribunal
Constitucional, por decisão sumária, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º
1, da Lei do Tribunal Constitucional, decidiu dele não tomar conhecimento, com
base nas seguintes ordens de considerações:
Relativamente à primeira interpretação normativa – a que se reporta aos artigos
334º, 373º, n.º 3, e 113º do Código de Processo Penal e que diz respeito à
desnecessidade de notificação da decisão condenatória ao arguido ausente -,
importa salientar que, só a título acessório, o tribunal recorrido teceu
considerações sobre a obrigatoriedade de notificação da sentença condenatória ao
arguido ausente.
Com efeito, a questão a decidir pelo tribunal recorrido era outra: a de saber a
partir de que momento se devia contar o prazo para interpor recurso da decisão
condenatória.
E a esta questão respondeu o tribunal recorrido através da aplicação do artigo
411º, n.º 1, do Código de Processo Penal – nos termos do qual o prazo para
recorrer deve contar-se a partir do depósito da sentença na secretaria -, não
através da aplicação dos preceitos legais indicados pelo recorrente.
Importa, pois, concluir, quanto à primeira interpretação normativa identificada
pelo recorrente, que a mesma não constituiu o fundamento da decisão recorrida.
Ora, só pode afirmar-se que a interpretação normativa que se submete à
apreciação do Tribunal Constitucional foi aplicada pelo tribunal recorrido, nos
termos e para os efeitos do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal
Constitucional, quando essa interpretação integra a motivação da decisão
recorrida.
A razão está em que, só nesses casos, o recurso de constitucionalidade possui
utilidade: se o tribunal recorrido adoptou a interpretação normativa que se
submete à apreciação do Tribunal Constitucional a título meramente acessório ou
marginal, nenhuma utilidade tem a sua apreciação pelo Tribunal Constitucional,
pois que, seja qual for a decisão que este Tribunal venha a proferir sobre a
questão, sempre a decisão recorrida se manterá (pois que o seu sentido não
depende da tal interpretação normativa adoptada a título acessório ou marginal,
mas apenas da interpretação normativa que constituiu o fundamento da decisão).
Não pode, assim, conhecer-se do objecto do presente recurso de
constitucionalidade, no que se refere à primeira interpretação normativa
indicada pelo recorrente, por não estar preenchido um dos seus pressupostos
processuais.
Quanto à segunda interpretação normativa cuja apreciação o recorrente pretende –
que se reporta aos artigos 107º do Código de Processo Penal, 146º, n.º 1, do
Código de Processo Civil, e 7º do Decreto-Lei n.º 39/95, e que diz respeito à
necessidade de alegação pelas partes (e, portanto, inexistência de um dever de
conhecimento oficioso pelo tribunal) da impossibilidade de acesso às cópias da
gravação -, cumpre também reconhecer que do texto da decisão recorrida não
decorre tal entendimento.
Na verdade, o tribunal recorrido, ao referir, depois de indicar vários elementos
dos autos, que “dificilmente se concebe – nem vem sequer invocada – uma efectiva
impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada”, deu claramente
a entender que a impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada
constitui uma circunstância que pode decorrer dos próprios autos, não dependendo
a sua atendibilidade de alegação pelas partes.
Dito de outro modo: se o tribunal recorrido entendesse que a impossibilidade de
acesso ao suporte material da prova gravada constitui uma circunstância cuja
atendibilidade depende de alegação das partes, não se compreenderia a alusão que
esse tribunal começou por fazer aos elementos dos autos, pois que lhe bastaria
declarar que tal alegação não fora feita, a fim de concluir no sentido de que,
ao recorrente não tinha sido impossível aceder ao suporte material da prova
gravada.
Não pode, assim, conhecer-se do objecto do presente recurso de
constitucionalidade, no que se refere à segunda interpretação normativa indicada
pelo recorrente, por esta interpretação não ter sido aplicada na decisão
recorrida e, assim, não estar preenchido um dos pressupostos processuais do
recurso.
Desta decisão interpõe o arguido reclamação para a conferência, que, na parte
útil, tem os seguintes fundamentos:
[…]
7º Quanto à 1ª questão – desnecessidade de notificação da decisão condenatória
do arguido ausente:
É um facto que o Tribunal da Relação apenas faz referência ao artigo 411º, nº
1, do Código de Processo Penal.
Porém não é menos verdade, que, ao pronunciar-se da forma e amplitude que o faz
deixa claro que não aceita o entendimento do recorrente, ou seja, na decisão os
contextos normativos invocados, embora não lhes faça referência o que na prática
conduz à mesma coisa.
8°. – Na verdade, afigura-se-nos que se não torna indispensável que o juiz
indique, na decisão, os normativos susceptíveis de violarem os preceitos
constitucionais, embora o deva fazer, sendo suficiente que os afloramentos
expressos na decisão, se contenham nas normas invocadas pelo recorrente.
9º - Ao fazer alusão apenas ao citado normativo, o ilustre juiz relator quis
dizer que os normativos invocados pelo recorrente artigos 334º, 373º, n.º 3, e
173°. Do CPP, quando interpretados nos termos do artigo 411º, n°. 1, do CPP não
ofendiam as garantias de defesa invocadas pelo arguido, deixando essa
interpretação na decisão recorrida, desprezando prazos previstos na lei, e
invocados pelo recorrente, sento certo que lhe não assiste razão por tal
entendimento encurtar de forma inadmissível e ilegal o direito à defesa.
10º - Direito que assiste ao reclamante e que clama lhe seja concedido tendo em
vista a apreciação da decisão de fundo, qual seja, a proferida pelo tribunal da
1ª instância e que no entendimento do Tribunal da Relação não será objecto de
apreciação.
2ª. Questão:
11º - Do texto da decisão ora reclamada depreende-se que o Tribunal da Relação
acabou por admitir que “o acesso ao suporte material da prova gravada constitui
uma circunstância que pode decorrer dos próprios autos, não dependendo a sua
atendibilidade de alegação pelas partes”.
12°. – Ora, do texto da decisão recorrida não é isso que resulta.
13º. – Diz a dado passo a douta decisão recorrida – “Porém, quando a ultimação
das motivações de recurso não for susceptível de ocorrer; mormente pela demora
na disponibilidade das pretendidas cópias, sempre poderá o recorrente usar da
faculdade de invocar justo impedimento e de assim vir a ser admitida a prática
do acto fora do prazo «norma» de l5 dias….
E acrescenta
- Todavia, in casu no requerimento de fls. 127 o arguido nada invocou, …
solicitou cópias quando se já estava no 7°. Dia do prazo máximo de 8 dias …quer
do prazo de 3 dias de que dispunha para reclamar quanto à qualidade da prova.
- “Assim dificilmente se concebe — nem vem sequer invocada — uma efectiva
impossibilidade de acesso ao suporte material … geradora de justo impedimento,
relativamente à não apresentação das motivações de recurso no decurso do prazo
de 15 dias…
- Daí que, por força do que se acaba de expender não se vislumbra a existência
de qualquer interpretação inconstitucional… pelo que se impõe concluir-se que o
recurso deduzido pelo arguido… é manifestamente extemporâneo… e deve ser
rejeitado por se verificar causa que devia ter determinado a sua não admissão.”
14º. – Salvo o devido respeito não sufragamos o entendimento do ilustre
magistrado reclamado.
15º - Os fundamentos invocados pelo Tribunal da Relação foram bem diferentes dos
expressos na decisão proferida pelo Tribunal Constitucional e foi com base na
violação dos preceitos invocados pelo recorrente que o tribunal recorrido
rejeitou a apreciação do recurso da decisão condenatória.
No seu parecer, o Exmo magistrado do Ministério Público pronunciou-se pelo
indeferimento da reclamação por entender que a mesma não põe em causa o
essencial da fundamentação nem o sentido da decisão sumária proferida.
Vem o processo à conferência sem vistos.
II Fundamentação
2. No recurso para o Tribunal Constitucional, o recorrente pretendia ver
analisadas duas questões de inconstitucionalidade: uma referente às normas dos
artigos 334º, 373º, nº 3, e 113º, do Código de Processo Penal, quando
interpretadas no sentido de a decisão condenatória penal não ter de ser
notificada ao arguido ausente, por violação das garantias de defesa consagradas
no artigo 32º, nº 1, da CRP; outra relativa às normas dos artigos 107º do Código
de Processo Penal, 146º, nº 1, do Código de Processo Civil e 7º do Decreto-Lei
nº 39/95, quando interpretadas no sentido de a impossibilidade de acesso às
cópias da gravação, para além do prazo legal, por inobservância deste prazo por
parte da secção de processos, dever ser alegada pelas partes, e não conhecida
oficiosamente pelo Tribunal, por violação da mesma disposição do artigo 32º, nº
1, da CRP.
Por decisão sumária, entendeu-se não tomar conhecimento do recurso por
inverificação dos respectivos pressupostos processuais, em relação a uma das
interpretações normativas por se considerar que ela não tinha constituído o
fundamento principal da decisão recorrida, e em relação a outra com base na
ideia de que ela não tinha sido aplicada nessa mesma decisão.
O reclamante discorda deste entendimento, quanto àquele primeiro aspecto, por
considerar que o Tribunal da Relação, embora não faça uma referência expressa às
normas dos artigos 334º, 373º, n.º 3, e 113° do CPP, acaba por aceitar uma
interpretação dessas normas desconforme à Constituição por força da aplicação do
estabelecido no artigo 411º, n°. 1, do mesmo Código.
O argumento é insubsistente.
O recurso de constitucionalidade com fundamento na alínea b) do n.º 1, do artigo
70º, da Lei do Tribunal Constitucional, como é o caso, pressupõe que, pela
decisão recorrida, tenha sido aplicada norma cuja inconstitucionalidade tenha
sido suscitada no processo. Não bastará, por isso, uma mera referência de
passagem ou a alusão indirecta à norma que vem arguida de inconstitucionalidade
para que se considere preenchido o pressuposto processual. Por outro lado, o
carácter instrumental do recurso para o Tribunal Constitucional – que se
pronuncia apenas sobre questão de inconstitucionalidade – justifica que se
considere prejudicado o julgamento da questão, por inutilidade, quando a decisão
sobre o recurso de constitucionalidade não possa ter qualquer influência sobre o
desfecho da causa (sobre o interesse processual enquanto pressuposto processual
do recurso de constitucionalidade, vejam-se, entre muitos outros, os Acórdãos
n.º s 93/95, de 21 de Fevereiro, e 317/2004, de 5 de Maio).
Não é, por isso, admissível, à partida, que a interpretação normativa que o
recorrente põe em causa – e que constitui objecto do recurso – seja aquela que
resulte, não directamente da aplicação das normas que são invocadas no recurso,
mas indirectamente por efeito da aplicação de um outro preceito legal a que as
instâncias recorreram para fundamentar a sua decisão.
No caso vertente, o que sucede é que – estando em causa a questão da
extemporaneidade do recurso – o Tribunal da Relação considerou que o prazo para
interposição do recurso penal se contava a partir do depósito da sentença na
secretaria, isso por aplicação do artigo 411º, n.° 1, do Código de Processo
Penal, que justamente prevê que o prazo se conte «a partir da notificação da
decisão ou, tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria».
Certo é que, de seguida, o acórdão recorrido também afirma (fazendo expressa
referência ao artigo 373º, n.º 3, do CPP) que, não estando o arguido presente na
sala de audiência, sempre teria de considerar-se notificado da sentença através
da sua leitura perante o defensor constituído (tal como esse preceito prevê).
Esse é, no entanto, um argumento meramente lateral e não decisivo para a solução
jurídica do caso, como se depreende de um excerto subsequente, onde se lê:
«[C]ontudo, de acordo com o que deixámos exarado supra, verifica-se que a lei
passou a fazer depender a contagem do prazo de recurso do depósito na
secretaria, isto, de certo, para evitar incertezas acerca do início do mesmo,
atendendo a alguma prática de publicação de sentenças sem que fosse
correspondente e simultaneamente facultado às partes o acesso ao seu teor».
O acórdão reporta-se, pois, ao artigo 411º, nº 1, do CPP e é a interpretação que
dele se faz, em matéria de contagem do prazo de recurso – aliás, na linha do
entendimento da jurisprudência do STJ, a que se faz também alusão –, que se
considera, no mesmo aresto, não ser susceptível de violar as garantias de defesa
do arguido.
A questão de constitucionalidade que foi suscitada no processo, por sua vez, não
é essa, mas uma outra, que se reporta aos artigos 334º, 373º, n.º 3, e 113º do
Código de Processo Penal e que diz respeito à desnecessidade de notificação da
decisão condenatória ao arguido ausente. Na verdade, os artigos 334º e 373º, n.º
3, do CPP (enquadrados pela disposição do artigo 113º, que apenas institui as
regras gerais em matéria de notificações) apenas se referem às situações de
ausência do arguido na audiência, estabelecendo o regime em que esta pode
prosseguir sem a sua comparência e determinando uma presunção de notificação do
arguido ausente por via da leitura pública da sentença.
A norma que foi aplicada ao caso foi, porém, a do artigo 411º, n.º 1 (que manda
contar o prazo de recurso do depósito da sentença na secretaria) e dela não se
pode depreender um qualquer juízo de constitucionalidade relativamente à
inexigência de uma notificação pessoal do arguido quando este se encontre
ausente.
3. O reclamante também suscitou a questão da inconstitucionalidade das normas
dos artigos 107º do Código de Processo Penal, 146º, nº 1, do Código de Processo
Civil e 7º do Decreto-Lei nº 39/95, por violação do artigo 32º, nº 1, da CRP,
quando interpretadas no sentido de que a impossibilidade de acesso às cópias da
gravação, para além do prazo legal, por inobservância deste prazo por parte da
secção de processos, dever ser alegada pelas partes, e não conhecida
oficiosamente pelo Tribunal.
As normas dos artigos 107º do Código de Processo Penal e 146º, nº 1, do Código
de Processo Civil referem-se à possibilidade legal de as partes, em processo
penal ou em processo civil, praticarem acto processual fora de prazo com
fundamento em circunstância que não lhe seja imputável e possa caracterizar-se
como justo impedimento. Por sua vez, o artigo 7º do Decreto-Lei nº 39/95
(diploma que veio consagrar a possibilidade de documentação e registo das
audiências finais e da prova neles produzida para efeito de recurso) impõe a
obrigatoriedade de o tribunal facultar à parte interessada, no prazo de oito
dias após a audiência, cópia das gravações de prova.
O recorrente alegou que a declaração de extemporaneidade do recurso penal
poderia representar uma interpretação inconstitucional daquelas referidas
disposições, por violação das garantias de defesa do arguido, no ponto que
tornasse exigível (para a prática do acto processual fora de prazo) a invocação
do justo impedimento que seja decorrente da própria impossibilidade de o
recorrente aceder às gravações por facto que seja imputável à secretaria
judicial.
O que o acórdão recorrido ponderou a este propósito – depois de descrever o
mecanismo legal de interposição de recurso para reapreciação da matéria de facto
– é que dificilmente se poderia conceber – nem vinha sequer invocada - «uma
efectiva impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada,
geradora de justo impedimento, relativamente à não apresentação das motivações
de recurso no decurso do prazo de 15 dias previsto na lei para esse efeito».
Isso até porque, conforme aí se expôs, nos termos legalmente previstos, «durante
a audiência, são gravadas simultaneamente uma fita magnética destinada ao
tribunal e outra destinada às partes», o que – infere-se – permitirá facultar
imediatamente aos interessados cópia dos registos.
Sem excluir, portanto, a hipótese de a parte poder recorrer ao mecanismo
processual do justo impedimento quando, em última análise, se depare com uma
situação de demora na disponibilização das gravações, o acórdão formula um juízo
de constitucionalidade partindo essencialmente da virtualidade do sistema legal
para assegurar a apresentação atempada das alegações de recurso, mesmo quando
visem a impugnação da matéria de facto.
Não há, assim, uma tomada de posição quanto ao carácter de não oficiosidade do
conhecimento dos eventuais obstáculos ao cumprimento do prazo para a
apresentação das alegações de recurso, ou, dito de outro modo, não decorre da
decisão recorrida que tenha sido a não invocação do justo impedimento que tenha
determinado a rejeição do recurso por intempestividade.
Não se vê, por isso, também motivo, nessa parte, para alterar o julgado
III Decisão
Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, acordam em indeferir a reclamação e
confirmar a decisão reclamada.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 11 de Julho de 2007
Carlos Fernandes Cadilha
Maria Lúcia Amaral
Gil Galvão