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Processo n.º 577/06
1ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
A recorrente A. LDA vem pedir aclaração e reforma do Acórdão n.º 580/06,
proferido a 24 de Outubro, dizendo:
[...]
A Recorrente após estudo e análise do douto acórdão proferido pelos Venerandos
Conselheiros em conferência, não logrou percepcionar cabalmente o mesmo na sua
letra e no seu espírito, o que terá ocorrido certamente por limitação da
Recorrente, pelo que, requer muito respeitosamente a V.Ex.ªs Venerandas a
aclaração da douta decisão, na parte que a seguir exporá.
A obscuridade para a Recorrente prende-se com o teor do último parágrafo da
página quarta, parágrafo que se estende ainda pela página quinta do douto
acórdão, designadamente “...Mas, o que essa transcrição revela é que ao pôr em
causa a interpretação da prova produzida e a aplicação da lei ao caso concreto
feitas pelo tribunal recorrido, a recorrente não está a suscitar uma questão de
inconstitucionalidade reportada a uma norma jurídica que tenha sido aplicada na
decisão recorrida como sua ratio decidendi; o que aquelas transcrições
representam é a discordância da recorrente quanto à solução jurídica consagrada
na decisão recorrida, suscitando questões que se reportam ao acerto da decisão
recorrida como são as que implicam o confronto da própria decisão com princípios
ou normas constitucionais.”
Efectivamente a Recorrente nunca pôs em crise as normas aplicadas pelas doutas
decisões recorridas, designadamente as do C.P.E.R.E.F., porquanto não vislumbra
quaisquer motivos para que as mesmas fossem declaradas inconstitucionais, o que
no entender da Recorrente padece de inconstitucionalidade é o juízo preconizado
pelos venerandos tribunais que já se pronunciaram sobre o presente pleito, da
letra e do espírito das normas do C.P.E.R.E.F., que é violador dos Princípios da
Legalidade e da Livre Iniciativa Económica Privada.
II
Preceitua o artigo 204° da Constituição da República Portuguesa que os tribunais
não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os
princípios nela consignados, expressando o nº 1 do artigo 277° do mesmo diploma
que essas normas são inconstitucionais, cabendo a sua apreciação a este
Venerando Tribunal Constitucional de acordo com o preceituado no n°1 do artigo
223°.
Venerandos Conselheiros cabendo a V.Ex.as a aferição da inconstitucionalidade
das normas, importará igualmente apreciar a aplicação das normas pelos tribunais
de forma violadora às disposições e princípios constitucionais, porquanto se
essas normas não prejudicam os Direitos; legal e constitucionalmente
reconhecidos aos cidadãos, sejam estes, pessoas colectivas ou privadas, já esses
juízos podem ser manifestamente lesivos aos seus direitos, pois dúvidas não
restam à Recorrente não são as normas em si que irão prejudicar os legítimos
direitos de cada cidadão, mas sim a aplicação que depois é feita dessas normas a
cada situação em concreto, situação que no entender da Recorrente, se verifica
no presente pleito.
Atento o exposto, resta a dúvida à Recorrente, que expressa perante V.Exas
Venerandos Conselheiros, efectivamente a Recorrente, conforme resulta do excerto
transcrito do douto acórdão, suscitou questões que implicavam o confronto da
douta decisão recorrida com Princípios e Normas Constitucionais, mas fê-lo
porque considera que a decisão recorrida padece, pelo entendimento que faz das
normas Jurídicas aplicadas, de inconstitucionalidade, assim como por considerar
ser este o Tribunal competente em razão da matéria para aferir ou não dessa
inconstitucionalidade, bem como por entender, quiçá de forma errónea, que a
inconstitucionalidade expressa nos juízos formulados aquando da interpretação e
aplicação das normas legais, deverá ser digna de um juízo de V.Ex.as Venerandos
Conselheiros, assim não parece resultar, do consagrado no douto acórdão
proferido por este Venerando Tribunal, contudo entende dever a Recorrente
suscitar a sua dúvida.
Pelo que atento tudo o exposto, vem a Recorrente muito respeitosamente requerer
a V.Ex.as Venerandos Conselheiros a aclaração do douto acórdão e considerando
haver motivos para a alteração do entendimento que parece presidir ao mesmo, a
sua reforma, nomeadamente na redução do valor, fixado, da taxa de Justiça.
Não houve resposta.
O pedido ora formulado pela recorrente A., LDA espelha, uma vez mais, um
incorrecto entendimento acerca dos requisitos do recurso de
inconstitucionalidade definido na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do
Tribunal Constitucional, como é o presente.
Na verdade, a recorrente não logrou destacar da decisão proferida no Supremo
Tribunal de Justiça um critério normativo, dotado de generalidade e abstracção,
que, tido por inconstitucional, pudesse, nos termos do aludido preceito, ser
submetido à apreciação do Tribunal Constitucional. É que – conforme se quis
explicar no acórdão agora reclamado – o Tribunal Constitucional não tem
competência para sindicar directamente as decisões dos outros tribunais, pois
apenas lhe cabe avaliar a conformidade constitucional de normas jurídicas.
Impunha-se, portanto, que a recorrente tivesse identificado como objecto do
recurso uma norma anteriormente acusada de desconformidade constitucional
aplicada na decisão recorrida, o que efectivamente não fez.
Na verdade, perante o Supremo Tribunal de Justiça a recorrente não suscitou
qualquer questão relacionada com a desconformidade constitucional de norma
jurídica aplicada na solução do pleito, limitando-se a afirmar que o aresto
violara normas legais e a Constituição, alegação que é claramente insuficiente
para habilitar o recorrente a interpor recurso de inconstitucionalidade, uma vez
que nem sequer ficou definido o objecto deste recurso.
Aliás, a própria recorrente afirma não querer fazer qualquer acusação de
inconstitucionalidade às normas aplicadas nas decisões recorridas, pois visa
sindicar 'o juízo preconizado pelos venerandos tribunais que já se pronunciaram
sobre o presente pleito, da letra e do espírito das normas do CPEREF que é
violador dos princípios da legalidade e da livre iniciativa económica privada' o
que, a qualquer luz, não pode deixar de ser entendido como uma impugnação
directa da decisão recorrida.
Ora, conforme se viu já, este tipo de recurso não permite a impugnação directa
de decisão recorrida.
Esclarecido este ponto, e apurando-se que o acórdão sob reclamação não enferma
de qualquer ininteligibilidade ou erro na fixação da taxa de justiça, resta
concluir que o pedido de aclaração e reforma em análise não tem qualquer
fundamento.
Decide-se, em suma, indeferir integralmente tal pedido.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UC.
Lisboa, 9 de Janeiro de 2007
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria Helena Brito
Rui Manuel Moura Ramos