Imprimir acórdão
Processo nº 766/06
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é
recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b),
da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional
(LTC), dos despachos proferidos pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça,
em 23 de Maio de 2006 e em 22 de Junho de 2006, e dos proferidos pelo Presidente
da Relação de Coimbra, em 17 de Março de 2006 e em 28 de Abril de 2006.
2. Em 24 de Outubro de 2006, foi proferida decisão sumária, pela qual se
entendeu não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto (artigo 78º-A,
nº 1, da LTC).
Para o que agora releva, pode ler-se o seguinte nesta decisão:
«O recorrente declarou, no requerimento de interposição de recurso para este
Tribunal, interpor recurso de dois despachos do Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça e de dois despachos do Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra.
Sucede, porém, no que se refere às decisões do Tribunal da Relação, que não
existe despacho a admitir os recursos para o Tribunal Constitucional, o que
obsta ao conhecimento dos mesmos, por não se poder dar como cumprido o disposto
no nº 1 do artigo 76º da LTC».
3. Notificado desta decisão, o recorrente apresentou o seguinte requerimento:
«A., recorrente nos autos supra, notificado da DECISÃO SUMÁRIA de 24.10.2006,
vem, ao abrigo do disposto no art° 266°, nº 1, do Código de Processo Civil,
dizer o seguinte:
1. Nela se transcreve o pedido constante do requerimento de interposição de
recurso para o Tribunal Constitucional, dos Despachos de 17.3.2006 e 28.4.2006,
do Presidente da Relação de Coimbra (cf. fls 12/3), que é do teor seguinte:
· Salvo melhor opinião, o respeito devido à Constituição – no tocante
à hierarquia – e à lei – no tocante à competência – impõe que, antes da prolação
de despacho sobre o requerimento de interposição do recurso dos despachos de
23.5.2006 e 22.6.2006, se ordene a baixa dos mesmos, a título devolutivo, ao
Presidente da Relação de Coimbra, para aí ser apreciado o requerimento – que
aqui se formula – de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, dos
seus despachos de 17.3.2006 e 28.4.2006.
2. O despacho proferido sobre o requerimento de interposição de recurso, por
parte do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, a tal respeito, diz:
· “Não se toma posição sobre a parte do requerimento em que se
interpõe recurso dos despachos do Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra,
por estes nos serem estranhos”.
3. O recorrente interpretou tal decisão de não tomada de posição, como devolução
da questão para o Tribunal Constitucional para que fosse este a decidir sobre o
pedido de
· se ordene a baixa dos autos a título devolutivo ao Presidente da
Relação de Coimbra, para aí ser apreciado o requerimento de interposição de
recurso para o Tribunal Constitucional, dos seus despachos de 17.3.2006 e
28.4.2006.
Efectivamente, a mera declaração do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de
que “não se toma posição”, não é passível de impugnação pelo recorrente, pois
que, não podendo ser interpretada como indeferimento do requerimento de
interposição de recurso dos despachos em causa, não era passível de reclamação
ao abrigo do disposto no artigo 76°, n°4, da Lei n°28/82, de 15 de Novembro.
Por outro lado, também, sendo aplicável à tramitação dos recursos para o
Tribunal Constitucional, as normas do Código de Processo Civil, especialmente as
do artigo 700°, e, entre estas, a da alínea a) do seu número 1, era legítima a
prognose de que o Relator no Tribunal Constitucional se pronunciasse, antes de
mais, sobre o pedido pendente, constante do requerimento de interposição do
recurso. A qual, salvo melhor opinião, constitui – até por razões de
racionalidade jurídica – uma questão prévia.
Presume-se que seria isso que teria acontecido se, por qualquer circunstância
anómala, o tribunal a quo tivesse remetido os autos ao Tribunal Constitucional
sem despacho de pronúncia sobre o requerimento de interposição do recurso.
E era dessa pronúncia que o recorrente aguardava notificação.
4. Atento o disposto nos artigos 18°, nº 1, e 20°, nº 1 da Constituição, o
requerimento de interposição de recurso dos despachos do Presidente da Relação
de Coimbra, de 17.3.2006 e 28.4.2006, não pode deixar de ser objecto de
pronúncia por parte do seu autor.
E a Exma Juíza Conselheira Relatora nesse Alto Tribunal não pode – salvo o
devido respeito – infringir tais preceitos constitucionais e correspondentes
direitos subjectivos do recorrente, omitindo decisão adequada à obtenção da
referida pronúncia.
O presente requerimento, imposto pelas normas do artigo 266°, n°1, do Código de
Processo Civil, visa prevenir o risco de o silêncio do recorrente posterior à
notificação operada por oficio desse Tribunal, de 25.10.2006, poder ser
entendido como renúncia ao direito à decisão requerida, por parte do Presidente
da Relação de Coimbra.
Excluída que está tal renúncia, reitera-se, com a devida vénia, o sobredito
pedido de que sejam os autos remetidos ao Presidente da Relação de Coimbra, para
efeito da sua pronúncia sobre o requerimento de interposição de recurso dos seus
despachos de 17.3.2006 e 28.4.2006».
4. Notificado para se pronunciar sobre este requerimento, o Ministério Público
fê-lo da forma seguinte:
«Incumbe à parte o ónus de esclarecer adequadamente qual a decisão que pretende
impugnar perante o Tribunal Constitucional, endereçando o respectivo
requerimento de interposição ao autor da decisão recorrida.
No caso dos autos, o recorrente optou por
dirigir o requerimento de interposição do recurso ao Presidente do STJ – só
sendo concebível que esteja a impugnar a decisão por ele proferida, no âmbito do
procedimento de reclamação: na verdade, é evidente que – se o recorrente
pretendia também impugnar no âmbito da fiscalização concreta, outras decisões
interlocutórias, proferidas por outros órgãos jurisdicionais, deveria
naturalmente ter-lhes endereçado o requerimento respectivo.
O objecto do presente recurso está, pois, circunscrito à apreciação da decisão
proferida pelo Presidente do STJ, não se vendo, aliás, minimamente em que medida
a eventual interposição de recursos de decisões proferidas pela Relação poderia
contender com os termos da decisão reclamada, que naturalmente se pronunciou
sobre os pressupostos de admissibilidade do recurso interposto e admitido no
Tribunal “a quo”.
E não compete obviamente a este Tribunal Constitucional pronunciar-se, no âmbito
do presente recurso – relativo a uma decisão proferida pelo Presidente do STJ –
sobre outras vicissitudes processuais, ocorridas durante a tramitação do
processo nos tribunais judiciais, cabendo ao recorrente adoptar, quanto a eles e
perante as entidades competentes, a estratégia processual que for adequada».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Segundo o disposto no nº 3 do artigo 78º-A da LTC, “da decisão sumária do
relator pode reclamar-se para a conferência”. O presente requerimento equivale,
assim, a reclamação para a conferência, uma vez que a decisão sumária se
pronunciou expressamente no sentido do não conhecimento do objecto do recurso
interposto dos despachos do Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra.
Esta decisão fundou-se na circunstância de, relativamente a estas decisões, não
haver no processo qualquer despacho a admitir o respectivo recurso para o
Tribunal Constitucional, o que contraria o disposto no artigo 76º, nº 1, da LTC.
Com efeito, no despacho que foi proferido na sequência do requerimento de
interposição de recurso para este Tribunal (fl. 142) pode ler-se relativamente
àqueles despachos apenas que “não se toma posição sobre a parte do requerimento
em que se interpõe recurso dos despachos do Presidente do Tribunal da Relação de
Coimbra, por estes nos serem estranhos”.
É este entendimento que agora se reitera, considerando, ainda, que se, por um
lado, o recorrente tinha o ónus de dirigir o recurso de constitucionalidade ao
tribunal que proferiu as decisões recorridas, por outro, aceitou o teor daquele
despacho do Supremo Tribunal de Justiça, já que nada fez na sequência da
respectiva notificação. Para além do mais, contrariamente ao sustentado pelo ora
reclamante, os artigos 266º, nº 1, e 700º, nº 1, alínea a), do Código de
Processo Civil não legitimam qualquer expectativa no sentido de caber ao
Tribunal Constitucional a remessa dos autos ao Presidente do Tribunal da Relação
de Coimbra para aí ser proferida decisão sobre a admissibilidade do recurso de
constitucionalidade interposto dos despachos em causa.
Resta, assim, reafirmar que não pode conhecer-se do objecto de recurso que não
haja sido admitido no tribunal recorrido. Consequentemente, indefere-se a
presente reclamação.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a parte da decisão que foi reclamada.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ( vinte ) unidades de
conta.
Lisboa, 20 de Dezembro de 2006
Maria João Antunes
Rui Manuel Moura Ramos
Artur Maurício