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Processo n.º 1040/06
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão, nos termos do n.º 1
do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC):
“1. Rede Ferroviária Nacional – REFER EP (recorrente), num processo em que
figura como expropriante e em que são expropriados A. e B. (recorridos),
interpôs recurso da sentença que fixou a indemnização pela expropriação. Além do
mais, pôs em crise o entendimento da sentença recorrida de que o n.º 4 do artigo
23.º do Código das Expropriações de 1999 (CE99) deveria ser interpretado
restritivamente, com o sentido de que apenas quando a entidade expropriante seja
um município e o prédio expropriado esteja localizado na respectiva
circunscrição territorial pode ser deduzido o montante correspondente à
diferença entre a contribuição autárquica paga nos últimos cinco anos e aquela
que seria paga em função do valor da indemnização, interpretação que acusou de
violar o disposto no artigo 13.º e no n.º 2 do artigo 62.º da Constituição.
Por acórdão de 21 de Setembro de 2006, o Tribunal da Relação de Évora negou
provimento ao recurso. Decidiu a questão acima referida nos seguintes termos:
“(…)Comecemos pela primeira questão suscitada, ou seja a não aplicação ao caso
dos autos da dedução, a que alude o art° 23°, n° 4, do Cód. das Expropriações,
referente ao diferencial entre a quantia paga a título de contribuição
autárquica e aquela que teria de ser paga atento valor da indemnização fixado.
Vejamos:
Será razoável que, sendo a contribuição autárquica uma receita municipal, se
esteja no caso vertente a beneficiar a REFER, a qual nada tem a ver com uma
autarquia local?
A este propósito Luís Perestrelo de Oliveira, in Código das Expropriações,
2ªedição, 2000 a pgs. 93, chama desde logo a necessidade de uma interpretação
restritiva deste preceito, afirmando, nomeadamente o seguinte “só poderá
funcionar quando a entidade expropriante seja um Município e o prédio
expropriado se localize na respectiva circunscrição”. Por outro lado, Fernando
Alves Correia, no seu estudo a Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre
Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999,
publicado na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 133°, n°s. 3913 e
3914, a pgs. 116/117, explica a referida interpretação restritiva do seguinte
modo:
“Estamos perante uma norma fiscal espúria enxertada no Código das Expropriações,
que suscita várias perplexidades. A primeira diz respeito ao seu âmbito de
aplicação. O texto da norma parece indiciar que ela abrange todas e quaisquer
expropriações de prédios urbanos e rústicos, qualquer que seja a entidade
beneficiária da expropriação. Mas tal interpretação seria de todo
incompreensível. De facto, sendo a contribuição autárquica um imposto de
natureza local, no sentido de que constitui uma receita municipal, que incide
sobre o valor patrimonial dos prédios rústicos e urbanos, não faria sentido que
o Estado, um instituto público ou empresa privada, enquanto beneficiários de uma
expropriação, deduzissem na indemnização a pagar ao expropriado a “diferença
entre as quantias efectivamente pagas a título de contribuição autárquica e
aquelas que o expropriado teria pago com base na avaliação efectuada para
efeitos de expropriação, nos últimos cinco anos”.
Concordamos inteiramente com o entendimento sufragado na obra atrás citada,
entendimento esse que foi seguido pelo Tribunal recorrido.
Assim sendo e atendendo à interpretação acabada de referir, não é aplicável ao
caso dos autos a dedução a que alude o art° 23°, n° 4 do Cód. das Expropriações,
pelo que carece a recorrente de razão na primeira questão suscitada, razão pela
qual a mesma improcede, sendo certo que tal interpretação não viola o art° 13° e
62°, da C.R.P., como pretende a recorrente.”
2. A REFER interpôs recurso para o Tribunal Constitucional mediante requerimento
do seguinte teor:
“notificada do acórdão desse tribunal, proferido em 21 de Setembro de 2006, e
não se conformando com o mesmo, na parte em que decidiu interpretar o art.°
23°/4 do Código dás Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n° 168/99, de 18 de
Setembro, como apenas se aplicando às autarquias ,locais, recusando a sua
aplicação a outras entidades expropriantes, em violação dos art.°s 13° e 62° do
C.R.P., vem dele interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do
art° 70° da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional, em contradição com toda a jurisprudência emitida sobre o
problema pelo Tribunal Constitucional.”
Já no Tribunal Constitucional, o relator proferiu o seguinte despacho:
“Ao abrigo do disposto nos n.ºs 1, 2, 3, 5, 6 e 7 do artigo 75.º-A da LTC,
convido a recorrente a completar o requerimento de interposição do recurso nos
seguintes termos:
- indicação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso
é interposto;
- enunciação precisa do sentido normativo que quer ver apreciado;
- se pretende recorrer ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º,
indicação da peça processual em que suscitou a questão de
inconstitucionalidade;
- se pretende recorrer ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º,
indicação da decisão do Tribunal Constitucional que julgou inconstitucional a
norma cuja inconstitucionalidade quer agora ver apreciada.”
A recorrente respondeu a este convite nos seguintes termos:
“REDE FERROVIÁRIA NACIONAL, REFER, EP, já devidamente identificada nos autos à
margem referenciados, notificada do despacho de V. Exa., de 18/12/2006 vem,
muito respeitosamente, dizer o seguinte:
1 – O recurso em causa foi interposto ao abrigo da alínea a) do n.° 1 do art.º
70º do L.T.C. (por lapso manifesto não figurou a indicação da alínea a)).
2 – O sentido normativo que se quer ver apreciado encontra-se resumidamente
indicado no requerimento de interposição do recurso e consiste em saber se a
interpretação dada pelo venerando Tribunal da Relação de Évora ao art.º 23º/4 do
Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 168/99, de 18 de
Setembro, como apenas se aplicando às autarquias locais, recusando a sua
aplicação a outras entidades expropriantes, viola os princípios constitucionais
de igualdade e de justa indemnização expressos nos artºs 13º e 62º de C.R.P.,
devendo ou não ser considerada inconstitucional.
3 – Nestes termos, naturalmente que ficam prejudicadas as respostas às questões
colocadas no referido despacho, uma vez que não se pretende recorrer, ao abrigo
da alínea b) ou g) do n.º 1, do citado art.º 70.º.”
3. Com este requerimento ficou esclarecido, em cumprimento do ónus estabelecido
pelo n.º 1 do artigo 75.º-A da LTC, que o recurso é interposto ao abrigo da
alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º deste diploma legal, preceito este que, em
conformidade com a alínea a) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição, dispõe
que cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos demais
tribunais que recusem a aplicação de qualquer norma, com fundamento em
inconstitucionalidade.
Ora, é manifesto que a decisão recorrida não recusou a aplicação da
norma do n.º 4 do artigo 23.º do CE99 com fundamento em inconstitucionalidade.
Limitou-se a interpretar o preceito no sentido de que a sua previsão não
abrangia a situação em causa, procedendo a uma interpretação restritiva.
Determinação do sentido e alcance da lei a que o tribunal a quo procedeu com
recurso a elementos de interpretação em que não intervieram ou não foram
decisivos argumentos de ordem constitucional, de modo que nem sequer é razoável
conjecturar a hipótese de imputar tal resultado a uma recusa implícita, fundada
num juízo de inconstitucionalidade não expresso, do sentido propugnado pela
expropriante.
Deste modo, não tendo havido recusa de aplicação com fundamento em
inconstitucionalidade, o recurso interposto não tem cabimento (alínea a) do n.º
1 do artigo 70.º da LTC), pelo que não pode prosseguir.
4. Decisão
Pelo exposto, no uso dos poderes conferidos pelo n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC,
decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso e condenar a recorrente
nas custas, fixando a taxa de justiça em 7 ( sete) unidades de conta.”
2. A recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º-A
da LTC, em síntese, com os seguintes fundamentos:
O acórdão recorrido restringiu artificiosamente o âmbito de
aplicação do n.º 4 do artigo 23.º do Código das Expropriações, por forma a não
ter de realizar uma expressa desaplicação por inconstitucionalidade. Mas essa
desaplicação implícita é inegável, designadamente pelo facto de sufragar, sem
reservas, a posição doutrinária que cita, no sentido da inconstitucionalidade da
norma com o alcance normativo recusado.
Se, perante fundamentações deste género, não for aceite o
recurso de constitucionalidade, ficarão frustradas as vias de acesso que a
Constituição e a lei estabeleceram, permitindo aos demais tribunais formular
juízos de inconstitucionalidade à margem de qualquer controlo do Tribunal
Constitucional.
À semelhança dos demais acórdãos que vem proferindo sobre a
matéria, o presente acórdão do Tribunal da Relação de Évora traduz-se no não
acatamento da jurisprudência do Tribunal Constitucional quanto à conformidade da
norma em causa com a Constituição, tornando-se necessário que este Tribunal
reafirme o seu entendimento para que se reponha a legalidade.
Os recorridos responderam que a reclamação é improcedente,
sustentando, em síntese, o seguinte:
O acórdão recorrido assenta numa argumentação lógica para não
aplicar a dedução estabelecida pelo n.º 3 do artigo 24.º do Código das
Expropriações e não em qualquer razão de inconstitucionalidade. A reclamação
deturpa o que foi decidido no acórdão recorrido, em cuja fundamentação não há
qualquer juízo, ainda que tácito ou implícito, de inconstitucionalidade.
É certo que a decisão recorrida contrasta com a fundamentação
do acórdão n.º 422/2004, no ponto em que este considerou que a natureza
tributária do n.º 4 do Código das Expropriações não é contrariado pelo facto de
não se encontrarem previstos nesse Código os termos em que o montante pago 'a
menos' pelo expropriante deve ser transferido para a autarquia a que é devido o
imposto, nos casos em que não é essa autarquia a expropriante, sendo a obrigação
de transferência resultado de a receita constituir, por força do art.º 1.º do
Código da Contribuição Autárquica, um imposto municipal. Porém, a ter por exacto
este entendimento do Tribunal, o acórdão recorrido teria violado o n.º 4 do
art.º 23.º do CE e o art.º 1.º do CCA, havendo mero erro de aplicação do
direito, a justificar o recurso de revista se este fosse admissível, mas não
envolvendo qualquer questão de constitucionalidade.
Mesmo na perspectiva da REFER o presente recurso seria inútil
uma vez que, relativamente à contribuição autárquica de todos os anos que
poderiam justificar a pretendida dedução, já ocorreu a caducidade do direito de
proceder à liquidação complementar, visto que só a notificação da decisão
judicial final que fixe a indemnização constitui o facto impeditivo da
caducidade, para efeitos do art.º 45.º da Lei Geral Tributária. Assim sendo, a
REFER vem controverter a aplicabilidade de um preceito cuja efectiva aplicação
ao caso jamais pode ter lugar.
3. Sendo o recurso, como ficou assente com a resposta da
recorrente ao convite do relator, interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do
art.º 70.º da LTC, é seu pressuposto a efectiva recusa de aplicação, pela
decisão recorrida, da norma cuja inconstitucionalidade se quer ver apreciada,
com fundamento em inconstitucionalidade. Neste capítulo, como este Tribunal tem
reconhecido (cfr. p. ex. acórdão n.º16/96, in Acórdãos do Tribunal
Constitucional, vol. 33º, pp. 117 e segs.), é exacta a afirmação da reclamante
de que a recusa de aplicação tanto pode ser expressa como implícita. Mas é
sempre indispensável que possa objectivamente concluir-se que a não consideração
da norma na decisão do caso ficou a dever-se a um juízo de invalidade com tal
fundamento. Conclusão que há-de resultar de interpretação da decisão recorrida
tendo como ponto de partida e limite o próprio texto dessa decisão, ainda que
sem descurar o contexto processual em que surge, designadamente os termos em que
lhe eram colocadas as questões a que deu resposta.
Tendo isto presente, verifica-se que no acórdão recorrido nada
mais há de relevante para a questão de constitucionalidade que o recorrente
pretende colocar além da passagem que a decisão sumária transcreve. Ora, nessa
fundamentação nada se descortina que indicie um juízo de inconstitucionalidade
sobre a norma ou um seu sentido normativo. O acórdão limitou-se a interpretar
restritivamente o n.º 3 do artigo 24.º do CE99 (porventura, a operar uma redução
teleológica do seu campo de previsão), determinando um dos seus sentidos
possíveis, com base em argumentos de ordem lógica, sem invocar qualquer razão de
inconstitucionalidade.
Argumenta a reclamante que o acórdão se socorreu de opiniões
doutrinárias que defendem que o sentido normativo por que optou é o único capaz
de preservar a constitucionalidade da norma, tendo visado com a interpretação
restritiva impedir que o resultado final redundasse no que entendia ser uma
inconstitucionalidade. Estaríamos perante uma interpretação conforme à
Constituição, com a correspondente recusa implícita do sentido julgado
desconforme, que era aquele que a recorrente defendia no seu recurso, o que,
com limites que não se torna necessário esclarecer, poderia equivaler a recusa
de aplicação para efeitos de abrir a via de recurso prevista na alínea a) do n.º
1 do artigo 70.º da LTC ( cfr. a título exemplificativo acs. n.ºs 636/94, 500/96
e n.º 1020/96, in www.tribunalconstitucional.pt; para uma perspectiva geral do
problema, RUI MEDEIROS, A Decisão de Inconstitucionalidade - Os Autores, o
Conteúdo e os Efeitos da Decisão de Inconstitucionalidade da Lei, pág. 320 e
segs.).
Sucede, porém, que esta imputação de recusa de um sentido por
considerá-lo inconstitucional não tem no texto da decisão recorrida suficiente
correspondência verbal.
Não basta, para o efeito, que o acórdão se socorra de opiniões doutrinárias em
que o argumento de interpretação conforme seja utilizado; seria necessário que
do texto transparecesse que esse argumento representou a razão principalmente
determinante do sentido normativo que o tribunal a quo atribuiu e com que
aplicou a disposição interpretanda. Ora, o que se verifica do texto transcrito é
que, para rejeitar a interpretação que a ora reclamante defendia no recurso, o
acórdão não faz qualquer referência à sua inconstitucionalidade, antes valoriza
outros elementos de hermenêutica. Do texto doutrinário a que genericamente
adere, a parte de que se serve é precisamente aquela em que aí se defende a
interpretação restritiva da norma, não fazendo referência às dúvidas de
constitucionalidade que esse mesmo Autor levanta.
Assim, não pode objectivamente dizer-se que o sentido a que chegou quanto ao
âmbito de aplicação do n.º 3 do artigo 24.º se fundou 'única ou primacialmente
no princípio da interpretação conforme à Constituição', pelo que estamos perante
uma opção de interpretação do direito ordinário que não cabe ao Tribunal
Constitucional censurar.
Aliás, os termos em que a questão foi colocada ao Tribunal da
Relação pela reclamante, em vez de valerem como elemento coadjuvante da
interpretação do acórdão no sentido de que este procedeu a uma desaplicação
implícita da norma com fundamento em inconstitucionalidade, militam em sentido
oposto. Na verdade, a própria reclamante o que sustentou nas suas alegações de
recurso não foi que a sentença de 1ª instância procedera a uma errada
desaplicação da norma com fundamento em inconstitucionalidade, mas que a
aplicara numa interpretação restritiva de que resulta a sua
inconstitucionalidade, como avulta das conclusões que a seguir se transcrevem:
“(…)
3ª - O fundamento da sentença recorrida, ao não aplicar o nº 4 do art° 23°
daquele diploma legal, foi o facto de ter interpretado este preceito
restritivamente, apenas, quando se tratasse de um Município e que tivesse como
objecto prédios localizados na respectiva circunscrição territorial.
4ª - Esta interpretação restritiva do n° 4 do art° 23° do Código das
Expropriações viola o princípio constitucional de igualdade (art° 13° C.R.P.) e
o princípio constitucional da justa indemnização (art° 62°/2 da C.R.P.).
5ª - As entidades expropriantes que procedem à dedução ao montante
indemnizatório de diferença entre as quantias efectivamente pagas a título de
contribuição autárquica e aquela que os expropriados teriam efectivamente de
pagar, com base na avaliação efectuada para o efeito, nos últimos cinco anos,
não beneficiam do montante que se deduz ao valor da indemnização.
6ª - A incidência da dedução em causa não vai ser cobrada pela entidade
expropriante, nem absorvida por esta, quer seja um Município ou qualquer outra
entidade.
7ª - Q art° 23°/4 do Código das Expropriações visa antes do mais, concretizar o
conceito constitucional de justa indemnização, contido no art° 62°/2 da C.R.P.
8ª - Só se poderia considerar que ocorreu uma ruptura indevida na sistematização
do respectivo Código - ao ponto de se ver nele uma norma fiscal “espúria”, se se
demonstrasse que a dedução da diferença prescrita no n° 4 não integra o conceito
constitucional da justa indemnização nem tem com ele nenhuma conexão funcional,
não concorrendo, por isso, em nada para a concretização legal do princípio
contido no art° 62°/2 da C.R.P.
9ª – A “cláusula de redução” do art° 23°/4 do Código das Expropriações é, tão
somente, um critério de determinação da justa indemnização, nem tem nenhuma
conexão funcional com o conceito constitucional como o tribunal tem
interpretado.
(…)
19ª - A interpretação restritiva dada pelo Tribunal “a quo” ao art° 23°-4 não
tem qualquer fundamento e é inconstitucional, uma vez que fere o princípio
constitucional de igualdade e da justa indemnização.
20º - A norma do art° 23°/4 não é uma norma fiscal que imponha de forma autónoma
um agravamento do imposto autárquico. É tão somente um critério – conforme à
C.R.P. – da determinação do montante correspondente à justa indemnização.
21ª - A separação entre Municípios e outras entidades expropriantes, como
critérios delimitados do âmbito de aplicação do art° 23°/4 do Código das
Expropriações deixa assim de ter qualquer fundamento.
22ª - A interpretação que a douta sentença recorrida deu ao não aplicar ao caso
dos autos, o referido n° 4 do art° 23° do Código das Expropriações, é
inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais contidos nos
art°s. 62°/2 e 13° da C.R.P., pelo que se arguiu a sua inconstitucionalidade.
(…).”
Esta colocação da questão mostra que, afinal, o que a
recorrente entende é que os tribunais da causa optaram por uma interpretação e
aplicação da norma com um sentido inconstitucional e não que recusaram aplicação
a um determinado sentido por ser inconstitucional. Assim sendo, justificar-se-ia
que interpusesse recurso de constitucionalidade ao abrigo da alínea b) do n.º 1
do artigo 70.º, mas não tem fundamento para interpor recurso de uma decisão
positiva de inconstitucionalidade, que não é possível imputar ao acórdão
recorrido.
Por último, embora podendo redundar no mesmo resultado prático
quanto aos termos da indemnização, o caso não se assemelha, nos seus contornos
processualmente relevantes, ao apreciado nos precedentes que a reclamante
invoca. Designadamente, não se identifica com o apreciado na decisão proferida
no Proc. n.º 758/2006 ( Decisão Sumária n.º 414/2006) . Como nessa Decisão se
põe em evidência, apesar de também não recusar expressamente a aplicação da
norma, o acórdão então recorrido continha inequívocas considerações sobre a
inconstitucionalidade da norma, nomeadamente por referência ao acórdão n.º
422/2004 e seus votos dissidentes.
4. A questão, suscitada pelos recorridos, da inutilidade do
recurso, face à caducidade do direito a proceder à liquidação complementar do
imposto, só teria sentido se o recurso devesse prosseguir, pelo que a sua
consideração fica prejudicada.
5. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar a
reclamante nas custas, com 20 (vinte) unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 13 de Fevereiro de 2007
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Artur Maurício