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Processo n.º 31/07
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. Por decisão sumária de fls. 176 e seguintes, não se tomou
conhecimento do recurso interposto para este Tribunal por A., pelos seguintes
fundamentos:
“[…]
6. Tendo o presente recurso sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do
artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (supra, 5.), constitui seu
pressuposto processual a invocação, durante o processo, da questão da
inconstitucionalidade da norma ou interpretação normativa cuja apreciação se
requer ao Tribunal Constitucional.
Nos termos do artigo 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, sobre o
recorrente impende o ónus de suscitar a questão da inconstitucionalidade «de
modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão
recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer».
Ora, no caso dos autos, o recorrente não cumpriu perante o tribunal recorrido, o
ónus a que aludem os preceitos referidos. Com efeito, o recorrente não suscitou,
de modo processualmente adequado, a inconstitucionalidade das interpretações
normativas que agora submete à apreciação do Tribunal Constitucional.
E não o fez porque, perante o tribunal recorrido, o recorrente se limitou a
identificar as interpretações normativas que, na sua perspectiva, teriam sido
perfilhadas na decisão então impugnada, esclarecendo quais as interpretações
normativas que, em sua opinião, seriam as correctas e imputando o vício de
inconstitucionalidade às decisões proferidas no processo (supra, 2.).
Ou seja: perante o tribunal recorrido, e não obstante ter sustentado a violação
de certos preceitos e princípios constitucionais, não levantou o recorrente, na
verdade, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, pois que a censura
que fez se reportou sempre à correcção de certas interpretações normativas, o
que se situa num plano de legalidade ou de aferição do respeito pelos princípios
legais que norteiam a interpretação da lei.
Assim sendo, compreende-se que, na decisão recorrida, não só não se encontre
tratada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, como também se
afirme que «o recorrente não cumpre o necessário ónus de alegação, não indicando
em concreto o sentido em que qualquer dos preceitos foi interpretado com
violação das normas constitucionais»: é que o recorrente não logrou identificar,
perante o tribunal recorrido, qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa, relativamente à qual esse tribunal se encontrasse obrigado a emitir
pronúncia.
Não tendo o recorrente cumprido o ónus de invocação da questão de
inconstitucionalidade, a que se referem os artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º,
n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, conclui-se que não se mostra
preenchido um dos pressupostos processuais do presente recurso, não sendo,
consequentemente, possível conhecer do respectivo objecto.
7. A terminar, não pode deixar de se sublinhar que, não tendo o Tribunal
Constitucional competência para decidir sobre a melhor (ou a mais correcta)
interpretação dos preceitos da lei ordinária, mas apenas sobre a conformidade
constitucional da interpretação que foi adoptada pelo tribunal recorrido (cfr. a
alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional), nunca
poderia pronunciar-se, no âmbito do presente recurso, sobre a correcção ou não
da interpretação perfilhada nos autos quanto aos preceitos legais mencionados
pelo recorrente [no] requerimento de interposição do recurso para o Tribunal
Constitucional (supra, 5.).
Tal pretensão excede obviamente a competência do Tribunal Constitucional. Como
tem sido repetidamente afirmado, não cabe ao Tribunal Constitucional decidir os
litígios judiciais em matérias que escapam à sua função específica de controlo
de constitucionalidade. A questão de constitucionalidade que a este Tribunal
compete resolver não consiste em fazer a adequada subsunção dos factos à norma,
ou em fixar a melhor interpretação – isto é, a interpretação preferível,
independentemente da análise da conformidade constitucional – da norma
aplicável.
Por outras palavras: está fora do âmbito do recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade a questão de saber se a interpretação perfilhada na decisão
recorrida é ou não a melhor ou a mais correcta (de acordo com os cânones
hermenêuticos) dos preceitos aplicáveis. Não pode portanto o Tribunal
Constitucional dirimir conflitos de interpretação de normas
infraconstitucionais, nem determinar qual a melhor interpretação de tais normas,
mas, apenas decidir se a interpretação por que optou a decisão recorrida é ou
não compatível com a Constituição e, designadamente, com os preceitos e
princípios indicados pelos recorrentes.
[…].”.
2. Notificado desta decisão sumária, veio A. reclamar para a
conferência, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal
Constitucional (LTC), através do requerimento de fls. 192 e seguinte (195 e
seguinte):
“[…]
1) - Vem o presente recurso rejeitado sem conhecimento da vasta matéria em que
assenta por, em suma, não ser da competência deste Tribunal Constitucional «(…)
decidir sobre a melhor (ou a mais correcta) interpretação dos preceitos da lei
ordinária, mas apenas sobre a conformidade constitucional da interpretação que
foi adoptada pelo tribunal recorrido (...)» não tendo o recorrente cumprido «(…)
perante o tribunal recorrido, o ónus a que aludem os preceitos referidos (…)» –
os do n.º 2 do art. 72º da LOTC – pois que «(...) o recorrente se limitou a
identificar as interpretações normativas que, na sua perspectiva, teriam sido
perfilhadas na decisão então impugnada, esclarecendo as interpretações
normativas que, na sua opinião, seriam as correctas e imputando o vício de
inconstitucionalidade às decisões proferidas no processo».
2) - Tal decisão enferma, data venia, de erro grave porquanto o recurso
constitucional em apreço vindo interposto sobre Acórdão do Venerando Tribunal da
Relação de Lisboa contém todas as sujeições regulamentares no que tange à
adequação formal do recurso constitucional, mesmo que quando ad cautelam.
3) - Na realidade a arguição de inconstitucionalidade interpretativa em sede de
recurso tirado da decisão de 1ª Instância sempre contém expressamente, nas suas
conclusões 3ª, 5ª, 6ª e 8ª, todas as razões de violação dos imperativos
constitucionais na interpretação expressa ou emanente que o Tribunal a quo
deixava plasmada na decisão recorrida.
4) - Esta arguição assim produzida tem a virtualidade de ser entendida na
perfeição pelo comum dos cidadãos, mais ainda por tão criteriosos e distintos
juízes, contendo todos os elementos que a lei impõe como obrigatórios.
5) - A que só alguma falta de fundamentação no acórdão recorrido quanto às
interpretações dos preceitos legais assim suscitados e arguidos de
inconstitucionalidade tornou menos esclarecedora a aplicação errada de normas
indevidamente interpretadas, como é patente até pela oposição a acórdão
constitucional citado quanto à segunda das inconstitucionalidades arguidas.
6) - Neste particular concede-se apenas haver uma lacuna no que concerne à
invocação do acórdão constitucional referido no requerimento de interposição de
recurso perante este Tribunal e não carreado ante o Tribunal a quo, mas que é
sanada pelo imperativo do conhecimento da jurisprudência por esse tribunal
segundo o são e basilar princípio jura novit curia.
7) - No mais foi cumprido na perfeição o ónus de indicar as normas violadas pela
interpretação dada na decisão recorrida, em sede de motivações e na de
conclusões, bem como aquelas que se consideram correctas, mostrando-se
perceptível pelo comum bonus paterfamilias em todas as dimensões e detalhes
exigidos pela lei.
8) - E mais não é exigido, salvo o devido e merecido respeito, que muito é, pois
que será também de aplicar na sua apreciação – indispensável à boa defesa do
recorrente/arguido na maior amplitude exigida pelos artºs 6º, n.º 1, e 11º, n.º
1, da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades
Fundamentais – o sábio princípio favorabilia amplianda, odiosa restringenda.
9) - Carecendo assim a doutíssima decisão sumária de devida apreciação em
conferência, admitindo o recurso para os ulteriores termos processuais.
[…].”.
3. Notificado da mencionada reclamação, o representante do Ministério
Público junto do Tribunal Constitucional respondeu (fls. 197):
“1º - A reclamação deduzida é manifestamente improcedente.
2º - Na verdade, a argumentação do recorrente em nada abala os fundamentos da
decisão reclamada, no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do
recurso – decorrente de o ora reclamante não ter cumprido o ónus de suscitação
processualmente adequada das questões de inconstitucionalidade que pretendia
submeter a este Tribunal Constitucional.”.
Cumpre apreciar e decidir.
II
4. O requerimento de interposição do presente recurso para o Tribunal
Constitucional tem o seguinte teor (fls. 168 e seguintes):
“[…]
I - Para apreciação da inconstitucionalidade interpretativa da norma contida no
n.º 1 do artigo 262º do Código de Processo Penal e, em consequência, dos
correlativos artigos 283º, n.º 1 e 2, e 120º, n.º 3, alínea c), na interpretação
emanente do Venerando Acórdão em causa, bem como da própria decisão instrutória
cujo recurso decide, de que, em suma, «A insuficiência do inquérito é uma
nulidade genérica que só se verifica quando se tiver omitido a prática de um
acto que a lei prescreve», e que, daí derivando, «A omissão de diligências não
impostas por lei não determina a nulidade do inquérito por insuficiência (…)».
Uma tal interpretação dessas normas adjectivas penais viola os imperativos dos
n.ºs 1 a 5 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.
Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada expressamente ad cautelam na
conclusão 3.ª do recurso submetido à apreciação do Venerando Tribunal a quo.
Sendo a interpretação considerada correcta pelo recorrente a de que «(...) a
investigação inquisitorial envolve todas as diligências necessárias ao
apuramento da verdade material, explorando todas as pistas que conduzam ao seu
apuramento tão rigoroso quanto o humanamente possível», como está sumariado a
final da mesma conclusão 3.ª.
II - Para apreciação da inconstitucionalidade interpretativa da regra contida na
alínea b) do n.º 2 do artigo 180º do Código de Processo Penal, em conjugação e
concomitância com os seus artigos 120º n.º 2, alínea d), e 283º, n.ºs 1 e 2, na
interpretação dada no Acórdão em crise de que «A prova da verdade dessa
imputação ao arguido cabe, caso pretenda a exclusão da punição (…)».
Uma tal interpretação dessas normas adjectivas penais viola o imperativo do n.º
2 do artigo 32º da Lei Fundamental, em correlação aos demais artigos 13º, n.º 1,
e 26º n.º 2.
Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada cautelar e expressamente nas
conclusões 5.ª e 6.ª do recurso em análise.
Considerando-se correcta a interpretação plasmada em sede de Tribunal
Constitucional, a saber: «O princípio da presunção de inocência do arguido,
consagrado no artigo 32º, n.º 2, da Constituição, implica, na sua dimensão
processual, a proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido»,
reforçada a conclusão 7.ª das motivações do recurso decidendo com «(...) que
toda a factualidade trazida ao inquérito deve ser investigada de forma a
garantir ao arguido que só será acusado se houver indícios suficientes após a
devida apreciação desses factos (...)».
A fortiori, por imposição do disposto no artigo 6º n.º 2 da Convenção para a
protecção dos direitos do homem e das liberdades fundamentais, (CPDHLF)
ratificada pelo Estado Português e, em consequência, obrigado ao cumprimento
pleno de tais regras elementares de defesa dos direitos e dignidade humanas.
III - Para apreciação da inconstitucionalidade interpretativa da norma dos
artigos 61º, n.º 1, alíneas d) e e), 66º, n.º 4, e 119º, […] alínea c), todos do
Código de Processo Penal, na interpretação dada no Acórdão em crise e outrossim
na decisão instrutória criticada, de que a falta de assistência do arguido por
defensor em interrogatório só gera nulidade se for obrigatória por imposição
legal plasmada agora na forma lapidar: «Não era obrigatória a assistência de
defensor, não era imprescindível que o arguido fosse assistido pelo defensor que
anteriormente lhe havia sido nomeado (...)».
Uma tal interpretação destes normativos viola os imperativos dos artigos 20º,
n.º 2, 26º n.º 2, e, especialmente, do n.º 3 do artigo 32º, da Constituição da
República Portuguesa.
Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada expressamente ad cautelam na
conclusão 8.ª do recurso analisado pelo Tribunal a quo.
Tendo-se por correcta a interpretação vertida […] sucintamente na conclusão 9.ª
do recurso analisado pelo Tribunal a quo no sentido de «Ser soberana a vontade
do arguido em ser assistido por defensor da sua escolha em todos os actos
processuais, independentemente de a lei, para além dessa vontade, lhe impor a
presença de defensor em casos específicos».
Matéria esta que, em especial, viola também as imposições da parte final do n.º
1 do artigo 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e ainda do artigo
6º, n.º 1, alínea c) da supra citada CPDHLF.
[…].”.
5. Na decisão sumária reclamada decidiu-se não conhecer do objecto do
recurso, por se ter entendido que não estavam preenchidos os respectivos
pressupostos processuais.
Concretamente, o Tribunal Constitucional verificou que o
recorrente não cumpriu, perante o tribunal recorrido, o ónus a que aludem os
artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º 2, da LTC, pois não suscitou, de modo
processualmente adequado, a inconstitucionalidade das interpretações normativas
que agora vem submeter à apreciação do Tribunal Constitucional. E não o fez
porque, perante o tribunal recorrido, o recorrente se limitou a identificar as
interpretações normativas que, na sua perspectiva, teriam sido perfilhadas na
decisão então impugnada, esclarecendo quais as interpretações normativas que, em
sua opinião, seriam as correctas e imputando o vício de inconstitucionalidade às
decisões proferidas no processo (supra, 1.).
Sublinhou-se ainda que “não tendo o Tribunal Constitucional
competência para decidir sobre a melhor (ou a mais correcta) interpretação dos
preceitos da lei ordinária, mas apenas sobre a conformidade constitucional da
interpretação que foi adoptada pelo tribunal recorrido (cfr. a alínea b) do n.º
1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional), nunca poderia pronunciar-se,
no âmbito do presente recurso, sobre a correcção ou não da interpretação
perfilhada nos autos quanto aos preceitos legais mencionados pelo recorrente
[no] requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional”.
6. Na reclamação agora deduzida, o reclamante vem, em resumo,
sustentar (supra, 2.):
– que suscitou de modo adequado a questão de
inconstitucionalidade, uma vez que “a arguição de inconstitucionalidade
interpretativa em sede de recurso tirado da decisão de 1ª Instância sempre
contém expressamente, nas suas conclusões 3ª, 5ª, 6ª e 8ª, todas as razões de
violação dos imperativos constitucionais na interpretação expressa ou emanente
que o Tribunal a quo deixava plasmada na decisão recorrida”;
– que “só alguma falta de fundamentação no acórdão recorrido
quanto às interpretações dos preceitos legais assim suscitados e arguidos de
inconstitucionalidade tornou menos esclarecedora a aplicação errada de normas
indevidamente interpretadas” [itálico aditado agora].
7. Quanto ao primeiro argumento, observem-se as conclusões da
motivação que o ora reclamante apresentou no recurso interposto para o Tribunal
da Relação de Lisboa (transcrevem-se as conclusões 3ª, 5ª, 6ª e 8ª, a que o
reclamante se reporta na reclamação, e que haviam sido transcritas no ponto 2.
da decisão sumária reclamada):
“[…]
3 - A interpretação das normas supra citadas emergente da decisão recorrida no
sentido de que a investigação de factos marginais mas relevantes não constituem
diligências obrigatórias por lei viola o conjunto de garantias constitucionais
de defesa do arguido impostas pelo artº 32º, n.ºs 1 a 5, da Constituição da
República Portuguesa, cuja interpretação correcta é a de que a investigação
inquisitorial envolve todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade
material, explorando todas as pistas que conduzam ao seu apuramento tão rigoroso
quanto o humanamente possível;
[…]
5 - A douta decisão, quanto a esta matéria, assenta em que cabe ao arguido fazer
a prova de factos que excluam a punição segundo as regras [da] alínea b) do n.º
2 do art. 180º do Código Penal, estando por isso em franca e total oposição com
a vasta jurisprudência e o constitucional «princípio da presunção da inocência,
consagrado no art. 32º, n.º 2, da Constituição, que implica, na sua dimensão
processual, a proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido»
como está decidido pelo acórdão n.º 91-426-2, de 6 de Novembro de 1991, do
Tribunal Constitucional, na sua súmula XI […];
6 - Assim a interpretação dada a essa regra substantiva conduziu a decisão
errada, na óptica do recorrente, ao não conceder procedência à invocada
nulidade, violando o disposto nos art.s 120º, n.º 2, alínea d), e 283º, n.ºs 1 e
2, ambos do Código de Processo Penal e, maxime, os imperativos constitucionais
conjugadamente contidos nos art.s 13º, n.º 1, 26º, n.º 2, e 32º, n.º 2, da
Constituição;
[…]
8 - A douta decisão instrutória aqui sindicada desatende a arguição [de]
nulidade de falta de acompanhamento do arguido por um mesmo defensor por si
escolhido ou aceite durante todos os actos processuais, interpretando as normas
adjectivas sobre esta matéria no sentido de que só se gera nulidade do acto se
for obrigatória por imposição legal a presença do defensor, o que não é o caso
do interrogatório não judicial do arguido, violando assim os direitos
fundamentais de defesa do arguido, imposto de forma peremptória nos art.s 20º,
n.º 2, 26º, n.º 2, e, especialmente, 32º, n.º 2, todos da Constituição da
República;
[…].”.
Reitera-se que nas expressões utilizadas nesta motivação não
pode ver-se a invocação, em termos processualmente adequados, de questões de
inconstitucionalidade normativa susceptíveis de constituir objecto idóneo de
recurso para o Tribunal Constitucional.
Como se disse na decisão sumária reclamada, na motivação do
recurso apresentada perante o Tribunal da Relação de Lisboa – o tribunal
recorrido –, “não obstante ter sustentado a violação de certos preceitos e
princípios constitucionais, não levantou o recorrente, na verdade, qualquer
questão de inconstitucionalidade normativa, pois que a censura que fez se
reportou sempre à correcção de certas interpretações normativas, o que se situa
num plano de legalidade ou de aferição do respeito pelos princípios legais que
norteiam a interpretação da lei”.
8. Quanto ao segundo argumento, apenas se faz notar que com ele o ora
reclamante insiste em pretender colocar perante o Tribunal Constitucional uma
questão relacionada com o controlo da aplicação que o tribunal recorrido fez do
direito infraconstitucional. Ora, tal pretensão excede obviamente a competência
do Tribunal Constitucional que, no âmbito do recurso de fiscalização concreta da
constitucionalidade fundado na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, apenas
pode incidir sobre a conformidade constitucional de normas ou interpretações
normativas perfilhadas na decisão recorrida.
9. Não sendo invocadas pelo reclamante outras razões susceptíveis de
alterar a decisão sumária proferida nos autos, nada mais resta do que
confirmá-la.
III
10. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal
Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando a decisão
sumária de fls. 176 e seguintes, que não tomou conhecimento do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (
vinte ) unidades de conta.
Lisboa, 8 de Março de 2007
Maria Helena Brito
Carlos Pamplona de Oliveira
Rui Manuel Moura Ramos